Diego Duarte (Antuérpia, Países Baixos Espanhóis, 1612 - Antuérpia, Países Baixos Espanhóis, 1691) foi um joalheiro, banqueiro, compositor, organista, mecenas e coleccionador de arte luso-flamengo judeu, conhecido por possuir uma das maiores colecções de arte da Antuérpia, durante o século XVII.

Diego Duarte
Nascimento 1612
Antuérpia
Morte 1691 (78–79 anos)
Antuérpia
Progenitores
  • Gaspar Duarte (1584-1653)
  • Catharina Rodrigues (1584-1644)
Parentesco Francisca Duarte (tia)
Irmão(ã)(s) Leonora Duarte (1610-1678)
Ocupação joalheiro, banqueiro, compositor, organista, mecenas e coleccionador de arte

Biografia editar

Nascimento e Família editar

 
"A Expulsão dos Judeus", por Alfredo Roque Gameiro

Nascido em 1612, na Antuérpia, Diego Duarte era filho de Catharina Rodrigues (1584-1644) e Gaspar Duarte (1584-1653), famoso harpista, violinista, cravista, comerciante, joalheiro, mecenas e diplomata luso-flamengo, que exerceu como cônsul de Portugal em 1641. Pelo lado paterno era neto de Diego Duarte (1545-1628), natural de Lisboa, do qual recebeu o mesmo nome em sua homenagem, e sobrinho da cantora Francisca Duarte (1595-1640) e de Immanuel Abolais Duarte (1598-1632), que se tornou num dos mais conhecidos joalheiros e empresários judeus de Amesterdão. Era ainda o segundo filho dos seis filhos do casal e, conseguintemente, irmão de Leonora Duarte (1610-1678), compositora, Catharina Duarte (1614-1678), Gaspar Duarte II (1615-1685), joalheiro e mecenas, Francisca Duarte II (1619-1678), cantora, e Isabella Duarte (1620-1685).[1] Por partilhar o mesmo nome com o seu avô paterno, em alguns registos e documentos é referido como Diego Duarte II ou ainda Jacob Duarte, sendo esse o seu nome hebraico.[2]

Os seus pais eram filhos de judeus sefarditas portugueses que emigraram para os Países Baixos Espanhóis, actual Bélgica, em busca de exílio durante a Inquisição Portuguesa, contudo, devido à regência da coroa espanhola e ao fervor anti-semítico que existia no país, as suas famílias foram forçadas a se converter ao catolicismo quando chegaram à Antuérpia, passando a exercer a sua fé em segredo como criptojudeus.[3] No seu país de acolhimento, a família Duarte recuperou a sua fortuna através dos seus negócios na joelharia e nas importações e exportações de especiarias e pedras preciosas como diamantes, tornando-se no século XVII numa das famílias mais abastadas da Antuérpia.[4][5]

Educação editar

 
Retrato da família Duarte em Antuérpia, pintura a óleo de Gonzales Coques. Atribuído originalmente a Jacques van Eyck e à sua família, a pintura encontra-se exposta no Museu Snijders & Rockoxhuis.

Crescendo no seio de uma família amante das artes, Diego Duarte e os seus irmãos tiveram uma educação privilegiada, sendo ensinados pelos próprios pais em casa sobre a fé judaica, apesar de em segredo, tendo todos sido baptizados para iludir quem os vigiasse por serem cristãos novos ou "marranos", e por tutores privados que os versaram em literatura, geografia, história, matemática, filosofia e línguas, como português, holandês, inglês, latim, grego e francês.[6] Dotados para a música, aprenderam a tocar harpa, violino, flauta, viola da gamba, órgão, cravo e virginal, tornando-se conhecidos pelos saraus e recitais que organizavam para entreter os ilustres convidados que visitavam a sua casa.[7]

Inglaterra editar

Acompanhando os negócios do seu pai no ramo da joalharia e na venda e compra de diamantes desde pequena idade, em 1632, Diego Duarte, com 20 anos, e o seu irmão Gaspar, com 16 anos, decidiram partir para Londres em busca de novos clientes e oportunidades para expandir o empreendimento da família.[8] Sendo bem sucedidos, os irmãos permaneceram em Inglaterra, onde abriram uma filial e receberam um visto de cidadania que lhes permitia residir no país e usufruir de alguns direitos civis. Angariando como clientes vários membros da família real inglesa e estrangeira a viver no país, a fama de Diego Duarte tornou-se internacional, sendo nomeado joalheiro oficial de Carlos I da Inglaterra, em 1635.[9][10]

Regresso aos Países Baixos editar

 
Lady Seated at a Virginal, pintura a óleo de Johannes Vermeer, originalmente pertencente à colecção da família Duarte

Regressando à sua cidade natal como um dos homens mais ricos da Antuérpia em 1642, Diego Duarte continuou a trabalhar ao lado do seu pai e irmão nos anos que se seguiram, aumentando a fortuna e reputação da família ao realizar inúmeros acordos comerciais com vários portugueses judeus ou criptojudeus que trabalhavam ou geriam os portos de Amesterdão, Londres, Hamburgo, Paris, Dublin, Lisboa, Colónia e Goa, tendo assim acesso imediato às principais matérias primas que necessitava para criar as jóias mais requisitadas pela aristocracia europeia. Durante esse período, a sua residência, que era chamada de Parnaso da Antuérpia, tornou-se num dos locais de referência para o encontro da elite intelectual e aristocrática da época. Guilherme III da Inglaterra, Dirk Sweelinck, Jan Pieterszoon Sweelinck, Constantijn Huygens, Anna Roemers Visscher, Nicholas Lanier, Anne de la Barre, Guilielmo Calandrini, John Evelyn, William Swann, William Cavendish, 1.º duque de Devonshire, ou a família de fabricantes de pianos Ruckers eram apenas alguns dos habituais visitantes.[11]

