Empastelamento consiste na forma violenta de impor o silêncio de um jornal ou publicação noticiosa pela destruição de seus equipamentos de tal forma que o jornalista Alberto Dines o comparava como sendo o linchamento aplicado a um meio de imprensa.[1] Com o incremento da tecnologia de comunicação virtual e transmissão de sinais eletrônicos, empastelar também ganhou acepção de embaralhamento de dados ou outras formas de ataques virtuais, não somente aos meios jornalísticos.[2][3]

O jornalista Lira Neto esclarece a definição que a palavra assumiu, ao longo do tempo, dizendo que o termo

"...definia a invasão e destruição do jornal, e remetia à época em que os periódicos eram compostos em máquinas de tipos móveis, em que cada letra tinha de ser escolhida pelo tipógrafo e montada, uma a uma, para formar as palavras", explicando que "empastelar, nesse caso, significava abrir as gavetas de tipos e esparramar as letras de chumbo no chão, o que exigia meses para reorganizá-las"; ele conclui, dizendo que o termo passou a ter o significado ampliado - "com o tempo, o vocábulo passou a designar qualquer ato de violência contra jornais".[4]

Origem do termo editar

Originalmente o termo era usado em tipografia, usado para quando ocorre a mistura dos tipos e outros elementos da impressão e que podem ocorrer durante as fases do processo editorial, como a composição ou montagem.[5] É, ainda, o estrago feito nos tipos, rotativas e outros equipamentos editoriais.[6] Na impressão colorida o empastelamento pode derivar ainda da má superposição de fotolitos, de modo a criar no resultado impresso uma confusão de cores e formas, tornando-o irreconhecível.[5]

Por extensão, empastelamento passou também a significar o ato de:

"invadir uma gráfica ou redação de jornal para inutilizar o trabalho em curso, danificar equipamentos e materiais"

Como define o Houaiss.[1]

Empastelamento eletrônico editar

Com a migração das mídias para a internet, o ataque a veículos de informação como o feito por hackers dá lugar ao "empastelamento virtual", engendrando situações análogas àquelas da agressão física às redações com o ataque cibernético aos sítios de jornais e revistas, engendrando a necessidade de se criar medidas de proteção ao jornalismo eletrônico para evitar tais ações, bem como descobrir e punir seus autores, muitas vezes protegidos pelo anonimato e complexidade das ligações em rede.[3]

No meio militar o termo implica no embaralhamento dos sinais eletrônicos mormente aqueles que, utilizando dos sistemas de orientação por satélites (geolocalização ou GPS), enviam sinais para guiar mísseis por exemplo; neste sentido existem no mercado aparelhos capazes de empastelar redes de GPS com uma banda estreita de funcionamento, como no caso dos utilizados no meio civil; a fim de evitar o empastelamento de sinais há duas contramedidas que a tecnologia desenvolveu: o uso "de antenas especiais que rejeitam os sinais dos empasteladores e emprego de filtros especiais nos receptores GPS, tanto militares como civis".[2]

Empastelamento de jornais no Brasil editar

 
Incêndio no empastelamento de O Paiz, em 1930.

Ao longo da história diversos jornais tiveram suas sedes empasteladas; no Brasil vários casos se sucederam, numa prática que teve início no II Reinado;[1] dentre estes alguns notórios:

