São João Batista no Cárcere: diferenças entre revisões

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{{Info/Obra de arte/Wikidata}}
{{Wikipédia falada|Audio file of São João Batista no Cárcere.oga|22 de novembro de 2017}}
A obra '''São João Batista no Cárcere''' foi um quadro religioso pintado por [[Victor Meirelles]] em [[1852]] a pedido da Academia Imperial de Belas Artes para concorrer ao 7º Prêmio de Viagem Internacional.<ref name=":1" /> A pintura que lhe rendeu oito anos no exterior, é feita de óleo sobre tela, uma técnica que surgiu na Europa no fim da Idade Média como arte doméstica e tornou-se um símbolo das obras modernas.<ref>http://opei.unellez.edu.ve/archivos/cpo.pdf</ref> Com dimensões de 88,7 por 105,9 cm, esta produção neoclássica contrastou com as pinturas que Meirelles realizava até então: paisagens urbanas de sua cidade natal, Desterro. A obra funcionou como um instrumento de evangelização em uma época em que o pintor identificado com a Monarquia trabalhava para a corte portuguesa ajudando no processo de civilização brasileiro <ref name=":1" /> por meio de imagens-arquétipo.<ref name=":6" />
 
Dessa forma, a pintura segue os valores tradicionais arraigados da Academia<ref name=":8">http://www2.eca.usp.br/cap/ars6/chiarelli.pdf</ref> e a composição estética retrata o evento da forma mais fidedigna possível aos fatos, atentando-se ao cenário e personagem,<ref name=":3">https://periodicos.ufsc.br/index.php/esbocos/article/viewFile/447/9907</ref> fazendo uma releitura do movimento clássico que retomava os ideais greco-romanos: perfeição, harmonia, rigor e ordem.<ref name=":4">https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/105436/Cassia%20Aline%20Schuck.pdf?sequence=1</ref> O artista brasileiro aproximava seus trabalhos da produção europeia: sistematizando padrões de beleza utilizando racionalmente as formas e proporções geométricas<ref name=":1">http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/252037/1/Bezerra_CarolinaCavalcanti_M.pdf</ref> e repleta de detalhes.<ref name=":2">http://www.fernandoboppre.net/wordpress/wp-content/uploads/2009/01/victormeirelles_aspartes_dc_fernandocboppre.pdf</ref>
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== Victor Meirelles ==
O retratista, professor e pintor <ref name=":0">https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/89850/247607.pdf?sequence=1&isAllowed=y</ref> Victor Meirelles de Lima nasceu em 18 de agosto de 1832 em Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis em Santa Catarina, uma região calma, mas importante geograficamente pelo quesito fronteira.<ref name=":20">http://www.acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/21117/DISSERTACAO%202009%20-%20Versao%20Final.pdf?sequence=1</ref> Filho do comerciante português Antônio Meirelles de Lima e da brasileira Maria Conceição Prazeres, <ref name=":6">http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/252037/1/Bezerra_CarolinaCavalcanti_M.pdf</ref> foi um artista acadêmico representante do neoclassicismo com alguns traços do romantismo que pintava sobre a história brasileira por meio de retratos de heróis e fatos famosos.<ref>http://nexos.ufsc.br/index.php/sceh/article/viewFile/518/174</ref> A favor da Monarquia, Meirelles viveu na transição entre este período e a República e manteve-se artista da corte até o fim do Império. Considera-se que o retratista teve 5 fases artísticas ao longo da vida relacionadas com o seu deslocamento físico: fase catarinense (1832-1846), escolar (1847-1853), Prêmio de Viagem (1853-1861), plenitude (1861-1890) e fase final (1890-1903).<ref name=":0" /> O professor catarinense faleceu aos 71 anos em 20 de fevereiro de 1903 no Rio de Janeiro, um domingo de carnaval, por motivos de saúde deixando a esposa Rosália, que veio a óbito no final do mesmo ano.<ref name=":23">https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/105436/Cassia%20Aline%20Schuck.pdf?sequence=1</ref>
 