Após a morte de Gaspar Duarte em 1653, como filho mais velho, Diego Duarte herdou não só os negócios do seu pai como uma vasta colecção de arte, composta por pinturas a óleo de ilustres artistas como Johannes Vermeer, Peter Paul Rubens e Antoon van Dyck.[12][13] Seguindo os seus passos no mecenato, o homem de negócios e joalheiro luso-flamengo começou também a patrocinar e a comprar distintas obras de arte de vários artistas até ao fim da sua vida, obtendo uma das maiores colecções de arte do país.[14]

Morte editar

Após a morte das suas três irmãs Leonora, Catharina e Francisca, vítimas da peste que devastou a cidade em 1678, e dos seus irmãos Gaspar e Isabella em 1685, tendo se dedicado inteiramente aos negócios da família, Diego Duarte faleceu em 1691. Sem descendência directa ou de nenhum dos seus irmãos, Diego Duarte tornou-se no último elemento da família Duarte a viver na Antuérpia.[15]

Legado editar

Herdando os empreendimentos e a colecção de arte, que contava com mais de 200 obras, Manuel Levy Duarte, sócio da firma Athias & Levy, casado com Constância Duarte, filha de Immanuel Abolais Duarte e prima de Diego Duarte, continuou com os negócios da família em Amesterdão, onde a restante família vivia, sendo proeminente dentro da comunidade sefardita portuguesa emigrada na cidade portuária.

Actualmente, o Museu Snijders & Rockoxhuis, situado na antiga residência da família Rockox, vizinhos de Diego Duarte, em parceira com o Museu Vleeshuis, criou uma sala de exposição permanente, inteiramente dedicada à família Duarte e ao seu espólio artístico e musical, incluindo algumas pinturas de Johannes Vermeer.

Colecção de Arte editar

Lista incompleta das obras adquiridas por Diego Duarte, tendo como base o inventário de 1682, quando várias obras foram leiloadas.[16][17]

Referências

  1. England, Jewish Historical Society of (1982). Transactions - The Jewish Historical Society of England (em inglês). [S.l.]: Jewish Historical Society of England. 
  2. Samuel, Edgar; England, Jewish Historical Society of (2004). At the End of the Earth: Essays on the History of the Jews in England and Portugal (em inglês). [S.l.]: Jewish Historical Society of England 
  3. Kistemaker, Renée; Levie, Tirtsah (1987). Êxodo, Portugezen in Amsterdam, 1600-1680 (em neerlandês). [S.l.]: Bataafsche Leeuw 
  4. Fernandes, José Carlos (2020). «Regresso a Sefarade: A atribulada história dos judeus ibéricos». Observador 
  5. Bodian, Miriam (1999). Hebrews of the Portuguese Nation: Conversos and Community in Early Modern Amsterdam (em inglês). [S.l.]: Indiana University Press 
  6. Bailey, Anthony (24 de abril de 2015). A View Of Delft (em inglês). [S.l.]: Random House 
  7. Sadie, Julie Anne; Samuel, Rhian (1994). The New Grove Dictionary of Women Composers (em inglês). [S.l.]: Macmillan 
  8. England, Jewish Historical Society of (1982). Transactions - The Jewish Historical Society of England (em inglês). [S.l.]: Jewish Historical Society of England. 
  9. Samuel, Edgar; England), Jewish Museum (London (1992). The Portuguese Jewish Community in London, 1656-1830 (em inglês). [S.l.]: Jewish Museum 
  10. Baker, Christopher (2003). Collecting prints and drawings in Europe, c. 1500-1750. [S.l.]: Ashgate Publishing, Ltd. 225 páginas. ISBN 978-0-7546-0037-4 
  11. Siegfried, Brandie R.; Sarasohn, Lisa T. (22 de abril de 2016). God and Nature in the Thought of Margaret Cavendish (em inglês). [S.l.]: Routledge 
  12. Snyder, Laura J. (9 de abril de 2015). Eye of the Beholder: Johannes Vermeer, Antoni van Leeuwenhoek, and the Reinvention of Seeing (em inglês). [S.l.]: Head of Zeus 
  13. Montias, John Michael (5 de junho de 2018). Vermeer and His Milieu: A Web of Social History (em inglês). [S.l.]: Princeton University Press 
  14. N.Y.), Metropolitan Museum of Art (New York; Liedtke, Walter A. (2007). Dutch Paintings in the Metropolitan Museum of Art (em inglês). [S.l.]: Metropolitan Museum of Art 
  15. «Music in the Time and Paintings of Vermeer: The Duarte Family». Essential Vermeer 
  16. Broos, B. P. J.; Netherlands), Mauritshuis (Hague (1993). Intimacies & Intrigues: History Painting in the Mauritshuis (em inglês). [S.l.]: Snoeck-Ducaju & Zoon 
  17. Thyssen-Bornemisza, Hans Heinrich Baron (1969). Text (em inglês). [S.l.]: Villa Favorita