Arthur Schopenhauer: diferenças entre revisões

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{{mais-fontes notas|data=setembro de 2010}}
{{Info/Biografia
|imagem =Arthur_Schopenhauer_by_J_Schäfer,_1859b.jpg
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|local_morte =[[Frankfurt]], [[Grão-Ducado de Hesse]]
|escola =[[Idealismo alemão]], [[Immanuel Kant|kantismo]]
|interesses =[[filosofia]], [[gnosiologia]], [[lógica]], [[retórica]], [[antropologia]], [[psicologia]], [[ética]], [[direitos dos animais]], [[estética]], [[metafísica]], [[sabedoria religiosa]], [[eudaimonia]], [[política]], [[linguagem]] e [[educação]]
|influências =[[Sidarta Gautama]], [[Platão]], [[Aristóteles]], [[Séneca]], [[Kant]], [[Hobbes]], [[Goethe]], [[Leibniz]], [[filosofia oriental]]
|influenciados =[[Nietzsche]], [[Kierkegaard]], [[Samuel Beckett|Beckett]], [[Jorge Luis Borges]], [[Mihai Eminescu]], [[Sigmund Freud|Freud]], [[Hermann Hesse|Hesse]], [[Max Horkheimer|Horkheimer]], [[Carl Jung|Jung]], [[Thomas Mann|Mann]], [[Gilbert Ryle]], [[Leo Tolstoy|Tolstoy]], [[Machado de Assis]], [[Swami Vivekananda|Vivekananda]], [[Guy de Maupassant|Maupassant]], [[Richard Wagner|Wagner]], [[Ludwig Wittgenstein|Wittgenstein]], [[Marcel Proust|Proust]], [[Albert Einstein]], [[Henri Bergson]], [[Luitzen Egbertus Jan Brouwer]]
|ideias_notáveis = [[vontade]] como essência radical do mundo, [[antropologia]] do [[egoísmo]], [[pessimismo]] realista prático, teoria da [[loucura]], vida [[estética]] enquanto forma de libertação do [[egoísmo]] pela via da [[arte]] e/ou do [[nirvana]], teoria da [[genialidade]], [[moral]] compassiva, [[determinismo]] crítico, [[direito moral]], [[direitos dos animais]], teoria da natureza meramente abstrata-representativa da [[razão]]
|assinatura =[[FileImagem:Arthur Schopenhauer Signature.svg|150px|center]]
}}
 
'''Arthur Schopenhauer''' ([[Gdansk|Danzig]], {{dtlink|lang=br|22|2|1788}} — [[Frankfurt]], {{dtlink|lang=br|21|9|1860}}) foi um [[Filosofia|filósofo]] [[Alemanha|alemão]] do [[século XIX]].<ref name="UOL - Educação">{{citar web |url=http://educacao.uol.com.br/biografias/arthur-schopenhauer.jhtm |título=Arthur Schopenhauer |acessodata=21 de setembro de 2012 |autor= |coautores= |data= |ano= |mes= |formato= |obra= |publicado=UOL - Educação |páginas= |língua= |língua2=pt |língua3= |lang= |citação= }}</ref> Ele é mais conhecido pela sua obra principal "[[O mundo como vontade e representação]]" (1818), em que ele caracteriza o mundo fenomenal como o produto de uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica. A partir do [[idealismo transcendental]] de [[Imannuel Kant]], Schopenhauer desenvolveu um sistema metafísico [[ateu]] e ético que tem sido descrito como uma manifestação exemplar de [[pessimismo]] filosófico. Schopenhauer foi o filósofo que introduziu o pensamento indiano e alguns dos conceitos [[Budismo|budistas]] na [[metafísica]] alemã.<ref name="UOL - Educação" /> Foi fortemente influenciado pela leitura das [[Upanixade|Upanishads]],<ref>[[Urs App]]: ''Schopenhauer's Compass. An Introduction to Schopenhauer's Philosophy and its Origins''. Wil: UniversityMedia, 2014 (ISBN 978-3-906000-03-9)</ref> que foram traduzidas pela primeira vez para o latim no início do século XIX.<ref>BIANCHINI, Flávia; REDYSON, Deyve. [https://www.academia.edu/4500469/A_obra_Oupnekhat_na_filosofia_de_Schopenhauer._Flavia_Bianchini_Deyve_Redyson A obra Oupnek'hat na filosofia de Schopenhauer]. ''Litterarius'', 11 (2): 157-184, 2012.</ref>
 
