Futebol na Alemanha Oriental: diferenças entre revisões

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Nos jogos de 1964, seus jogadores representaram a seleção de futebol da [[Equipe Alemã Unida]] após dois jogos, ida e volta, com os jogadores da Alemanha Ocidental para decidir quem iria.<ref name = "elgrafico"/> Por outro lado, era a época em que o futebol olímpico foi propício para boas campanhas comunistas; atletas profissionais eram impedidos de participarem, o que fez com que tradicionais seleções capitalistas levassem equipes mais fracas. Os atletas comunistas principais, por sua vez, eram considerados oficialmente servidores do Estado e, por essa brecha, liberados para atuarem.<ref name = "20 anos"/>
 
Seu uniforme principal consistia em camisa e meiões brancos e calças e detalhes da camisa em azul; a combinação contrária consistia no uniforme reserva (que acabaria mais consagrado, após seu uso na vitória contra a RFA na Copa). Sobre o coração ficava bordado o [[brasão da RDA]], e, acima deste, a sigla '''DDR'''. Azul, uma cor neutra, era a cor utilizada pela Juventude Livre Alemã - braço jovem do Partido Comunista único do país -, que fiscalizou os esportes da Alemanha Oriental quando estes voltaram a ser oficialmente praticados, após a Guerra.<ref>{{Citar web |url=http://www.guardian.co.uk/football/2006/mar/22/theknowledge.sport |título=The Knowledge: The most postponed game ever|língua= |publicado=BBC|autor=DART, James |obra= |data= |acessodata=}}</ref><ref name = "explica">{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/como-o-futebol-explica-o-regime-da-alemanha-oriental/|titulo=Como o futebol explica o regime da Alemanha Oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=04/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref>
 
== [[Clube]]s e [[campeonato]]s de [[futebol]]. ==
A '''DDR-Oberliga''' (Liga Superior da RDA) era, até a reunificação alemã, em 1990, a divisão de elite de futebol da [[Alemanha Oriental]] (assim como a [[Bundesliga]] era da [[Alemanha Ocidental]] e continua sendo na Alemanha unificada). Ambas as Alemanhas [[Reunificação Alemã|reunificaram-se]] no final de 1990, mas com os campeonatos da ambas ainda em andamento na época, a reunificação das Ligas só se deu a partir do segundo semestre de [[1991]], quando começou a nova temporada na Europa. O mesmo ocorreu com a '''Copa FDGB''', uma espécie de Copa da RDA. Com a reunificação, o nome Oberliga passou a designar algumas divisões inferiores do campeonato alemão.<ref name = "elgrafico"/>
 
Quatro cidades destacavam-se no cenário futebolístico da RDA: [[Dresden]], cidade do [[Dynamo Dresden|Dínamo Dresden]] (segundo maior vencedor do campeonato <ref name = "oberliga">{{citar web|url=http://www.rsssf.com/tablesd/ddrhist.html|titulo=East Germany 1946-1990|publicado=RSSSF|autor=SCHOENMAKERS, Jan |data=16/10/2005|acessodata=21/08/2011}}</ref>) e do [[Dresdner SC|Dresdner]], equipe forte antes do comunismo e que entrou em decadência por ser vista como "burguesa",<ref name = "explica"/> era tida como a mais fanática.<ref name = "elgrafico"/> [[Leipzig]] foi onde a própria [[Federação Alemã de Futebol]] fora fundada, em [[28 de janeiro]] de [[1900]], e seu clube [[1. FC Lokomotive Leipzig|VfB Leipzig]] (renomeado Lokomotive após a instação do [[comunismo]]) fora o primeiro campeão alemão, três anos depois; além disso, nela ficava o [[Zentralstadion Leipzig|Zentralstadion]], que, entre [[1956]] e [[2000]], foi o maior estádio alemão, com capacidade para 100 mil pessoas e naturalmente, a casa da Seleção Alemã-Oriental, tendo sido o único estádio do antigo país a ser utilizado como sede da [[Copa do Mundo de 2006]].<ref name = "historia">FREITAS, Carlos Eduardo (junho de 2006). '''A história falou mais alto'''. [[Revista Trivela|Copa'06]] n. 5. Pool Editora, pp. 38-41</ref> Já [[Magdeburgo]] foi a única a conter um clube campeão europeu, o [[1. FC Magdeburg|Magdeburgo]], vencedor da [[Recopa Europeia]] de [[1974]], sobre o [[AC Milan|Milan]].<ref name = "elgrafico"/>
 
