Departamento de Ordem Política e Social

órgão do governo brasileiro utilizado durante o Estado Novo e na Ditadura Militar

O Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), criado em 30 de dezembro de 1924, foi um órgão do governo brasileiro utilizado principalmente durante o Estado Novo e mais tarde na Ditadura Militar. O órgão, que tinha a função de assegurar e disciplinar a ordem militar no país, foi instituído em 17 de abril de 1928 pela lei nº 2 034 que tratava de reorganizar a Polícia do Estado.

Departamento de Ordem Política e Social
(DOPS)
Departamento de Ordem Política e Social
Prédio do antigo DOPS no Rio de Janeiro
Fundação 30 de dezembro de 1924
Extinção 4 de março de 1983
Estado legal  Brasil

História editar

 Ver também : 4.ª Delegacia Auxiliar
 
DOPS

O que normalmente se chama de DOPS são as unidades de Polícia Política de cada estado, responsável pela repressão a comunistas, anarquistas, sindicatos e movimentos sociais. Isto desde a Primeira República. Estavam estruturadas a partir de delegacias, divisões ou departamentos da Polícia Civil de cada estado da federação – em especial São Paulo e Rio de Janeiro, então Capital Federal.[1]

Na capital Federal (então, o Rio de Janeiro), a Polícia Civil do Distrito Federal foi reformulada a fim de que se adaptasse a um novo modelo de repressão e vigilância. Esta remodelagem afetou ao seu segmento de Segurança Política e Social, criando uma delegacia para aquele fim. A função do órgão era lidar com problemas de ordem política – por meio a Secção 1 (S-1) da Delegacia – e de ordem social – Secção 2 (S-2). No caso, as ameaças de cunho político eram o Integralismo, atividade de espiões internacionais – mormente da Alemanha e da Itália. Já as questões de cunho social eram o comunismo, os sindicatos, as associações e movimentos civis e a propaganda contra o Governo. Ao final do Estado Novo – mais precisamente em 1944 – a polícia havia sido transformada de uma delegacia para uma divisão, ampliando seus quadros e estrutura através do Decreto Lei n° 6 378 de 28 de março de 1944. Pelo Decreto Lei n° 9353 de 13 de julho de 1946, era estabelecida jurisprudência sobre qualquer crime contra a segurança do Estado.[1]

Em São Paulo, no ano de 1930, a Delegacia de Ordem Política e Social foi desmembrada em duas: a de Ordem Política e a de Ordem Social.[2] Em 1938, sob a ditadura do Estado Novo, teve seu organograma alterado, passando a ser supervisionada pela Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública. Era constituído pelo Gabinete do Delegado, pelas delegacias de Ordem Política e Ordem Social, cada uma composta pelas seções de policiamento e investigações: o Cartório, a seção de Expediente – em que estavam vinculados os serviços de Protocolo e Arquivo Geral –, e, ainda, a seção de Contabilidade, o Corpo de Segurança, o Serviço Reservado (mais tarde chamado de Serviço Secreto), Prisões e Portaria. Além das duas primeiras delegacias, o DEOPS também contava com mais duas especializadas: a Delegacia de Fiscalização de Explosivos, Armas e Munições e a Delegacia de Fiscalização de Entrada, Permanência e Saída de Estrangeiros.[3]

Durante a segunda metade da década de 1940 a 1969, o DOPS de São Paulo abrigava as Delegacias de Ordem Política, de Ordem Social, de Estrangeiros, de Ordem Econômica, de Armas e Explosivos e, também, o Serviço Secreto. A Delegacia de Ordem Social era responsável por investigar todos os tipos de movimentos sociais, como greves, campanhas contra a carestia, associações de amigos de bairros, bem como fiscalizar a ação dos sindicatos e dos trabalhadores organizados, produzindo inquéritos, relatórios e prontuários de presos e investigar os movimentos nas cidades do interior do estado de São Paulo. As questões políticas ficavam a cargo de uma delegacia especializada. Além de acompanhar comícios e eleições, esse setor ainda fornecia informações sobre a situação política nas cidades do interior, dos partidos políticos, personalidades e cargos. Em seu acervo, encontram-se cortes de jornais agrupados por tema, relatórios e inquéritos que, por sua vez, também possuem duplicatas arquivadas na série prontuários. A partir da década de 1960, com a demanda crescente do aparelho repressivo militar, essa delegacia ampliou suas atribuições, passando a investigar as ações dos movimentos estudantis e das organizações clandestinas.[3] Quanto ao DOPS do Rio, devido ao volume de seus arquivos sobre criminosos políticos (acumulados desde os primeiros anos da República) e a experiência investigativa, tinha função complementar dentro do sistema de Segurança e de Informações estabelecidos pelos militares.[4]

