Macbeth

tragédia de William Shakespeare
 Nota: Para outros significados, veja Macbeth (desambiguação).

Macbeth é uma tragédia do dramaturgo inglês William Shakespeare, sobre um regicídio e suas consequências. É a tragédia shakespeariana mais curta, e acredita-se que tenha sido escrita entre 1603 e 1607. O primeiro relato de uma performance da peça é de abril de 1611, quando Simon Forman registrou tê-la visto no Globe Theatre, em Londres. A obra foi publicada pela primeira vez no Folio, de 1623, possivelmente a partir de uma transcrição de alguma performance específica.

Macbeth e Banquo com as Bruxas, de Johann Heinrich Füssli

As principais fontes de Shakespeare para a tragédia são os relatos dos reis Duff e Duncan nas Crônicas da Inglaterra, Escócia e Irlanda, de 1587, uma história das Ilhas Britânicas familiar a Shakespeare e seus contemporâneos, e pelos escritos do filósofo escocês Hector Boece.[1]

Ao longo dos séculos a peça atraiu alguns dos maiores atores de seu tempo para os papéis de Macbeth e Lady Macbeth. A obra já foi adaptada para o cinema, televisão, ópera, quadrinhos e muitas outras mídias. No cinema destacam-se as versões do italiano Mario Caserini (1908), a do austríaco Richard Oswald (1921), a do norte-americano Orson Welles (1948), a do japonês Akira Kurosawa (1957), a do polonês Roman Polanski (1971) e a do australiano Justin Kurzel (2015).

No teatro brasileiro, a peça ganhou adaptação de Aderbal Freire-Filho e João Dantas e foi interpretada por elenco contando com Daniel Dantas como Macbeth e Renata Sorrah como Lady Macbeth.[2] No cinema, em 2015, foi lançada uma adaptação contemporânea chamada A Floresta que se Move, do diretor Vinícius Coimbra,[3] com Gabriel Braga Nunes e Ana Paula Arósio nos papéis principais.

Personagens

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Enredo

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Cena de Macbeth mostrando as bruxas conjurando uma aparição, na primeira cena do quarto ato, em pintura de William Rimmer

O primeiro ato da peça abre entre trovões e relâmpagos, com as Três Bruxas decidindo que seu próximo encontro será com Macbeth. Na cena seguinte, um sargento ferido apresenta-se ao rei Duncan da Escócia, relatando que seus generais Banquo e Macbeth, que é tano (barão) de Glamis, acabaram de derrotar as forças aliadas da Noruega e da Irlanda, lideradas pelo rebelde Macdonwald. Macbeth, parente do rei, é louvado por sua bravura e habilidade na batalha.

A cena muda. Macbeth e Banquo entram, discutindo o tempo e sua vitória ("So foul and fair a day I have not seen"; "Tão feio e belo dia eu jamais vi"). À medida que se aproximam de uma charneca, as três bruxas, que os esperavam, cumprimentam-nos com profecias. Ainda que seja Banquo o primeiro a desafiá-las, dirigem-se a Macbeth. A primeira o saúda como "thane de Glamis", a segunda como "thane de Cawdor", e a terceira proclama que ele deverá "ser rei daí em diante". Macbeth parece estarrecido a ponto de silenciar-se, e Banquo novamente as desafia. As bruxas informam a Banquo que ele dará origem a uma linhagem de reis, embora ele mesmo não se tornará um. Enquanto os dois ficam maravilhados com o que ouviram, as bruxas desaparecem, e outro thane, Ross, um mensageiro do rei, chega e informa Macbeth sobre o título que lhe acaba de ser concedido — thane de Cawdor. A primeira profecia é cumprida. Imediatamente, Macbeth começa a ambicionar tornar-se rei.

Macbeth escreve a sua esposa, Lady Macbeth, falando sobre as profecias das bruxas. Quando Duncan decide ficar no castelo de Macbeth, em Inverness, ela bola um plano para assassiná-lo e conquistar o trono para seu marido. Embora Macbeth se demonstre preocupado com o regicídio, sua esposa finalmente o consegue persuadir, questionando sua condição humana, a seguir seu plano. Na noite da visita do rei, Macbeth mata Duncan; o ato, que não é visto pela plateia, o deixa tão abalado que Lady Macbeth tem que assumir o controle da situação, recolhendo o punhal ensanguentado das mãos do marido. De acordo com o seu plano, ela incrimina os criados de Duncan, adormecidos por causa da bebedeira ocorrida na noite anterior, pelo assassinato, colocando punhais sujos de sangue em meio a eles. Na manhã seguinte, Lennox, um nobre escocês, juntamente com Macduff, o leal thane de Fife, chegam.[4] O porteiro, ainda bêbado, abre o portão, e Macbeth os leva aos aposentos do rei, onde Macduff descobre o cadáver. Num acesso fingido de raiva, Macbeth assassina os guardas, antes que eles jurem sua inocência. Macduff imediatamente suspeita de Macbeth, porém não revela publicamente esta suspeita. Temendo por suas vidas, os filhos de Duncan fogem; Malcolm vai para a Inglaterra e Donalbain para a Irlanda. A fuga dos herdeiros também faz deles suspeitos, e Macbeth assume o trono como o novo rei da Escócia, já que possui parentesco com o falecido rei.

