A Biologia DIY, DIYBio, biologia de garagem (em referência aos começos da revolução informática) ou biohacking é um movimento internacional de ciência cidadã que trata de criar uma versão acessível e distribuída da biologia, através de soluções tecnológicas de baixo custo, e maioritariamente ao exterior dos meios convencionais da biologia (a universidade e as empresas de biotecnologia).[1][2][3] A diferença da biologia institucional, muitos dos praticantes de biologia DIY não possuem uma formação académica nesta ciência senão que adquirem suas noções e a praticam graças ao apoio da comunidade.

Instalação artística de biologia DIY que utiliza protistas do género Euglena, Paris, 2012

História editar

O aparecimento do movimento de biologia DIY durante a segunda metade de anos 2000 tem sido possível graças a vários factores. Um deles é o desenvolvimento de uma rede de hackerspaces, onde a partir de 2005 se começaram a realizar experimentos demonstrativos de técnicas biotecnológicas em Estados Unidos.[4][5] Agora bem, não foi até o período entre 2008 e 2010 em que a biologia DIY começou a se desvincular da biotecnologia corporativista e de competições académicas como iGEM até chegar a se diversificar e internacionalizar-se.[6] Os laboratórios de biologia DIY estão presentes em pelo menos 21 países no mundo, sem contar com os indivíduos ou outro tipo de organismos que a praticam.[7] Os principais laboratórios estão concentrados em América do Norte e Europa, ainda que também existem na Ásia.

Também se destaca o abaratamento nos últimos anos do material de laboratório para realizar experiências de biologia bem como a possibilidade de criação de alternativas de baixo custo ou de recuperar material usado de laboratórios profissionais e académicos. Neste sentido, a biologia DIY utiliza as possibilidades do movimento de código aberto, através de internet, para a transmissão de informação sobre métodos e materiais de laboratório. As analogias entre a informática e os sistemas vivos são muito frequentes neste movimento, ainda que estas poderiam se revelar como limitadas ao cabo do tempo já que a complexidade da vida é muito superior à da informática.

Biohacking editar

Os praticantes da biologia DIY são comumente chamados biohackers, o qual implica uma adesão à filosofia hacker além da intenção de modificar os sistemas vivos com o objectivo de explorar suas capacidades ou inclusive de criar novas funções.[8][9] Práticas comuns neste movimento são o DNA Barcoding (análise de marcadores genéticos para identificar uma espécie), a fabricação de material de laboratório de baixo custo para estudar a vida e o cultivo de microorganismos não patogénicos para obter seus produtos. Cabe destacar que a manipulação genética de seres vivos bem como a leitura de ADN humano estão sujeitas a regulação na maioria de países do mundo, e são muito poucos os laboratórios de biologia DIY que possuem uma licença do estado para realizar tais operações (ainda que a leitura de ADN não-humano costuma ser legal).[10] Na prática, os objectivos de tais experimentos poderiam ser a busca de novos aplicativos tecnológicos dos organismos vivos, a biorremediação, a investigação fundamental em biologia e inclusive a divulgação de técnicas de biotecnologia. Por último, o bioarte também incorpora técnicas que podem ser qualificadas como biologia DIY.

Em 2011, as redes de laboratórios de biologia DIY de Europa e Estados Unidos criaram documentos para tentar estabelecer um código ético que regule as suas atividades, segundo os quais os pesquisadores se comprometem a seguir as regras de segurança de laboratório bem como a respeitar todos os sistemas biológicos e a reconhecer a responsabilidade de suas acções.[11] Assim mesmo, a biologia DIY deveria ser utilizada unicamente com fins pacíficos.

Os movimentos grinder (modificação corporal destinada a aumentar as capacidades sensoriais do ser humano) e transhumanista também se apropriaram do termo biohacker, que entendem como a experimentação biológica sobre um mesmo por médio de diferentes implantes electrónicos e de novos modos de alimentação.[12] No entanto, a maioria de laboratórios de biologia DIY tende a desvincular destas correntes ideológicas por causa dos riscos sobre a saúde humana que estas poderiam implicar.

