As Horas Vulgares é um longa-metragem de ficção, roteirizado e dirigido por Rodrigo de Oliveira e Vitor Graize. É uma adaptação do livro Reino dos Medas, de Reinaldo Santos Neves, com algumas adaptações. Foi filmado em preto-e-branco em Vitória, a capital do Espírito Santo, em 2011. Amantes Constantes, filme dirigido por Philippe Garrel, serviu de referência para o longa. A trilha sonora foi composta por Fabiano Araújo e é composta majoritariamente por músicas do gênero jazz.

As Horas Vulgares
As Horas Vulgares
Pôster promocional do filme.
 Brasil
2011 •  p&b •  123 min 
Gênero drama
Direção Vitor Graize
Rodrigo de Oliveira
Produção Bob Redins
Produção executiva Ursula Dart
Roteiro Vitor Graize
Rodrigo de Oliveira
Baseado em Reino dos Medas de Reinaldo Santos Neves
Elenco João Gabriel Vasconcellos
Rômulo Braga
Música Fabiano Araújo
Diretor de fotografia Lucas Barbi
Direção de arte Manuela Curtiss
Companhia(s) produtora(s) Patuléia Filmes
Pique-Bandeira Filmes
Distribuição Petrini Filmes
Lançamento 2 de agosto de 2013
Idioma português

O filme, que contou com recursos do Fundo de Cultura do Espírito Santo, teve sua primeira exibição em outubro de 2011, na mesma cidade em que foi rodado. Em seguida, foi exibido em diversos festivais de cinema e tem estreia no circuito comercial brasileiro prevista para 2 de agosto de 2013. Recebeu críticas, em sua maioria, positivas, principalmente por se diferenciar dos filmes lançados na época no país.

Sinopse editar

No início da década de 2000, Lauro (João Gabriel Vasconcellos) é um pintor, casado com Erika (Julia Lund), que está em meio a uma crise existencial e acabou de sair de um período turbulento, acreditando ter encontrado uma solução. Numa noite, ele reencontra Théo (Rômulo Braga), seu melhor amigo, que a muito não o via, em Vitória, capital do Espírito. Eles começam a descobrir mais sobre a cidade, pois não tem nada planejado para fazer na segunda-feira e passam a se lembrar de noites passadas, como quando Clara (Thais Simonassi) foi embora da cidade. Na companhia de velhos conhecidos, como Júlia (Sara Antunes), Fra (Higor Campagnaro), Gil (Murilo Abreu) e Negro (Raphael Sil), ou recém-apresentados, como Ana (Tayana Dantas), que encontram pela cidade, bebidas e jazz, os amigos confrontam a realidade e o desencanto. Após suas conversas, Lauro decide que esse será seu último dia de vida.[1][2][3][4]

Elenco editar

Produção editar

A produção do filme recebeu recursos do Fundo de Cultura do Espírito Santo por meio do "Edital 010/2009 - Prêmio à produção de longa-metragem para mídia digital", da Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo.[7]

Roteiro editar

[...] esta é uma história contada em retrospecto, uma longa carta de Théo escrita para Clara a seu pedido, onde ele se anuncia um narrador incompleto [...]. A experiência da vida é linear, a da memória, do cinema, é quântica, se dá em diversos planos, e todos eles acontecem simultaneamente. O que nos ficou claro, então, era que estes planos paralelos, associados ao plano central (a última noite na vida de Lauro, seu reencontro com Théo e o trajeto por uma casa vazia, uma cidade vazia, até a porta de uma igreja) surgiam não como realizações de uma lembrança, mas como os fantasmas dela. Fantasma: a dimensão visível daquilo que já morreu. O passado é o fantasma do presente. E ele se manifesta por acúmulo, nunca por contraste: daí vêm os planos isolados e mudos do brinde dos amigos na praia e de Lauro observando sua mulher dormir, fugindo antes que ela acorde, bem como sua caminhada final, antes da morte. De algum modo, não bastava que o filme simplesmente associasse uma ideia à outra, para aí então irmos formando um corpo central, coeso, auto-explicativo.