Schopenhauer acreditava no [[amor]] como meta na vida, mas não acreditava que ele tivesse a ver com a [[felicidade]].<ref name="UOL - Educação"/>
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As ideias de Schopenhauer consistem em uma coletânea de pensamentos ditos [[Pessimismo|pessimistas]] que dizem respeito à vida humana. Segundo o filósofo, esta é regida pela [[vontade]] e, sendo, a vontade, uma espécie de [[Deus]] presente em todos os humanos sem exceção de nenhum e que necessita sobreviver se usando do [[libido|desejo sexual]] para se reproduzir e multiplicar, e devido ao desejo de sempre querer mais, a vontade acaba levando ao sofrimento humano, pois o homem nunca será satisfeito com uma única coisa. Ainda, de vez que a Vontade é surpreendida como a coisa-em-si/essência do ser humano, e em razão do fato de o homem ser, do ponto de vista cósmico, não mais que um tipo de ser em meio a vários outros tipos de seres, Schopenhauer, valendo-se de uma razão analógica, sente-se autorizado a estender essa substância primordial (a Vontade) a todos os demais seres, concebendo-a, assim, como essência não só do homem, mas do mundo.
 
Schopenhauer procura uma forma de libertação dessa vontade se baseando em escritos [[Budismo|budistas]] e na [[filosofia oriental]], que diz que a única forma de se libertar da vontade é a total renúncia, alcançada no [[Nirvana]]. Vale a pena acrescentar que Schopenhauer também identifica esse mecanismo da libertação da vontade no [[cristianismo]] genuíno. De todo modo, a sabedoria religiosa que tem por referência é o [[budismo]].
{{Portal-filosofia}}
 
===Um mundo cego e irracional===
 
O ponto de partida do pensamento de Schopenhauer encontra-se na filosofia kantiana. [[Immanuel Kant]] ([[1724]] – [[1804]]) estabelecera distinção entre os [[fenômeno]]s e a [[coisa em si]] (que chamou ''noumenon''), isto é, entre o que nos aparece e o que existiria em si mesmo. A coisa-em-si (''noumenon'') não poderia, segundo Kant, ser objeto de conhecimento científico, como até então pretendera a [[metafísica]] clássica. A [[ciência]] restringir-se-ia, assim, ao mundo dos fenômenos, e seria constituída pelas formas ''[[a priori]]'' da sensibilidade ([[espaço]] e [[tempo]]) e pelas categorias do entendimento (a exemplo da categoria da causalidade). Dessas distinções, Schopenhauer concluiu que o [[mundo]] não seria mais do que representações, entendidas por ele, num primeiro momento, como sínteses entre o [[Subjetividade|subjetivo]] e o [[Objetividade (filosofia)|objetivo]], entre a realidade exterior e a [[consciência]] humana. Como afirma em [[O Mundo Como Vontade e Representação]],
{{quote2|Por mais maciço e imenso que seja este mundo, sua existência depende, em qualquer momento, apenas de um fio único e delgadíssimo: a consciência em que aparece.}}
Em outra passagem de sua principal obra, Schopenhauer deixa mais clara essa ideia:
{{quote2|O mundo como [[representação]], isto é; unicamente do ponto de vista de que o consideramos aqui, tem duas metades essenciais, necessárias e inseparáveis. Uma é o objeto; suas formas são o espaço e o tempo, donde a pluralidade. A outra metade é o sujeito; não se encontra colocada no tempo e no espaço, porque existe inteira e indivisa em todo ser que percebe: daí resulta que um só desses seres junto ao objeto completa o mundo como representação, tão perfeitamente quanto todos os milhões de seres semelhantes que existem: mas, também, se esse ser desaparece, o mundo como representação não mais existe.}}
 