  • Os jornais cariocas Liberdade e Gazeta da Tarde, que foram empastelados no dia 8 de março de 1897, por supostamente manifestarem apoio aos revoltosos de Canudos.[1]
  • Em 1912 o Diário de Pernambuco, mais antigo jornal da América Latina, sofreu o empastelamento a mando do general Dantas Barreto que, derrotado nas eleições do ano anterior, usara das tropas federais para derrubar o até então grupo hegemônico na política pernambucana chefiada pelo coronel Francisco de Assis Rosa e Silva, proprietário do periódico que fora cercado e impedido de circular desde as eleições; em meados de fevereiro um jornalista fora espancado na entrada do jornal e no dia 23 daquele mês o filho de Rosa, Chiquinho Rosa e Silva junto a Assis Chateaubriand foram presos por dois dias por soldados armados; libertados, voltaram à redação para escrever uma matéria relatando a arbitrariedade que sofreram e, quando prestes a ser impressa a edição, o edifício do jornal foi invadido por homens à paisana que, armados com barras de ferro, destruíram tudo: máquinas, móveis, linotipos, etc.: instaurado um inquérito, este chegou à conclusão absurda de que o empastelamento fora ordenado pelo próprio dono — Rosa e Silva — acusando Assis Chateubriand e seu irmão Ganot como os executantes; vendido, o jornal somente voltou a circular após um ano, sob novos donos.[7]
  • A Tribuna, Gazeta do Povo e Folha de Santos, jornais santistas que, durante a Revolução de 1930, tiveram suas sedes empasteladas e até incendiadas por populares no dia 24 de outubro; destes, a Gazeta encerrou suas atividades com o empastelamento sofrido, tendo suas caras bobinas e materiais de impressão sido jogados pelas ruas, conforme uma descrição da época: "atapetando-as [as ruas] com ouro branco da imprensa, como se fosse troféu de vitória pela impensada e covarde arremetida contra uma trincheira que só fazia o bem, por defender o Povo, e da qual muitas famílias hauriam o pão da subsistência".[8]
  • O Momento, órgão do Partido Comunista na Bahia, foi empastelado durante o governo de Otávio Mangabeira. O ato, apoiado pelo governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, foi criticado pelo então deputado estadual paulista Salomão Jorge, dizendo: "em Berlim, quando começaram a empastelar os jornais, surgiu o nazismo."[9]
  • Durante a ditadura militar uma forma indireta de empastelamento ocorreu quando o regime patrocinou não o ataque às redações, mas às bancas de revistas que vendiam os jornais visados.[1]
  • Em 2008 o Observatório da Imprensa sugeriu que o Novo Jornal sofreu empastelamento "virtual", com uso da justiça de Minas Gerais, a fim de omitir notícias negativas sobre Aécio Neves e outros políticos do estado,[10] configurado não somente pela retirada do ar do site que publicara a Lista de Furnas e prisão de seu editor, como pelo desaparecimento de seus arquivos após apreensão pela polícia civil com anuência do Ministério Público estadual.[11]

Referências

  1. a b c d e Alberto Dines (6 de novembro de 2006). «Empastelamento, modo de emprego». Observatório da Imprensa, edição 405. Consultado em 17 de outubro de 2016 
  2. a b Luís Nuno da Cunha Sardinha Monteiro (2007). «O GPS na Guerra». Revista Militar, nº 2463. Consultado em 2 de agosto de 2019. Cópia arquivada em 2 de agosto de 2019 
  3. a b Lília Diniz (7 de novembro de 2007). «Terrorismo virtual ameaça jornalismo digital». Observatório da Imprensa. Consultado em 2 de agosto de 2019. Cópia arquivada em 2 de julho de 2019 
  4. Lira Neto (2013). Getúlio (1930-1945): Do governo provisório à ditadura do Estado Novo. [S.l.]: Companhia das Letras. 632 páginas. ISBN 8580867576 
  5. a b Institucional. «Glossário». Política para Políticos. Consultado em 17 de outubro de 2016. Cópia arquivada em 21 de outubro de 2016 
  6. Dicionário Aurélio, verbetes empastelamento e empastelar.
  7. Fernando Morais (1994). Chatô, O Rei do Brasil. [S.l.]: Companhia das Letras. 736 páginas. ISBN 8571643962  (pág. 64-76)
  8. s/a (5 de julho de 2016). «População incendiou A Tribuna, em 1930». Novo Milênio. Consultado em 17 de outubro de 2016 
  9. Fernando Jorge (1974). Chacrinha, Silvio Santos, Ibrahim Sued, Houaiss e Cia. São Paulo: Obelisco Ltda. 194 páginas 
  10. José de Souza Castro (16 de agosto de 2008). «O empastelamento do Novo Jornal». Observatório da Imprensa. Consultado em 30 de junho de 2019. Cópia arquivada em 1 de julho de 2019 
  11. «Aécio Neves usava Justiça mineira para calar a imprensa sobre crimes». Correio do Brasil. 18 de janeiro de 2018. Consultado em 30 de junho de 2019. Cópia arquivada em 1 de julho de 2019