Intelectual: diferenças entre revisões

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[[File:"Intellectual_Development"_statue_by_Hermon_Atkins_MacNeil.jpg|thumb|280px|<small>''Desenvolvimento intelectual'', estátuaescultura de Hermon MacNeil's, 1916.</small>]]
 
O termo '''intelectual''' deriva do [[latim tardio]] ''intellectualis'', adjetivo que indica aquilo que, em [[filosofia]], diz respeito ao [[intelecto]] na sua atividade [[teórica]], ou seja, separado da [[Experiência (filosofia)|experiência]] [[sensação|sensível]] - esta considerada como de grau [[conhecimento|cognitivo]] inferior.
Um '''intelectual''' é uma pessoa que usa o seu "[[intelecto]]" para [[estudo|estudar]], refletir ou especular acerca de [[ideia]]s, de modo que este uso do seu intelecto possua uma relevância social e [[coletiva]]. A definição do intelectual é realizada, principalmente, por outros intelectuais e [[acadêmico]]s. Estes definem o termo segundo seus próprios [[posicionamento]]s intelectuais, fato este que complexifica a [[definição]]. Autores como [[Bobbio]] e [[Bernard-Henri Lévy|Lévy]] concordam com um aspecto em comum: o intelectual é definido pelo meio [[social]] no qual vive ou no qual estabelece sua trajetória social.
 
Na concepção [[Aristóteles|aristotélica]], eram definidas como intelectuais as [[virtudes]] como [[ciência]], [[sapiência]], [[inteligência]] e [[arte]], as quais permitiriam à ''[[alma]] intelectiva'' - distinta da ''alma vegetativa'' e da ''alma sensitiva'' e entendida como princípio vital do Homem<ref>Echegoyen Olleta, Javier. [http://www.e-torredebabel.com/Historia-de-la-filosofia/Filosofiagriega/Aristoteles/AlmaIntelectiva.htm Historia de la Filosofía. Volumen 1: Filosofía Griega.] Editorial Edinumen.]</ref><ref>''Treccani. Vocabolario on line''. [http://www.treccani.it/vocabolario/intellettivo/ "Intellettivo"]</ref> - alcançar a [[verdade]]. No campo da [[metafísica]] o termo indicava a [[abstração]], em contraposição à [[concreto|concretude]] e à [[material]]idade.
 
Contemporaneamente, a definição do intelectual é geralmente construída pelos próprios intelectuais e segundo suas respectivas concepções, o que resulta em várias abordagens e definições do termo. Autores como [[Norberto Bobbio]] e [[Bernard-Henri Lévy]]<ref>LÉVY, Bernard-Henri. ''Elogio dos intelectuais''. Rio de Janeiro: Rocco, 1988.</ref> concordam em pelo menos um aspecto: o intelectual se define [[social]] e [[História intelectual|historicamente]], segundo o papel das [[ideia]]s em uma dada sociedade. Segundo Bobbio, "toda sociedade em todas as épocas teve seus intelectuais ou, mais precisamente, um grupo mais ou menos amplo de pessoas que exercem o [[poder]] [[Espiritualidade|espiritual]] ou [[ideológico]], em oposição ao [[poder temporal]] ou [[poder político|político]]." <ref>Bobbio, Norberto. [http://www.treccani.it/enciclopedia/intellettuali_%28Enciclopedia-del-Novecento%29/ "Intellettuali"]. ''Enciclopedia del Novecento'' (1978)</ref>
 
