Delação premiada

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Delação premiada (expressão coloquial para colaboração premiada), na legislação brasileira, é o instituto jurídico pelo qual o investigado ou réu em um processo penal recebe um benefício em troca de sua colaboração com o Estado para evitar a prática de novos crimes, produzir provas sobre crimes já ocorridos ou identificar coautores desses crimes. A colaboração premiada está prevista em diversas leis brasileiras: Código Penal, Lei nº 8 072/90 – Lei dos Crimes Hediondos e Equiparados, Lei 12 850/2013 – Lei das Organizações Criminosas, 7 492/86 – Crimes contra o sistema financeiro nacional, 8 137/90 – Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, Lei nº 9 613/98 – Lei da Lavagem de dinheiro, Lei nº 9 807/99 – Lei de Proteção a Testemunhas, Lei nº 12 529/2011 – Lei dos Crimes Econômicos, Lei nº 11 343/06 – Lei de Drogas.[1]

Delatar tem origem latina da palavra delatare, que se refere ao ato de denunciar a responsabilidade de alguém ou a si mesmo por um crime ou revelar um fato relacionado a um delito.[2]

Tornando-se um delator editar

A Lei de Organizações Criminosas (Lei 12 850/2013) define que, para aquele que contribuir efetiva e voluntariamente com a investigação ou processo, o juiz poderá conceder perdão judicial, reduzir a pena de prisão em até dois terços ou substituir por pena restritiva de direitos.[3]

Assim, para que um réu se torne um delator e goze dos benefícios que a lei lhe oferece, o primeiro passo é manifestar oficialmente o interesse em fazer o acordo. Depois, na presença de advogados e procuradores, o réu revela o que tem para delatar. Se o processo avançar, as partes assinam um termo de confidencialidade para evitar vazamentos.[4]

Só depois que a delação for homologada pela Justiça é que as informações poderão ser usadas nas investigações. Junto com os depoimentos, o delator tem que apresentar provas e documentos. Em troca, recebe uma pena mais leve.[4] Especialistas no assunto defendem que a decisão de tornar-se um delator precisa partir voluntariamente do investigado.[3]

Segundo a legislação, a colaboração deve resultar em pelo menos um desses aspectos:[3]

  • identificação de outros autores do crime ou membros da organização criminosa;
  • revelação da estrutura hierárquica da organização criminosa;
  • prevenção de infrações penais decorrentes da atividade criminosa;
  • recuperação parcial ou total dos produtos das infrações;
  • localização de vítima com integridade física preservada.

Benefícios aos delatores editar

A delação premiada pode, a depender da legislação, beneficiar o acusado com:[5][6]

  • diminuição da pena privativa de liberdade em até 2/3 (66,6%);
  • substituição da pena privativa liberdade por penas restritivas de direitos;
  • cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto;
  • perdão judicial (isenção de pena);
  • não oferecimento da denúncia.

Utilização em organização criminosa editar

Em 2013, a então presidente da república Dilma Rousseff homologou a lei de colaboração premiada para utilização em crime de organização criminosa, na lei 12 850/13.[7][8]

Pontos positivos da delação editar

Valores recuperados da corrupção editar

Em dois anos, a Operação Lava Jato recuperou mais de 4 bilhões de reais desviados pela corrupção.[9][10] A investigação só avançou até esse ponto em razão das informações obtidas junto às comprovações nos termos das delações premiadas. Em troca de informações, vários delatores conseguiram o benefício da prisão domiciliar.[11]

Meio de vencer pactos de silêncio entre criminosos editar

O juiz federal responsável pela primeira sentença do mensalão, Alexandre Sampaio, afirmou que a delação é um instrumento "estritamente regulado em lei" e fundamental para "vencer pactos de silêncio estabelecidos entre criminosos", e disse também que alterar a delação premiada irá "dificultar o acesso da Justiça aos altos escalões das organizações criminosas".[12]

Pontos negativos da delação editar

Semelhança com a tortura editar

Críticos da delação premiada argumentam que, ao efetuar uma prisão preventiva e condicionar a liberdade do preso a sua delação premiada, a instituição da delação premiada assemelha-se à tortura.[13][14][15] Inclusive, em 2019, o ministro Gilmar Mendes manifestou que "Não se justifica prisão provisória de dois anos sem que haja outros fundamentos.", questionando se "...nós não a estamos usando como tortura?".[16] A comparação é questionada por quem defende a colaboração. Nos dois primeiros anos da Operação Lava Jato, dentre 52 negociações de delação, somente 13 foram feitas com réus presos.[17]

