África começa nos Pirenéus

África começa nos Pirenéus é uma expressão que pretende mostrar desconsideração para com Espanha — e por localização geográfica, a Portugal, Andorra e Gibraltar —, que se baseia na situação geográfica da Península Ibérica. É originária de França, sendo a autoria geralmente atribuída a Alexandre Dumas, embora isto seja desmentido por Nestor Luján.[1] Jean-Frédéric Schaub documenta na sua obra A France espagnole. Les racines hispaniques de l’absolutisme français (2003) uma frase similar de Stendhal: «Se o espanhol fosse muçulmano, seria um africano completo».[2]

Cunhada em algum momento entre finais do século XVIII[3] e inícios do século XIX, foi utilizada na Europa durante todo esse século, sendo particularmente habitual na Espanha do século XX , onde se utilizava de maneira burlesca nos círculos absolutistas e reaccionarios opostos à expansão do liberalismo no país como legitimação do subdesenvolvimento secular das regiões espanholas face às propostas modernizadoras dos afrancesados.[4][5] Os historiadores García de Cortázar e González Vega escreveram que, expressão de despeito ou não, o termo é unicamente «a constatação dessa especificidade cultural do âmbito peninsular, difícil de assimilar às categorias dos países desenvolvidos».[6]

Segundo José María Ortega Sánchez (1977) no artigo «As origens do islão em Espanha, de mercenários, misioneros, estudantes e conversos (e II)» a frase foi cunhada por Domingos António de Sousa Coutinho (1760-1833) ao comentar a obra de Dominique de Pradt (1759-1837) Mémoires historiques sul a révolution d ́Espagne (1816).

Domingos António de Sousa Coutinho, ao comentar no livro A guerre da Péninsule sous são véritable point de vue (Bruxelles: Weissenbruch 1819 p.xxiv), escreveu-a, referindo-se à estreita união que teve Espanha tanto com respeito a África como com respeito à Europa.[7][8] Também não têm faltado intelectuais que trataram de dar a volta ao seu significado, utilizando-a como motivo de orgulho, como foi o caso de Miguel de Unamuno em Sobre a independência da pátria (1908).[9] Outros, como Antonio Machado, se ofenderam com ele e argumentaram em seu contrário.[10]

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Referências

  1. Luján, Néstor (1993). Cuento de cuentos: origen y aventura de ciertas palabras y frases proverbiales. Vol. 1. [S.l.]: Folio. pp. 14–15. ISBN 8475833586 
  2. Juan Eloy. «Imperiofobia: luces, sombras y claroscuros». Revista de Libros. Consultado em 23 de setembro de 2018 
  3. García Arenal, Mercedes (2003). La diáspora de los andalusíes. [S.l.]: Icaria Editorial. p. 17. ISBN 8474266661 
  4. Pérez Galdós, Benito (2004). Ait Tettauen. [S.l.]: Akal. p. 123, nota 43. ISBN 9788446013426 
  5. Pániker, Agustín (2007). Índika. Una descolonización intelectual. Reflexiones sobre la história, la etnología, la política y la religión en el sur de Asia. [S.l.]: Kairós. p. 27. ISBN 9788472456075 
  6. José María Iribarren, en El porqué de los dichos (citado en Marco Kunz, Metáforas de la imaginación, pg. 139), atribuye la frase a Dominique de Pradt, que en Mémoires historiques sur la révolution d'Espagne, 1816, utiliza una expresión similar: "es un error de la geografía haber atribuído España a Europa; pertenece a África: sangre, costumbres, lenguaje, manera de vivir y de combatir; en España todo es africano" (pg. 168).
  7. Ortega Sánchez, José María (2018). «Los orígenes del islam en España, de mercenários, misioneros, estudiantes y conversos (y II)». JSTR, Universidad de Valladolid 
  8. García de Cortázar, Fernando; y González Vega, José Manuel (1994). Breve história de España. Barcelona: Círculo de Lectores. p. 8. ISBN 84-226-5401-6 
  9. Unamuno, Miguel de, (1908) Sobre la independencia de la pátria. Texto completo.
  10. Aubert, Paul (1994). Antonio Machado hoy (1939-1989). [S.l.]: Casa de Velázquez. p. 392. ISBN 8486839483