Reduplicação em linguística é um processo morfológico pelo qual o radical de uma palavra (ou parte dela) é repetida de forma exata ou com pequena modificação.

Reduplicação é usada como uma flexão para indicar uma função gramatical, tais como pluralidade, intensidade, etc, em derivação de léxicos para criar novas palavras. É com frequência usada quando quem fala usa um tom mais expressivo ou figurativo do que numa conversação normal, também quando se trata de algo icônico em seu significado. A reduplicação é encontrada em diversas línguas e grupos linguísticos, com seu nível de produtividade linguística variando em cada caso.

Reduplicação é a denominação padrão desse fenômeno na literatura linguística, havendo porém outros termos que podem ser usados, tais como, clonagem, duplicação, repetição e tautônimo.

Tipologia editar

Forma editar

A reduplicação é muitas vezes descrita fonologicamente em uma de duas maneiras: ou (1) como reduplicação de segmentos de sequências de consoantes e vogais ou (2) como reduplicação de unidades prosódicas (sílabas ou moras). Além de descrição fonológica, a reduplicação muitas vezes é descrita [[morfologia| morfologicamente ] como uma reduplicação de constituintes linguísticos (ou seja, palavras, raízes, bases ). Como resultado, a reduplicação é teoricamente interessante, uma vez que envolve a interface entre fonologia e morfologia .


A dita 'base' é a palavra (ou parte da palavra ) que está a ser copiada. O elemento reduplicado é chamado de 'reduplicante', muitas vezes abreviado como RED ou às vezes apenas ' 'R


Na reduplicação o reduplicante é mais frequentemente repetido apenas uma vez. No entanto, em alguns idiomas,essa reduplicação pode ocorrer mais de uma vez , resultando numa forma triplicada, e não um ' 'duplo' ' como na maioria das reduplicações.' ' 'Triplicação' é o termo para esse fenômeno de copiar duas vezes. A língua pingelapesa apresenta tanto reduplicação como triplicação .

Verbo básico Reduplicação Triplicação
kɔul  'cantar' kɔukɔul  'cantando' kɔukɔukɔul  'ainda cantando'
mejr  'dormir' mejmejr  'dormindo' mejmejmejr  'ainda dormindo'

(Rehg 1981)

Triplicação ocorre em outras línguas, Ex.: jeje, Shipibo, axante, Mokilês, Min Nan (Hoquiém).

Por vezes, a geminação (duplicação de consoantes ou vogais) é considerada uma forma de reduplicação. O termo duplema tem sido usado (a partir de morfema) para se referir a diferentes tipos de reduplicações que tenham o mesmo significado.

Total e parcial editar

Reduplicação totalenvolve a reduplicação da palavra completa. Por exemplo, a língua Kham deriva formas recíproca dos pronomes reflexivos por meio da reduplicação total:

    [ɡin] 'nós mesmos' [ɡinɡin] 'nos (p/) nós' (ɡin-ɡin)
    [jaː] 'eles mesmos' [jaːjaː] 'eles (para) lhes' (jaː-jaː) (Watters 2002)

Outro exemplo vem do Musqueamo Halkomelem (indígenas da Colúmbia Britânica) com formação "dispositional" do aspecto gramatical:

    [kʼʷə́ɬ] 'adernar' [kʼʷə́ɬkʼʷəɬ] 'como que adernando' (kʼʷə́ɬ-kʼʷəɬ)
    [qʷél] 'falar' [qʷélqʷel] 'loquaz' (qʷél-qʷel) (Shaw 2004)

Reduplicação parcial envolve somente parte da palavra. Por exemplo, a língua marshalesa forma palavras de significado 'usar X' reduplicando o último grupo consoante-vogal-consoante (CVC) da base: base+CVC:

    kagir 'cinto' kagirgir 'usar cinto' (kagir-gir)
    takin 'meias' takinkin 'usar meias' (takin-kin) (Moravsik 1978)

Outras línguas usam tanto a reduplicação total como a parcial – ex. língua hiri motu:

