Chevalier d'Eon

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 Nota: Não confundir com Le Chevalier d'Eon (telessérie animada).

Charles de Beaumont (Tonnerre, 5 de outubro de 1728 - Londres, 21 de maio de 1810), também Cavaleiro d'Éon (Chevalier d’Eon) ou Mademoiselle Beaumont, atuou como diplomata, espiã e militar francesa. D'Éon foi uma das mais famosas personalidades transgênero e deu origem ao epônimo "eonismo", que designa o fenômeno do travestismo de gênero em linhas gerais.

Chevalier d'Eon
Chevalier d'Eon
Portrait du chevalier d’Éon par Thomas Stewart (1792).
Nascimento Charles-Geneviève-Louis-Auguste-André-Timothée-Robert-Pierre d'Éon de Beaumont
5 de outubro de 1728
Tonnerre
Morte 21 de maio de 1810 (81 anos)
Londres
Sepultamento St Pancras Old Church Garden Gates And Railings To Road Frontage
Cidadania França
Alma mater
Ocupação diplomata, escritora, espia, militar
Prêmios
  • Cavaleiro da Ordem Real e Militar de São Luís

Destacou-se por seus serviços de espionagem, a serviço do rei Luís XV da França, na corte da tsarina Isabel da Rússia, onde viveu como uma mulher.[1] Quando Luís XV faleceu, viveu permanentemente como mulher (viveu 49 anos como homem e 34 como mulher). Passou seus últimos anos na Inglaterra.[2]

Primeiros anos editar

 
Retrato de D'Éon em seus primeiros anos

D'Éon nasceu no Hotel d'Uzès em Tonnerre, Borgonha, em uma família nobre empobrecida. O pai de D'Éon, Louis d'Éon de Beaumont, foi advogado e diretor dos domínios do rei na região, e, depois, prefeito de Tonnerre e subdelegado do Intendência Geral de Paris.[3] A mãe de D'Éon, Françoise de Charanton, era filha de um Comissário Geral nos exércitos durante as guerras contra Espanha e Itália. A maior parte do que se sabe sobre o início da vida de d'Éon vem de uma autobiografia The Interests of the Chevalier d'Éon de Beaumont e do ensaio de Bram Stoker sobre o cavaleiro em seu livro de 1910 Famous Impostors.[4][5][6]

D'Éon se destacou na escola, mudando-se de Tonnerre para Paris em 1743, graduando-se em direito civil e direito canônico pelo Collège Mazarin em 1749, aos 21 anos. D'Éon tornou-se secretária de Bertier de Sauvigny, Intendente de Paris, e serviu como secretária do administrador do departamento fiscal e, depois, foi nomeada censora real da história e literatura por Malesherbes em 1758.[4]

Vida como espiã editar

Em 1756 , D'Éon juntou-se à rede secreta de espiões chamada Le Secret du Roi, que trabalhava pessoalmente para o rei Luís XV, sem conhecimento da administração, e às vezes contra as políticas e tratados oficiais. O monarca a enviou em uma missão secreta à Rússia para conhecer a imperatriz Isabel e conspirar com a facção pró-francesa contra a Monarquia de Habsburgo. Relatos posteriores afirmam que D'Éon assumiu o papel de Mademoiselle Beaumont para realizar tal tarefa e, também, se tornou dama de honra da imperatriz. A carreira de D'Éon na Rússia é tema de um romance de Valentin Pikul.

Em 1761 d'Éon retornou à França . No ano seguinte, tornou-se capitã dos dragões sob o comando do marechal de Broglie e lutou nos últimos estágios da Guerra dos Sete Anos. Recebeu após o conflito a Ordem de São Luís, maior honraria militar do reino da França.