Críticas e controvérsias editar

O movimento de biologia DIY, ao igual que a biologia sintética, tem sido o objeto de numerosos artigos de imprensa nos que se utilizam argumentos como a síndrome de Frankenstein para criar um estado de alarme ao redor dele, o associando ao bioterrorismo.[13] Em realidade os principais laboratórios de biologia DIY são vigiados pelas agências do estado de diferentes países para assegurar-se que suas actividades não apresentam nenhum perigo, e às vezes chegam a colaborar com elas. Por exemplo, em 2012 o FBI organizou uma conferência sobre Biologia DIY e Segurança em Califórnia, Estados Unidos, à qual assistiram representantes dos principais laboratórios estadounidenses.[14] No entanto, os riscos que apresenta este tipo de ciência são relativamente baixos.[15] Em junho de 2013 o laboratório estadounidense BioCurious propôs um projecto na plataforma de financiamento participativo Kickstarter para criar plantas geneticamente modificadas que brilhavam na escuridão.[16] A raiz da polémica que se gerou a partir dele sobre os usos apropriados das biotecnologias, Kickstarter decidiu proibir as campanhas que prometessem organismos geneticamente modificados como recompensa.[17]

Referências

  1. Landrain, Thomas; Meyer, Morgan; Martín Pérez, Ariel; Sussan, Remi (2013). Do-it-yourself biology: challenges and promises for an open science and technology movement. Systems and Synthetic Biology. 7. Países Baixos: Springer Netherlands. pp. 115–126. ISSN 1872-5325. doi:10.1007/s11693-013-9116-4. Resumo divulgativoThe do-it-yourself biology (DIYbio) community] promises in particular to be a source of cheaper and simpler solutions for environmental monitoring, personal diagnostic and the use of biomaterials. (19 de julho de 2014) 
  2. Baker, Pam (5 de maio de 2011). «Playing God in Your Basement». Genome Alberta. Consultado em 20 de janeiro de 2012 
  3. Greg Boustead (11 de dezembro de 2008). «The Biohacking Hobbyist». Seed Magazine. Consultado em 11 de julho de 2010 
  4. Ver, nesse sentido, este artígo da revista Wired: «Splice It Yourself - Who needs a geneticist? Build your own DNA lab.». Wired (em inglês). Maio de 2005. Consultado em 14 de novembro de 2014. The era of garage biology is upon us. Want to participate? Take a moment to buy yourself a molecular biology lab on eBay. 
  5. Wohlsen, Marcus (14 de abril de 2011). Biopunk: Solving Biotech's Biggest Problems in Kitchens and Garages. [S.l.]: Penguin. p. 96. ISBN 9781101476352 
  6. «Denisa Kera, "Do It Yourself biology (DIYbio): Return of the Folly of Empiricism and Living Instruments"». www.academia.edu , artigo publicado no livro colectivo (2014). Meta-Life: Biotechnologies, Synthetic Biology, ALife and the Arts. [S.l.]: Leonardo/ISAST and MIT Press. Consultado em 22 de julho de 2014 
  7. «Grupos locais de DIYbio». diybio.org 
  8. Michels, Spencer (23 de setembro de 2014). «What is biohacking and why should we care?». PBS NewsHour. Consultado em 30 de outubro de 2015 
  9. Delfanti, Alessandro (2013). Biohackers. The politics of open science. Londres: Pluto Press. ISBN 9780745332802 
  10. ««Austria Greenlights DIY Genetic Engineering»». www.popsci.com 
  11. «Draft DIYbio Code of Ethics from European Congress» (em inglês) 
  12. «Cyborgs Among Us: Human 'Biohackers' Embed Chips In Their Bodies» (em inglês) 
  13. «Myths and Realities of the DIYbio Movement» (em inglês). Consultado em 19 de novembro de 2013 
  14. Scroggings, Michael (2013). «DIYbio and the "New FBI"». Estados Unidos: O’Reilly Media Inc. BioCoder, DIY/BIO NEWSLETTER (em inglês) (1): 11-12. ISBN 978-1-491-94601-5. Consultado em 21 de julho de 2014 
  15. Holloway, Dustin T. (1 de março de 2013). «Regulating Amateurs - How should the government ensure the safety and responsibility of do-it-yourself biologists?». The Scientist (em inglês). Consultado em 21 de julho de 2014. While there is no evidence that DIYbio represents a national security threat of this sort—on the contrary, the movement is founded on the principles of innovation, entrepreneurship, accessible science, and education—bioterrorism is a risk that policy makers must consider when developing regulations for citizen science.  |arquivourl= é mal formado: timestamp (ajuda)
  16. «Plantas que Brillan: Iluminación natural sin Electricidad por Antony Evans en Kickstarter». www.kickstarter.com 
  17. «Why did Kickstarter ban GMOs?» (em inglês) 

Ligações externas editar