Verbo base Reduplicação total Reduplicação parcial
mahuta  'dormir' mahutamahuta  'dormir constantemente' mamahuta  'dormir (plural)'
  (mahuta-mahuta) (ma-mahuta)

Posição do reduplicante editar

A reduplicação pode ser com prefixo (inicial), sufixo (final) ou infixo (interna):

Inicial em Agta (povo Aeta) (prefixo CV):

    [ɸuɾab] 'à tarde' [ɸuɸuɾab] 'fim de tarde' (ɸu-ɸuɾab)
    [ŋaŋaj] 'muito tempo time' [ŋaŋaŋaj] 'muito tempo (anos)' (ŋa-ŋaŋaj) (Healey 1960)

Final em Dakota (sufixo -CCV):

    [hãska] 'alto (singular)' [hãskaska] 'alto (plural)' (hãska-ska)
    [waʃte] 'bom (singular)' [waʃteʃte] 'bom (plural)' (waʃte-ʃte) (Shaw 1980, Marantz 1982, Albright 2002)

Interna Samoano (infixo -CV- ):

    savali 'ele/ela caminha' (singular) savavali 'eles/elas caminham' (plural) (sa-va-vali)
    alofa 'ele/ela ama' (singular) alolofa 'eles/elas amam' (plural) (a-lo-lofa) (Moravcsik 1978, Broselow and McCarthy 1984)
    le tamaloa 'the man' (singular)[1] tamaloloa 'homens' (plural) (tama-lo-loa)

A reduplicação interna é muito menos comum do que inicial ou final.

Direções editar

O reduplicante pode copiar tanto pelo lado esquerdo da palavra (esquerda-para-direita) como pelo direito (direita para esquerda). Há uma tendência a prefixar os reduplicantes para cópia esquerda-para-direita e sufixar os reduplicantes para cópia esquerda-para-direita:

Cópia inicial ‘‘‘E → D’’’ em Oykangand (língua kunjen) (uma língua Pama–Nyungan da Austrália):

    [eder] [ededer] 'chuva' (ed-eder)
    [alɡal] [alɡalɡal] 'direto-reto' (alg-algal)

Cópia final D →RL em Sirionó:

    achisia achisiasia 'Eu corto' (achisia-sia)
    ñimbuchao ñimbuchaochao 'separar-se, afastar-set' (ñimbuchao-chao) (McCarthy and Prince 1996)

Cópia de outra direção é menos comum: em Tillamook:

    [ɡaɬ] 'olho' [ɬɡaɬ] 'olhos' (ɬ-ɡaɬ)
    [təq] ' quebrar' [qtəq] 'eles quebram' (q-təq) (Reichard 1959)

Cópia final ‘‘‘E → D’’’ em Chukoto:

    nute- 'terra' nutenut 'torre (abs. sg.)' (nute-nut)
    jilʔe- 'geomydae' (roedor) jilʔejil ' geomydae (abs. sg.)' (jilʔe-jil) (Marantz 1982)

A reduplicação interna pode também envolver a cópia do início ou do final da base. Em língua Quileute, a primeira consoante da base é copiada e inserida depois da primeira vogal da base. Internal ‘‘‘E → D’’’ copying in Quileute:

    [tsiko] 'ele colocou em cima' [tsitsko] 'ele quase sempre coloca em cima' (tsi-ts-ko)
    [tukoːjoʔ] 'neve' [tutkoːjoʔ] 'neve aqui e ali' (tu-t-ko:jo’) (Broselow and McCarthy 1984)

Em língua Temiar,a última consoante da raiz é copiada e inserida antes da consoante do meio da raiz.

Cópia interna ‘‘D → E’’’ em Temiar (língua Austro-asiática da Malásia):

    [sluh] 'atingido (perfeito)' [shluh] 'atingindo (continuativo)' (s-h-luh)
    [slɔɡ] 'casou (perfeito)' [sɡlɔɡ] 'casando (continuativo)' (s-ɡ-lɔɡ) (Broselow and McCarthy 1984, Walther 2000)

Um tipo raro de reduplicação ocorre na Semai (língua Austro-asiática da Malásia). “Reduplicação menor expressiva” formada com um reduplicante inicial que copia primeiro e o último segmento da base.