=== Vida artística ===
Victor Meirelles, em 1843, iniciou seu estudo das línguas francês e latim com o padre Joaquim Gomes d'Oliveira, assim como de filosofia.<ref>https://www.ebiografia.com/victor_meirelles/</ref> Em relação à arte, seu estudo começou em 1945, lecionado pelo engenheiro e imigrante argentino Marciano Moreno, que havia sido contratado por seus pais uma vez que a cidade natal não possuía escolas voltadas para as artes plásticas. O conteúdo se fundamentava sobre os desenhos geométricos.<ref name=":1" />
 
Ainda menino, com apenas 14 anos de idade e gosto pela arte, enviou duas pinturas autorais à direção da Academia Imperial de Belas Artes (AIBA) que foram selecionadas para a Exposição Geral da organização que ocorreu em dezembro de 1846. Com tal reconhecimento, o garoto foi convidado a estudar nesta famosa escola da época que reunia jovens promessas do universo das artes plásticas. Como a Academia ficava no Rio de Janeiro, ele se mudou para a cidade em 1847 <ref name=":2" /> com o apoio de alguns amigos da família e do Conselheiro Jerônimo Francisco Coelho que arcaram com as despesas da viagem <ref name=":21">http://anpap.org.br/anais/2008/artigos/014.pdf</ref> e matriculou-se na escola onde realizou os seus primeiros trabalhos acadêmicos. Lá suas obras passaram a ter caráter histórico visando a construção de uma identidade nacional.
 
Em 1849, Meirelles se inscreveu na matéria de pintura histórica a qual cursou por 3 anos tendo como mestre o pintor José Correia de Lima.<ref name=":3" /> Em 1852, o pintor concorreu ao 7º Prêmio de Viagem ao Exterior apresentando a obra em questão São João Batista no Cárcere, a qual lhe rendeu a vitória e o prêmio <ref name=":1" /> de uma viagem a Europa no ano seguinte subsidiada pelo governo brasileiro, decolando para a Itália em 10 de abril de 1853.<ref name=":3" /> Nos 8 anos que permaneceu no exterior, teve contato com Tommaso Minardi (1787-1871), Nicola Consoni (1814-1884) em Roma - onde permaneceu por 4 anos <ref name=":7">http://www.cbha.art.br/coloquios/2012/anais/pdfs/artigo_s2_anacavalcanti.pdf</ref> - e Leon Cogniet (1794-1880), Andrea Gastaldi (1810-1889) em Paris por meio das aulas na École Superiéure des Beaux-Arts (Escola Superior de Belas Artes) - onde ficou até 1861.<ref name=":22">http://www.portal.fae.ufmg.br/pensareducacao/portal/view/files/Victor.pdf </ref> Neste período em que o artista esteve na Europa, a pintura resumia-se em duas tendências: Neoclassicismo - retomada da arte greco-romana seguindo padrões de clareza, proporção e equilíbrio e Romantismo - ruptura com o racionalismo iluminista.<ref name=":2" />
 
Influenciado, principalmente, pelo primeiro movimento, Victor Meirelles enviou ao Brasil trabalhos próprios de desenhos e pintura à óleo para comprovar sua aplicação nos estudos.<ref name=":3" /> Regressou à pátria em 1861 onde, após um ano, foi eleito professor de pintura histórica e paisagem da Academia. De 1869 a 1872, o artista fez dois quadros famosos Passagem de Humaitá e Batalha de Riachuelo. Em 1872, expôs a Batalha dos Guararapes durante a Exposição Geral de Belas Artes.<ref name=":4" /> Tais obras citadas acima produzidas no regime de D. Pedro II reforçaram a ideia de uma identidade nacional. Por fim, em 1886, ele decide focar na pintura de panoramas pintando 3: O Panorama do Rio de Janeiro junto de H. Langerock, A Entrada da Esquadra legal no Porto do Rio de Janeiro e Descobrimento do Brasil, <ref name=":3" /> adotando no país uma modernidade relacionada às Exposições Universais.<ref name=":0" />
 