Vida como mulher editar

Chevalière d'Éon
D'Éon retratada como uma odalisca, por Kauffmann

Apesar do fato de que d'Éon costumava usar trajas militares, circularam rumores em Londres de que d'Éon era na verdade uma mulher. Um bolão de apostas foi iniciado na Bolsa de Valores de Londres sobre o verdadeiro sexo de d'Éon. D'Éon foi convidada a participar, mas recusou, dizendo que um exame seria desonroso, qualquer que fosse o resultado. Após um ano sem progresso, a aposta foi abandonada. Após a morte de Luís XV em 1774, o secret du roi foi abolido e d'Éon tentou negociar um retorno do exílio. O escritor Pierre de Beaumarchais representou o governo francês nas negociações. O tratado de vinte páginas resultante permitiu que d'Éon retornasse à França e retivesse a pensão ministerial, mas exigia que d'Éon entregasse a correspondência referente ao segredo do rei.[7]

Madame Campan escreveu em suas memórias: "Esse ser excêntrico há muito solicitava permissão para retornar à França; mas era necessário encontrar uma maneira de poupar a família que ofendera do insulto que veriam em seu retorno; portanto, ele foi obrigado a retomar o traje desse sexo ao qual na França tudo é perdoado. O desejo de ver sua terra natal mais uma vez o levou a se submeter à condição, mas ele se vingou combinando a longa cauda do vestido e os três babados profundos nas mangas com a atitude e a conversa de um granadeiro, o que o tornava uma companhia muito desagradável."

O Chevalier d'Éon alegou ter sido designada mulher ao nascer e exigiu reconhecimento pelo governo como tal. D'Éon alegou ter sido criada como um menino porque Louis d'Éon de Beaumont só poderia herdar de seus sogros se tivesse um filho. O rei Luís XVI e sua corte atenderam a essa exigência, mas exigiram que d'Éon se vestisse adequadamente com roupas femininas, embora d'Éon pudesse continuar a usar a insígnia da Ordem de São Luís. Quando a oferta do rei incluiu fundos para um novo guarda-roupa de roupas femininas, d'Éon concordou. Em 1777, após quatorze meses de negociação, d'Éon retornou à França e se estabeleceu em Tonnerre.[8]

 
Uma batalha de esgrima entre d’Eon e o Cavaleiro de Saint-George, na Casa Carlton, Londres, 1787. D’Eon estava vestida com trajes femininos

A pensão que Luís XV havia concedido foi cortada devido a Revolução Francesa, e d'Éon teve que vender bens pessoais, incluindo livros, joias e pratos. As propriedades da família em Tonnerre foram confiscadas pelo governo revolucionário. Em 1792, d'Éon enviou uma carta à Assembleia Nacional Francesa oferecendo-se para liderar uma divisão de soldados do sexo feminino contra os Habsburgos, mas a oferta foi rejeitada. D'Éon participou de torneios de esgrima até ficar gravemente ferida em Southampton em 1796.[9] D'Éon passou seus últimos anos em companhia de uma viúva, Sra. Cole.[10] Em 1804, d'Éon foi enviada para uma prisão de devedores por cinco meses e assinou um contrato para uma biografia a ser escrita por Thomas William Plummer, que nunca foi publicada. D'Éon ficou paralisada após uma queda e passou os últimos quatro anos acamada, morrendo na pobreza em Londres em 21 de maio de 1810 aos 81 anos.[10]

O cirurgião que examinou o corpo de d'Éon atestou em seu atestado post-mortem, que a Chevalier tinha "órgãos masculinos em todos os aspectos perfeitamente formados", e ao mesmo tempo exibia características femininas. Algumas características descritas no certificado eram "arredondamento incomum na formação dos membros", bem como "seios notavelmente cheios".[11] O corpo de D'Éon foi enterrado no Cemitério de St Pancras Old Church, e as posses restantes de d'Éon foram vendidas pela Christie's em 1813. O túmulo de D'Éon está listado no Burdett-Coutts Memorial.