 
Macbeth vendo o fantasma de Banquo, de Théodore Chassériau

Apesar de seu sucesso, Macbeth continua inquieto com a profecia a respeito de Banquo, então o convida para um banquete real — onde descobre que Banquo e seu jovem filho, Fleance, planejam fugir naquela mesma noite. Macbeth contrata então dois homens para assassiná-los, porém um terceiro assassino surge misteriosamente no parque, antes do crime. Enquanto os assassinos matam Banquo, Fleance escapa; no banquete, o fantasma de Banquo entra e se senta no lugar de Macbeth à mesa. Apenas este pode ver o espectro, enquanto os outros convidados entram em pânico diante da visão de Macbeth em fúria, esbravejando contra uma cadeira vazia, até que uma desesperada Lady Macbeth lhes ordena irem embora.

Macbeth, perturbado, vai às bruxas mais uma vez. Elas conjuram então três espíritos, em meio a três outros avisos e profecias, que lhe mandam ter "cuidado com Macduff", porém também lhe avisam que "ninguém que tenha nascido de uma mulher fará mal a Macbeth", e que ele "jamais será vencido até que a Grande Floresta de Birnam vá até as alturas do Monte Dunsinane". Como Macduff está exilado na Inglaterra, Macbeth presume que está seguro; então condena à morte todos do castelo de Macduff, incluindo Lady Macduff e suas crianças.

Enquanto isso, Lady Macbeth torna-se atormentada pela culpa dos crimes que ela e o marido cometeram; numa cena célebre, ela perambula pela casa de ambos, à noite, sonâmbula, e tenta lavar manchas imaginárias de sangue de suas mãos, enquanto comenta as coisas terríveis de que sabe.

 
Lady Macbeth sonâmbula, de Johann Heinrich Füssli

Na Inglaterra, Malcolm e Macduff são informados por Ross de que "seu castelo foi pego de surpresa, e suas esposas e seus bebês selvagemente abatidos." Macbeth, agora visto como um tirano, vê a deserção de muitos de seus thanes. Malcolm lidera então um exército, juntamente com Macduff e o inglês Siward (o Velho), earl de Northumberland, contra o Castelo de Dunsinane. Enquanto seus soldados ainda estão acampados na Floresta de Birnam, recebem a ordem de cortar e carregar todos os troncos de madeira que puderem para camuflar o número de soldados — e acabando por realizar a terceira profecia das bruxas. Neste meio tempo, Macbeth faz o seu famoso solilóquio ("Tomorrow and tomorrow and tomorrow", "Amanhã e amanhã e amanhã") ao ficar sabendo da morte de Lady Macbeth; embora a causa da morte não seja revelada, presume-se que ela tenha cometido suicídio, já que a última referência de Malcolm a respeito dela revela que "como se acredita, por suas próprias e violentas mãos, tenha tirado sua própria vida" ("as 'tis thought, by self and violent hands / took off her life").

A batalha tem o seu ápice na morte do jovem Siward, e no confronto de Macduff com Macbeth, que apregoa não temer o oponente, pois não pode ser morto por qualquer homem que tenha nascido de uma mulher. Macduff declara então que ele foi "rasgado do útero de sua mãe antes do tempo" ("from his mother's womb untimely ripp'd", ou seja, nascido através de cesariana) e, portanto, não "nasceu do ventre de uma mulher", mas sim do ventre de um cadáver, visto que a mãe de Macduff morre durante o parto. Macbeth percebe, já tarde demais, que as bruxas o enganaram. Fora de cena, Macduff corta a cabeça de Macbeth, e cumpre assim a última das profecias.

Embora Malcolm seja colocado no trono, e não Fleance, a profecia das bruxas a respeito de Banquo — "Thou shalt [be]get kings", "Tu gerarás reis" — era conhecida pelo público da época de Shakespeare como verdade, já que o rei Jaime I da Inglaterra era, supostamente, um dos descendentes de Banquo.