Intermediada pela Polícia Federal editar

Em junho de 2018, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) homologou a delação de Antonio Palocci, no âmbito da Operação Lava Jato. O acordo foi homologado pelo desembargador federal João Pedro Gebran Neto.[18][19][20] Anteriormente, os acordos de colaboração foram intermediados pelo Ministério Público Federal e pela Procuradoria-Geral da República.[21]

Ver também editar

Referências

  1. Marcella Sanguinetti Soares Mendes. «A delação premiada com o advento na Lei 9.807/99». ambito-juridico.com.br. Consultado em 7 de julho de 2015 
  2. Monique Caldeira. «Delação Premiada e a sua colaboração para a Lava Jato». JusBrasil 
  3. a b c gazetadopovo.com.br/ Como se tornar delator?
  4. a b g1.globo.com/ Em depoimento a Moro, Palocci deixa claro que sabe mais e quer falar
  5. Rodrigo Murad do Prado (23 de dezembro de 2013). «A delação "premiada" e as recentes modificações oriundas da Lei 12.850/13». DireitoNet. Consultado em 7 de julho de 2015 
  6. Nathalia Passarinho (23 de setembro de 2014). «Tire dúvidas sobre delação premiada». G1. Consultado em 7 de julho de 2015 
  7. «LEI Nº 12.850, DE 2 DE AGOSTO DE 2013.». Planalto. 2 de agosto de 2013. Consultado em 15 de março de 2016 
  8. Carlos Madeiro (4 de março de 2016). «Criada por Dilma, lei da delação permite apurar denúncia de Delcídio». Uol. Consultado em 25 de outubro de 2017 
  9. «Lava Jato já recuperou mais de R$ 4 bilhões, afirma Rodrigo Janot». iG. 16 de março de 2016. Consultado em 25 de março de 2016 
  10. «MPF congelou equivalente a R$ 4,2 bilhões desviados da Petrobras, diz Janot em Paris». Época Negócios. 16 de março de 2016. Consultado em 25 de março de 2016 
  11. Fantástico (14 de março de 2016). «Operação Lava Jato já recuperou quase R$ 3 bilhões em dois anos». G1. Consultado em 15 de março de 2016 
  12. Thiago Guimarães (31 de maio de 2016). «Delação premiada é chave para combater 'pacto de silêncio entre criminosos', diz juiz do mensalão». BBC. Consultado em 31 de maio de 2016 
  13. Jusbrasil. Disponível em https://portal-justificando.jusbrasil.com.br/noticias/320955281/aceitar-a-delacao-premiada-como-prova-legaliza-a-tortura-cometida-por-juizes. Acesso em 26 de outubro de 2017.
  14. Jusbrasil. Disponível em https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/317089196/delacao-premiada-voluntaria-ou-tortura-autorizada. Acesso em 26 de outubro de 2017.
  15. Forum. Disponível em https://www.revistaforum.com.br/rodrigovianna/plenos-poderes/pedro-serrano-sobre-lava-jato-delacao-premiada-e-confissao-sob-tortura-psicologica/. Acesso em 26 de outubro de 2017.
  16. «Mendes questiona se prisões provisórias são usadas como "tortura" para fechar delação». GaúchaZH. 30 de maio de 2017. Consultado em 3 de outubro de 2019 
  17. «De 52 ações de delação premiada, apenas 13 foram feitas com réus presos». O Globo. Globo. 30 de maio de 2016 
  18. «TRF-4 homologa delação do ex-ministro Antonio Palocci à Polícia Federal». G1. Globo.com. 22 de junho de 2018. Consultado em 1 de julho de 2018 
  19. «Delação de Antonio Palocci é homologada no TRF-4». Correio Braziliense. 22 de junho de 2018. Consultado em 1 de julho de 2018 
  20. «Justiça homologa delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci». Gazeta do Povo. 22 de junho de 2018. Consultado em 1 de julho de 2018 
  21. «Quem pode fazer delação premiada? Após 4 anos de trabalho conjunto, PF e MPF não têm consenso». Gazeta do Povo. Consultado em 1 de julho de 2018