Consonância e dissonância: diferenças entre revisões

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Consonância pode ser definida de várias maneiras:
 
* '''Razão entre [[freqüênciafrequência]]s''': as razões de menores números inteiros sendo mais consonantes do que as de número maior ([[Pitágoras]]). Muitas dessas definições não exigem afinações inteiras ''exatas'', apenas uma aproximação.
** '''Coincidência dos [[harmônico]]s''': consonância é a maior coincidência dos harmônicos ou dos [[Harmônica|parciais]] (''ondas parciais'' ou ''componentes''<ref>As ''ondas parciais'' podem ser [[harmônica]]s, quando suas freqüênciasfrequências correspondem a um número inteiro de vezes da freqüênciafrequência [[Harmônica|fundamental]]–o primeiro harmônico– ou [[inarmônicas]], quando esta correspondência não é um número inteiro.–Ver: [[:en:Overtone#Musical usage term]] em inglês)</ref>) (coletivamente [[Sobretom|sobretons]]–[[Hermann von Helmholtz|Helmholtz]]). Segundo esta definição, a consonância não é dependente apenas do intervalo entre duas notas, mas dos parciais e, portanto, da qualidade do som ([[timbre]]) das próprias notas.
** '''Fusão ou coincidência de padrões''': os fundamentais podem ser percebidos pela coincidência de padrões na análise individual dos parciais para formar um modelo que melhor se ajuste harmonicamente (Gerson & Goldstein, 1978) ou pelos sub-harmônicos mais apropriados (Terhardt, 1974). Os harmônicos também podem ser juntados perceptivelmente numa única entidade, com as consonâncias sendo aqueles intervalos que são propensos a serem mais facilmente confundidos com os [[uníssono]]s, os [[Intervalo (música)|intervalos justos]], por causa das múltiplas estimativas dos fundamentais, que ocorrem nos intervalos justos, para um [[Tonalidade|tom]] harmônico (Terhardt, 1974). Segundo estas definições, os parciais [[Harmonia|inarmônicos]], que de outra maneira seriam [[Espectro sonoro|espectros]] harmônicos, são processados separadamente (Hartmann et al., 1990), a menos que a freqüênciafrequência e a [[amplitude]] sejam [[Modulação (música)|moduladas]] de maneira coerente com os parciais harmônicos (McAdams, 1983). Para algumas dessas definições, a atividade neural (ver a seguir) fornece os dados para a identificação dos padrões. (Por exemplo, Moore, 1989; pp.&nbsp;183–187; Srulovicz & Goldstein, 1983).
** '''Duração do [[Período (física)|período]] ou coincidência com o [[Neurónio|disparo neural]]''': com a duração do disparo neural periódico, resultante do estímulo feito por duas ou mais [[onda]]s, números inteiros mais baixos criando períodos menores ou comuns ou maior coincidência entre o disparo neural e, portanto, consonância (Patternson, 1986; Boomsliter & Creel, 1961; Meyer, 1898; Roederer, 1973, p.&nbsp;145-149). Tons puros estimulam o cérebro, que responde exatamente com o mesmo período ou com múltiplos do período do tom puro produzido.
* '''[[Espectro sonoro|Banda crítica]]''': Consonâncias são [[Altura (música)|alturas]] bem distantes das bandas críticas.
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Em música, '''dissonância''' é a qualidade dos sons parecerem "instáveis" e de terem uma necessidade natural de serem [[Resolução (música)|resolvidos]] para uma consonância estável. Tanto consonância como dissonância são palavras aplicáveis à [[harmonia]], [[acorde]]s e [[Intervalo (música)|intervalos]] e, por extensão, à [[melodia]], e mesmo ao [[ritmo]] e à [[Métrica (música)|métrica]]. Conquanto haja fatos neurológicos e físicos ponderosos, importantes para se entender a ideia de dissonância, a definição precisa de dissonância é condicionada culturalmente – definições de e convenções sobre o uso, relativas à dissonância, variam muito entre os diferentes estilos, tradições e culturas musicais. Entretanto, as ideias básicas de dissonância, consonância e resolução existem de alguma forma em todas as tradições musicais que têm um conceito de melodia, harmonia e tonalidade.
 