    [kʉːʔ] [kʔkʉːʔ] 'vomitar' (-kʉːʔ)
    [dŋɔh] [dhdŋɔh] 'parecer estar sempre concordando (gesto)' (dh-dŋɔh)
    [cruhaːw] [cwcruhaːw] 'chuva de monção' (cw-cruhaːw) (Diffloth 1973

Notas editar

  1. Pratt, George (1984) [1893]. A Grammar and Dictionary of the Samoan Language, with English and Samoan vocabulary 3rd and revised ed. Papakura, New Zealand: R. McMillan. ISBN 0-908712-09-X. Consultado em 8 de junho de 2010 

Bibliografia editar

  • Abraham, Roy. (1964). Somali-English dictionary. London, England: University of London Press.
  • Albright, Adam. (2002). A restricted model of UR discovery: Evidence from Lakhota. (Draft version).
  • Alderete, John; Benua, Laura; Gnanadesikan, Amalia E.; Beckman, Jill N.; McCarthy, John J.; and Urbanczyk, Suzanne. (1999). Reduplication with fixed segmentism. Linguistic Inquiry, 30, 327-364. (Online version ROA 226-1097).
  • Botha, Rudi P. (1988). Form and meaning in word formation : a study of Afrikaans reduplication. Cambridge: Cambridge University Press.
  • Broselow, Ellen; and McCarthy, John J. (1984). A theory of internal reduplication. The linguistic review, 3, 25-88.
  • Cooper, William E.; and Ross, "Háj" John R. (1975). World order. In R. E. Grossman, L. J. San, and T. J. Vance (Eds.), Papers from the parasession on functionalism (pp. 63–111). Chicago, IL: Chicago Linguistic Society.
  • Dayley, Jon P. (1985). Tzutujil grammar. Berkeley, CA: University of California Press.
  • Diffloth, Gérald. (1973). Expressives in Semai. In P. N. Jenner, L. C. Thompson, and S. Starsota (Eds.), Austroasiatic studies part I (pp. 249–264). University Press of Hawaii.
  • Fabricius, Anne H. (2006). A comparative survey of reduplication in Australian languages. LINCOM Studies in Australian Languages (No. 03). Lincom. ISBN 3-89586-531-1.
  • Haeberlin, Herman. (1918). “Types of Reduplication in Salish Dialects.” International Journal of American Linguistics 1: 154-174.
  • Haugen, Jason D. (forthcoming). Reduplicative allomorphy and language prehistory in Uto-Aztecan. (Paper presented at Graz Reduplication Conference 2002, November 3–6).
  • Harlow, Ray. (2007) Māori: a linguistic introduction Cambridge University Press. ISBN 978-0-521-80861-3. 127-129
  • Healey, Phyllis M. (1960). An Agta grammar. Manila: The Institute of National Language and The Summer Institute of Linguistics.
  • Hurch, Bernhard (Ed.). (2005). Studies on reduplication. Empirical approaches to language typology (No. 28). Mouton de Gruyter. ISBN 3-11-018119-3.
  • Inkelas, Sharon; & Zoll, Cheryl. (2005). Reduplication: Doubling in morphology. Cambridge studies in linguistics (No. 106). Cambridge University Press. ISBN 0-521-80649-6.
  • Key, Harold. (1965). Some semantic functions of reduplication in various languages. Anthropological Linguistics, 7(3), 88-101.
  • Marantz, Alec. (1982). Re reduplication. Linguistic Inquiry 13: 435-482.
  • McCarthy, John J. and Alan S. Prince. (1986 [1996]). Prosodic morphology 1986. Technical report #32. Rutgers University Center for Cognitive Science. (Unpublished revised version of the 1986 paper available online on McCarthy's website: http://ruccs.rutgers.edu/pub/papers/pm86all.pdf).