Fontes do texto

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Macbeth já foi comparada a outra peça do próprio Shakespeare, Antony and Cleopatra (Antônio e Cleópatra). Tanto Antônio quanto Macbeth, enquanto personagens, procuram um novo mundo, ainda que a custa do antigo. Ambos estão lutando por um trono e têm uma 'nêmesis' a enfrentar para obter este trono; para Antônio, é Otávio, e para Macbeth é Banquo. A certo ponto da peça Macbeth até mesmo se compara a Antônio, dizendo: "under [Banquo] / My Genius is rebuk'd, as it is said / Mark Antonies was by Caesar" ("sob [Banquo] / Meu gênio é rechaçado, como diz-se que / o de Marco Antônio era por César"). As duas peças também contêm figuras femininas poderosas: Cleópatra e Lady Macbeth.[5]

Shakespeare pegou a história emprestada de diversos relatos existentes nas Crônicas da Inglaterra, Escócia e Irlanda, uma história das ilhas Britânicas compilada inicialmente por Raphael Holinshed e muito conhecida na época. Nas Crônicas um homem chamado Donwald encontra diversos membros de sua família assassinados pelo seu rei, o rei Duff, por terem se envolvido com bruxas. Após ser pressionado por sua esposa, ele e quatro de seus criados matam o rei em sua própria casa. Quanto ao próprio Macbeth, as Crônicas o retratam como um personagem esforçado em manter o reino diante da incapacidade do rei Duncan. Ele e Banquo encontram-se com três bruxas, que fazem exatamente as mesmas profecias da versão de Shakespeare; os dois tramam então a morte de Duncan, a pedido de Lady Macbeth. Macbeth reina então por dez anos antes de finalmente ser deposto por Macduff e Malcolm. Os paralelos entre as duas versões são claros; alguns estudiosos, no entanto, acreditam que a obra Rerum Scoticarum Historia, de George Buchanan, seja ainda mais similar à versão de Shakespeare. A obra estava disponível, em latim, na Inglaterra da época de Shakespeare.[6]

Em nenhuma outra versão da história o rei é morto no próprio castelo de Macbeth; acredita-se que esta mudança tenha sido uma adição intencional de Shakespeare, para acrescentar à maldade de Macbeth esta terrível violação da hospitalidade. Em outras versões da história comuns na época Duncan é morto numa emboscada em Inverness, e não num castelo.

Shakespeare fundiu a história de Macbeth à história de Donwald e do rei Duff, alterando significantemente a trama,[7] e fez outra mudança reveladora: nas Crônicas Banquo é cúmplice do assassinato do rei Duncan, por Macbeth. Ele também desempenha um papel importante ao assegurar que Macbeth, e não Malcolm, assuma o trono no golpe que se segue ao crime.[8] Na época de Shakespeare, Banquo era tido como um ancestral direto do rei Stuart, Jaime I.[9] O Banquo retratado nas fontes históricas difere significativamente do Banquo criado por Shakespeare, e diversas razões para esta mudança foram propostas. Uma delas é que retratar um ancestral real como um assassino seria, no mínimo, arriscado. Outra especulação é de que a alteração pode ter sido simplesmente porque não havia uma necessidade dramática para outro cúmplice para o assassinato, enquanto havia ao mesmo tempo uma necessidade de se ter um personagem que fornecesse o contraste dramático a Macbeth - papel que seria preenchido pelo Banquo shakespeariano.[8] Outros autores da época que escreveram sobre Banquo, como Jean de Schelandre, em seu Stuartide, também mudaram a história, ao retratá-lo como um homem nobre, e não um assassino, provavelmente pelos mesmos motivos.[10]

 
Facsimile da primeira página de Macbeth, na edição conhecida como First Folio, publicada em 1623