Durante o regime militar, em São Paulo, o seu delegado mais conhecido foi Sérgio Paranhos Fleury, que ficou famoso por dirigir o Esquadrão da Morte que atuava na periferia de São Paulo, além de ser acusado de organizar e participar de vários sequestros, torturas e assassinatos.[5][6]

Havia muitas dificuldades para quem fosse fichado no DOPS. O candidato a um emprego, por exemplo, em um período da ditadura militar, precisava apresentar um "Atestado de Antecedentes Políticos e Sociais", mais conhecido como "Atestado Ideológico", que era fornecido pelo DOPS a quem não tinha ficha no órgão.[7]

Durante o regime, além da repressão política, o DOPS da Polícia Federal tinha a atribuição de censurar os meios de comunicação através da Divisão de Censura e Diversões Públicas. Com a Constituição brasileira de 1988, a Divisão de Ordem Política e Social não consta mais do organograma da Polícia Federal, que ainda mantém a competência de apurar as "infrações penais contra a ordem política e social", no capítulo III referente à Segurança Pública, nos termos do inciso I, do § 1º, do artigo 144.

Em São Paulo, o DOPS foi extinto em 4 de março de 1983. Em alguns outros estados brasileiros, permaneceram todavia, as Delegacias Especializadas de Ordem Política e Social, que também adotam o acrônimo DEOPS.[8]

Arquivos editar

Os arquivos dos numerosos DOPS existentes até o início da década de 1980 tiveram destinos diversos. Os do Rio Grande do Sul, que foi o primeiro a ser extinto, em 27 de maio de 1982, teriam sido queimados, conforme as informações oficiais, ainda que muitos acreditem que o acervo esteja guardado em local secreto.[7]

Após a extinção do DOPS, seu arquivo ficou sob a guarda da Polícia Federal até o final do ano de 1992. O decreto nº 34 216, de 19 de novembro de 1991, constituiu uma Comissão Especial com a finalidade de coordenar a destinação desses documentos. A comissão deliberou passar o acervo à guarda do Arquivo Público do Estado de São Paulo, o que aconteceu em 1992, durante a gestão do Professor Doutor Carlos Guilherme Motta.[9]

Em São Paulo, antes da posse do governador do MDB, Franco Montoro, em 1983, os arquivos foram transferidos para a Polícia Federal, o que ocorreu também em outros estados. Somente em 1991 os arquivos foram devolvidos aos estados de origem, sendo que, em São Paulo, ficaram sob a guarda do Arquivo Público.[10] A documentação existente, no entanto, é incompleta, havendo várias falhas sequenciais, mostrando que muitos documentos foram desviados. Em São Paulo, não é possível encontrar nenhum documento sobre informantes do DOPS, nem sobre pessoas que teriam executado torturas.[7]

Até 1994, o acesso aos documentos do DOPS ficou restrito aos familiares de presos e desaparecidos políticos.[11] Neste mesmo ano, com base na resolução nº 38, de 27 de Dezembro, o arquivo foi aberto à consulta pública, mediante a assinatura de um termo de responsabilidade pelo consulente.[carece de fontes?]

No acervo, disponibilizado parcialmente na internet desde 2013,[12] encontram-se documentos bastante diversificados, que retratam tanto a rotina interna do órgão repressivo, tal como os ofícios, relatórios anuais, relatórios diários, pedidos de informações, correspondências, inquéritos policiais e prontuários temáticos e nominais. Nesse conjunto, é possível encontrar documentos e fotografias particulares, além de livros, revistas, jornais, entre outros.[13]

