Ciência forense

(Redirecionado de Criminalística)

A Ciência Forense é compreendida como o conjunto de todos os conhecimentos científicos e técnicas que são utilizados para desvendar não só crimes, como também variados assuntos legais (cíveis, penais ou administrativos).[1] É considerada uma área interdisciplinar pois envolve física, química, biologia, entre outras. Tem como objetivo principal o suporte a investigações referentes a justiça civil e criminal.[2]

Crânios em uma praia.

A Ciência Forense possui estreita ligação com a Criminalística, uma vez que a distinção entre ambas as áreas não é clara,[3] sendo comum a confusão entre ambas, inclusive com utilização do termo "criminalística forense".[4][5] Muitas vezes o tratamento é como sinônimos,[6] se referindo a ambas como ciências naturais aplicadas à solução de crimes.[7] Alguns autores, como Grazinoli Garrido e Alexandre Giovanelli,[1] tratam a Criminalística como disciplina da Ciência Forense.[6][8] A Criminalística tem origem no termo alemão Kriminalistik[6] e na escola alemã com propagação na Europa,[1] por outro lado, a Ciência Forense tem origem do inglês forensic science.[6] Dentre as diferenciações feitas estão a que o especialista em criminalística (detetives e investigadores) seria o responsável pelo comando da investigação e encarregados das provas, enquanto que os cientistas forenses analisam cientificamente os termos relacionados ao objeto de investigação.[9]

Em investigações criminais o foco principal dos profissionais na área é tanto confirmar a autoria dos crimes, quanto descartar o envolvimento do(s) suspeito(s). Em casos de homicídio são utilizados diversos recursos como, por exemplo, fio de cabelo, sangue e impressão digital deixados no local do crime e que são úteis na identificação dos suspeitos. É possível também descobrir a hora, a data, causa da morte, quem matou e o que levou ao homicídio. Peritos de diversas especialidades são os profissionais que realizam os testes forenses dentro de instituições policiais, associadas ao governo, ou em consultorias independentes.

Para o sucesso do trabalho forense se faz necessário o uso de algumas técnicas. Uma delas é dermatoglifia que estuda os padrões das cristas dérmicas. Outra bastante utilizada é a técnica do pó, no qual são depositados pós em superfícies lisas que facilite o decalque das impressões digitais.[2]

Etimologia editar

A palavra forense vem do latim forensis, que significa "de antes do fórum".[10] A história do termo provém da época romana, onde uma acusação criminal significava apresentar o caso perante um grupo de indivíduos públicos no fórum e, tanto o acusado do crime quanto o acusador dariam discursos com base em suas perspectivas da história. O caso seria decidido em favor do indivíduo com o melhor argumento entregue. Esta origem é a fonte dos dois usos modernos da palavra forense — como uma forma de prova legal e como uma categoria de apresentação pública. No uso moderno, somente o termo forense no lugar de ciência forense pode ser considerada correta, pois o termo forense é efetivamente um sinônimo para legal ou relacionado aos tribunais. No entanto, devido o termo ser tão associado com o campo científico, muitos dicionários incluem um significado que equivale para a palavra forense e ciência forense.

História editar

Métodos iniciais editar

No mundo antigo não existiam práticas forenses padronizadas, resultando em muitos casos que não tiveram resolução. Investigações criminais e julgamentos eram fortemente baseados em confissões e testemunhos. No entanto, há fontes antigas que contêm vários relatos de técnicas que indicam o início dos conceitos da ciência forense que foram desenvolvidas séculos mais tarde.[11]

Arquimedes (287-212 a.C.), por exemplo, inventou um método para a determinação do volume de um objeto com forma irregular. De acordo com Vitrúvio, uma coroa votiva de um templo havia sido feita para o rei Hiero II, que havia fornecido ouro puro para ser usado em sua fabricação e, a partir disto, Arquimedes foi solicitado para determinar se alguma prata havia sido colocada na coroa durante sua produção pelo ourives.[12] Arquimedes não podia danificar a coroa e, para resolver o problema, pode ter se utilizado de seu princípio da flutuabilidade, onde é possível observar o deslocamento dos corpos a partir da imersão na água.

O primeiro relato escrito do uso de medicamentos e da entomologia para resolver casos criminais é atribuído ao livro Xi Yuan Lu (traduzido em inglês como Washing Away of Wrongs),[13] escrito no ano 1248 na China por Song Ci (宋慈, 1186–1249), durante a dinastia Sung. Em um dos relatos do livro, há o caso de uma pessoa assassinada com uma foice que foi resolvido por um investigador que instruiu todos os moradores próximos do local do crime a trazerem suas foices para uma determinada localidade, pois tinha percebido qual arma foi utilizada testando várias lâminas em uma carcaça de animal e comparando as feridas. A partir disto, moscas atraídas pelo cheiro de sangue eventualmente se reuniram em uma única foice, o assassino confessou logo após o ocorrido.[14]

O livro também oferece informações sobre como distinguir um afogamento (água nos pulmões) de um estrangulamento, juntamente com outras evidencias que podem ser analisadas para examinar cadáveres e determinar se a morte foi causada por homicídio, suicídio ou acidente.[14]

Origens editar

Na Europa, durante o século XVI, médicos militares e universitários começaram a reunir informações sobre a causa e circunstâncias da morte, como Ambroise Paré, um cirurgião do exército francês que estudou sistematicamente os efeitos da morte violenta em órgãos internos[15][16] e dois cirurgiões italianos, Fortunato Fidelis e Paolo Zacchia, que lançaram as bases da patologia moderna estudando as mudanças ocorridas na estrutura do corpo como resultado de enfermidades.[17] No final do século XVIII, os estudos sobre o tema ficaram em evidencia devido a obras como "Um Tratado sobre Medicina Forense e Saúde Pública" pelo médico francês Francois Immanuele Fodéré[18] e "O Sistema Completo de Medicina da Polícia" pelo médico perito alemão Johann Peter Frank.[19]

Como os valores racionais da época do Iluminismo estavam cada vez mais permeado a sociedade do século XVIII, a investigação criminal tornou-se um procedimento mais baseado em evidências, racional — o uso de tortura para forçar confissões foi reduzido e a crença em bruxaria e poderes ocultos deixaram de influenciar as decisões de tribunais.