A peça não pode ser datada com precisão devido às evidências significativas de revisões posteriores. Muitos estudiosos conjecturam a provável data da composição como estando entre 1603 e 1606.[11][12] Como a peça parece ter tido a intenção de celebrar os ancestrais do rei Jaime e a ascensão dos Stuart ao trono, ocorrida em 1603 (o próprio Jaime acreditava ser descendente direto de Banquo),[13] é improvável que ela tenha sido composta antes deste ano; e sugeriu-se também que o desfile de oito reis parecidos com Banquo, mostrados pelas bruxas a Macbeth numa visão no quarto ato da peça, seriam uma homenagem a Jaime VI da Escócia. Já outros autores especularam uma data ainda mais específica, de 1605-6, com base em possíveis alusões à chamada Conspiração da Pólvora, e os julgamentos que se seguiram a ela. A fala do porteiro (ato II, cena III, versos 1-21), em especial, conteria alusões ao julgamento do jesuíta Henry Garnet, ocorrido na primavera de 1606; "equivocator" (verso 8) poderia se referir à defesa de Garnet da "equivocação", e "farmer" ("fazendeiro", verso 4) a um dos apelidos (alcunhas) de Garnet.[14] "Farmer", no entanto, é uma palavra muito comum, e o conceito de "equivocação" já havia sido o tema de um tratado escrito em 1583 pelo conselheiro-chefe da rainha Elizabeth I, Lorde Burghley, e da Doutrina da Equivocação, escrita em 1584 pelo prelado espanhol Martin Azpilcueta, que a disseminou pela Europa até que chegasse na Inglaterra na década de 1590.[15]

Outra referência citada seria um espetáculo assistido pelo rei Jaime em Oxford, no verão de 1605 que contava com três "sibilas", às quais alguma alusão poderia ter sido feita nas Três Bruxas da peça.[16] A versão mais aceita, no entanto, estipula uma possível data que não anteceda 109[17] e não seja posterior a 1607, já que neste ano já existem "claras alusões" à peça.[16] O primeiro relato de uma performance da peça é de abril de 1611, quando Simon Forman registrou tê-la assistido no Globe Theatre, em Londres.[18]

A peça foi impressa pela primeira vez na edição chamada de First Folio, de 1623; e o Folio é até hoje a única fonte disponível. O texto que sobreviveu foi claramente alterado por mãos posteriores; a alteração mais significante foi a inclusão de duas canções da peça The Witch (1615), de Thomas Middleton. Especula-se que Middleton teria inserido uma cena extra envolvendo as bruxas e Hécate pois este tipo de cena tinha se revelado muito popular entre as platéias da época. Estas revisões feitas ao texto - que, desde a edição Clarendon de 1869, presume-se que inclua todo a quinta cena do terceiro ato e parte da primeira cena do quarto - frequentemente são indicadas nos textos modernos.[19] Com base nisto diversos estudiosos rejeitam todos os três interlúdios com a deusa Hécate como não sendo autênticos; porém, como mesmo com este material, a peça é conspicuamente curta, o que indica que o texto do Folio pode ter sido derivado de uma transcrição que foi, por sua vez, cortada substancialmente para a performance, ou que tenha sido editada por um adaptador.

Histórico de encenações

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Thomas Keene em Macbeth, 1884

Na época de Shakespeare

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Além da menção no documento de Forman, não existem outras performances conhecidas com certeza na época do próprio William Shakespeare. A brevidade da peça e certos aspectos de sua encenação (por exemplo, a grande proporção de cenas noturnas e a quantidade excessiva de efeitos sonoros ocorridos fora do palco) sugerem que o texto existente atualmente tenha sido revisado para produções em lugares fechados, provavelmente no Blackfriars Theatre, que havia sido comprado pelo grupo teatral a qual Shakespeare pertencia, os King's Men, em 1608.[20]

Restauração e século XVIII

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Durante a chamada 'Restauração', sir William Davenant produziu uma adaptação "operática" espetacular de Macbeth, "com todas as cantorias e danças nela", e efeitos especiais como "voos para as bruxas".[21] A revisão de Davenant também ampliava o papel de Lady Macduff, fazendo dela um contrapeso temático a Lady Macbeth. Samuel Pepys, na anotação feita em 19 de abril de 1667 em seu célebre Diário, chamou o MacBeth de Davenant de "uma das melhores peças destinadas a um palco, e das melhores variedades de dança e música que eu já vi." A versão ficou em cartaz até a metade do século seguinte, e foi nesta versão que os mais famosos Macbeths do início do século XVIII, como James Quin, atuaram.

Charles Macklin, que não foi particularmente lembrado como um grande Macbeth, é recordado por suas performances na Royal Opera House, em Covent Garden, Londres, no ano de 1773, nas quais diversos tumultos ocorreram, relacionados às rivalidades entre Garrick e William Smith. Macklin atuava vestido em trajes típicos escoceses, revertendo uma tendência anterior que vestia o personagem como um brigadeiro inglês. A encenação recebeu críticas respeitosas, no geral, embora o crítico shakespeariano George Steevens tenha comentado sobre a falta de adequação de Macklin, então com oitenta anos, ao papel.

