Fernão Lopes: diferenças entre revisões

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::"Como Guarda-mor da Torre do Tombo, Fernão Lopes tinha ao seu alcance os arquivos do Estado, circunstância de que soube utilizar-se, transcrevendo, resumindo e aproveitando a correspondência diplomática, as disposições legais, os capítulos das Cortes, e outra documentação que enriqueceu ainda examinando fora da Torre do Tombo: os cartórios das igrejas e lápides de sepulturas. [...] O primeiro cronista português pode, assim, ser chamado também com justiça o primeiro, em data, dos historiadores portugueses, isto é, o primeiro que, não se limitando a compilar, vai investigar os fatos nas suas fontes documentais e submete a tradição a uma análise crítica".<ref name="Saraiva7">Lopes, Oscar; Saraiva, António José. ''História da Literatura Portuguesa'', 4ª ed. Porto Editora: Porto, s/d., pp. 113-114</ref>
 
Apesar de ter sido designado oficialmente para compor uma história portuguesa, sua [[historiografia]] não é apenas regiocêntrica. O autor, mesmo que utilize o rei como centro da história, demonstra na sua narrativa grande interesse pelo povo, colocando-o como um importante protagonista nas transformações sociais de Portugal, além de trabalhar de maneira inédita aspectos psicológicos, econômicos e humanistas que influem nos agentes e nos rumos da História.<ref name="Gianez"/><ref name="Guaranha"/><ref name="Magalhães"/><ref name="Abdala"/> O grande espaço que concedeu ao povo em suas crônicas, muitas vezes identificando-se com ele e considerando-o a expressão do mais autêntico espírito português,<ref name="Saraiva7"/><ref name="Abdala"/> reflete-se também no seu [[estilo (arte)|estilo]], enraizando sua escrita na expressão oral e no universo popular. Prestigiou o [[vernáculo]] quando a maioria dos textos eruditos era produzida em [[latim]] e foi um representante do ''saber popular'', mas já no seu tempo um novo tipo de saber começava a surgir: de cunho [[humanista]], universalista, classicizante, do qual Fernão Lopes foi um dos primeiros cultivadores em Portugal.<ref name="Gianez3">Gianez, pp. 130-140</ref><ref name="Abdala"> Abdala Júnior, Benjamin. ''Literaturas de língua portuguesa: marcos e marcas. Portugal''. Arte & Ciência, 2007, pp. 34-37</ref>

Porém, ele próprio diz que nas suas páginas não se encontra a formosura das palavras, mas a nudez da verdade.<ref name="Magalhães">Magalhães, Alessandra Cristina Moreira de. [http://www.filologia.org.br/cluerj-sg/anais/ii/completos/comunicacoes/alessandracristinamoreirademagalhaes.pdf "Considerações sobre a crônica de Fernão Lopes"]. In: ''XX Congresso ABRAPLIP'', 2005 </ref> Apesar disso, sua prosa direta, desembaraçada e cheia de charme, seu magistral domínio de variadas técnicas narrativas, suas originais maneiras de estabelecer significados por meios indiretos, sua capacidade de evocar cenas complexas e movimentadas e de prender a atenção do leitor, sua compreensão do drama humano, entre outras qualidades, tornam suas crônicas as maiores obras-primas da [[literatura medieval]] portuguesa, que a despeito da distância dos séculos continuam ainda hoje exercendo fascínio sobre leigos e especialistas.<ref name="Massaud">Moisés, Massaud. ''A literatura portuguesa através dos textos'', 29ª ed. São Paulo: Cultrix, 1998, p. 49</ref><ref name="Saraiva7"/><ref name="Magalhães"/> Para [[António José Saraiva]], "a prosa de Fernão Lopes conserva o tom 'falado' dos [[Romance de cavalaria|romances de cavalaria]], mas enriquecido com um vocabulário e imagens reveladores de um grande senso de concreto, e com os recursos da oratória clerical, tocada oportunamente por um arrepio de solenidade bíblica, como quando fala da 'boa e mansa oliveira portuguesa'. O tom em que fala é sempre repassado de emoção, que não exclui a ironia, como se verifica na extraordinária descrição do cerco de Lisboa. Os ditos populares, as anedotas e a majestade de tom adequado aos grandes momentos sucedem-se com perfeita naturalidade, sem deixar perceber o tecnicismo retórico da época, que aliás dominava perfeitamente. E uma poderosa voz patriarcal, ora trovejando de indignação, ora espraiando-se com solenidade, ora gracejando, mas sempre quente e de largo fôlego, parece desprender-se das suas palavras".<ref>Saraiva, António José. ''Iniciação na Literatura Portuguesa''. Gradiva, Colecção Cultura e História do jornal [[Público (jornal)|Público]], 1996, p. 29 </ref>
[[File:Fernão Lopes - Crónicas de Dom Pedro I e Dom Fernando.jpg|thumb|Primeira página de uma cópia manuscrita das ''Crônicas de D. Pedro I e D. Fernando''.]]