Nobreza da Itália: diferenças entre revisões

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[[Ficheiro:Servius Tullius by Frans Huys.jpg|thumb|Retrato imaginário de Sérvio Túlio, sexto rei de Roma, que teria estabelecido pela primeira vez na [[história da Itália]] os conceitos fundamentais da nobreza, em essência seguidos até a contemporaneidade.]]
[[Imagem:The Lady with an Ermine.jpg|thumb|Cecilia Gallerani, nobre italiana, na pintura ''[[Dama com Arminho]]'', de [[Leonardo da Vinci]], c. 1490, no [[Museu Czartoryski]]]]
A '''nobreza da Itália''' foi a [[classe social]] superior na [[Itália]] até o advento da [[República Italiana]]. Os nobres tinham um estatuto legal específico, e eram detentores da maior parte das riquezas e de diversos privilégios negados às outras classes, principalmente políticos. Na maioria dos antigos Estados italianos pré-[[unificação italiana|Unificação]] era a única classe que tinha acesso aos cargos de alto escalão do governo. Também praticamente monopolizaram por longo tempo os postos mais distinguidos nas milícias e na Igreja. Houve vários sistemas diferentes de nobreza ao longo do tempo e nas várias regiões.
 
==Origens==
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==Evolução==
Na [[Idade Média]], quando os [[Lista de imperadores do Sacro Império Romano-Germânico|imperadores]] do [[Sacro Império Romano-Germânico]] dominavam boa parte da [[península Itálica]], a nobreza nem sempre foi hereditária, os nobres em geral não tinham títulos específicos, e eram na maioria das vezes chefes militares e administradores imperiais de [[feudo]]s e cidades, os condes, ''signori'' (senhores) ou ''domini'', na versão latina.<ref name="Mendola">Mendola, Louis. "Italian Titles of Nobility". In: Heraldry Society. ''The Coat of Arms'', 1997</ref> Depois da queda do [[Reino Itálico]], parte do Sacro Império, houve um período de anarquia, e muitas cidades italianas formaram [[república]]s independentes ou semi-independentes, criando um sistema de [[patriciado]] semelhante ao da [[Roma Antiga]]. Era a classe governante, e apesar da constituição republicana das cidades era uma forma de nobreza, de caráter hereditário e familiar.
[[Imagem:The Lady with an Ermine.jpg|thumb|Cecilia Gallerani, nobre italiana do Renascimento, na pintura ''[[Dama com Arminho]]'', de [[Leonardo da Vinci]], c. 1490, no. [[Museu Czartoryski]].]]
 
Na [[Idade Moderna]], quando se formaram na Itália outros Estados, generalizou-se o sistema da nobreza hereditária e extensível às famílias, surgindo titulações diversificadas, mas elas variavam em cada local. No entanto, nem todos os membros das famílias tituladas detinham os mesmos [[direitos políticos]]. Até a formação do [[Reino de Itália (1861–1946)|Reino da Itália]] somente o chefe da Casa podia ostentar o título, herdado em geral pelo seu primogênito varão; mesmo assim, todos os seus outros filhos, homens ou mulheres, eram considerados nobres e recebiam a titulação informal de ''nobili'' (nobres), transmitindo nobreza à sua própria descendência perpetuamente, mas não transmitiam o título.<ref name="Tosi"/><ref name="Mendola"/><ref name="Archivio"/><ref>Gregorovius, Ferdinand [1872]. ''History of the City of Rome in the Middle Ages'', Volume 3. Reimpressão Cambridge University Press, 2010 </ref><ref>Martines, Lauro. ''Power and Imagination: City-States in Renaissance Italy''. Taylor & Francis, 1988</ref><ref name="Visconti">Visconti, A. ''L’Italia nell’ epoca della Controrifor a dal 1516 al 1713''. Milão, 1958</ref><ref>Jocteau, Gian Carlo. “Un censimento della nobiltà italiana”. In: ''Meridiana'', 1994 (19)</ref> Nas cidades onde havia patriciado, a grande maioria, somente alguns poucos membros de cada família patrícia podiam casar e gerar prole legalmente, a fim de não ampliar demasiado a classe governante, e só esses tinham acesso efetivo ao governo, embora o patriciado fosse familiar. Multiplicaram-se assim ramos [[bastardo]]s, que não obstante era considerados nobres informalmente, casavam entre patrícios sem desonrá-los, mas eram privados de vários direitos políticos. É característica do sistema italiano a existência também de famílias que jamais receberam algum título nem foram patrícias, mas eram oficialmente nobres hereditários, e seus membros eram chamados também de ''nobili'', formando uma classe comparável à nobreza não titulada de outros países, como a Alemanha e os Países Baixos.<ref>Dursteler, Eric (ed.). ''A Companion to Venetian History, 1400-1797''. Brill, 2013</ref><ref name="Archivio">Archivio di Stato di Venezia [Mosto, Andrea da (ed.)]. ''L’Archivio di Stato di Venezia: Indice Generale, Storico, Descritivo''. Tomos I - II. Volume V della ''Biblioteca degli Annales Institutorum''. Biblioteca d’Arte Editrice, 1940</ref><ref name="Visconti"/>
 