Não se pode dizer que essas ideias expressem exatamente o [[pensamento]] kantiano, mas, seja como for, Schopenhauer chegou a essas conclusões, partindo do mestre que tanto admirava, bem como, frisa-se, da constatação dessas mesmas verdades na [[Platonismo|filosofia platônica]] e na dos [[Vedas]], embora expressas de maneira alegórica e intuitiva, portanto, não do modo conceitual e racional kantiano. De fato, Schopenhauer louva Kant precisamente por haver demonstrado de maneira clara e racional, de uma vez por todas, essas verdades antigas - até então poeticamente manifestas. Schopenhauer, contudo, separa-se, explicitamente, de Kant em um ponto essencial e, a partir daí, constrói uma [[filosofia]] original. Para Kant, a coisa-em-si é inacessível ao conhecimento humano, pois encontra-se além dos limites das estruturas do próprio ato cognitivo, entendido como [[síntese]] dos dados da intuição sensível, síntese essa realizada pelas categorias a priori do entendimento. Schopenhauer, ao contrário, pretendeu abordar a própria coisa-em-si. Essa coisa-em-si, raiz metafísica de toda a [[realidade]], seria a [[Vontade]].
 
Segundo o autor de O Mundo como Vontade e Representação, a [[experiência]] interna do indivíduo assegura-lhe mais do que o simples fato de ele ser "um objeto entre outros". A experiência interna também revela ao [[indivíduo]] que ele é um ser que se move a si mesmo, um ser ativo cujo [[comportamento]] manifesto expressa diretamente sua vontade. Essa consciência interior que cada um possui de si mesmo como vontade seria primitiva e irredutível: A vontade revelar-se-ia imediatamente a todas as pessoas como o em-si e a percepção que as pessoas têm de si mesmas como vontades seria distinta da percepção que as mesmas têm como corpo através da percepção externa mediada pelo princípio de razão. Mas isso não significa que Schopenhauer tinha esposado a tese de que as ações corporais e as ações da vontade constituem duas séries de fatos, entendidas as primeiras como causadoras das segundas. Para Schopenhauer, o [[corpo]] [[humano]] é apenas objetivação da vontade, tal como aparece sob as condições da [[percepção]] externa (mediada pelo aludido princípio de razão). Em outros termos, o que se quer e o que se faz são uma e a mesma coisa, vistos, porém, de perspectivas diferentes.
 
Da mesma forma como nos [[Homo sapiens|homens]], a vontade seria o princípio fundamental da [[natureza]]. Para Schopenhauer, na queda de uma [[pedra]], no crescimento de uma [[planta]] ou no puro comportamento [[Instinto|instintivo]] de um [[animal]], afirmam-se tendências, em cuja objetivação se constituem os corpos. Essas diversas tendências não passariam de disfarces sob os quais se oculta uma vontade única, superior, de caráter [[Metafísica|metafísico]] (mas entenda-se "metafísica" não no sentido clássico de conhecimento respeitante a algo além e fora da experiência, mas sim do que há de mais primitivo e de íntimo no mundo experienciável) e presente igualmente na planta que nasce e cresce, e nas complexas ações humanas. Essa vontade, para Schopenhauer, é independente da representação e, portanto, não se submete às leis da razão. Ao contrário de [[Hegel]], para quem o real é racional, a filosofia de Schopenhauer sustenta que o real é em si mesmo cego e irracional, enquanto vontade. As formas racionais da consciência não passariam de ilusórias aparências e a [[essência]] de todas as coisas seria alheia à razão:
{{quote2|A consciência é a mera superfície de nossa mente, da qual, como da [[terra]], não conhecemos o interior, mas apenas a crosta.}}
O inconsciente representa, assim, papel fundamental na filosofia de Schopenhauer. Sob esse aspecto, o autor de O Mundo como Vontade e Representação antecipou-se a alguns dos conceitos mais importantes da psicanálise fundada por [[Sigmund Freud]] ([[1856]]-[[1939]]).
 
