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'''Quintino de Lacerda''' ([[Itabaiana (Sergipe)|Itabaiana]][[1955|, 1955]] - [[Santos]], [[10 de agosto]] de [[1898]]) foi um ex-escravo que se tornou herói abolicionista, líder do [[Quilombo do Jabaquara]], primeiro vereador negro do Brasil e recebeu a patente de Major honorário do [[Exército Brasileiro|Exército Nacional]].
 
Primeiro líder político negro de Santos, participou ativamente de, pelo menos, dois grandes eventos nacionais: a [[Revolta da Armada]] e o processo de desestruturação do sistema escravista no Brasil,<ref name=":0">{{citar web|url=http://www.historia.uff.br/stricto/td/1488.pdf|titulo=http://www.historia.uff.br/stricto/td/1488.pdf|data=2011|acessodata=17/11/2017|publicado=|ultimo=Pereira|primeiro=Matheus}}</ref>, considerado o mais atuante fomentador da abolição no litoral paulista.<ref>{{citar web|url=http://www.santos.sp.gov.br/?q=noticia/897570/oito-personalidades-receber-o-nesta-quinta-25-medalha-quintino-de-lacerda|titulo=Oito personalidades receberão nesta quinta (25) a medalha Quintino de Lacerda|data=|acessodata=|publicado=|ultimo=|primeiro=}}</ref>
== Biografia ==
 
Quintino de Lacerda nasceu escravo em 1855, na cidade serrana de [[Itabaiana (Sergipe)|Itabaiana]], em [[Sergipe]]. Vendido como escravo aos 19 anos por seu senhor, Major Antonio dos Santos Leite, para [[Santos]]<ref name=":3">Lima, Zózimo. "Quintino Lacerda." ''Revista da Academia Sergipana de Letras'' 1.12 (2017).</ref> durante o crescimento do comércio interno de escravos entre as províncias do país após a proibição do comércio atlântico, foi escravo de ganho doméstico - cozinheiro - de Joaquim e Antônio Lacerda Franco.<ref name=":0" />. Inteligente, ativo, dócil e simpático, afeiçoou-se à família de seu novo senhor, de quem adotou o sobrenome e com suas filhas estudou os rudimentos da leitura e da escrita, conseguindo, após 8 anos de serviços como escravo, a carta de alforria.<ref name=":3" />
 
Sua influência e poder de sedução eram tão grandes, seu nome tão querido e respeitado, que os abolicionistas da cidade, não podendo mais conter em suas casas o crescente número de negros fugidos das fazendas, dirigiram-se a sua figura, por intermédio de Lacerda Franco, para que Quintino organizasse e assumisse o comando do reduto estabelecido nas matas do Jabaquara.<ref name=":3" /> Quintino de Lacerda tornou-se, nas duas últimas décadas do século XIX no Brasil, uma figura central nos movimentos sociais e debates políticos que surgiam nesses agitados anos.<ref name=":1">{{citar web|url=http://anais.anpuh.org/wp-content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S25.0976.pdf|titulo=A difícil viagem: do navio negreiro à cidadania.|data=2009|acessodata=17/11/2017|publicado=Universidade Federal Fluminense|ultimo=Pereira|primeiro=Matheus Serva}}</ref><blockquote>"Assim, durante os dez anos posteriores à aprovação da Lei Áurea, a população de cor santista conclamara Quintino de Lacerda como figura central para o sucesso de seus anseios."<ref>{{citar periódico|ultimo=Pereira|primeiro=Matheus Serva|data=2016|titulotítulo=Em busca da cidadania: ex-escravos, negros, imigrantes e disputas por terra e trabalho no Jabaquara (Santos, 1880-1900)|url=|jornal=Revista África(s), v. 03, n. 06, p. 106-130, jul./dez. 2016|volume=|via=}}</ref></blockquote>
negros, imigrantes e disputas por
terra e trabalho no Jabaquara
(Santos, 1880-1900)|url=|jornal=Revista África(s), v. 03, n. 06, p. 106-130, jul./dez. 2016|volume=|via=}}</ref></blockquote>
 
== Líder do Quilombo do Jabaquara ==
Chefe do [[Quilombo do Jabaquara]], garantiu abrigo a escravos fugitivos de toda a região do planalto, que em Santos buscavam defesa. Assumiu a função de comandar arriscadas fugas e chefiar os escravos, atingindo o auge de suas ações abolicionistas em 1888.<ref name=":0" /> [[Antônio da Silva Jardim]], famoso republicano radical, chegou a atribuir o sucesso do Quilombo à Quintino de Lacerda em seu livro ''Memórias e viagens (1891)'' "Era aí que se achava o célebre quilombo do Jabaquara, protegido pela população, ao qual muitos comerciantes forneciam mantimentos, a pedido do chefe negro Quintino de Lacerda".
 
O Quilombo do Jabaquara, na descrição de [[Antônio da Silva Jardim|Antonio da Silva Jardim]], era verdadeiramente intransponível, defendido pelas encosta do morro do Jabaquara e com um único caminho de acesso permanentemente guardados por sentinelas de Quintino.<ref name="Quintino de Lacerda">[http://www.afrodescendente.com.br/quintino_lacerda.htm Quintino de Lacerda] ''Afrodescendentes''.</ref> Os 2023 cativos que habitavam o quilombo do Jabaquara vieram as ruas dia 13 de maio de 1888, quando o decreto que extinguia o cativeiro chegou a [[Santos]], cidade que considerava, desde 1886, abolida a escravidão de seu território. <ref name=":3" /> Dez dias de festas populares, passeatas e luminárias sucederam aquele 13 de maio. Quintino recebeu homenagens por parte das comissões organizadoras dos festejos e foi considerado ídolo do povo santista.
 