=== Obras ===
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=== Curiosidades ===
Victor Meirelles também redigiu um texto “II Exposição Nacional” sobre a presença da fotografia no evento que ocorreu em 1866 na cidade do Rio de Janeiro. O primeiro relato sobre esta máquina escrita no Brasil e, possivelmente, na língua portuguesa alega o importante papel da fotografia para as artes e ciências, estando a serviço destas.<ref name=":8">http://www2.eca.usp.br/cap/ars6/chiarelli.pdf</ref>
 
O Museu Nacional de Belas Artes/IPHAN localizado no Rio de Janeiro conta com cerca de mil obras de Meirelles desde estudos realizados pelo pintor até seus desenhos sobre o papel e as pinturas.<ref>http://www.fernandoboppre.net/wordpress/wp-content/uploads/2009/01/victormeirelles_aspartes_dc_fernandocboppre.pdf </ref>
 
O Museu Victor Meirelles foi aberto em 1952 no centro de Florianópolis,<ref name=":5">http://museuvictormeirelles.museus.gov.br/o-museu/historico/</ref> após ser tombada como Patrimônio Histórico Nacional, <ref name=":2" /> no local que havia sido a moradia do catarinense.<ref name=":5" /> O pontapé inicial se deu durante a Semana de Arte Moderna de 1922 a fim de proteger e preservar patrimônios nacionais. Depois de 1994, o lugar tornou-se um centro cultural com diversos projetos como “Museu vai à escola/Escola vai ao Museu”, o qual diz respeito aos alunos de ensinos públicos.<ref name=":2" /> Atrelado ao Instituto Brasileiro de Museus do Ministério da Cultura, o estabelecimento persiste há mais de 55 anos expondo as coleções do artista assim como apresentações culturais no local com o cenário preservado da casa do artista construída entre os séculos XVIII e XIX.<ref name=":5" />
 
== Contexto histórico ==
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== Academia Imperial de Belas Artes ==
{{AP|Academia Imperial de Belas Artes}}
Criada em 1826 por Dom João VI e fundada por artistas franceses, <ref name=":1" /> a Academia Imperial de Belas Artes (AIBA) marcou o desenvolvimento neoclássico no Brasil, <ref name=":24">http://www.acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/3948/consuelo_final.pdf?sequence=1</ref> baseando-se na Academia Francesa.<ref name=":9">http://www.ufjf.br/virtu/files/2010/05/artigo-7a23.pdf</ref> Dessa forma, a influência iluminista objetivava civilizar a cidade por olhares europeus <ref name=":3" /> - tanto dos franceses quanto da elite monárquica portuguesa, ou seja, usar a arte com a função pedagógica <ref name=":7" /> por meio da criação de símbolos e alegorias.<ref name=":6" />
 
Através da imagem, a corte escolhia os fatos que pretendia gravar na memória da população, assim como os valores e virtudes de uma boa sociedade, além de impedir o surgimento de outros pontos de vista não oficiais, sendo fonte de um controle social na construção da memória dos cidadãos acerca do passado. Mantendo os ideais do Império, a Academia fomentou o progresso artístico no país exigindo uma técnica primorosa e um desenho rigoroso, <ref name=":9" /> primeiramente, copiando outras obras europeias enfatizando o estudo da perspectiva e formas geométricas. Com o passar dos anos, introduziram às obras da Academia os aspectos anatômicos, arquitetônicos, cores, efeitos de luz e sombra, prezando pela simetria.<ref name=":6" /> A escola também sofreu influência da fotografia, agregando as suas pinturas objetividade, perfeição e potencialidade que aquela garantia.<ref name=":8" />
 
Somente alunos de destaque no ramo artístico tinha acesso a Academia <ref name=":6" /> e alguns artistas neoclássicos como Jacques Luis David (1748-1825) se rebelaram contra as suas imposições. Embora a rigidez de sua ideologia, ela não se manteve estática diante das mudanças sociais da época. Contudo, tais alterações não previam afrouxar o controle da mesma, mas ao contrário, adaptar suas narrativas com o intuito de ser útil para a corte monárquica: promovendo o projeto civilizador. A Academia fechou em 1889.<ref name=":1" />
 