Rodrigo de Oliveira sobre a história do filme.[8]

O roteiro é baseado no livro Reino dos Medas, romance de Reinaldo Santos Neves, publicado em 1971, porém "agora ambientado em outra época, no início dos anos 2000, e enriquecido por ações que o livro apenas citava de passagem, mas sobre a qual nos debruçamos com mais atenção; e acrescido também de sensações conquistadas a partir do trabalho com os atores", de acordo com Vitor Graize.[1] Mesmo atrelado ao livro, Rodrigo de Oliveira disse que "[o] processo de escritura do roteiro foi sempre bastante livre" e que eles mudaram algumas coisas do livro, como por exemplo retiraram a morte de Lauro do começo e os flashbacks iniciais, acrescentando no lugar a despedida de Clara, uma personagem que não existe na obra original. Ele mencionou que os atores nunca leram a obra de Reinaldo, então o roteiro "foi escrito de modo a poder responder todas as dúvidas."[8]

Rodrigo de Oliveira afirmou que As Horas Vulgares "é um filme de Vitória, no sentido que o destino íntimo dele está irremediavelmente atado ao destino da cidade e das pessoas que já passaram por ela", notando que todo centro velho é "um lugar preenchido por tragédias anteriores à nossa existência." O filme aborda "[a] ideia de que as cidades têm um prazo de validade", segundo o diretor, que acrescentou que "[q]uando os personagens de As Horas Vulgares começam a procurar o exílio, não é da Vitória oficial que eles estão fugindo, mas da Vitória imaginária que inventaram para eles mesmos. É o fracasso de um projeto de amor, e não de um projeto social."[8]

Escolha e preparação do elenco editar

Rodrigo de Oliveira disse que viu as atuações de Rômulo Braga na peça Aqueles Dois e no curta O Menino Japonês, de Caetano Gotardo, e que ali "ficou bem claro que este era o nosso cara." Adicionalmente, o diretor disse que Rômulo foi escolhido porquê ele "tem um tipo de gentileza à toda prova que parecia perfeita para o Théo, porque o nosso grande medo sempre foi o de ter um melhor amigo fraco e sem desejos, sobre o qual Lauro reinaria, e não o melhor amigo generoso e apaixonado em que Rômulo o transformou." Rodrigo comento que "sabíamos que sobre Théo recairia uma suspeita que, no fim, deveria ser imputada a nós diretores: 'por que você não salvou Lauro?'. E o modo como o Rômulo defende o personagem me parece muito cuidadoso – há um amor expresso ali, e ele é absoluto, mas há ao mesmo tempo um cansaço, a fadiga desse absoluto, e eles se conjugam conflituosamente, sem vitória aparente de um ou de outro."[8]

Para o papel de Lauro, a equipe desejava alguém que justificasse o amor que Théo sente por ele, "alguém para quem se olhasse uma vez e se pensasse: 'como não amá-lo?'." Rodrigo de Oliveira disse que sabia que o filme em si não conseguiria justificar esse fato, então ele escolheu João, pois "de algum modo eu enxergava isso nos olhos do João Gabriel Vasconcellos no meio de Do Começo ao Fim".[8]

Tayana Dantas conta que conheceu o diretor Vitor Graize durante a entrega do prêmio de Revelação do Cinema no "Omelete Marginal" e, em seguida, ele a adicionou no Orkut. Após trocas de mensagens pela rede social, a atriz se encontrou com a produção para um conversa, onde, após ler o roteiro, fez algumas observações apreciadas por Vitor, que dispensou o teste e a convidou para fazer parte do filme.[5]

A preparação do elenco começou em abril de 2010,[3] com ensaios no Rio de Janeiro e em Vitória. Rodrigo de Oliveira destacou que o processo "foi todo muito intelectual." Ele disse que a falta de experiência no trato com atores não foi problema, uma vez que o trabalho físico e comportamental não foi o mais importante no projeto. Rodrigo declarou que foi mais "um trabalho de entender e valorizar o poder da palavra, porque é isso que os personagens fazem: eles levam a sério o discurso, é esse seu modo de relação com o mundo, isso é o que lhes parece valoroso na vida adulta, a possibilidade de ser personagem, comentador e advogado de acusação da sua própria vida, tudo isso através da palavra." Durante a preparação, a única obra de arte usada como referência que foi mostrada aos atores foi Amantes Constantes, de Philippe Garrel.[8]