Em algumas cidades onde havia patriciado (a grande maioria), somente alguns poucos membros de cada família patrícia podiam casar e gerar prole legalmente, a fim de não ampliar demasiado a classe governante, e só esses tinham acesso efetivo ao governo, embora o patriciado fosse familiar. Multiplicaram-se assim ramos [[bastardo]]s, que não obstante era considerados nobres informalmente, casavam entre patrícios sem desonrá-los, mas eram privados de vários direitos políticos. É característica do sistema italiano a existência também de famílias que jamais receberam algum título nem foram patrícias, mas eram oficialmente nobres hereditários e seus membros eram chamados de ''nobili'', formando uma classe comparável à nobreza não titulada de outros países, como a Alemanha e os Países Baixos.<ref>Dursteler, Eric (ed.). ''A Companion to Venetian History, 1400-1797''. Brill, 2013</ref><ref name="Archivio">Archivio di Stato di Venezia [Mosto, Andrea da (ed.)]. ''L’Archivio di Stato di Venezia: Indice Generale, Storico, Descritivo''. Tomos I - II. Volume V della ''Biblioteca degli Annales Institutorum''. Biblioteca d’Arte Editrice, 1940</ref><ref name="Visconti"/>
Neste processo histórico, as elites foram sempre se reestruturando para acompanhar o curso dos acontecimentos e as mudanças sociais, mas observa-se incessantemente o espetáculo da ascensão e queda de incontáveis famílias, algumas desenvolvendo carreiras meteóricas para logo depois perderem posses e poder e caírem de volta na obscuridade, enquanto outras ascenderam ao topo desde a Antiguidade e lá ficaram por longo tempo, algumas até os dias de hoje, crescendo e se tornando “reinos” maiores que reinos, com extenso número de membros, títulos e posses espalhados por toda a península itálica e mesmo no estrangeiro, formando uma rede de sólidos relacionamentos de parentesco e interesse que ultrapassava largamente as fronteiras geográficas do seu Estado de origem e influía nos destinos de grandes regiões, de fato, criando boa parte da História dessas regiões, como observou Campanile.<ref>Campanile, Filiberto. ''L'armi, ouero Insegne de' nobil, Oue sono i discorsi d'alcune famiglie nobili, così spente, come viue del regno di Napoli''. Longo, 1610</ref><ref>Visconti, A. ''L’Italia nell’ epoca della Controriforma dal 1516 al 1713''. Milão, 1958</ref>
 