O próprio Freud reconheceu a importância das ideias de Schopenhauer; em um de seus escritos, afirma que certas considerações sobre a [[loucura]], encontradas no Mundo como Vontade e Representação, poderiam "rigorosamente, sobrepor-se à [[Recalque (psicanálise)|doutrina da repressão]]".
 
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===Viver é sofrer===
 
No [[sistema]] de Schopenhauer, a vontade é a raiz metafísica do mundo e da conduta humana; ao mesmo tempo, é a fonte de todos os sofrimentos. Sua filosofia é, assim, profundamente [[pessimismo|pessimista]], pois a vontade é concebida em seu sistema como algo sem nenhuma [[meta]] ou finalidade (ateleológica), um querer [[irracional]] e inconsciente. Sendo um [[mal]] inerente à [[existência]] do homem, ela gera a [[dor]], necessária e inevitavelmente, sendo aquilo que se conhece como felicidade, por conseguinte, apenas a interrupção temporária de um processo de [[infelicidade]] e somente a lembrança de um sofrimento [[passado]] criaria a ilusão de um bem [[presente]]. Para Schopenhauer, o [[prazer]] é [[momento]] fugaz de ausência de dor e não existe satisfação durável. Todo prazer é ponto de partida de novas aspirações, sempre obstadas e sempre em [[luta]] por sua realização: "Viver é sofrer". Nesse sentido, verifica-se como seu pessimismo não é gratuito, dado que suportado por uma antropologia-metafísica-realista de fundo, apresentando-se, deste modo, como apanágio e característica natural desta.
 
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===No Nada, há salvação===
 
A libertação proporcionada pela [[arte]], segundo Schopenhauer, não é, contudo, total e completa. A arte significa apenas um distanciamento relativamente passageiro e não a supressão da Vontade. Para que atinja a [[Liberdade|libertação]], é necessário que o homem ascenda ao nível da conduta [[Ascetismo|ascética]], a qual representa uma etapa superior no processo de superação das "dores do mundo".
 
Com efeito, para Schopenhauer, a mais completa forma de salvação para o homem somente pode ser encontrada na renúncia quietista ao mundo e a todas as suas solicitações, na mortificação dos [[instinto]]s, na autoanulação da vontade e na fuga para o Nada:
{{quote2|Desviemos um instante os [[olho]]s de nossa própria indigência e de nosso limitado [[horizonte]]; levemo-los sobre esses homens que venceram o mundo, nos quais a vontade, atingindo a [[Perfeição|perfeita]] consciência de si, se reconheceu em tudo que existe e, livremente, renunciou a si mesma...}}
 
Então, em vez desse tumulto de aspirações sem [[fim]], em vez dessas passagens constantes do desejo ao medo, da [[alegria]] ao [[sofrimento]], em vez dessas [[esperança]]s sempre inalcançadas e sempre renascentes, que fazem da vida humana, enquanto animada pela vontade, um sonho interrompido, não perceberemos mais do que esta paz, mais preciosa que todos os tesouros da razão, a calma absoluta do espírito, esta serenidade imperturbável, tal como [[Rafael]] e [[Correggio (pintor)|Correggio]] a pintaram nas figuras de seus [[santo]]s e cujo [[brilho]] deve ser para nós a mais completa e verídica anunciação da boa nova: a vontade desapareceu; subsiste apenas o conhecimento".
 