Mais confusão sobre a ideia de dissonância é criada pelo fato dos músicos e escritores algumas vezes utilizarem a palavra "dissonância" e seus termos relacionados de uma maneira precisa e cuidadosamente definida, mais freqüentementefrequentemente de maneira informal e com mais freqüênciafrequência ainda, num sentido metafórico ("dissonância rítmica"). Para muitos músicos e compositores, as ideias básicas de dissonância e resolução são vitalmente importantes, pois são ideias que revelam em vários níveis o seu (dos compositores e músicos) pensamento musical.
 
A despeito do uso freqüentefrequente de palavras como "desagradável" e "irritante" para explicar o som resultante da dissonância, a verdade é que toda a música composta numa base tonal e harmônica – mesmo música que geralmente é percebida como harmoniosa – incorpora um certo grau de dissonância. A construção e alívio de uma tensão na música (dissonância e resolução), que pode ocorrer em todos os níveis, do sútil ao mais denso, é o que é, em grande escala, a principal responsável pelo que muitos ouvintes percebem como beleza, emoção e expressão em música.
 
=== Dissonância e estilo musical ===
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As dissonâncias têm sido entendidas e escutadas de maneiras diferentes nas diversas tradições, culturas, estilos e períodos musicais. Relaxamento e tensão têm sido usados como analogia desde os tempos de [[Aristóteles]] até os nossos dias.<ref>DELONE et. al. 1975. p.&nbsp;290</ref>
 
No início do [[Música Renascentista|Renascimento]], intervalos como, por exemplo, a quarta justa, eram considerados como grandes dissonâncias que deviam ser imediatamente resolvidas. A ''regola delle terze e seste'' ('"regra das terças e sextas"), exigia que as consonâncias imperfeitas fossem resolvidas por uma consonância perfeita de um semi intervalo de segunda maior numa voz e e por um intervalo de segunda maior na outra (Dahlhaus [[1990]], p.&nbsp;179). O Anônimo 13 permitia duas ou três consonâncias imperfeitas, o ''Optima introductio'' três ou quatro e o Anônimo 11 (século XV) quatro ou cinco. Por volta do final do [[século XV]], as consonâncias imperfeitas não eram mais consideradas "sonoridades tensas", mas "sonoridades independentes", como evidenciado pelo argumento de Adam von Fulda, permitindo suas sucessões, conforme registrado por Gerbert:<ref>vol. 3, página 353</ref>
{{quote2|Embora os eruditos no passado proibissem todas as sequências com mais de três ou quatro consonâncias imperfeitas, nós, que somos mais modernos, as permitimos.<ref>ibid., página 179</ref>}}
 
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Os estilos musicais são como idiomas no sentido de que certos fatos físicos, fisiológicos e neurológicos criam conexões que afetam enormemente o desenvolvimento de todas as linguagens. Não obstante, culturas e tradições diferentes têm incorporado as possibilidades e limitações criadas por tais fatos neurológicos e físicos a uma vasta gama de sistemas vivos da linguagem humana. Não se deve minimizar a importância dos fatos subjacentes, nem a importância da cultura, ao atribuir um significado específico a esses fatos.
 
Por exemplo, duas notas tocadas simultaneamente mas com freqüênciasfrequências ligeiramente diferentes produzem um [[Batimentos|batimento]] sonoro perfeitamente audível. Alguns estilos musicais consideram esse efeito objetável ("desafinado") e fazem todos os esforços para eliminá-lo. Outros estilos musicais consideram este som uma parte atraente do timbre musical e igualmente envidam todos os esforços em criar instrumentos que tenham essa leve "aspereza" como uma propriedade de seu som (Vassilakis, 2005)
 