Depois de Garrick, uma dos mais célebres Macbeths do século XVIII foi John Philip Kemble; ele desempenhou o papel com sua irmã, Sarah Siddons, cuja Lady Macbeth era tida amplamente como insuperável. Kemble continuou a tendência rumo às vestimentas mais realistas, e ao idioma de Shakespeare, que haviam marcado a produção de Macklin; o escritor escocês Walter Scott relatou ter feito diversas "experiências" com a roupa escocesa da peça. As reações à interpretação de Kemble foram divididas; no entanto, Siddons foi louvada de maneira unânime. Seu desempenho na cena do "sonambulismo", no quinto ato, ficou especialmente marcada; o poeta Leigh Hunt a chamou de "sublime". As performances de Kemble e Siddons foram as primeiras produções amplamente influentes nas quais a perversidade de Lady Macbeth foi apresentada de maneira mais profunda e ainda mais poderosa que a do próprio Macbeth. Foi também a primeira vez em que o fantasma de Banquo não apareceu em cena.

O Macbeth de Kemble foi, para alguns críticos, educado e cortês demais para o texto de Shakespeare. Seu sucessor como melhor ator de Londres, Edmund Kean, era frequentemente ainda mais criticado por seus excessos emocionais durante a peça, especialmente no quinto ato. A atuação de Kean como o personagem, aliás, esteve longe de ser admirada universalmente; o escritor inglês William Hazlitt, por exemplo, reclamava que o Macbeth de Kean se assemelhava muito ao seu próprio Ricardo III. Como costumava fazer em outros papéis, Kean explorava sua forma física atlética como componente chave do colapso mental de Macbeth. Kean também reverteu a ênfase dada por Kemble em Macbeth como um nobre, apresentado-o como um político inescrupuloso, que desaba sob o peso da culpa e do medo. Kean, no entanto, nada vez para interromper a tendência da época rumo a cenários e figurinos cada vez mais extravagantes.

Século XIX

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O Macbeth do próximo ator proeminente de Londres, William Charles Macready, provocou respostas tão variadas quanto as que Kean recebera no século anterior. Macready estreou no papel em 1820, na Royal Opera House, em Covent Garden. Como Hazlitt notou, a leitura de Macready do personagem era puramente psicológica; nela, as bruxas perdiam qualquer poder sobrenatural, e a queda de Macbeth se dava unicamente devido aos conflitos internos do personagem. A Lady Macbeth mais famosa a contracenar com Macready foi Helena Faucit, que estreou catastroficamente no papel, enquanto ainda tinha pouco mais de 20 anos, mas que conseguiu eventualmente ser aclamada no papel por uma atuação que, ao contrário da de Siddons no século anterior, estava em acordo com as noções da época de decoro feminino. Depois que Macready se mudou para os Estados Unidos, continuou a desempenhar o papel; em 1849 esteve envolvido numa rivalidade com o ator americano Edwin Forrest, cujos seguidores o vaiaram durante a performance da peça em Astor Place, levando ao que ficou conhecido como Tumulto de Astor Place.

 
Charles Kean e sua esposa como Macbeth e Lady Macbeth, em figurinos que tinham a pretensão de serem precisos historicamente

Os dois Macbeths mais destacados de meados daquele século, Samuel Phelps e Charles Kean, foram recebidos com ambiguidade pela crítica, porém obtiveram sucesso popular. Ambos são menos famosos por sua interpretação do personagem, do que por certos aspectos de suas encenações. No Sadler's Wells Theatre, Phelps trouxe de volta quase todo o texto original de Shakespeare, incluindo a primeira metade da cena do Porteiro, que era ignorada pelos diretores desde muito tempo; já a segunda metade permaneceu cortada, devido à sua "obscenidade". Também abandonou a música que era utilizada na peça, e reduziu as aparições das bruxas ao seu papel no Folio. De maneira igualmente significante, ele retornou para o tratamento dispensado no mesmo Folio à morte de Macbeth. Nem todas estas decisões foram bem-sucedidas no contexto vitoriano, e Phelps experimentou com diversas combinações de Shakespeare e D'Avenant em suas mais de doze produções realizadas entre 1844 e 1861. Sua Lady Macbeth de mais sucesso foi Isabella Glyn, cuja presença dominante lembrava a alguns críticos de Siddons.

Uma característica particular das produções de Kean no Princess's Theatre de Londres depois de 1850 era o realismo dos seus figurinos. Kean conseguiu seu maior sucesso no melodrana moderno, e não era tido como cativante o suficiente para os principais papéis elizabetanos. As platéias, no entanto, não se incomodavam; uma produção de 1853 ficou em cartaz por vinte semanas. Presume-se que parte da atração era a famosa atenção dada por Kean ao realismo histórico; em suas produções, como notou o acadêmico Allardyce Nicoll, "até mesmo a botânica é correta historicamente."