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Primeiramente, de se dizer que a ética, para Schopenhauer, é a ciência filosófica da vida moral, e, precisamente enquanto saber de natureza científico-filosófica limita-se a dizer o que É, ou seja, a descrever seu objeto - no caso, a realidade moral, caracterizada pela ação desinteressada voltada a respeitar (justiça) e a auxiliar (piedade) o próximo (entendendo-se por próximo não apenas o sujeito-suscetível a sofrimento-humano, mas também o sujeito-suscetível a sofrimento-não-humano). A ética de Schopenhauer não está, contudo, presa à noção de "dever", o que equivale a dizer que não estamos diante de uma ética prescritiva (tal qual, por exemplo, a ética kantiana); Schopenhauer rejeita as formas imperativas de filosofia que são, para ele, formas de coerção - e, dentre outras razões, isso é assaz importante, haja vista colocar Schopenhauer se não numa posição ímpar, então numa posição "alternativa".
 
Sua [[ética]] não se apoia em mandamentos, mas, antes, na [[Conceito|noção]] de que a [[contemplação]] da [[verdade]] é o caminho de acesso ao [[Bem (filosofia)|bem]] - não obstante reconhecer a necessidade de se traduzir e erigir as coordenadas morais espontâneas e naturais, emanadas da disposição compassiva, em princípios racionais, a fim de se estabelecer uma vida moral efetiva. Para Schopenhauer, o [[egoísmo]], que faz do homem o inimigo do homem, advém da [[ilusão]] de vontades independentes que afirmam seus ímpetos individuais. A superação do egoísmo somente seria possível mediante o conhecimento da natureza única [[Universo|universal]] da Vontade. Como consequência [[moral]] do desaparecimento de sua [[individualidade]], o homem pode tornar-se bom; ao espírito de luta contra os semelhantes, segue-se o espírito de [[simpatia]]. Libertado da [[ilusão]] do [[egoísmo]], o homem atinge o [[princípio]] que é o fundamento de toda verdade moral: ''"Não prejudiques pessoa alguma, sê bom com todos"'', princípio este em que se nota, na primeira parte, a [[Virtudes cardinais|virtude cardeal]] da [[justiça]] e, na segunda, a outra virtude cardeal, a [[piedade]].
 
Essa ética que descreve a moral como prática da [[justiça]] e da [[piedade]] fundada na [[Compaixão|comiseração]] (reservada, relembre-se, à possibilidade de se fixar racionalmente, em princípios, no espírito do agente), segundo Schopenhauer, encontrou sua mais acabada expressão nos [[Bíblia|evangelhos]], onde ''"ama a teu próximo como a ti mesmo"'' constitui o princípio fundamental da conduta.
 
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[[Filho]] de Heinrich Floris Schopenhauer, comerciante da cidade de Danzig, na Prússia (atualmente [[Gdansk]], na [[Polônia]]), o filósofo Arthur Schopenhauer estava destinado a seguir a [[profissão]] de seu [[pai]]. Por isso, a família nunca se preocupou muito com sua educação intelectual e, quando contava apenas doze anos de idade, em 1800, induziu-o a empreender uma série de viagens importantes para um futuro comerciante. Schopenhauer percorreu a [[Alemanha]], a [[França]], a [[Inglaterra]], a [[Holanda]], a [[Suíça]], a [[Silésia]] e a [[Áustria]]. Mas seu interesse não foi despertado por aquilo que seu pai mais desejava: o que fez de mais importante, durante essas viagens, foi redigir uma série de considerações melancólicas e pessimistas sobre a miséria da condição humana. Em abril de 1804, visitou o arsenal de [[Toulon]], onde teve contato com os condenados às [[galé]]s. Ele registrou em seu diário suas impressões sobre essa visita, que o marcou profundamente.<ref>{{Citar livro
|autor = SAFRANSKI, Rüdiger
|título = A cena primordial da compaixão
|subtítulo = In: BOFF, L.; MÜLLER, W. Princípio de compaixão e cuidado
|idioma =
|edição = 4
|local = Petrópolis
|editora = Vozes
|ano = 2009
|capítulo = V
|páginas = 128-129
|volumes =
|volume =
|id isbn= ISBN 978-85-326-2414-7
}}
</ref> Em 1805, a família fixou-se em [[Hamburgo]] e o obrigou a cursar uma escola comercial. A morte do pai (presumivelmente cometeu [[suicídio]]) permitiu-lhe, contudo, abandonar para sempre os estudos comerciais e voltar-se para uma carreira universitária, como era seu desejo. Assim, Schopenhauer passou a dedicar-se aos estudos humanísticos, ingressando no Liceu de [[Weimar]] em 1807; dois anos depois, encontrava-se na faculdade de medicina de [[Göttingen]], onde adquiriu vastos conhecimentos científicos.
 