Legado editar

 
O nome de D'Eon's listado na fachada sul do Burdett-Coutts Memorial, em Londres, Inglaterra

Alguns dos documentos de d'Éon's estão sob jurisdição da Biblioteca Brotherton em Leeds, Inglaterra.[12]

Representações culturais editar

  • The Chevalière d'Eon, por Charles Dupeuty e o Barão de Maldigny (1837), Théâtre du Vaudeville;[13]
  • The Chevalier d'Eon, uma comedia em três atos por Dumanoir e Jean-François Bayard (1837), Théâtre des Variétés;[14]
  • Le chevalier d'Eon, opéra-comique em quatro atos por Rodolphe Berger, libreto por Armand Silvestre e Henri Cain (1908), Théâtre de la Porte Saint-Martin; Mlle. Anne Dancrey criou a obra narrativa;[15][16]
  • Spy of Madame Pompadour (1928), filme;
  • Le secret du Chevalier d'Éon (1959), filme;
  • Le Chevalier D'Eon (2006), anime;
  • The Sword of the Chevalier (2017), um episódio da série Doctor Who[17][18][19]
  • D’Eon aparece como uma personagem não jogável no jogo eletrônico Assassin's Creed: Unity.[20]

Referências

  1. McRobbie, Linda Rodriguez (29 de julho de 2016). «The Incredible Chevalier d'Eon, Who Left France as a Male Spy and Returned as a Christian Woman». Atlas Obscura. Consultado em 15 de março de 2021. Cópia arquivada em 18 de janeiro de 2021 
  2. Green R. Mythological, historical and cross-cultural aspects of transsexualism. In: Denny D, editor. Current concepts in transgender identity. New York: Garland Publishing; 1998. p.3-14.
  3. J. M. J. Rogister, D'Éon de Beaumont, Charles Geneviève Louis Auguste André Timothée, Chevalier D'Éon in the French nobility (1728–1810), Oxford Dictionary of National Biography, Oxford University Press, 2004; online edn, Sept 2012 Consultado em 26 de abril de 2013 Arquivado em 6 outubro 2014 no Wayback Machine
  4. a b Lever, Evelyne; Maurice Lever (19 de fevereiro de 2009). Le Chevalier d'Éon : Une vie sans queue ni tête. [S.l.]: Fayard. 384 páginas. ISBN 978-2-213-61630-8 
  5. D'Eon de Beaumont, his life and times archive.org
  6. «The Project Gutenberg eBook of Famous Impostors, by Bram Stoker.». www.gutenberg.org. Consultado em 2 de março de 2018. Arquivado do original em 2 de março de 2018 
  7. Este artigo incorpora texto (em inglês) da Encyclopædia Britannica (11.ª edição), publicação em domínio público.
  8. Burrows, Simon; Russell Goulbourne; Jonathan Conlin; Valerie Mainz (23 de abril de 2010). The Chevalier d'Éon and his worlds: gender, espionage and politics in the eighteenth century. [S.l.]: Continuum. 272 páginas. ISBN 9780826422781. Consultado em 10 de julho de 2016. Arquivado do original em 4 de julho de 2014 
  9. Chisholm 1911.
  10. a b Burrows, Simon (Outubro de 2006). Blackmail, scandal and revolution London's French libellistes, 1758–92. Manchester, Reino Unido: Manchester University Press. 9780719065262 
  11.   Laughton, John Knox (1888). «D'Éon de Beaumont, Charles Geneviève Louis Auguste André Timothée». In: Stephen, Leslie. Dictionary of National Biography. 14. Londres: Smith, Elder & Co 
  12. «Papers of Charles Chevalier d' Eon de Beaumont». Special Collections. Leeds University Library. Consultado em 3 de abril de 2017. Cópia arquivada em 13 de outubro de 2017 
  13. The Chevalier d'Eon and Other Short Farces from the Eighteenth and Nineteenth Century French Theatre, By Frank J. Morlock
  14. Theatrical Costume, Masks, Make-up and Wigs: A Bibliography and Iconography, by Sidney Jackson Jowers, p. 314
  15. Le Guide Musical: Revue Internationale de la Musique Et de Theâtres Lyriques. [S.l.: s.n.] 1908. p. 330. Consultado em 29 de outubro de 2016. Cópia arquivada em 2 de janeiro de 2020 
  16. Data.bnf.fr (ed.). «Le chevalier d'Eon - Spectacle - 1908» (em francês). Consultado em 23 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 25 de outubro de 2016 
  17. «2.2. Doctor Who: Sword of the Chevalier - Doctor Who - The Tenth Doctor Adventures - Big Finish». www.bigfinish.com. Consultado em 1 de julho de 2021. Cópia arquivada em 9 de julho de 2021 
  18. Adams, Guy (2017). The sword of the chevalier. Nicholas Briggs, David Tennant, Billie Piper, Nickolas Grace, Tam Williams, Mark Elstob. [Maidenhead, Berkshire, England]: [s.n.] ISBN 978-1-78703-371-9. OCLC 1081424575. Consultado em 1 de julho de 2021 
  19. «Doctor Who: The Tenth Doctor Adventures Volume 2 review - David Tennant and Billie Piper return!». CultBox (em inglês). 28 de novembro de 2017. Consultado em 1 de julho de 2021. Cópia arquivada em 9 de julho de 2021 
  20. «Chevalier d'Éon in Assassin's Creed Unity». Junho de 2018. Consultado em 24 de agosto de 2021. Cópia arquivada em 24 de agosto de 2021 