A primeira tentativa de Henry Irving no papel, no Lyceum Theatre de Londres, em 1875, foi um fracasso. Sob a produção de Sidney Frances Bateman, e estrelando ao lado de Kate Josephine Bateman, Irving pode ter sido afetado pela morte recente de seu empresário, Hezekiah Linthicum Bateman. Embora a produção tenha durado apenas oitenta performances, seu Macbeth foi tido como inferior a seu Hamlet. Sua próxima tentativa, ao lado de Ellen Terry, no mesmo Lyceum, em 1888, teve um desempenho melhor, chegando a 150 encenações,[22] e contava com música incidental de autoria do célebre compositor Arthur Sullivan.[23] Amigos de Irving, como o escritor Bram Stoker, defenderam sua leitura "psicológica", baseados na suposição de que Macbeth havia sonhado em matar Duncan antes do início da peça. Seus detratores, entre eles o também escritor Henry James, deploraram suas mudanças um tanto arbitrárias no texto ("would have" passou para "should have", na fala durante a morte de Lady Macbeth) e sua abordagem "neurastênica" ao personagem.

Século XX - presente

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Barry Vincent Jackson encenou uma influente performance em figurinos modernos no Repertory Theatre de Birmingham, em 1928; a produção chegou a Londres e foi encenada no Royal Court Theatre, onde recebeu críticas variadas. Eric Maturin o classificou como um Macbeth inadequado, enquanto a Lady Macbeth vamp de Mary Merrall foi criticada positivamente. Embora o jornal inglês The Times tenha classificado a montagem de um "fracasso desprezível", a produção contribuiu muito para reverter a tendência ao excesso cênico e à antiquação que tinham tido seu ápice com Charles Kean.

 
Produção de Macbeth encenada pela Negro Unit ("unidade de negros") do Federal Theatre Project, em 1935

Entre as produções mais propagandeadas do século XX está a que foi montada pelo Federal Theater Project, do Lafayette Theatre, no bairro nova-iorquino do Harlem, de 14 de abril a 20 de junho de 1936. Orson Welles, em sua primeira produção no palco, dirigiu Jack Carter e Edna Thomas, com Canada Lee como Banquo, numa produção inteiramente composta por atores afro-americanos. Welles ambientou a peça no Haiti pós-colonial, e sua direção enfatizou o espetáculo e o suspense: suas dúzias de tambores africanos lembravam o coro de bruxas de Davenant.

Laurence Olivier fez o papel de Malcolm na produção de 1937 do Old Vic Theatre, numa montagem que viu a diretora artística do Vic, Lilian Baylis, morrer bem na noite de sua abertura. A maquiagem de Olivier estava tão pesada e estilizada nesta produção que a atriz Vivien Leigh, Lady Macbeth nesta montagem, teria dito: "Você ouve a primeira fala de Macbeth, então a maquiagem de Larry [Olivier] entra em cena, depois Banquo entra em cena, e depois Larry entra em cena."[24] Laurence Olivier estrelou posteriormente naquela que é considerada como a mais famosa das produções da peça no sécullo XX, dirigida por Glen Byam Shaw, em Stratford-upon-Avon, terra natal de Shakespeare, em 1955. O elenco de apoio, denegrido pelo crítico teatral Harold Hobson, incluía diversos atores que seguiram carreiras shakespearianas posteriormente: Ian Holm, no papel de Donalbain, Keith Mitchell como Macduff, e Patrick Wymark como o Porteiro. Olivier, no entanto, foi o principal motivo do sucesso da montagem. A intensidade de sua performance, particularmente durante a conversa com os assassinos, e ao confrontar o fantasma de Banquo, pareceu, para muitos dos críticos, lembrar Edmund Kean. Planos para uma versão para o cinema, no entanto, foram abandonados, após o fracasso da versão cinematográfica de Olivier para Ricardo III. Foi a respeito desta performance que o crítico teatral e escritor inglês Kenneth Tynan teria afirmado que "ninguém jamais foi bem-sucedido como Macbeth - até Olivier".

A co-estrela de Olivier em sua produção de 1937 no mesmo Old Vic, Judith anderson, teve uma associação de igual sucesso com a peça. Desempenhou Lady Macbeth na Broadway, juntamente com Maurice Evans, numa produção dirigida por Margaret Webster, que teve 131 performances no ano de 1941, a mais longa temporada da peça na históra da Broadway. Anderson e Evans também desempenharam a peça na televisão por duas vezes, em 1954 e 1962, pelas quais Anderson ganhou o Emmy pelas duas e Evans pela produção de 1962.