A Recopa, por sinal, foi o único torneio do continente em que equipes da Alemanha Oriental conseguiram chegar à decisão: o próprio Lokomotive Leipzig e o [[Carl Zeiss Jena]] também chegaram às finais do torneio, mas acabaram como vice-campeões (em 81, para o soviético [[FC Dínamo Tbilisi|Dínamo Tbilisi]]; e em 87, para o holandês [[AFC Ajax|Ajax]], respectivamente).<ref name = "elgrafico"/> O Magdeburgo foi também, ao lado do mesmo Carl Zeiss e do [[Dynamo Dresden|Dínamo Dresden]], o maior vencedor da Copa nacional, com sete conquistas.<ref name = "ddrcup">{{citar web|url=http://www.rsssf.com/tablesd/ddrcuphist.html|titulo=East Germany - List of Cup Finals|publicado=RSSSF|autor=WERNER, Andreas |data=16/10/2005|acessodata=22/08/2011}}</ref> Na campanha do vice-campeonato continental, o Carl Zeiss eliminou o [[SL Benfica|Benfica]], o [[Valencia CF|Valencia]] e a [[AS Roma|Roma]], goleando por 4-0 o clube em que atuava [[Paulo Roberto Falcão]].<ref>{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/os-25-maiores-motivos-de-orgulho-para-o-futebol-da-alemanha-oriental/#13|titulo=Os 25 maiores motivos de orgulho para o futebol da Alemanha Oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=03/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref>
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Apesar da falta de mais títulos internacionais, os times do país não deixavam de despertar respeito nos adversários. ''"Naquela época, tínhamos boas equipes, que não deviam nada às grandes do continente"'', chegou a declarar [[Jürgen Sparwasser]], jogador do Magdeburgo.<ref name = "trivela">FREITAS, Carlos Eduardo (fevereiro de 2008). '''Muro abaixo'''. [[Revista Trivela|Trivela]] n. 24. Trivela Comunicações, pp. 44-47</ref> De fato, na [[década de 1970]], a liga alemã-oriental estava entre as dez melhores colocadas no ranking da [[UEFA]], à frente inclusive do [[Campeonato Italiano de Futebol|Campeonato Italiano]].<ref>{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/especial-italia-8090-um-verdureiro-um-escandalo-uma-crise-sem-fim-e-italia-comeca-dominar-o-mundo/|titulo=Um verdureiro, um escândalo, uma crise sem fim, e a Itália começa a dominar o mundo|publicado=Trivela|autor=LEAL, Ubiratan |data=28/01/2014|acessodata=28/01/2014}}</ref> O Dínamo Dresden chegou a quase eliminar, nas semifinais da Liga dos Campeões de 1973-74, o futuro campeão [[Bayern Munique]], que chegou a estar perdendo em casa por 3-2, posteriormente vencendo para 4-3 e segurando um duro 3-3 em Dresden para avançar à final - na qual ganharia o torneio pela primeira vez.<ref name = "hafner">{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/dynamo-dresden-honra-reinhard-hafner-seu-eterno-capitao-e-lenda-da-alemanha-oriental/|titulo=Dynamo Dresden honra Reinhard Häfner, seu eterno capitão e lenda da Alemanha Oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=25/10/2016|acessodata=26/10/2016}}</ref> Antes, o Dínamo já havia eliminado a [[Juventus]] naquela campanha.<ref>{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/os-25-maiores-motivos-de-orgulho-para-o-futebol-da-alemanha-oriental/#6|titulo=Os 25 maiores motivos de orgulho para o futebol da Alemanha Oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=03/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref>
 
A quarta cidade a destacar-se foi a capital, [[Berlim Oriental]]. Mesmo antes da divisão - dela e do país -, a cidade, ao contrário das demais capitais europeias, não fazia parte da elite futebolística do continente.<ref>FREITAS, Carlos Eduardo (abril de 2006). '''Tamanho x Tradição'''. [[Revista Trivela|Copa'06]] n. 3. Pool Editora, pp. 30-33</ref> Em [[1975]], a [[Stasi]], o serviço de inteligencia da RDA, resolveu apadrinhar uma pouco expressiva equipe local, o [[Dínamo de Berlim]],<ref name = "elgrafico"/> cujo único título até então resumia-se à Copa da RDA em [[1959]].<ref name = "ddrcup"/><ref name = "oberliga"/> O Dínamo, originalmente, surgira na cidade de [[Dresden]], sendo realocado para a capital na [[década de 1950]]. A mudança de cidades era comum naqueles anos, mas protestos de torcedores descontentes com tantas alterações fizeram com que tal operação se reduzisse a partir da década seguinte.<ref name = "explica"/>
 