Bibliografia editar

  • Decker, Michel de. Madame Le Chevalier d'Éon, Paris: Perrin, 1987, ISBN 978-2-7242-3612-5.
  • d'Éon De Beaumont, Charles. The Maiden of Tonnerre: The Vicissitudes of the Chevalier and the Chevalière d'Éon, Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, 2001, ISBN 978-0-8018-6687-6.
  • d'Éon, Leonard J. The Cavalier, New York: G.P. Putnam's Sons, 1987, ISBN 0-399-13227-9.
  • Frank, André, with Jean Chaumely. D'Éon chevalier et chevalière: sa confession inédite, Paris: Amiot-Dumont, 1953.
  • Fortelle M. de la. La Vie militaire, politique et privée de Demoiselle Charles-Geneviève-Auguste-Andrée-Thimothée Éon ou d'Èon de Beaumont, [... etc.], Paris: Lambert, 1779.
  • Gaillardet, F. (ed.), Mémoires du chevalier d'Éon, Paris, 1836, 2 vols.
  • Gontier, Fernande. Homme ou femme? La confusion des sexes, Paris: Perrin, 2006, Chapter 6. ISBN 978-2262024918.
  • Homberg, O., and F. Jousselin, Un Aventurier au XVIIIe siècle: Le Chevalier D'Éon (1728–1810), Paris: Plon-Nourrit, 1904.
  • Kates, Gary. Monsieur d'Éon Is a Woman: A Tale of Political Intrigue and Sexual Masquerade, Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, 2001, ISBN 978-0-8018-6731-6.
  • Lever, Évelyne and Maurice. Le Chevalier d'Éon: Une vie sans queue ni tête, Paris: Fayard, 2009, ISBN 978-2-213-61630-8.
  • Luyt, Philippe. D'Éon de Tonnerre. Iconographie et histoire, 2007, OCLC 163617123
  • Mourousy, Paul. Le Chevalier d'Éon: un travesti malgré lui, Paris: Le Rocher, 1998, ISBN 978-2-268-02917-7.
  • Musée municipal de Tonnerre, Catalogue bilingue de l'exposition, Le Chevalier d'Éon: secrets et lumières, 2007.
  • Royer, Jean-Michel. Le Double Je, ou les Mémoires du chevalier d'Éon, Paris: Grasset & Fasquelle, 1986, ISBN 978-2-246-38001-6.
  • Telfer, John Buchan, The strange career of the Chevalier d'Eon de Beaumont, minister plenipotentiary from France to Great Britain in 1763, 1885,