Requiem (Verdi)

Cenário musical da missa fúnebre católica romana composto por Giuseppe Verdi

A Missa de Réquiem (em italiano: Messa da Requiem) de Giuseppe Verdi é um cenário musical da missa fúnebre católica romana (chamada réquiem a partir da primeira palavra do texto, que começa Requiem aeternam dona eis, Domine,, "concedei-lhes descanso eterno, ó Senhor"). A primeira apresentação foi realizada em 22 de maio de 1874 para comemorar o primeiro aniversário da morte de Alessandro Manzoni, um poeta e romancista italiano muito admirado por Verdi. A peça também é por vezes referida como Requiem de Manzoni.[1] Um desempenho típico leva cerca de 85 a 90 minutos.

Missa de Requiem - Primeira edição de poster

Instrumentação editar

O Requiem de Verdi foi feito para uma grande orquestra, consistindo de três flautas (a terceira flauta dobra o piccolo), dois oboés, duas clarinetas, quatro fagotes, quatro trompas, oito trompetes (dos quais quatro tocam de fora do palco durante o Tuba mirum), três trombones, um oficleide (instrumento obsoleto, normalmente substituído pela tuba em performances atuais), tímpanos, bumbo e cordas.

A obra também conta com um quarteto de cantores solistas (soprano, mezzo-soprano, tenor e baixo), bem como dois corais.

Contexto histórico editar

Quando Gioachino Rossini morreu, em 1868, Verdi sugeriu que diversos compositores italianos deveriam compôr em conjunto um Requiem em homenagem ao mestre, e começou a empreitada com uma versão do "Libera me." No ano seguinte uma Messa per Rossini foi compilada por treze compositores (dos quais o único conhecido atualmente é o próprio Verdi). A estreia da obra foi marcada para 13 de novembro de 1869, primeiro aniversário da morte de Rossini.

No entanto, em 4 de novembro, nove dias antes da estreia, o comitê organizador abandonou o projeto. Verdi colocou a culpa no maestro que havia sido escalado, Angelo Mariani, indicando a falta de entusiasmo de Mariani pelo projeto - ainda que este tivesse feito parte do comitê organizador desde o seu início - marcando assim o fim de sua longa amizade. Verdi nunca perdoou Mariani pelo ocorrido; a obra caiu no esquecimento até 1988, quando o alemão Helmuth Rilling regeu uma versão completa da Messa per Rossini em Stuttgart.

Neste meio tempo, Verdi continuou a mexer em seu "Libera me," frustrado que a comemoração agendada da vida de Rossini não seria realizada durante a sua própria vida.

Em maio de 1873 o escritor e humanista italiano Alessandro Manzoni, a quem Verdi havia admirado por toda a sua vida adulta, e com quem havia se encontrado em 1868, morreu. Ao ouvir a notícia de sua morte Verdi decidiu finalizar um requiem - desta vez sozinho - em homenagem a Manzoni. Viajou para Paris em junho, onde começou a trabalhar na obra, dando-lhe a forma que apresenta atualmente, incluindo uma versão daquele "Libera me" composto originalmente para Rossini. O Requiem de Verdi foi executado pela primeira vez em maio do ano seguinte, na Igreja de São Marcos, em Milão, no primeiro aniversário da morte de Manzoni.

O próprio Verdi regeu a obra, e os quatro solistas foram Teresa Stolz (soprano), Maria Waldmann (mezzo-soprano), Giuseppe Coppini (tenor) e Ormando Maini (bass).[2] Stolz (Aída), Waldmann (Amnéris) e Maini (Ramfis) todos tinham participado da estreia europeia de Aida, em 1872, da qual Coppini também estava escalado para participar (no papel de Radamés), porém teve de ser substituído por motivos de saúde. Teresa Stolz acabou tendo uma longa e brilhante carreira, Waldmann se aposentou muito jovem, em 1875, e os outros cantores parecem ter tido destinos mais obscuros. Stolz também ficou noiva de Angelo Mariani, em 1869, porém posteriormente o abandonou entre boatos (nunca provados) de que ela estaria tendo um caso com Verdi.