Filmagens editar

O filme foi gravado no formato 16 milímetros, em preto-e-branco, com locação em Vitória, em lugares que vão desde o centro histórico da cidade ao bairro Ilha das Caieiras, com início em outubro de 2011.[1][2][6] O diretor Rodrigo de Oliveira optou por esse formato, pois, segundo ele, o preto-e-branco "desloca toda a atenção do olhar para os volumes, para o movimento dos corpos, para a fisicalidade das coisas, e num filme em que os personagens falam muito e andam muito, isso pareceu ressaltar esse aspecto das formas, da oposição entre o claro e o escuro e como os corpos ressurgem mergulhados nesse ambiente."[1] Ele acrescentou que por retratar o mundo de um artista, "achamos que essa seria uma linguagem mais adequada, de uma sensibilidade maior."[9]

Rodrigo de Oliveira disse que Amantes Constantes serviu de "referência fotográfica" e que a cena do rock no meio da festa de jazz foi "encenado e filmado igual à famosa cena em que toca The Kinks no filme do Garrel." Ele revelou que antes mesmo de um produtor, a primeira pessoa a integrar o elenco foi Lucas Barbi, o diretor de fotografia, que é responsável pela autoria do storyboard. Rodrigo comentou que "filme foi todo decupado meticulosamente [...], e as discussões sobre a natureza do olhar e sobre a postura da câmera diante daquele universo foram exaustivas." No entanto, ele notou que a realidade do set de filmagem "joga tudo isso para o alto".[8]

Trilha sonora editar

A trilha sonora, em sua maioria constituída de jazz, composta por Fabiano Araújo conta com a participação da banda Valvulla, na canção "Supercapixaba".[1] Segundo Rodrigo de Oliveira, a equipe montou o filme "com algumas músicas-guia, e quando veio a trilha sonora final, alguma coisa mudou, não só de sentido, mas literalmente: existiam mais dois planos no fim do filme, ele não se encerrava no close da pintura do Lauro finalmente pronta e entregue à Clara, e quando a música dos créditos finais chegou, ela era tão viciosa, tão terrível naquilo que projetava para o resto da vida daquelas pessoas, que os planos seguintes perderam a função."[8]

Lançamento e recepção editar

Lançamento editar

O filme foi exibido pela primeira vez ao público em outubro de 2011, em Vitória.[7] Posteriormente, foi selecionado para participar da mostra competitiva Aurora realizada durante a 15ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2012.[1][10] O longa também foi exibido na 7ª Mostra Produção Independente da ABD Capixaba, na III Semana dos Realizadores, Panorama Internacional Coisa de Cinema, na Bahia, no Festival Lume de Cinema, em São Luís e na Cinemateca Brasileira, em 21 de setembro de 2012.[1][2][11] Em 19 de julho de 2013, As Horas Vulgares foi exibido no Cineclub Brazil, em Londres, com legendas em inglês.[12] O filme, que será distribuído pela Petrini Filmes, tem estreia prevista para 2 de agosto de 2013, em 17 cidades do Brasil.[7][13]

Recepção crítica editar

Escrevendo para a revista Cinética, Juliano Gomes comentou que "[u]m mérito claro aqui é o de nos dar essa sensação de estar à mercê desse jogo de desaparecimentos sem anúncio. E se nos tornamos um deles, é porque podemos em sua presença fazer uma relação, nos projetarmos ali e assim criar vínculo e espaço comum. É um film esobre [sic] estar junto e sobre uma espécie de drama que assombra essa situação que passa de espacial para algo espiritual - no sentido que há um vínculo imaterial, que paira sobre todos ali." O crítico afirmou que o filme "opta por uma espécie de artificialidade que resulta potente em relação à colocação dos corpos na imagem, mas relativamente inócua como opção de interpretação, pois falta àqueles fantasmas, contraditoriamente, algo que pulse, algum vestígio real desse estado que os acomete – algo ainda mais agravado pelos limites do protagonista Lauro". Em contrapartida, ele elogiou Théo que "quase sempre consegue dar conta de causar uma forte impressão física na imagem e dar densidade ao pequenos conflitos que se desenham."[14]