  • McCarthy, John J.; and Prince, Alan S. (1995). Faithfulness and reduplicative identity. In J. Beckman, S. Urbanczyk, and L. W. Dickey (Eds.), University of Massachusetts occasional papers in linguistics 18: Papers in optimality theory (pp. 249–384). Amherst, MA: Graduate Linguistics Students Association. (Available online on the Rutgers Optimality Archive website: https://web.archive.org/web/20090423020041/http://roa.rutgers.edu/view.php3?id=568).
  • McCarthy, John J.; and Prince, Alan S. (1999). Faithfulness and identity in prosodic morphology. In R. Kager, H. van der Hulst, and W. Zonneveld (Eds.), The prosody morphology interface (pp. 218–309). Cambridge: Cambridge University Press. (Available online on the Rutgers Optimality Archive website: https://web.archive.org/web/20050525032431/http://roa.rutgers.edu/view.php3?id=562).
  • Moravcsik, Edith. (1978). Reduplicative constructions. In J. H. Greenberg (Ed.), Universals of human language: Word structure (Vol. 3, pp. 297–334). Stanford, CA: Stanford University Press.
  • Nevins, Andrew; and Vaux, Bert. (2003). Metalinguistic, shmetalinguistic: The phonology of shm-reduplication. (Presented at the Chicago Linguistics Society, April 2003). (Online version: http://ling.auf.net/lingbuzz/@qclBWVDkyQupkDAI/yuTibEgY?78).
  • Oller, D. Kimbrough. 1980. The emergence of the sounds of speech in infancy, in Child Phonology Vol. I, edited by G. H. Yeni-Komshian, J. F. Kavanaugh, and C. A. Ferguson. Academic Press, New York. pp. 93–112.
  • Raimy, Eric. (2000). Remarks on backcopying. Linguistic Inquiry 31:541-552.
  • Rehg, Kenneth L. (1981). Ponapean reference grammar. Honolulu: The University Press of Hawaii.
  • Reichard, Gladys A. (1959). A comparison of five Salish languages. International Journal of American Linguistics, 25, 239-253.
  • Shaw, Patricia A. (1980). Theoretical Issues in Dakota Phonology and Morphology. Garland Publ: New York. pp. ix + 396.
  • Shaw, Patricia A. (2004). Reduplicant order and identity: Never trust a Salish CVC either?. In D. Gerdts and L. Matthewson (Eds.), Studies in Salish linguistics in honor of M. Dale Kinkade. University of Montana Occasional Papers in Linguistics (Vol. 17). Missoula, MT: University of Montana.
  • Smyth, Herbert Weir (1920). A Greek Grammar for Colleges. [S.l.]: American Book Company – via Christian Classics Ethereal Library 
  • Stark, Rachel E. (1980). Features of infant sounds: The emergence of cooing. Journal of Child Language Vol 5(3) Oct 1978, 379-390.
  • Thun, Nils. (1963). Reduplicative words in English: A study of formations of the types tick-tock, hurly-burly, and shilly-shally. Uppsala.
  • Van Huyssteen, Gerhard B. (2004). Motivating the composition of Afrikaans reduplications: a cognitive grammar analysis. In: Radden, G & Panther, K-U. (eds.). Studies in Linguistic Motivation. ISBN 3-11-018245-9. Berlin: Mouton de Gruyter. pp. 269–292.
  • Van Huyssteen, Gerhard B and Wissing, Daan P. (2007). Datagebaseerde Aspekte van Afrikaanse Reduplikasies. [Data-based Aspects of Afrikaans Reduplications]. Southern African Linguistics and Applied Language Studies. 25(3): 419–439.
  • Watters, David E. (2002). A grammar of Kham. Cambridge grammatical descriptions. Cambridge: Cambridge University Press. ISBN 0-521-81245-3.
  • Wilbur, Ronnie B. (1973). The phonology of reduplication. Doctoral dissertation, University of Illinois. (Also published by Indiana University Linguistics Club in 1973, republished 1997.)

Ligações externas editar