A equipe berlinense-oriental mais vitoriosa vinha sendo o [[Frankfurter FC Viktoria|Vorwärts Berlim]], mas esta foi deslocada em [[1971]], quando era o clube mais vezes campeão da Oberliga,<ref name = "oberliga"/> para [[Frankfurt an der Oder]]. Foi justamente o último deslocamento clubístico no país.<ref name = "explica"/> O Dínamo logou passou a receber os melhores jogadores das outras equipes e também arbitragens convenientes: os impedimentos costumavam ser dados apenas aos adversários, além de contar com pênaltis duvidosos - um deles tornou-se célebre, marcado no minuto 95 de umaum jogo decisivo final.<ref name = "elgrafico"/> contra o Lokomotive Leipzig em 1986.<ref name = "explica"/>
 
Uma das maneiras utilizadas para ganhar a complacência da arbitragem era controlar quais juízes do país teriam o privilégio de passar alguns dias no exterior capitalista para apitar alguma partida dos torneios ou eliminatórias continentais de clubes ou seleções.<ref name = "elgrafico"/>
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Os dínamos acabaram por formar a maior rivalidade do país,<ref>ZAMBUZI, Luciana (outubro de 2008). '''Top 10 Rivalidades que estão em baixa'''. [[Revista Trivela|Trivela]] n. 32. Trivela Comunicações, p. 13</ref> alimentada também pelo fato de que muitos dos primeiros jogadores do clube da capital após a intervenção da Stasi terem sido arrancados de Dresden.<ref name = "elgrafico"/> Ainda assim, [[Reinhard Häfner]], símbolo do clube de Dresden (é o segundo jogador com mais partidas pelo clube, defendido por ele de 1971 a 1988), declararia em janeiro de 2016 que os berlinenses tinham qualidade, embora sem deixar de protestar: "todos os times da liga sentiam que as coisas não estavam certas. Mas não podemos esquecer que o Dínamo de Berlim também era um time muito bom. Acho que eles teriam ganhado sete títulos sob condições normais, mas três deles foram graças aos árbitros".<ref name = "hafner"/> A equipe da capital foi a única que conseguiu derrotar o [[Nottingham Forest]] na casa do oponente durante a campanha do bicampeonato do clube inglês na [[Liga dos Campeões da UEFA]]; durante o decacampeonato, teve justamente a sina de enfrentar futuros campeões, tendo eliminações precoces e chegando no máximo às quartas-de-final.<ref>{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/os-25-maiores-motivos-de-orgulho-para-o-futebol-da-alemanha-oriental/#12|titulo=Os 25 maiores motivos de orgulho para o futebol da Alemanha Oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=03/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref>
 
Mesmo em Berlim, o decacampeão não foi exatamente popular: os berlinenses-orientais, em geral, preferiam o mais modesto [[1. FC Union Berlin|Union Berlim]]. Dizia-se que "nem todo torcedor do Union era um inimigo do Estado, mas todos os inimigos do Estado eram torcedores do Union"; o grito de guerra de seus simpatizantes era ''"antes ser um perdedor do que um porco da Stasi"''.<ref name = "lance">ROJO, Ricardo (outubro de 2011). '''Segredos do Muro'''. Fut Lance! n. 35. Areté Editorial, pp. 58-63</ref> A polícia secreta retaliava: fiscalizava secretamente quem frequentava as arquibancadas do Union, o que se confirmou com a queda do regime. Existente desde antes do [[nazismo]], o Union era um clube médio na capital com sucessos ocasionais. Enfraqueceu-se ainda mais na temporada 1950-51. Na época, a travessia entre as duas Berlins era viável e um vice-campeonato regional permitiria ao clube disputar as fases finais do campeonato da vizinha [[Alemanha Ocidental]]. O governo não autorizou a travessia, efetuada ainda assim por jogadores descontentes, que fundaram em [[Berlim Ocidental]] outro clube chamado Union. Bons resultados do Union ocidental enfraqueceram a torcida pelo Union oriental, até que a construção do [[Muro de Berlim]] em 1963 freou o fluxo de torcedores - estagnando, dessa vez, o Union ocidental e reforçando o oriental, ainda que este passasse por diversas refundações, fusões e rebaixamentos.<ref name = "unionb">{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/o-union-berlim-se-dividiu-como-alemanha-e-ajudou-combater-o-autoritarismo-lado-oriental/|titulo=O Union Berlim se dividiu como a Alemanha e ajudou a combater o autoritarismo no lado oriental|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=05/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref>
 