Luiz Carlos Merten, do jornal O Estado de S. Paulo disse que o filme "tem ecos de Estrada para Ythaca, do coletivo Pretti-Parente, mas é, senão propriamente original, único." Ele notou descreveu As Horas Vulgares como um "filme sobre amizade viril, que comporta certa tensão homossexual, a crônica de uma morte anunciada." O crítico finalizou dizendo que "As Horas Vulgares é um belo trabalho. Tem o seu tempo, às vezes lento. Toca, como o cinema sabe fazer, em temas profundos, que remetem, como se diz, à essência do ser."[15]

Referências

  1. a b c d e f g h i j k l «Sessão Especial do filme As Horas Vulgares será apresentada na próxima quinta (29)». Governo do Estado do Espírito Santo. Consultado em 13 de julho de 2013 
  2. a b c «Longa capixaba 'As Horas Vulgares' será lançado no circuito comercial brasileiro». A Gazeta. 19 de abril de 2013. Consultado em 13 de julho de 2013 
  3. a b c d e Oakes, Erik (23 de setembro de 2010). «Diretores de 'As Horas Vulgares', longa capixaba com atores globais, disponibilizam teaser do filme na internet». A Gazeta. Consultado em 14 de julho de 2013 
  4. a b Paganini, Ingridy; Jabes, Reydson; Carneiro, Merielly (24 de agosto de 2011). «Bate-papo sobre audiovisual na 1ª MCA Histórico Cultural». Mostra Capixaba de Audiovisual. Consultado em 14 de julho de 2013 
  5. a b «Capixaba Tayana Dantas faz sucesso na TV, cinema e teatro». A Gazeta. 24 de setembro de 2011. Consultado em 14 de julho de 2013 
  6. a b «É Chegada a Hora». Nós (2): 16-17. Novembro de 2010. Consultado em 14 de julho de 2013 
  7. a b c «Longa-metragem contemplado pelo Funcultura será lançado no circuito comercial brasileiro». Governo do Estado do Espírito Santo. 19 de abril de 2013. Consultado em 14 de julho de 2013 
  8. a b c d e f g h Takamatsu, Roberta (27 de novembro de 2012). «O fracasso de um projeto de amor». Taturama. Consultado em 13 de julho de 2013 
  9. Neiva, Paula (29 de agosto de 2010). «João Gabriel Vasconcellos: em novo filme, um pintor em crise». Veja. Consultado em 13 de julho de 2013 
  10. «Mostra de Cinema de Tiradentes tem programação intensa até dia 28». Ancine. 24 de janeiro de 2012. Consultado em 13 de julho de 2013 
  11. Zanoli, Tiago (6 de setembro de 2012). «Produção de filmes no Estado passa por boa fase, dizem realizadores». A Gazeta. Consultado em 14 de julho de 2013 
  12. «Cineclub Brasil apresenta As Horas Vulgares». The Brazilian Post. 19 de julho de 2013. Consultado em 13 de julho de 2013 
  13. «Calendário de estreias nacionais : 2013». Filme B. Consultado em 13 de julho de 2013 
  14. Gomes, Juliano (dezembro de 2011). «As Horas Vulgares, de Rodrigo de Oliveira e Vitor Graize (Brasil, 2011)». Cinética. Consultado em 14 de julho de 2013 
  15. Merten, Luiz Carlos (26 de janeiro de 2012). «'As Horas Vulgares', algo mágico em Tiradentes». O Estado de S. Paulo. Consultado em 14 de julho de 2013 

Ligações externas editar