Uma das produções mais notáveis do século XX foi a de Trevor Nunn para a Royal Shakespeare Company, em 1976. Nunn já havia dirigido Nicol Williamson e Helen Mirren na peça, dois anos antes, porém a produção não havia causado qualquer impressão. Em 1976 Nunn produziu a peça novamente, desta vez com um cenário minimalista, no teatro The Other Place; o palco pequeno, quase circular, focalizava a atenção dos espectadores na dinâmica psicológica dos personagens. Tanto Ian McKellen, no papel-título, como Judi Dench, como Lady Macbeth, receberam críticas excepcionalmente favoráveis. Dench venceu o prêmio de Melhor Atriz pela SWET (The Society of London Theatre) e, em 2004, membros da Royal Shakespeare Company votaram esta sua performance como a maior por uma atriz na história da companhia.

A produção de Nunn foi transferida para Londres em 1977, e foi filmada posteriormente para a televisão; acabou por ofuscar a produção de 1978, dirigida por Peter Hall, com Albert Finney como Macbeth e Dorothy Tutin como Lady Macbeth. Uma das performances mais criticas de Macbeth foi encenada no Old Vic, em 1980, onde Peter O'Toole e Frances Tomelty assumiram os papéis principais numa produção de Bryan Forbes que foi renegada em público antes da noite de abertura por Timothy West, diretor-artístico do teatro, apesar de ter sido um sucesso de público, devido à sua notoriedade. Segundo o crítico Jack Tinker, comtando a seu respeito no Daily Mail, "a performance não é tão completamente ruim quanto é heroicamente ridícula".[25]

No palco, Lady Macbeth passou a ser considerada como um papéis mais "grandiosos e desafiadores" de toda a obra de Shakespeare.[26] Outras atrizes que se destacaram no papel neste século foram Gwen Ffrangcon-Davies, Glenda Jackson e Jane Lapotaire.

Uma encenação da peça foi realizada no lar verdadeiro de Macbeth, em Moray, produzida pelo Teatro Nacional da Escócia, e realizado na Catedral de Elgin. Atores profissionais, dançarinos, músicos, alunos de escolas locais e um elenco da própria região de Moray participaram num dos eventos do chamado Highland Year of Culture ("Ano da Cultura das Highlands"), realizado em 2007.

No mesmo ano houve um consenso entre os críticos de que a produção de Rupert Goold para o Festival de Chichester daquele ano, com Patrick Stewart e Kate Fleetwood, rivalizava a aclamada produção de 1976 de Trevor Nunn e da Royal Shakespeare Company. Quando foi transferida para o Gielgud Theatre, em Londres, Charles Spencer, crítico teatral do Daily Telegraph, a declarou o melhor Macbeth que já havia visto.[27] No prêmio Evening Standard de 2007 a produção venceu as categorias de Melhor Ator, para Stewart, e Melhor Diretor, para Goold.[28] A mesma produção estreou no ano seguinte nos Estados Unidos, na Brooklyn Academy of Music, antes de se mudar para o Lyceum Theatre, na Broadway.

Edições e traduções brasileiras

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Abaixo, uma lista cronológica das traduções brasileiras de Hamlet.[29] Uma lista talvez ainda mais atualizada pode ser visualizada na página oficial da Fundação Biblioteca Nacional.[30]

  • Tradução de Artur de Sales: Macbeth, prosa e versos dodecassílabos (alexandrinos): Clássicos Jackson, 1948 (edição com Rei Lear e Macbeth) e 1960.
  • Tradução de Carlos Alberto Nunes: Macbeth, prosa e decassílabos heróicos:
    • Melhoramentos, 1956 e 1957 (edição com Coriolano e Macbeth);
    • Ediouro, s/d (em Shakespeare – Teatro Completo em 3 vol. “Tragédias”);
    • Agir, 2008 (em William Shakespeare – Teatro Completo em 3 vol. “Tragédias”).
  • Tradução de Jean Melville: Macbeth, prosa e verso, Martin Claret, 2002.
  • Tradução de Elvio Funck: Macbeth, prosa, Movimento/UFSC, 2006 (edição bilíngue, tradução interlinear).
  • Tradução de Rafael Raffaelli: Macbeth:
    • Cadernos de pesquisa interdisciplinar em ciências humanas, prosa e verso, 2008;
    • Editora UFSC, prosa e verso com a predominância de decassílabos, preservando-se as rimas, 2016 (edição bilíngue).