A dissonância sensorial e sua manifestações perceptivas (batimento sonoro e aspereza) estão intimamente relacionadas às flutuações de amplitude do sinal sonoro. Flutuações na amplitude descrevem variações no valor máximo do sinal sonoro (amplitude) em relação a um ponto de referência e são resultantes da interferência entre as ondas sonoras. O princípio da interferência define que as amplitudes de duas ou mais fontes vibratórias combinadas (ondas sonoras) pode resultar numa amplitude maior do que as amplitudes das fontes vibratórias (interferência construtiva) ou menor (interferência destrutiva), dependendo da relação entre suas fases. Duas ou mais fontes vibratórias (ondas) com freqüênciasfrequências diferentes, oscilando periodicamente, produzem alternadamente interferências construtivas e destrutivas, gerando o fenômeno conhecido como flutuação da amplitude (a amplitude aumenta e diminui em ciclos correspondentes às interferências que ocorrem entre as fontes vibratórias).
 
As variações de amplitude podem ser enquadradas em três categorias perceptíveis, superpostas, relacionadas às taxa de variação da flutuação. Flutuações lentas da amplitude (≈≤20 por segundo) são percebidas como variações de sonoridade chamadas de batimentos sonoros. À medida que aumenta a taxa de variação da amplitude, ou seja a velocidade com que a amplitude muda de valor, o som resultante parece ser constante para o ouvinte e é percebido como uma aspereza. Se a velocidade de variação da amplitude aumenta ainda mais, a aspereza atinge uma tensão máxima e, a seguir, diminui gradualmente até desaparecer (≈≥75-150 flutuações por segundo, dependendo da freqüênciafrequência dos tons interferentes).
 
Supondo que, conforme indicado pela lei acústica de Ohm (ver Helmholtz, 1885; plomp, 1964), o ouvido realize uma análise de freqüênciafrequência dos sinais que chega até ele, as categorias perceptuais descritas acima podem ser diretamente relacionadas à largura de banda de filtros de análise hipotéticos (Zwicker et al. 1957; Zwicker 1961). Por exemplo, no caso mais simples de flutuações de amplitude resultantes da adição de dois sinais senoidais com freqüênciasfrequências ''f''<sub>1</sub> and ''f''<sub>2</sub>, a velocidade de variação das freqüênciasfrequências (taxa de variação) é igual à diferença entre os dois senos |''f''<sub>1</sub>-''f''<sub>2</sub>| (largura de banda do filtro hipotético), e as afirmações a seguir podem ser consideradas válidas:
 
a) Se a velocidade de flutuação for menor do que a largura de banda do filtro, só é percebido um tom ou com batimento sonoro ou com aspereza;
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No caso de taxas de flutuação comparáveis com a largura de banda do filtro audível, o grau (intensidade), a taxa (velocidade de variação) e a forma das flutuações da amplitude, são variáveis que são manipuladas por músicos de várias culturas para explorar as sensações de batimento sonoro e aspereza, fazendo da variação da amplitude uma ferramenta importante na produção do som musical. Por outro lado, quando não há um batimento sonoro ou uma aspereza pronunciada, o grau (intensidade), a taxa (velocidade de variação) e a forma das flutuações complexas de amplitude, são variáveis que continuam a ser importantes devido às suas interações com os componentes do espectro do sinal. Esta interação se manifeta perceptualmente em termos de variações de altura ou timbre junto com a introdução de combinações de tonalidades (Vassilakis, 2001, 2005, 2007).
 
As sensações de batimento sonoro e aspereza, associadas a certos sinais complexos são, portanto, frequentemente entendidas em termos de interações do componente senoidal dentro da mesma faixa de freqüênciafrequência do filtro auditivo hipotético, chamado de [[banda crítica]].
 
{{Audio|Dissonance-M2-to-unison.ogg|Dois tons movendo-se de uma 2ª maior para um uníssono.}}<ref>Este arquivo ilustra a rudeza e as oscilações do batimento sonoro que gradualmente diminuem à medida que o intervalo se move para o [[uníssono]]</ref>
 
* Razões entre freqüênciasfrequências: Razões com números inteiros maiores são mais dissonantes do que as razões com números menores (Pitágoras).
 