Em 1811, na [[Universidade de Berlim]], assistiu aos cursos dos filósofos [[Schleiermacher]] (1768-1834) e [[Fichte]] (1762-1814). Este último seria, mais tarde, acusado por Schopenhauer de ter deliberadamente caricaturado a filosofia de [[Kant]] (1724-1804), tentando “envolver o povo alemão com a neblina filosófica”. Em 1813, Schopenhauer doutourou-se pela Universidade de Berlim com a tese Sobre a Quádrupla Raiz do Princípio de Razão Suficiente.
 
Nessa época, sua mãe, [[Johanna Schopenhauer]], estabeleceu-se em Weimar, onde começou a obter progressivo sucesso como novelista e passou a freqüentar os círculos mundanos que Schopenhauer detestava e se esforçava por ridicularizar ao máximo. As relações entre os dois deterioraram-se a ponto de Johanna declarar publicamente que a tese de seu filho não passava de um tratado de farmácia; em contrapartida, Schopenhauer afirmava ser incerto o futuro de sua mãe como romancista e que ela somente seria lembrada no futuro pelo fato de ser sua progenitora.
 
Apesar dessas brigas, Schopenhauer freqüentou durante algum tempo o salão de sua mãe. Ali tornou-se amigo de Goethe (1749-1832), que reconhecia seu gênio filosófico e sugeriu-lhe que trabalhasse numa teoria antinewtoniana da visão. A partir dessa sugestão, Schopenhauer escreveu Sobre a Visão e as Cores, publicado em 1816.
 
Em 1814, Schopenhauer rompeu definitivamente com a família e, quatro anos depois, concluiu sua principal obra, [[O mundo como vontade e representação|O Mundo como Vontade e Representação]]. Em 1819, o livro foi publicado, mas, um ano e meio após, haviam sido vendidos apenas cerca de 100 exemplares. A crítica também não foi favorável à obra.
 
Durante os anos de 1818 e 1819, Schopenhauer passou uma temporada na Itália: ao voltar, sua situação econômica não era das melhores. Solicitou então um posto de monitor na Universidade de Berlim, valendo-se de seu título de doutor e passando por uma prova que consistia numa conferência. Admitido em 1820, encarregou-se de um curso intitulado A Filosofia Inteira, ou O Ensino do Mundo e do Espírito Humano. O título do curso devia-se, provavelmente, a [[Hegel]] (1770-1831), que na época era um dos mais reputados professores da [[Universidade de Berlim]]. Tentando competir com Hegel, Schopenhauer escolheu o mesmo horário utilizado pelo rival, mas a tentativa redundou em fracasso completo: apenas quatro ouvintes assistiam a suas aulas. Ao fim de um semestre, renunciou à universidade.
 