Referências

  1. «The Columbia Encyclopedia, Sixth Edition». Consultado em 1 de abril de 2008. Arquivado do original em 2 de abril de 2008 
  2. «Daniel Dantas e Renata Sorrah levam "Macbeth" ao Sesc Pinheiros». Guia da Folha.com. 26 de junho de 2010. Consultado em 22 de maio de 2011 
  3. http://www.adorocinema.com/filmes/filme-232345/
  4. Ver On the Knocking at the Gate in Macbeth.
  5. Coursen (1997, 11-13)
  6. Coursen (1997, 15-21)
  7. Coursen (1997, 17)
  8. a b Nagarajan, S. "A Note on Banquo." Shakespeare Quarterly. (Oct 1956) 7.4 pgs. 371–376
  9. Palmer, J. Foster. "The Celt in Power: Tudor and Cromwell" Transactions of the Royal Historical Society. 1886 Vol. 3 pgs. 343–370
  10. Maskell, D. W. "The Transformation of History into Epic: The 'Stuartide' (1611) of Jean de Schelandre." The Modern Language Review. (Jan 1971) 66.1 pgs. 53–65.
  11. Boyce, Charles. Encyclopaedia of Shakespeare, New York, Roundtable Press, 1990, p. 350.
  12. Braunmuller, A. R. (ed.) Macbeth (CUP, 1997), 5-8.
  13. Braunmuller, Macbeth, pp. 2-3.
  14. Kermode, Frank. "Macbeth," The Riverside Shakespeare (Boston: Houghton Mifflin, 1974), p. 1308; para detalhes sobre Garnet, ver Perez Zagorin, "The Historical Significance of Lying and Dissimulation—Truth-Telling, Lying, and self-Deception," Social Research, Outono de 1996.
  15. Anderson, Mark. Shakespeare By Another Name, 2005, pp. 402-403
  16. a b Kermode, Riverside Shakespeare, p. 1308.
  17. Braunmuller, Macbeth, Cambridge, Cambridge University Press, 1997; pp. 5-8.
  18. Existe, no entanto, alguma dúvida sobre a autenticidade do documento; para mais informações, ver o artigo sobre Forman.
  19. Brooke, Nicholas, ed. The Tragedy of Macbeth Oxford: Oxford University Press, 1998:57
  20. Adams, J. Q, Shakespearean Playhouses, Boston: Houghton Mifflin, 1917: 224; Bentley, G. E. The Jacobean and Caroline Stage, Oxford: Clarendon Press, 1941: 6.13-17; Chambers, E. K., The Elizabethan Stage, Oxford: Clarendon Press, 1923: 2.498. Para Macbeth como uma peça de encenação interna, ver Bald, R.C., "Macbeth and the Short Plays," Review of English Studies 4 (1928): 430; Shirley, Frances, Shakespeare's Use of Off-stage Sounds, Lincoln: University of Nebraska Press, 1963: 168-89.
  21. Downes, John. Roscius Anglicanus, 1708
  22. "Henry Irving as Macbeth", Arquivado em 6 de dezembro de 2008, no Wayback Machine. PeoplePlay UK
  23. Information about Sullivan's incidental music to Macbeth in 1888, Arquivado em 1 de outubro de 2009, no Wayback Machine. The Gilbert and Sullivan Archive
  24. Tanitch, Robert, Olivier, Abbeville Press (1985)
  25. Tanitch, Robert. London Stage in the 20th Century, Haus Publishing (2007) ISBN 978-1-904950-74-5
  26. Brown, Langdon. Shakespeare around the Globe: A Guide to Notable Postwar Revivals. New York: Greenwood Press, 1986: 355.
  27. [1]
  28. «Cópia arquivada». Consultado em 12 de janeiro de 2009. Arquivado do original em 30 de dezembro de 2007 
  29. Fonte: "Traduções do teatro de Shakespeare no Brasil" por Marcia A. P. Martins (PUC-Rio).
  30. Página virtual da FBN: http://www.bn.br/portal/ Arquivado em 28 de março de 2010, no Wayback Machine.

Bibliografia

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  • Coursen, Herbert (1997). Macbeth. Westport: Greenwood Press. ISBN 031330047X 
  • Kliman, Bernice; Rick Santos (2005). Latin American Shakespeares. Madison: Fairleigh Dickinson University Press. ISBN 0838640648 

Ligações externas

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Performances

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Gravação de áudio

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Texto completo da peça

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