EsteAinda clubeque não fosse um time antissocialista, não tivesse uma torcida homogênea e nem se negasse a colaborar com o governo,<ref name = "unionb"/> o Union ainda carrega a imagem de antiautoritário, embora oseu próprio presidente do Union, Dirk Zingler, ele mesmo ex-membro do exército, ressalte que boa parte da história foi simplificada e romantizada por seguidores e imprensa. Ainda assim, Zingler e o Union desfizeram contrato milionário com um patrocinador em [[2009]] devido à revelação que o diretor do mesmo fora da temida polícia secreta.<ref name = "lance"/>
 
Também na capital, muitos outros reagiam ao Dínamo torcendo pelo [[Hertha Berlin|Hertha Berlim]], que ficara em [[Berlim Ocidental]], e com isso, participava das competições da outra Alemanha. A média de público do Dínamo, provavelmente a mais vitoriosa e mais odiada equipe do mundo na [[década de 1980]],<ref name = "super"/> não costumava ultrapassar 5 mil pessoas,<ref name = "elgrafico"/> enquanto o Hertha, em seu primeiro jogo a contar com torcedores ''ossies'', recebeu 59 mil para uma partida da segunda divisão.,<ref name = "super"/> que acabaria conquistada no embalo da reunificação da cidade.<ref name = "hertha">{{citar web|url=http://trivela.uol.com.br/o-muro-de-berlim-isolou-berlim-ocidental-mas-nao-rompeu-devocao-da-torcida-hertha/|titulo=O muro isolou Berlim Ocidental, mas não rompeu a devoção da torcida do Hertha|publicado=Trivela|autor=STEIN, Leandro|data=06/11/2016|acessodata=27/10/2016}}</ref> Outros 51 mil se fizeram presentes em amistoso festivo entre Hertha e Union em [[27 de janeiro]] de [[1990]], poucas semanas após a queda do muro, cantando-se "Hertha und Union, eine Nation" (Hertha e Union, uma nação).<ref name = "unionb"/> Mesmo quando a travessia entre as Berlins era viável, o Hertha foi isolado pelo governo vizinho após abrigar alguns jogadores do "perseguido" Dresdner - dentre estes, [[Helmut Schön]], futuro técnico da Alemanha Ocidental campeã da [[Copa do Mundo FIFA de 1974]]. Antes da construção do Muro, as bilheterias do Hertha, cujo estádio ficava próximo à fronteira, também vendiam ingressos na moeda alemã-oriental. O muro significou perda não só de receitas como de alguns jogadores que moravam no lado oriental, dentre eles um dos maiores artilheiros do Hertha, [[Klaus Taube]]: "foi irreal. Eu estava na fronteira e não entendia o que se passava. Minha carreira no Hertha acabou em minutos". O time também ficou pouco atrativo a alguns dos jogadores que ficaram no lado ocidental; sentindo-se ilhados e inseguros, preferiam rumar a clubes de outras cidades da Alemanha Ocidental. Mesmo após a reunificação, o time ainda padece de décadas estagnado, sendo apenas uma equipe de poderio intermediário na Alemanha.<ref name = "hertha"/>
 
O enfraquecimento do regime comunista refletiu-se no Dínamo, que veio a perder sua hegemonia em [[1989]], o mesmo ano da queda do [[Muro de Berlim]]. O muro marcou presença também no fato de que em [[1961]], quando foi construído, não ter havido campeão de futebol na Alemanha Oriental. Uma semana após a sua queda, caiu também o diretor da Stasi e principal mecenas do Dínamo.<ref name = "elgrafico"/> O campeão em [[1989]] e [[1990]] foi justamente o arquirrival Dínamo Dresden.<ref name = "oberliga"/>