Fernão Lopes: diferenças entre revisões

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O gênero da crônica histórica tem origens imemoriais. Na [[Idade Média]], iniciando a formação de poderosos reinos na Europa, a realeza entendeu que suas virtudes e conquistas deviam ser consagradas e perenizadas, retomando a antiga tradição das crônicas oficiais, onde de costume pouco se distinguiam fatos de mitos e assuntos de Estado de interesses privados da aristocracia, tornando a narrativa histórica claramente um projeto político, manipulando os fatos para que se criasse a "verdade" mais conveniente para os detentores do poder. No século XIII o gênero estava em alta, especialmente na França, onde haviam entrado na moda as ''Grandes chroniques'', que traçavam em linguagem retórica a origem dos reis franceses até a mítica [[Troia]].<ref name="Senko"/><ref name="Esteves"/><ref name="Vanise"/> Conforme Teresa Amado, o que se esperava do cronista medieval se revela explicitamente na encomenda feita a Lopes por D. Duarte: a de "poer em caronica as estorias dos antigos reis que antigamente em Portugal forom e isso mesmo os grandes feitos e altos do mui virtuoso e de grandes virtudes meu senhor e padre". Pouco espaço restava, na tradição historiográfica que Lopes recebeu, para a "arraia miúda", a massa dos vilões e camponeses, sempre dominados e explorados pela nobreza.<ref name="Apresentação"/>
 
Ao mesmo tempo, essas narrativas apresentavam um modelo de conduta ideal para os nobres, baseado na ética da [[cavalaria]], do [[cristianismo]] e do [[amor cortês]], procurando ser obras moralizantes e didáticas. A tradição oral, as mitologias dinásticas e a simples compilação de dados tinham enorme peso nessa literatura de encomenda, e a comprovação documental, bem como uma análise verdadeiramente crítica dos acontecimentos, eram aspectos muito negligenciados. Pensava-se a História de outra maneira naquela época. O modelo francês foi influente nas origens da [[literatura portuguesa]] em geral e especificamente na obra de Fernão Lopes, assim como o modelo espanhol, tipificado pelas crônicas alfonsinas e outras produções, como as de [[Pero Lopez de Ayala]], embora Lopes, influenciado pelos clássicos e por um contexto específico, e optando pela objetividade, verificabilidade e economia, tenha feito avanços importantes em relação aos seus predecessores.<ref name="Senko">Senko, Elaine Cristina. [http://revistas.ufpr.br/vernaculo/article/viewFile/22875/20230 "Perspectivas e sintomas da historiografia do período tardo medieval: um encontro entre Ocidente e Oriente"]. In: ''Revista Vernáculo'', 2010 (25)</ref><ref name="Vanise">Medeiros, Vanise Gomes de. [http://linguagem.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/linguagem-em-discurso/0501/050105.pdf "Discurso cronístico: uma 'falha no ritual' jornalístico"]. In: ''Linguagem em (Dis)curso - LemD'', 2004; 5 (1):93-118 </ref><ref name="Esteves">Esteves, Julieta Araújo. "Fontes de 'saber' nas crónicas medievais: Fernão Lopes". In: ''História Revista'', 2013; 18 (1):167-179 </ref> No resumo de [[António José Saraiva]],
 
::"Em Portugal chegava-se a um momento crítico. A guerra da independência, colocando face a face a velha aristocracia do sangue e os burgueses das grandes cidades, originou a derrocada dos antigos quadros sociais e deu acesso a uma nova aristocracia de interesses económicos e morais inteiramente novos. Fernão Lopes é o cronista da nova aristocracia, que ainda então se não constituíra em classe fechada, mas estava presa à revolução colectiva que lhe dera o acesso ao poder. Durante um momento parece que a nação ganha voz e consciência literária nas obras do cronista. Há entre ele e o 'povo' a quem se dirige um sincronismo muito claro. E aquela amaneirada poesia de sala, a linguagem cheia de jogos e subtilezas que se falava na corte de D. Dinis, ou os amores perfeitos dos cavaleiros andantes que entretêm a corte de D. Fernando, andam emigrados pelas cortes de Castela e Aragão. Na corte de D. Duarte, uma literatura grave, máscula e prosaica, acompanha as crônicas de Fernão Lopes. Também os costumes são outros: a gravidade conjugal sucede aos devaneios de D. Dinis e aos amores romanescos de D. Pedro e de D. Fernando".<ref>Saraiva, António José. [http://www.ocomuneiro.com/paginas_m_antoniojosesaraiva_Para_uma_sociologia_1945.html "Para uma sociologia da literatura portuguesa"]. In: Cunha, Carlos Manuel Ferreira da (ed.). ''Escrever a nação: literatura e nacionalidade (uma antologia)''. Opera Omnia, 2011, pp. 141-154</ref>
 
Como era um hábito tradicional entre os cronistas, Lopes muitas vezes não se preocupou em citar suas fontes claramente, mas entre as que mais largamente utilizou estavam a ''[[Crônica do Condestável]]'', as obras de Pero Lopez de Ayala e a crônica em latim do Dr. Christophorus sobre o reinado de Dom João I.<ref name="Apresentação"/>
 
===Caracteristicas gerais===