Diagnóstico psiquiátrico: diferenças entre revisões

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Ao contrário dos outros ramos da [[Medicina]], em [[Psiquiatria]] não se fala em doenças, mas em transtornos (1), porque não há uma relação de causa-efeito única nas alterações mentais e de comportamento. Na verdade, comportamentos considerados transtornados podem ter graus variáveis de fatores biológicos, psicológicos e sociais.
 
'''Doença ou Transtorno'''
 
O conceito tradicional de "[[doença]]" é desconstruído, então, por uma compreensão chamada de "sistêmica" da psiquiatria, como uma ciência que requer o estudo das múltiplas variáveis em cada situação a ser estudada e tratada. Os psiquiatras sistêmicos propõe uma reflexão sobre os fundamentos epistemológicosda [[epistemologia]] da ciência tradicional, a partir de algumas questões que são consideradas importantes para a análise crítica do discurso psiquiátrico, entre as quais a reificação dos constructos teóricos, a existência de proposições auto-corroborativas e os processos de disjunção e redução do conhecimento. Tomando como premissas (a) a construção social do conhecimento e (b) o caráter fragmentário da ciência tradicional, são explicitadas as bases de um novo paradigma, "sistêmico" ou "complexo", em direção ao qual caminha a ciência contemporânea. Entre as implicações de tal paradigma para a psiquiatria estão a superação das tendências reducionistas e disjuntivas nela presentes; a compreensão da contingência de que o ser humano é, por natureza, cultural e de que nenhuma abordagem pode, isoladamente, abarcar toda a complexidade da condição humana; e um entendimento do diagnóstico psiquiátrico como um ato semiótico, o qual participa recursivamente da construção da doença(2).
 
'''Diagnóstico sindrômico'''
 
“Síndrome”(segundo a definição desse termo, em Medicina) significa um conjunto de sinais e sintomas. Em Psiquiatria, é raro que se possa falar em “doenças” (que seria algo com causa única e bem definida, como por exemplo o meningococo que causa a meningite bacteriana, na Neurologia), então se usa o conceito de “síndrome” (por exemplo, “Síndrome do déficit de atenção”, ou “Síndrome do pânico”) para agrupar conjuntos de sinais e sintomas. O diagnóstico psiquiátrico é, em geral, um diagnóstico sindrômico, não um diagnóstico de doença (por isso, a Classificaqção Internacional de Doenças – o famoso CID – no capítulo de Psiquiatria usa o nome de “Transtornos” – conjuntos de sinais e sintomas de causa “multifatorial” – e não de “doenças”, por exemplo “Transtorno de humor” ou “Transtorno de conduta”).
 
'''Fatores subjetivos e sociais do diagnóstico'''
 
A Associação Psiquiatria Democrática promoveu debates culturais sobre sua ciência. Os psiquiatras italianos, com este movimento, deram origem à Reforma Psiquiátrica, seguida por outros países posteriormente. Um dos autores que participou desse movimento, Giovanni Jervis, registrou em sua obra que o diagnóstico psiquiátrico é "o resultado o resultado de um juízo, ou seja, da decisão de valorizar acima dos demais, alguns dos aspectos do comportamento do indivíduo. Quer dizer, é o resultado de uma opção entre os diferentes aspcetos da maneira de se comportar de um indivíduo submetido ao diagnóstico (sendo que, como os antropólogos, sociólogos e pesquisadores sobre comunicação já constataram, os aspectos subjetivos do próprio avaliador influem nas respostas do avaliado). O diagnóstico psiquiátrico não é mais que uma maneira, só que mais oficial, mais técnica e menos compreensível, de expressar um juízo sobre uma pessoa. Esses juízos são inevitáveis: todos classificamos as pessoas como estúpidas, inteligentes, egoístas, simpáticas, antipáticas, etc.; expressamos esse juízos, e resumimos neles uma série de “sinais e sintomas” que observamos. A Psiquiatria realiza a mesma operação, com uma diferença muito importante: a ‘etiqueta’ (rótulo) psiquiátrica tem conseqüências sociais muito mais graves. Assim, então, os diagnósticos psiquiátricos se tornam designações mais “técnicas” e autoritárias, sem deixar de ser, no fundo, tão primitivas quando as opiniões que as pessoas tem umas a respeito das outras. Na verdade, um diagnóstico psiquiátrico esclarece muito pouco sobre uma pessoa (sobre sua vida, seus sentimentos, seu contexto, seus problemas, ou como ajudá-la). O maior problema, no entanto, é que esse tipo de diagnóstico é sempre um juizo de valor fortemente desvalorizante que, sem dúvida, denigre e estigmatiza a imagem pessoal (afetando a auto-estima do indivíduo “etiquetado”). Definir um indivíduo, como por exemplo uma pessoa inconformista com o “status quo”, como tendo uma “personalidade psicopática” ou “suspeito de esquizofrenia”, significa atribuir um significado doentio a todos os seus pensamentos e atos, introduzindo uma “dúvida social” que ele carregará para o resto da vida. Neste sentido, o diagnóstico psiquiátrico pode se tornar um juízo totalitário, criando a imagem de um indivíduo “monoprogramado”, quer dizer, alguém “robotizado” pela “loucura”, um ser perigosamente irresponsável. Por estes motivos, o diagnóstico psiquiátrico deveria ser utilizado o mais raramente possível. A única justificativa para sua existência seriam breves indicações de caráter realmente técnico (quer dizer, que fossem úteis para resolver problemas que estivessem causando sofrimento para as pessoas)".(3)
 
'''Empatia para o diagnóstico psiquiátrico'''
 
Os problemas levantados por Jervis não resolvem a questão da necessidade do diagnóstico, pedido pelos próprios pacientes quando vão ao médico. O que se pode fazer, então, quando a pessoa se encontra nessa situação, necessitando de ajuda, que não seja rotulá-la ? Uma solução já havia sido apresentada (em 1913) por [[Karl Jaspers]], consagrado Psiquiatra e Filósofo, que propôs um diagnóstico “fenomenológico”, quer dizer, “apresentar de maneira viva, analisar em suas inter-relações, delimitar, distinguir do modo mais preciso possível e designar com termos fixos os estados psíquicos que os pacientes realmente vivenciam”. Isso significa tentar captar os sinais e sintomas “de dentro”, quer dizer, “como os pacientes realmente vivenciam” (4), fazendo uma forma de diagnóstico “empático”“[[empático]]”, que não seja um “rótulo”. Na construção da própria classificação da [[Organização Mundial da Saúde]], já referida, se pode notar o caráter descritivo, ao invés de interpretativo, dos sinais e sintomas que caracterizam o diagnóstico de cada transtorno ali registrado.
 
'''Ligações externas e Referências:'''
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(3) Jervis, Giovanni. Manual Crítico de Psiquiatria. Anagrama, Barcelona, 1977.
 
(4) Jaspers, Karl. Psicopatologia Geral, 2 vol. Atheneu, Rio de Janeiro, 19871997.