==Origem do termo==
Geralmente credita-se a introdução do termo 'intelectual', como [[substantivo]], a [[Georges Clemenceau]]. <ref>[http://www.bostonreview.net/noam-chomsky-responsibility-of-intellectuals-redux The Responsibility of Intellectuals, Redux]. Por [[Noam Chomsky]]. ''Boston Review'', 1º de setembro de 2011.</ref> . Durante o [[caso Dreyfus]]. Clemenceau, ele próprio um proeminente ''[[dreyfusard]]'', assim como [[Émile Zola]], [[Octave Mirbeau]] e [[Anatole France]], entre outros, publicou, em 1898, no jornal ''L'Aurore'', um artigo intitulado "À la dérive", no qual aparece o termo.<ref>''"N'est-ce pas un signe, tous ces intellectuels, venus de tous les coins de l'horizon, qui se groupent sur une idée et qui s'y tiennent inébranlables ? [...] "'' . Georges Clemenceau, « À la dérive », ''L'Aurore'', 23 de janeiro de 1898, republicado em Georges Clemenceau, ''L'affaire Dreyfus. L'iniquité''. Paris, Mémoire du livre, 2001, p. 217, ''apud'' Vincent Duclert, [http://ccrh.revues.org/293#ftn1 «Les intellectuels, un problème pour l’histoire culturelle »], ''Les Cahiers du Centre de Recherches Historiques'' n°, 31, 2003.</ref> Há, entretanto, indicações de que por volta de 1890, o termo já fosse usado, como substantivo. <ref>Idt, Geneviève «L'intellectuel avant l'affaire Dreyfus», ''Cahiers de lexicologie'', 1969-2, p. 35-46. Cf. «Le devoir supérieur de l'intellectuel réside tout entier dans la manipulation du Divin » (Péladan, 1891), ''apud'' [http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/article/mots_0243-6450_1993_num_37_1_2146 Des mots en politique. Les intellectuels, déjà, encore, toujours. A propos des Intellectuels des années trente et des Intellectuels en France, de l' affaire Dreyfus à nos jours]. Por Maurice Tournier. In: ''Mots'', dezembro de 1993, N°37, pp. 106-110. <br /> Lamonde, Yvan
A [[palavra]] foi usada pela primeira vez em [[França]], nos finais do [[século XIX]], durante o [[caso Dreyfus]] para descrever aqueles que se batiam ao lado de Dreyfus (chamados de ''[[dreyfusards]]''): [[Émile Zola]], [[Octave Mirbeau]], [[Anatole France]]. O termo "intelectual" como [[substantivo]] em [[Língua francesa|francês]] é atribuído a [[Georges Clemenceau]] em [[1898]], ele próprio um proeminente defensor de [[Dreyfus]].
[http://nelson.cen.umontreal.ca/revue/haf/1994/v48/n2/305323ar.pdf « Les "intellectuels" francophones au Québec au XIX<sup>e</sup> siècle : questions préalables »]. ''Revue d'histoire de l'Amérique française'', vol. 48, n° 2, 1994, p. 153-185.</ref>
Clemenceau se referia então a especialistas de primeira ordem, luminares das respectivas áreas de conhecimento, os quais acreditavam ter o direito e o dever de se mobilizar em defesa de valores importantes quando estes não lhes parecessem adequadamente protegidos ou estivessem mesmo em risco em decorrência de ações das autoridades constituídas. Em conjunto, esses notáveis especialistas detêm um poder que, embora derivado de fontes diferentes, pode ladear e, eventualmente, contrapor-se ao dos políticos.
 
Também no século XIX, na [[Império Russo|Rússia pré-revolucionária]], cunhou-se o termo ''[[intelligentsia]]'' para designar um grupo de indivíduos cultos, influenciados pelo ideário [[iluminista]], críticos do regime [[tsarista]] e defensores de valores [[democracia|democráticos]] e [[reformista]]s. Os integrantes da ''intelligentsia'' eram geralmente membros da [[aristocracia]] rural ou dos setores mais ilustrados da [[pequena burguesia]] urbana. Contemporaneamente, os intelectuais representariam ''la haute intelligentsia'' a que se refere [[Régis Debray]] - " o conjunto de indivíduos socialmente [[legitimação|legitimados]] para exprimir publicamente suas opiniões pessoal acerca de questões públicas, independentemente dos procedimentos regulares aos quais se devem submeter os cidadãos comuns ". <ref>Debray, Régis, ''Le pouvoir intellectuel en France''. Paris: Éditions Ramsay, 1979, pp. 43-44</ref>.
==Universidade e Intelectuais==
 
Um dos principais espaços de atuação do intelectual é a [[Universidade]].<ref>[[Pedro Demo]], A universidade como defesa organizada do intelectual. In.: DEMO, Pedro. ''Intelectuais e vivaldinos: da crítica acrítica''. São Paulo: ALMED, 1982. p.62-68.</ref> A [[ciência]] seria parte da [[ideologia]] do intelectual, assim como a dedicação à prática científica e o desejo do exercício de um cargo no [[ensino superior]] enquanto modo de distinção social.<ref>idem, ibidem. p.62-63.</ref> No caso [[brasil]]eiro, bem como em alguns outros [[país]]es, o intelectual procura as instituições superiores de ensino para apoio e para organização; partindo da [[sociedade]], a esta retorna com propostas embasadas no [[conhecimento]] técnico-científico adquirido através do estudos. Esta prática é claramente perceptível, por exemplo:
==Universidade e Intelectuaisintelectuais==
Um dos principais espaços de atuação do intelectual é a [[Universidadeuniversidade]].<ref>[[Pedro Demo]], "A universidade como defesa organizada do intelectual". In.: DEMO, Pedro. ''Intelectuais e vivaldinos: da crítica acrítica''. São Paulo: ALMED, 1982. p.62-68.</ref> A [[ciência]] seria parte da [[ideologia]] do intelectual, assim como a dedicação à prática científica e o desejo do exercício de um cargo no [[ensino superior]] enquanto modo de distinção social.<ref>idem, ibidem. p.62-63.</ref> No caso [[brasil]]eiro, bem como em alguns outros [[país]]es, o intelectual procura as instituições superiores de ensino para apoio e para organização; partindo da [[sociedade]], a esta retorna com propostas embasadas no [[conhecimento]] técnico-científico adquirido através do estudos. Esta prática é claramente perceptível, por exemplo:
 