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|[[Ficheiro:Dissonancia-a220-a440.jpg|center|thumbnail|535px|Análise [[Espectro sonoro|espectral]] de dois tons divergentes]]
 
{{Audio|Dissonance-a220-a440-slide.ogg|Dois tons senoidais divergentes.}}<ref>Tons senoidais são [[Onda triangular|ondas triangulares]] filtradas que têm fundamentais fortes, sem harmônicos pares (2x a freqüênciafrequência fundamental, 4x, 6x etc.) com harmônicos ímpares muito atenuados (em 3x, 5x, 7x etc.)</ref>
 
{{Audio|Dissonance-a220-a440-slide-sawtooth.ogg|Dois tons divergentes com onda em forma de dente de serra.}}<ref>A [[onda dente de serra]] tem harmônicos fortes tanto pares como ímpares que tornam alguns momentos da dissonância mais audíveis.</ref>
 
A base física para a observação de Pitágoras pode ser constatada na análise espectral acima e no arquivo sonoro acompanhante. Nos pontos em que as razões das freqüênciasfrequências dos tons envolvidos são números simples (indicados pelas setas no topo do gráfico), os ''sobretons'' são mais ordenados e mais simples. A maioria dos ouvintes percebeque o tom do intervalo, nestes pontos são mais "puros" ou "harmoniosos".
 
Diferentemente, quando a razão entre as freqüênciasfrequências não são números inteiros, a situação do ''sobretons'' parece complexa e caótica na análise espectral. A maioria dos ouvintes percebe que os intervalos nestes pontos são mais "ásperos" ou mais "desarmônicos".
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* No ouvido humano o efeito dessas razões diferentes podem ser percebidas por meio de um dos seguintes mecanismos:
** Fusão ou coincidência de padrões: as freqüênciasfrequências fundamentais podem ser percebidas por meio de uma coincidência de padrões dos parciais analisados separadamente para melhor se ajustar a um modelo harmônico exato (Gerson & Goldstein, 1978) ou sub-harmônico (Terhardt, 1974); ou os harmônicos podem ser perceptivelmente fundidos, transformando-se numa entidade única, com as dissonâncias sendo os intervalos menos propensos a serem confundidos com o uníssono, os intervalos imperfeitos, devido às múltiplas estimativas, nos intervalos perfeitos, dos fundamentais, para um tom harmônico (Terhardt, 1974). Segundo essas definições, os parciais inarmônicos dos espectros harmônicos, usualmente são processados separadamente (Hartmann et al., 1990), a menos que as freqüênciasfrequências e as amplitudes tenham sido moduladas de forma coerente com os parciais harmônicos (McAdams, [[1983]]). Para algumas dessas definições, conforme mostrado a seguir, o disparo neural fornece os dados necessários para se processar a coincidência de padrões (e.g., Moore, 1989; pp.&nbsp;183–187; Srulovicz & Goldstein, 1983).
** '''Duração do período ou coincidência com o disparo neural''': coincidência com a duração do disparo neural periódico, resultante do estímulo feito por duas ou mais ondas: números inteiros maiores criam períodos maiores ou menos coincidência entre o disparo neural e, portanto, disssonância (Patternson, 1986; Boomsliter & Creel, 1961; Meyer, 1898; Roederer, 1973, p.&nbsp;145-149). Tons puros estimulam o cérebro (disparo neural), que responde exatamente com o mesmo período ou com múltiplos do período do tom puro produzido.
* Dissonância também é definida como a quantidade de batimento sonoro entre dois harmônicos não comuns ou parciais (''sobretons'') (Helmholtz, 1877/1954). Terhardt (1984) chama isso de "dissonância sensorial". Segundo esta definição, a dissonância não depende apenas da qualidade do intervalo entre duas notas, mas dos harmônicos e, portanto, da qualidade ([[timbre]]) dessas notas. A dissonância sensorial, isto é, a presença de batimento sonoro e/ou rudeza no som, é associada à inabilidade do ouvido interno resolver plenamente os componentes espectrais com padrões de excitação que se sobreponham às bandas críticas.