Áreas científicas relacionadas editar

 
Agentes do CID, Estados Unidos, numa investigação de um crime.

Cultura popular editar

Uma das primeiras séries de televisão que se focaram na premissa de análise científica de evidencias foi Quincy, M.E. (baseado em uma série canadense intitulada Wojeck), onde o personagem principal é um médico legista que trabalha em Los Angeles resolvendo crimes através de um estudo cuidadoso das provas. A abertura de cada episódio se inicia com o personagem principal, interpretado por Jack Klugman, dizendo em uma palestra para policiais "Senhores, vocês estão prestes a entrar na esfera mais fascinante do trabalho policial, o mundo da medicina forense". Posteriormente surgiram séries com premissas semelhantes, como Dexter, The Mentalist, CSI, Hawaii Five-0, Cold Case, Bones, Law & Order, Body of Proof, NCIS, Criminal Minds, Silent Witness, Detective Conan e Midsomer Murders, onde retratam versões glamorizadas das atividades dos cientistas forenses do século XXI.[carece de fontes?]

Ver também editar

Referências

  1. a b c Garrido, Rodrigo Grazinoli; Giovanelli, Alexandre (20 de agosto de 2012). «Criminalística: origens, evolução e descaminhos». Cadernos de Ciências Sociais Aplicadas. 5 (5). ISSN 2358-1212. Consultado em 21 de abril de 2017 
  2. a b Chemello, Emiliano (2006). «A Ciência Forense: Impressões digitais» (PDF). Química Virtual. Consultado em 1 de junho de 2016 
  3. «Ciência Forense - Uma introdução à criminalística». www.biomedicinaemacao.com.br. Consultado em 21 de abril de 2017 
  4. «Criminalística Forense - ULBRA Carazinho». www.ulbra.br. Consultado em 21 de abril de 2017 
  5. «Criminalística forense - Penal - Âmbito Jurídico». ambito-juridico.com.br. Consultado em 21 de abril de 2017 
  6. a b c d Educacao, Portal. «Portal Educação - Artigo». www.portaleducacao.com.br. Consultado em 21 de abril de 2017 
  7. «O QUE FAZ UM CRIMINALISTA (técnico de Ciência Forense)». Polícia Fortalecendo a Cidadania. 28 de março de 2011. Consultado em 21 de abril de 2017 
  8. Fachone, Patrícia; Velho, Léa (13 de junho de 2007). «Ciência forense: interseção justiça, ciência e tecnologia». Revista Tecnologia e Sociedade. 3 (4): 155–156. ISSN 1984-3526. doi:10.3895/rts.v3n4.2498. Consultado em 21 de abril de 2017. Pesquisando na world wide web, foi possível identificar vários cursos, graduação e pós-graduação stricto sensu em ciências forenses nas universidades de vários países, sendo alguns exemplos discriminados a seguir: […]
    Na Argentina, em Buenos Aires o Instituto Universitário da Polícia Federal Argentina conduz licenciatura em criminalística, com duração de 4 anos, aprovada pela resolução 120/91 do Ministério da Educação da Nação. [grifos não originais]
     
  9. «ID – Investigação Discovery | Discovery». id.discoverybrasil.uol.com.br. Consultado em 21 de abril de 2017. Arquivado do original em 28 de julho de 2014 
  10. Shorter Oxford English Dictionary (em inglês) 6ª ed. [S.l.]: Oxford University Press. 2007 
  11. Schafer, Elizabeth D. (2008). Ancient Science and Forensics (em inglês). [S.l.]: Salem Press. ISBN 9781587654237 
  12. Vitruvius, Marcus (2007). de Architectura, Book IX. University of Chicago: [s.n.] 
  13. «Forensics Timeline». CBS News. Consultado em 1 de junho de 2016 
  14. a b Ci, Song (1981). The Washing Away of Wrongs: Forensic Medicine in Thirteenth-Century China (Science, Medicine, and Technology in East Asia) (em inglês). Center for Chinese Studies: University of Michigan. ISBN 9780892648009 
  15. Kelly, Jack (2009). Gunpowder: Alchemy, Bombards, and Pyrotechnics: The History of the Explosive That Changed the World (em inglês). [S.l.]: Basic Books. 79 páginas. ISBN 9780786739004 
  16. Park, Katharine; Daston, Lorraine (2003). The Cambridge History of Science: Volume 3, Early Modern Science (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press. ISBN 9780521572446 
  17. Suter, Patricia; D. Earnest, Russell; P. Earnest, Corinne (2010). The Hanging of Susanna Cox: The True Story of Pennsylvania's Most Notorious Infanticide & the Legend That's Kept it Alive (em inglês). [S.l.]: Stackpole Books. 20 páginas. ISBN 9780811705608 
  18. Madea, Burkhard (2014). Handbook of Forensic Medicine (em inglês). [S.l.]: Wiley. 10 páginas. ISBN 9781118570630 
  19. Lindemann, Mary (1999). Medicine and Society in Early Modern Europe (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press. 135 páginas. ISBN 9780521423540