*na ação de pensadores da [[educação]] no Brasil, como [[Anísio Teixeira]], [[Francisco Campos]], [[Gustavo Capanema]]<ref>ZOTTI, Solange A. Zotti. [http://www.sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe4/individuais-coautorais/eixo01/Solange%20Aparecida%20Zotti%20-%20Texto.pdf ''O Ensino Secundário nas Reformas Francisco Campos e Gustavo Capanema: um olhar sobre a organização do currículo escolar''.]</ref>, [[Manuel Lourenço Filho]];<ref>Em contraponto, temos a figura de [[Paulo Freire]] como intelectual de atuação expressiva fora da Universidade.</ref>
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*na elaboração do programa de [[energia nuclear]], onde os aspectos técnico-científicos envolvidos no processo de beneficiamento e utilização do [[urânio]] não se restringiam a espectos energéticos, mas também [[política|políticos]], [[moral|morais]], [[economia|econômicos]], [[antropologia|antropológicos]], etc.<ref>Especificamente na energia nuclear, percebe-se a relação entre a [[política]] e a Universidade através da [[tecnocracia]].</ref>
 
==Política e Intelectuaisintelectuais==
Devido à ação reflexiva, o intelectual é portador de uma autoridade científica quandoque se expressa. Como apresentado acima em relaçãosuas à Universidade, o intelectual estabelece relações com a sociedade através de seu ''status'' de intelectual.
Estas relações, inseridas num conjunto maior de relações de poder, colocam o intelectual em situação de comprometimento político: suas ideias não são desvinculadas da existência social e suas proposições seguem uma orientação determinada (como exemplo, a prática do [[Censo demográfico|censo]] e da criação de [[mapa]]s<ref>Consultar o livro ''Comunidades Imaginadas'' de [[Benedict Anderson]]</ref>). O intelectual pode então, através de seu [[intelecto]]portanto, contribuir para determinado regime político ou determinada concepção de mundo.<ref>[[Norberto Bobbio]] afirma:
 
Estas relações, inseridas num conjunto maior de relações de poder, colocam o intelectual em situação de comprometimento político: suas ideias não são desvinculadas da existência social e suas proposições seguem uma orientação determinada (como exemplo, a prática do [[Censo demográfico|censo]] e da criação de [[mapa]]s<ref>Consultar o livro ''Comunidades Imaginadas'' de [[Benedict Anderson]]</ref>). O intelectual pode então, através de seu [[intelecto]], contribuir para determinado regime político ou determinada concepção de mundo.<ref>[[Norberto Bobbio]] afirma:
 
:''"Embora com nomes diversos, os intelectuais sempre existiram, pois sempre existiu, em todas as sociedades, ao lado do poder econômico e do poder político, o poder ideológico, que se exerce não sobre os corpos como o poder político, jamais separado do poder militar, não sobre a posse de bens materiais, dos quais se necessita para viver e sobreviver, como o poder econômico, mas sobre as mentes pela produção e transmissão de ideias, de símbolos, de visões de mundo, de ensinamentos práticos, mediane o uso da palavra (o poder ideológico é extremamente dependente da natureza do homem como animal falante) Toda sociedade tem os seus detentores do poder ideológico, cuja função muda de sociedade para sociedade, de época para época, cambiantes sendo também as relações, ora de contraposição ora de aliança, que eles mantêm com os demais poderes."'' In: BOBBIO, Norberto. ''Os intelectuais e o poder: dúvidas e opções dos homens de cultura na sociedade contemporânea''. São Paulo: Editora UNESP, 1997. p.11</ref>
 
==O Fimfim dos Intelectuaisintelectuais==
Observando como o [[saber]] amplo e generalista, as [[ideologia]]s e as [[humanidades]] vêm sofrendo uma ''dêbacle'' frente às especialidades, ao saber técnico e prático, à indefinição política e às [[ciências aplicadas]], muitos estudiosos defendem estar ocorrendo o chamado "fim dos intelectuais". Os argumentos usados para defender esse fim lembram muito os argumentos de [[Francis Fukuyama]] em seu livro "[[O fim da História]]".
 