Música editar

Ao longo de toda a obra Verdi utiliza ritmos vigorosos, melodias sublimes e contrastes dramáticos, como fazia com suas óperas, para exprimir as poderosas emoções transmitidas pelo texto. O macabro e sublime (além de instantaneamente reconhecível) "Dies Irae", que introduz a tradicional sequência do rito fúnebre latino, é repetida por quatro vezes ao longo da obra para transmitir um sentido de unidade. Os trompetes que são posicionados em torno do palco para produzir um chamado inescapável ao Juízo Final no "Tuba mirum", e a combinação resultante das marcações de quádruplo fortissimo nos metais e no coro resultam em uma das peças musicais de volume mais elevado já produzidas sem o uso de amplificação. O célebre solo para tenor, "Ingemisco", exprime a esperança para o pecador que pede o perdão do Senhor, e a bela "Lacrimosa" foi composta por Verdi a partir do dueto "Qui me rendra ce mort? Ô funèbres abîmes!", do quarto ato de sua ópera Don Carlos.

O alegre "Sanctus" (uma complicada fuga em oito partes para ser cantada por dois corais simultaneamente ou por um coro dividido em dois) se inicia com uma fanfarra de metais que anuncia "aquele que vem em nome do Senhor", e conduz o ouvinte a um "Agnus Dei" angelical, cantado pelas solistas e pelo coro. Finalmente, o "Libera me," o trecho mais antigo do Requiem, irrompe, com a soprano cantando "Livrai-me, Senhor, da morte eterna". A solista é intercalada pelo coro cantando em pianissimo, transmitindo a ideia de súplica e oração contrita do texto, que é bruscamente interrompido pelo Dies irae, em fortissimo, cantado novamente.

Para a performance de Paris da obra, Verdi revisou o "Liber scriptus", para permitir que a mezzo-soprano Maria Waldmann pudesse ter uma participação maior.[3]

Recepção editar

O Requiem conquistou sucesso imediato em diversos lugares onde foi apresentado. Foi executado por sete vezes na Opéra-Comique de Paris, porém o novo Royal Albert Hall, de Londres, não conseguiu a lotação máxima durante um determinado evento católico. Em Veneza uma impressionante decoração bizantina foi desenhada especialmente para a ocasião da performance. Versões para quatro pianos ou um conjunto de metais também eram executadas. Posteriormente a obra desapareceu do repertório padrão coral, reaparecendo na década de 1930, tornando-se desde então um clássico deste tipo de repertório.[3]

Estrutura editar

  • Requiem:
    • Requiem e Kyrie eleison (coro, solistas)
  • Dies irae:
    • Dies irae, (coro)
    • Tuba mirum, Mors stupebit (coro, baixo)
    • Liber scriptus (mezzo-soprano, coro)
    • Quid sum miser (soprano, mezzo-soprano, tenor)
    • Rex tremendae majestatis (solistas, coro)
    • Recordare (soprano, mezzo-soprano)
    • Ingemisco (tenor)
    • Confutatis (baixo, coro)
    • Lacrimosa (solistas, coro)
  • Ofertório (solistas):
    • Domine Jesu Christe
    • Hostias et preces
  • Sanctus (coro duplo)
  • Agnus Dei (soprano, mezzo-soprano, coro)
  • Lux aeterna (mezzo-soprano, tenor, baixo)
  • Libera me (soprano, coro):
    • Libera me
    • Dies irae
    • Requiem aeternam
    • Libera me

Gravações editar

Referências

  1. Summer (2007) Robert J. Lanham, Maryland Choral Masterworks from Bach to Britten: Reflections of a Conductor Rowman & Littlefield. p. 89: "Verdi reverenciava Manzoni por esta sua grande contribuição à sua amada Itália, e desejava encontrar uma maneira de agradecê-lo. Seu presente foi o Requiem de Manzoni."
  2. Giuseppe Verdi Arquivado em 26 de maio de 2011, no Wayback Machine. – site oficial da província de Parma.
  3. a b Naxos: About this recording

Ligações externas editar