Ao todo, o acervo é composto por quatro grupos documentais, três deles contendo fichário remissivo. São eles: prontuários (170 000 fichas e 150 000 prontuários); dossiês do Arquivo Geral (1 100 000 fichas remissivas e 9 000 pastas); documentos produzidos pelas delegacias especializadas de Ordem Política (1 500 pastas), contendo prontuários e dossiês, e Ordem Social (235 000 fichas e 2 500 pastas), composto por autos de sindicância, inquéritos militares, prontuários e dossiês;[14] além de outras publicações como os Livros de Portaria do DEOPS, que agregam informações sobre os visitantes do departamento entre 1971 e 1979.[15]

A atuação da Polícia na legislação após a redemocratização editar

Compete ao Departamento de Polícia Federal (DPF) a apuração das infrações penais contra a ordem política e social, decorrentes de atos que atentem contra os princípios estabelecidos na Constituição Federal brasileira, especialmente contra o regime democrático nela consagrado.[16]

O Regimento Interno do DPF, aprovado pela Portaria n º 2 877-MJ, de 30.12.2011 (Publicada no DOU nº 01, Seção 1, de 2 de janeiro de 2012), se reporta ao artigo 144 § 1º da Constituição que dispõe sobre as competências da corporação dentre elas:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, bem assim outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei.[16]

Compete à Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado (DICOR), do Ministério da Justiça e Cidadania, reprimir os crimes contra a ordem política e social, por meio da Coordenação-Geral de Defesa Institucional (CGDI) e da Divisão de Assuntos Sociais e Políticos (DASP).[16]

Ver também editar

Referências

  1. a b Pacheco, Thiago. «Inteligência, Segurança e Polícia Política no Estado Novo e na República de 1946». Revista de História Comparada. Consultado em 24 de janeiro de 2020 
  2. «:: Arquivo Público do Estado de São Paulo :: Deops ::». www.arquivoestado.sp.gov.br. Consultado em 2 de setembro de 2021 
  3. a b Larissa Rosa Corrêa. Artigo publicado na edição nº 33 de outubro de 2008 em www.historica.arquivoestado.sp.gov.br
  4. Pacheco, Thiago. «Polícia Política, Inteligência e Segurança na Ditadura Militar (1964-1984)». Revista Saeculum. Consultado em 24 de janeiro de 2020 
  5. «Sérgio Paranhos Fleury». Memórias da ditadura. Instituto Vladimir Herzog. Consultado em 25 de janeiro de 2018. Cópia arquivada em 7 de janeiro de 2019 
  6. «Repressão Política: Origens e Consequências do Esquadrão da Morte». Comissão da Verdade do Estado de São Paulo. Consultado em 25 de janeiro de 2020 
  7. a b c Benedito, Mouzar (20 de março de 2009). «Até Marx era fichado no Dops». Revista Fórum. Revistaforum.com.br. Consultado em 16 de agosto de 2009. Arquivado do original em 13 de abril de 2009 
  8. «decreto 20728 - 04.03.1983». www.al.sp.gov.br. Consultado em 19 de abril de 2024 
  9. Decreto nº 34.216, de 19 de novembro de 1991 (jusbrasil.com.br)
  10. Seção do DEOPS, do Arquivo Público do Estado de São Paulo, acessado em 13.set.2016.
  11. Silva, Shirlene Linny da; Frota, Maria Guiomar da Cunha (2009). «A questão do acesso aos arquivos do Departamento de Ordem Política e Social do Estado de Minas Gerais numa abordagem multidimensional». Perspectivas em Ciência da Informação: 105–119. ISSN 1413-9936. doi:10.1590/S1413-99362009000400008. Consultado em 18 de outubro de 2021 
  12. Arquivo Público do Estado publica acervo do Deops na internet, acessado em 13.set.2016.
  13. Sodré, Caroline Almeida; Roncaglio, Cynthia (julho de 2017). «O caráter de prova dos documentos produzidos pelas DOPS». Perspectivas em Ciência da Informação: 252–266. ISSN 1413-9936. doi:10.1590/1981-5344/2623. Consultado em 2 de setembro de 2021 
  14. [1]
  15. Seção do Arquivo Público do Estado de São Paulo sobre os Livros de Portaria do DEOPS, acessado em 13.set.2016.
  16. a b c «Regimento Interno do DPF - Port.n.2877/2011» (PDF). Consultado em 27 de maio de 2014. Arquivado do original (PDF) em 21 de outubro de 2014 

Ligações externas editar