Há também resposta a essa ''dêbacle'' vinda de pessoas que não se alinham com Fukuyama. Essas lamuriampessoas deploram a existência do que chamam de ''fast-thinker'' (expressão de [[Pierre Bourdieu]]<ref>BOURDIEU, Pierre. [http://www.intellego.fr/soutien-scolaire-bts-1/aide-scolaire-francais/bourdieu-1-4-l-urgence-et-le-fast-thinking/23857 L'urgence et le fast-thinking]</ref>) ou ''intelectual-jornalista''<ref>PEREIRA, Fábio Henrique. "De [[Gramsci]] a [[Octavio Ianni|Ianni]]: [http://www.bocc.ubi.pt/pag/pereira-fabio-de-gramsci-a-ianni.pdf De Gramsci a Ianni: condições histórico-estruturais para a emergência do "intelectual jornalista”jornalista"].</ref>, ou seja, profissionais originadosoriundos da universidade, com destaque para [[psicólogo]]s, politicólogos[[politólogo]]s e [[jurista]]s, que se importam mais com o [[discurso]] do que com a relevância do saber transmitido, revelando uma espécie de comprometimento com o [[senso comum]] ou até mesmo com opiniões predeterminadas pelos donos do [[meio de comunicação]], visando agradar e fugindo ao engajamento que os definiria como autênticos intelectuais<ref>. Nas palavras de [[Pierre Rosanvallon]], historiador e professor do [[Collège de France]]: "''Intelectualintelectual é quem vincula um trabalho de análise a uma preocupação cidadã. De contrário, é um especialista''" Pierre Rosanvallon, historiador e professor do Collège de France.</ref>.
 
Outra forma de apresentar o "fim dos intelectuais" é a forma como os [[técnico]]s ou [[cientista]]s aplicados tomamganham destaque em nossa sociedade., Causandosendo temor ou [[inveja]]criticados dospor profissionais das [[artes]] ou [[humanidades]] que os acusam de falta de engajamento <ref>MATTELARD, Armand. ''Arqueologia da idade global – a construção de uma crença''[http://www.cebela.org.br/imagens/Materia/2001-2%20203-225%20armand%20mattelart.pdf Arqueologia da idade global – a construção de uma crença]. ''Comunicação&política'', n.s., v. VIII, n° 2, p.203-225</ref>.
 
Porém pode-se constatar que o ''[[geek]]'', em alguns casos, pode ser considerado um tipo extremamente engajado de intelectual, como recentemente demonstraram os fatos envolvendo a Fundação [[Wikileaks]] demonstraram. Ademais o [[ciberespaço]] vem, para o susto dos [[profeta]]s do fim, apresentando-se apresentando como ambiente de efervescência cultural e plataforma para atuações concretas na [[sociedade]]<ref>BOSCARIOL, Angélica. [http://www.metagov.com.br/blog/item/572-redes-sociais-tornam-jovens-mais-engajados-em-política ''Redes sociais tornam jovens mais engajados em política'' ]</ref><ref>[http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=1788335 ''Marrocos: Jovens mobilizados pelo Facebook''], 20 Fevereirode fevereiro de 2011</ref>.
 
{{Referências|Notas e referências}}
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*GIROTTI, Carlos A. ''Estado Nuclear no Brasil''. São Paulo: Brasiliense, 1984.
*KARIMI, Kian-Harald. ''Der verfolgte Schriftsteller als Diskurs der portugiesischen Literatur und Literaturgeschichte am Beispiel von B. Santarenos ‚O Judeu’ und C. A. Azevedos ‚Os herdeiros do medo’.'' In: Lange, Wolf-Dieter (ed.): 25 Jahre nachrevolutionäre Literatur in Portugal. Nationale Mythen und kulturelle Identitätssuche. Baden-Baden: Nomos, 2001, pp.&nbsp;77–138.
*LÉVY, Bernard-Henri. ''Elogio dos intelectuais''. Rio de Janeiro: Rocco, 1988.
 
=={{Ver também}}==
*[[Anti-intelectualismo]]
*''[[Intelligentsia]]''
*[[Intelectualismo]]
* [[Intelectual orgânico]]
 
=={{Ligações externas}}==