Neste processo histórico, as elites foram sempre se reestruturando para acompanhar o curso dos acontecimentos e as mudanças sociais, invariavelmente monopolizando os principais cargos administrativos, jurídicos e eclesiásticos e detendo muitos outros privilégios, mas observa-se incessantemente oao espetáculolongo da história a ascensão e queda de incontáveisdas famílias, algumas desenvolvendo carreiras meteóricas para logo depois perderem posses e poder e caírem de volta na obscuridade, enquanto outras ascenderam ao topo desde a Antiguidade e lá ficaram por longo tempo, algumas até os dias de hoje, crescendo e se tornando “reinos” maiores que reinos, com extenso número de membros, títulos e posses espalhados por toda a penínsulaPenínsula itálicaItálica e mesmo no estrangeiro, formando uma rede de sólidos relacionamentos de parentesco e interesse que ultrapassava largamente as fronteiras geográficas do seu Estado de origem e influía nos destinos de grandes regiões, de fato, criando boa parte da História dessas regiões, como observou Campanile.<ref>Campanile, Filiberto. ''L'armi, ouero Insegne de' nobil, Oue sono i discorsi d'alcune famiglie nobili, così spente, come viue del regno di Napoli''. Longo, 1610</ref><ref>Visconti, A. ''L’Italia nell’ epoca della Controriforma dal 1516 al 1713''. Milão, 1958</ref>
Eram vários os critérios para que uma família ou indivíduo fossem enobrecidos. Na maioria dos Estados precisavam atestar o não envolvimento direto com atividades mecânicas e rudes, impróprias da nobreza, por várias gerações; em geral era exigida também tradição familiar consolidada e uma riqueza expressiva, baseada na posse da terra, mas também podiam ser enobrecidos [[plebeu]]s que se distinguissem nas armas, nas carreiras jurídicas e eclesiásticas, e mesmo no comércio e nas artes. Ao longo dos séculos muito se discutiu quais desses critérios eram mais ou menos justificáveis, se a mulher podia ser fonte de nobreza, e se a nobreza moral era equiparável à nobreza tradicional. A nobreza não estava necessariamente associada à riqueza ou à posse hereditária de um feudo, e muitas vezes não esteve. Mas como as honras oficiais e a maior parte das riquezas das famílias nobres passavam em geral aos homens, em particular ao primogênito, a concentração da herança na primogenitura fez com que inúmeros ramos cadetes empobrecessem. Isso podia acarretar a perda do estatuto. Da mesma maneira como havia exigências para enobrecimento, havia critérios, muitas vezes imprecisos, para a perda da nobreza, como a decadência moral, empobrecimento além de certo nível, envolvimento em crimes graves ou traição ao governo.<ref>Muzio, Girolamo. ''Il Gentilhuomo''. Valuassori & Micheli, 1575</ref><ref name="Visconti"/><ref>Lyman, Theodore. ''The Political State of Italy''. Wells and Lilly, 1820</ref><ref name="Ranke">Ranke, Leopold von. ''The history of the popes, their church and state and especially of their conflicts with Protestantism in the sixteenth & seventeenth centuries'', Volume 2. Henry G. Bohn, 1853</ref>
 
Eram vários os critérios para que uma família ou indivíduo fossem enobrecidos. Na maioria dos Estados precisavam atestar por várias gerações o não envolvimento direto com atividades mecânicas e rudes, imprópriasconsideradas indignas da nobreza, por várias gerações; em geral era exigida também tradição familiar consolidada e uma riqueza expressiva, baseada em geral na posse hereditária da terra, mas também podiam ser enobrecidos [[plebeu]]s que se distinguissem nas armas, nas carreiras jurídicas e eclesiásticas, e mesmo no comércio e nas artes. Ao longo dos séculos muito se discutiu quais desses critérios eram mais ou menos justificáveis, se a mulher podia ser fonte de nobreza, e se a nobreza moral era equiparável à nobreza tradicional. A nobreza não estava necessariamente associada à riqueza ou à posse hereditária de um feudo, e muitas vezes não esteve. Mas como as honras oficiais e a maior parte das riquezas das famílias nobres passavam em geral aos homens, em particular ao primogênito, a concentração da herança na primogenitura fez com que inúmeros ramos cadetes empobrecessem. Isso podia acarretar a perda do estatuto. Da mesma maneira como havia exigências para enobrecimento, havia critérios, muitas vezes imprecisos, para a perda da nobreza, como a decadência moral, empobrecimento além de certo nível, envolvimento em crimes graves ou traição ao governo.<ref>Muzio, Girolamo. ''Il Gentilhuomo''. Valuassori & Micheli, 1575</ref><ref name="Visconti"/><ref>Lyman, Theodore. ''The Political State of Italy''. Wells and Lilly, 1820</ref><ref name="Ranke">Ranke, Leopold von. ''The history of the popes, their church and state and especially of their conflicts with Protestantism in the sixteenth & seventeenth centuries'', Volume 2. Henry G. Bohn, 1853</ref>
 
A nobreza italiana foi numerosa. Von Ranke calculava que no século XVIII havia cerca de nove mil famílias nobres na Itália, com um total estimado de 144 mil indivíduos nobres, mas ele refere que eram poucos em relação a outros Estados europeus, como a [[Espanha]], que tinha uma população comparável mas quase três vezes mais nobres. Mesmo assim, sempre foi uma classe minoritária, e somente [[Milão]] na época tinha cerca de 100 mil habitantes.<ref name="Ranke"/>
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