Em 1821, envolveu-se em um acidente que teve desagradáveis conseqüências econômicas e, sobretudo, viria causar-lhe periódica crise de [[depressão nervosa|depressão]] psicológica. Nessa época, o [[filósofo]] residia numa [[pensão]], cujos principais locatários, em sua grande maioria, eram senhoritas de idade avançada. Essas pensionistas tinham o desagradável hábito de espionar a chegada de supostas amantes, recebidas por Schopenhauer em seus aposentos. Certa noite, quando uma costureira chamada Caroline-Louise Marquet dedicava-se a esse mister, Schopenhauer, perdendo a paciência, atirou-a escada abaixo. Como resultado, foi processado e acabou sendo condenado a pagar trezentos thalers de despesas médicas. Além disso, ficava obrigado a pagar sessenta thalers anuais, até a morte de Caroline, que somente veio a falecer vinte anos depois. Durante todo esse tempo, Schopenhauer entrava em depressão nervosa, uma vez por ano, todas as vezes que era obrigado a pagar a pensão. Sua revolta dizia respeito menos à quantia desembolsada do que àquilo que sentia como injustiça cometida pelas autoridades.
 
Entre 1826 e 1833, Schopenhauer empreendeu freqüentes viagens, adoeceu por diversas vezes e tentou uma segunda experiência como professor da [[Universidade de Berlim]]. Foi mais uma tentativa fracassada, somente contrabalançada pela crítica elogiosa a seu [[O Mundo como Vontade e Representação]], publicada no periódico Kleine Bücherschau.
 
Em 1833, depois de muitas hesitações, o filósofo resolveu fixar-se em [[Frankfurt]], onde permanecera até sua morte em 1860. Durante os vinte e sete anos que passou na cidade, levou uma vida solitária, acompanhado por seu cão. Sua predileção por animais era filosoficamente justificada; segundo Schopenhauer, entre os cães, contrariamente ao que ocorre entre os homens, a vontade não é dissimulada pela máscara do pensamento.
 
Dedicado exclusivamente à [[reflexão]] filosófica, Schopenhauer trabalhou intensamente em Frankfurt, redigindo e publicando diversos livros. Em 1836, veio a lume o ensaio Sobre a Vontade na Natureza, que deveria completar o segundo livro de O Mundo como Vontade e Representação. Na mesma época, redigiu também dois ensaios sobre moral. O primeiro, escrito para concorrer a um concurso da Academia de Ciências de Trondheim ([[Noruega]]), intitula-se [[Sobre a Liberdade da Vontade]]. O segundo, O Fundamento da Moral, concorreu ao concurso da Academia de Copenhague e continha verdadeiros insultos a [[Hegel]] e a [[Fichte]], que provocaram escândalo; embora fosse o único concorrente, o livro não foi premiado. Posteriormente, os dois ensaios seriam reunidos sob o título de Os Dois Problemas Fundamentais da Ética e publicados em 1841. Três anos depois, surgiu a segunda edição de O Mundo como Vontade e Representação, enriquecida com alguns suplementos. Apesar disso, não teve sucesso.
 
O mesmo não ocorreu com a última obra escrita e publicada por Schopenhauer. Intitulava-se [[Parerga e Paralipomena]] e continha pequenos ensaios sobre os mais diversos temas: política, moral, literatura, filosofia, estilo e metafísica, entre outros. A obra alcançou inesperado sucesso, logo depois de ser publicada em 1851. A partir daí, a notoriedade do autor espalhou-se pela Alemanha e depois pela Europa. Um artigo de Oxford, publicado na Inglaterra, deu início à grande difusão de sua filosofia. Na França, muitos filósofos e escritores viajaram até Frankfurt para visitá-lo. Na Alemanha, a filosofia de Hegel entrou em declínio e Schopenhauer surgiu como ídolo das novas gerações.
 
Assim, os últimos anos da vida de Schopenhauer proporcionaram-lhe um reconhecimento que ele sempre buscou. Artigos críticos surgiram em grande quantidade nos principais periódicos da época. A [[Universidade de Breslau]] dedicou cursos à análise de sua obra e a [[Academia Real de Ciências de Berlim]] propôs-lhe o título de membro, em 1858, que ele recusou.
 
