José Teófilo de Jesus: diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
m
Linha 23:
[[File:José Teófilo de Jesus - Santa Cecília.jpg|thumb|250px|''Santa Cecília'', Museu de Arte da Bahia]]
 
Mas em que pese esta definição genérica, isso não quer dizer que tenha se mostrado totalmente insensível às novidades neoclássicas. Se o Barroco foi excesso visual e ornamentos superabundantes, drama à flor da pele e religião por toda a parte, já o Rococó e ainda mais o Neoclassicismo foram propostas de progressivo despojamento, de uma busca de essências em formas mais leves, composições mais diretas e cores mais claras, e numa sociedade que se laicizava com rapidez e passava a prezar o [[racionalismo]] e o [[liberalismo]]. Sua produção madura reflete um pouco dessa tendência nova, interpretando visualmente o choque entre dois conceitos de mundo e de representação. Serve como exemplo o teto da [[Matriz de Divina Pastora]] em Sergipe, o último de sua carreira e considerado pelo [[Iphan]] uma de suas melhores obras: sua complexa arquitetura ilusionística é filha direta do Barroco italiano do século XVII, mas já não é tão complexa e pesadadensa como foram as de seus antecessores, e no medalhão central criou uma cena bucólica e singela digna dos [[arcadismo|árcades]]. Também é preciso lembrar que em seu aperfeiçoamento em Portugal o Barroco típico que herdara seu primeiro professor, José Joaquim, foi aligeirado e "modernizado" pelo contato com o Rococó e com o Neoclassicismo que começavam a se fazer notar por influência francesa, de modo que ele já trazia germes de renovação consigo desde relativamente cedo em sua carreira.<ref>Campos (2003) vol. I, pp. 282-334</ref><ref>Nigra, p. 359</ref><ref name="Iphan"/><ref name="Campos"/> Segundo Carlos Ott, Teófilo não chegou a dominar tão bem como seu mestre as regras da composição de [[perspectiva]] ilusionística, tão apreciada pelas gerações anteriores para a decoração dos tetos, mas isso não significava que fosse um pintor menor. Simplesmente o seu talento estaria em outro gênero de obra, o painel de cavalete. Mas como faz notar Maria de Fátima Campos, em se tratando de valorizações, muito acaba se resumindo a uma questão de opinião dos críticos. Para ela, por exemplo, as simplificações e distorções que Ott viu como defeitos, são indicativos em vez de uma nova concepção de harmonia plástica. Foi, de fato, bastante eclético.<ref name="Iphan"/><ref>Campos (2003) vol. I, pp. 334-335; 473</ref><ref name="Campos"/>
 
Esse ecletismo também é explicado por dois outros fatores a considerar: assim como faziam todos os mestres de ateliês, Teófilo, depois que se consagrou como um dos melhores pintores baianos de sua geração, pelo menos para realizar as obras nos grandes tetos, empregou ajudantes para dar conta do trabalho, ajudantes que se encarregavam de boas porções das obras mas nem sempre tinham uma grande qualificação. Era um sistema de produção coletiva, e em grande medida anônima. Até nisso Teófilo foi inovador, pois foi o primeiro que deixou grande número de obras assinadas. O outro fator também foi um costume recorrente no Brasil desde o século XVIII: o de tomar como modelo para as obras encomendadas imagens europeias que circulavam em quantidade na forma de [[gravura]]s. Essas imagens, pertencendo a diferentes épocas e estilos, de boa e má qualidade, foram a base e o modelo para muito da produção barroca brasileira, mesmo que via de regra fossem adaptadas, simplificadas e reorganizadas em um grau considerável para atender a necessidades específicas. Era uma [[iconografia]] rica, sua aquisição era barata, e supria uma séria lacuna de boas fontes de informação visual para o ambiente artístico brasileiro, ainda sem escolas de arte institucionalizadas e distante do que se fazia na Europa, de onde ainda vinham todas as referências. Quando a corrente romântica passou a predominar, toda essa "promiscuidade", esse anonimato e esse relativo amadorismo na produção artística brasileira passaram a ser encarados como sinais de atraso, e o Barroco, com sua abundância ornamental e tendência dramática, se tornou para muitos coisa totalmente fora de moda, sem valor algum. Não por acaso que até meados do século XX uma igreja barroca, mesmo rica, não valesse mais um tostão, e sua destruição fosse encarada como coisa normal, em nome da modernização e do progresso. Um número imenso de edifícios e obras de arte se perdeu deste modo. Hoje em geral se percebe esses "defeitos" não mais como defeitos, mas como a verdade do seu tempo, lugar e condição. Entende-se que essas características são o que define a tipicidade do Barroco brasileiro, e dão vigor e interesse ao legado de Teófilo, pois ele soube utilizar os recursos que teve à disposição construindo uma obra que é um importante documento histórico bem como um dos monumentos da arte nacional, com uma lucidez que lhe permitiu produzir uma de suas melhores composições quando chegava aos noventa anos de idade.<ref>Gomes Júnior, Guilherme Simões. ''Palavra peregrina: o Barroco e o pensamento sobre artes e letras no Brasil.'' Volume 16 de Ensaios de Cultura. EdUSP, 1998. pp. 48-50</ref><ref>Oliveira, Carla Mary S. "Construindo Teorias sobre o Barroco". In: ''Saeculum'', Revista de História. 162 [13]; João Pessoa, jul./ dez. 2005, pp. 159-162</ref><ref>Neves, Erivaldo Fagundes "O Barroco: substrato cultural da colonização". In: ''Politeia: História e Sociedade'', v. 7, n. 1, 2007, pp. 71-84</ref><ref>Tirapeli, Percival. "Importância do Restauro na conservação do Patrimônio Artístico Brasileiro". In: ''Revista Restauro'', 1974</ref><ref>''Memória da Destruição: Rio - Uma história que se perdeu (1889 - 1965)''. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, 2002, pp. 5; 13</ref><ref>França, Valéria. "Prédios escondem memórias de SP". In: ''Estadão'', 13/10/2008</ref><ref>Franco, Sérgio da Costa. ''Guia Histórico de Porto Alegre''. Porto Alegre: EDIUFRGS, 2006. 4ª ed., pp. 103–104; 352.</ref><ref name="Orazem">Orazem, Roberta Bacellar. [http://www.tjse.jus.br/revistahmj//images/stories/file/AS%20PINTURAS%20NA%20SACRISTIA%20DA%20IGREJA%20DE%20ORDEM%20TERCEIRA%20DO%20CARMO.pdf "As pinturas na sacristia da Igreja da Ordem Terceira do Carmo"]. ''História, Memória e Justiça - Revista Eletrônica do Arquivo Judiciário do Estado de Sergipe'', Ano 1, Número 2, pp. 5-7 </ref>
 
==Legado==