== Prêmio de Viagem ao Exterior ==
O Prêmio de Viagem ao Exterior oferecido pela Academia Imperial de Belas Artes tinha o papel estratégico de permitir aos melhores alunos da escola a oportunidade de aprender com grandes mestres das artes plásticas para basearem suas obras nestes novos ensinamentos e modelos europeus. Regulamentado na gestão de Félix Émile Taunay durante o Segundo Reinado, o concurso virou realidade em 1844 <ref name=":11">http://www.scielo.br/pdf/ts/v17n1/v17n1a14</ref> e tornou-se a prova máxima da instituição para aplicar em seus discípulos.
 
A posição de primeiro lugar permitia aos artistas uma viagem à Europa com duração média de 3 anos <ref name=":10" /> e pensão totalmente custeada pelo governo brasileiro, principalmente para Roma, na Itália por ser o berço do classicismo até 1855, quando o destino passou a ser Paris, na França que reunia as instituições artísticas mais consagradas da época - a exemplo da ''École des Beaux-Arts'' (EBA). Esta escola francesa realizava apenas duas provas de admissão por ano (em março e agosto) que incluíam várias etapas e somente os profissionais premiados através desse concurso adentravam a instituição sem necessitar participar destas etapas. Entendia-se que os medalhistas possuíam conhecimento prévio de anatomia, eram habilidosos nos seus traços, falavam o básico de francês e tinham noção básica da história do país.<ref name=":11" />
 
No exterior, o pintor estudava em ateliês renomados e, com o passar de cada ano, era mais cobrado pelos seus resultados, necessitando enviar seus trabalhos para o Brasil a fim de serem avaliados pelos profissionais da Academia. Este julgamento garantiria ou não o pagamento da pensão deste aluno por mais um período. As obras vencedoras dos concursos encontram-se no acervo da Academia e o quadro de Victor Meirelles São João Batista no Cárcere é um dos destaques.
 
== São João Batista ==
{{AP|São João Batista}}
Filho do sacerdote Zacarias e de Isabel (filha de Arão),<ref name=":17">http://www.febnet.org.br/wp-content/uploads/2012/06/Mod-2-Rot-3-Joao-Batista-o-precursor1.pdf
</ref> São João Batista era primo de Jesus. Sua história é contada no Evangelho de São Lucas e remete a um encontro entre as irmãs Isabel e Maria enquanto grávidas de João e Jesus respectivamente que fez com que aquele nascesse sem o pecado original, uma vez que Maria carregava o Salvador e era livre de pecados. Quando adulto e percursor de Jesus foi responsável por abir o caminho para o Senhor.<ref name=":18">http://www.ipascomnet.com/paroquia/inc.download/23112010053811O_PRECURSOR.PDF
</ref> Vivendo no deserto e se preparando para sua missão, São João Batista aguardava o momento de aparecer para o povo de Israel. Enquanto isso, narra a história que o homem amadurecia espiritualmente, sendo exemplo ao pregar penitências e agir de boa fé.<ref name=":17" /> O santo foi responsável por iniciar a era evangélica, sendo o último profeta enviado por Deus a fim de reforçar os mandamentos divinos.<ref name=":18" /> Por fim, São João Batista faleceu pelo mesmo ideal pelo qual viveu.<ref name=":17" />
 
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O Museu Paulista ou Museu do Ipiranga é responsável por guardar esta obra de Victor Meirelles. Criado em 1893 e aberto em 1895, o local engloba artifícios históricos nacionais. Estruturado no espaço em que Dom Pedro I declarou a Independência do Brasil, o museu arquitetado como um palácio encontra-se fechado atualmente (2017).<ref>http://mp.usp.br/sites/default/files/as_margens_do_ipiranga.pdf</ref>
 
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==Ver também==