Dois anos depois, a 21 de setembro de 1860, Arthur Schopenhauer, que Nietzsche (1844 – 1900) chamaria "o cavaleiro solitário", faleceu, vítima de [[insuficiência cardíaca]]. Contava, então, com 72 anos de idade.<ref>''Schopenhauer: his life and philosophy''.H Zimmern – 1932 – G. Allen & Unwin ltd</ref>
 
=== Pensamentos políticos e sociais ===
==== Pensamentos sobre as mulheres ====
No "Ensaio de Schopenhauer acerca das mulheres" de 1851<ref>{{citecitar web |url=http://geocities.com/c_ansata/wom.html |titletítulo=? |archiveurl arquivourl= http://web.archive.org/web/20091027102704/http://geocities.com/c_ansata/wom.html |archivedate arquivodata= 27 de Outubro de 2009}}{{dead link|datedatali=Outubro de 2010}}</ref> ("''Of Women''", "''Über die Weiber''", [[s:Ensaio Acerca das Mulheres|texto completo]]), ele expressou sua oposição ao que chamou de "estupidez germano-cristã" sobre questões femininas. Ele argumentou que "está na natureza da mulher obedecer" e se opôs ao poema em honra das mulheres de [[Friedrich Schiller]], "Dignidade das Mulheres" ("''Dignity of Women''"). O ensaio oferece dois elogios, no entanto: "as mulheres são decididamente mais sóbrias nos seus julgamentos que os [homens] são" e são mais simpáticas aos sofrimentos alheios.
 
As escritas controversas de Schopenhauer influenciaram várias pessoas, de [[Friedrich Nietzsche]] às [[feminismo|feministas]] do [[século XIX]].<ref>''Feminism and the Limits of Equality''
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Portanto, o mundo que percebemos é uma construção mental; os nossos sentidos recebem comprimentos de ondas do mundo exterior (input), que não são vermelhas ou verdes em si, e então nosso cérebro (entendimento) trabalha para traduzi-las em cores, formas etc...(output). O mesmo ocorrendo com sons, tato etc (no caso do som, o cérebro traduz ondas sonoras em sons).
Porém, tal construção não se dá de forma aleatória e desordenada, ela tem como a priori três fatores do entendimento: Espaço, Tempo e Causalidade.
O espaço e o tempo são como "óculos do entendimento" através da qual percebemos o mundo.
Já o mundo "fora de nossas representações cognitivas" ou "mundo exterior" seria a Vontade. A Vontade, portanto, está além do espaço e tempo e não é regida por causalidade, daí Schopenhauer dizer que a essência do mundo é "irracional" pois não segue o princípio de Razão.
Quando a Vontade passa pelos sentidos, e sofre os processos descritos na definição de representação citada acima, torna-se o mundo que vemos em nossa volta. Logo, na filosofia schopenhauriana, não há distinção entre Sujeito (ser que percebe) e objeto (Vontade representada), pois o próprio sujeito, seu corpo, seus pensamentos e sentimentos também são Vontade objetivada.
A Vontade atinge seu mais alto grau da consciência humana, quando então ela pode contemplar a si mesma como representação, pode ver a si mesma como num espelho.
 
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Para superar o sofrimento é necessário o reconhecimento de que há somente uma Vontade, independente, livre e essência do Universo. Há a mesma Vontade em um leão, num ser humano ou numa pedra.
 
Isto de certa forma diminuí um pouco o famoso "pessimismo" de Schopenhauer, pois ele abre a oportunidade de cada ser libertar-se das amarras da Representação. A essência da realidade (Vontade) é o próprio cerne do sujeito, o ser humano, então, leva dentro de si a chave que lhe permite ver a unidade dos fenômenos.
Para isto, o ser humano deve contemplar a si mesmo, reconhecer-se como Vontade e notar que sua vida é apenas uma sequencia de fenômenos representados que nada tem a ver com a essência do Ser.