Quintino de Lacerda era um personagem interessante e contraditório. Foi célebre em Santos, ocupando o noticiário dos jornais e recebendo elogios das autoridades. Ao mesmo tempo em que defendia os direitos dos negros libertos, principalmente o de permanecer nas terras do quilombo após a abolição, Quintino era cooptado pelas elites locais, que se utilizavam de seus serviços e aproveitavam de sua liderança sobre os negros, assim como muitos negros revertiam em proveito próprio a influência e moral que o abolicionista dispunha.<ref name=":3" />..<ref name=":2">{{citar web|url=https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/view/2205/1311|titulo=A IMPRENSA NA CIDADE DE SANTOS: 1849-1930|data=2007|acessodata=17/11/2017|publicado=Projeto História|ultimo=Alves|primeiro=Alexandre}}</ref>
 
Apesar de sua conduta controversa, que misturava aparente submissão a brancos com atitudes de proteção aos escravos que chegavam a Santos, o ex-escravo sergipano tornou-se respeitado entre negros e brancos pela sua valentia, fosse nos conflitos com autoridades que perseguiam cativos fugitivos em plena serra do Mar, fosse em brigas na rua para defender homens da elite a ele associados<ref>DA CUNHA, PEDRO FIGUEIREDO A. "CAPOEIRAS E VALENTÕES EM SÃO PAULO: MEDO E PERSEGUIÇÃO NO PÓS-ABOLIÇÃO."</ref><blockquote>"Exatamente por viver as duas experiências, de escravo e liberto, e os dois momentos, o anterior e o posterior a esse marco cronológico, sambando de um lado para o outro entre imigrantes, homens poderosos, escravos e ex-escravos, é que Quintino de Lacerda proporciona a oportunidade de discutir temas ligados às possibilidades de cidadania para a população oriunda do cativeiro, como os embates em relação à ocupação do Jabaquara e a participação política dos ex-quilombolas do Jabaquara na cidade de Santos após a proclamação da Abolição e da República."<ref name=":4">Pereira, Matheus Serva. "Em busca da cidadania: ex-escravos, negros, imigrantes e disputas por terra e trabalho no Jabaquara (Santos, 1880-1900)." ''África (s)-Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos Africanos, Povos Indígenas e Culturas Negras-PPGEAFIN.'' 3.6 (2016).</ref></blockquote>
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== Vida política ==
Durante o mesmo período, lança-se à luta política, incorporando, pela primeira vez, os negros ao processo político na cidade. Amigo do abolicionista [[Antônio da Silva Jardim|Antonio da Silva Jardim]] e do governador Bernardino de Campos, Quintino foi a ponte entre a elite branca e os negros libertos em Santos. Foi eleito vereador da Câmara Municipal em 1895, mas impedido de tomar posse pelos outros vereadores, que se negavam a compartilhar o poder com um negro. Sua eleição faz eclodir uma grande crise política fomentada pelos setores racistas. <ref name=":2" /> A batalha judicial que se segue chega aos tribunais paulistanos, e termina com a vitória de Quintino. Prevendo o desfecho em favor do líder negro, o presidente da Câmara, Manoel Maria Tourinho, renunciou ao mandato, seguido pelo vereador Alberto Veiga. O novo presidente, José André do Sacramento Macuco, foi obrigado a empossar Quintino. <ref name="Quintino de Lacerda" /><blockquote>"Suas ações na década de 1890 demonstram como a campanha abolicionista e o capital simbólico adquirido por aqueles indivíduos que lutaram em prol da causa permaneceram sendo acionados nos jogos políticos que vieram a ser desenhados durante o pós-abolição."<ref name=":4" /></blockquote>
 
== Morte ==
Morreu em 10 de agosto de [[1898]]. Seu enterro foi acompanhado por um grande número de pessoas, um testemunho do reconhecimento de sua importância histórica; seus restos mortais estão sepultados na Campa n.º 42, localizada no Jazigo da I.S.B. Irmandade São Benedito, no cemitério municipal do Paquetá, localizado na cidade de Santos/SP.<ref name="Quintino de Lacerda" />.
 
Com sua morte, Quintino de Lacerda deixou órfão três filhos, Alzira, com 13 anos, Arcelino, com 12 anos, e Sabina, com 7 anos. Quintino teve, ao todo, quatro filhos. Porém seu filho Januário faleceu com 8 anos antes da morte de Quintino. Sua esposa, Maria Isidora de Sousa, havia falecido exatamente um ano antes, no dia 20 de agosto de 1897.<ref name=":0" /> Homem bem relacionado, morreu rico, deixando extensa lista de bens, móveis e imóveis para seus herdeiros, incluindo um pequeno tesouro amealhado em jóias de ouro e moedas de prata.<ref>{{citar web|url=http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/bitstream/123456789/881/1/SILVA,%20E.%20-%20As%20camelias%20do%20Leblon%20e%20a%20abolicao%20da%20escravatura.pdf|titulo=As camélias do Leblon e a abolição da escravatura|data=|acessodata=17/11/2017|publicado=Fundação Casa de Rui Barbosa|ultimo=Silva|primeiro=Eduardo}}</ref>
 
Seu nome também foi lembrado em sua terra natal, onde denominaram uma artéria pública com seu nome no centro da cidade (Rua Quintino de Lacerda) e reconheceram-no pelo seu legislativo municipal, como Herói Negro de Itabaiana, considerando o 8 de junho como o ''Dia Municipal de Luta da Consciência Negra'' em sua homenagem gravada em 20 de setembro de 2001.<ref name="Quintino de Lacerda" />
 
== Medalha Quintino de Lacerda ==
A resolução da Prefeitura de Santos nº99/2000, de 8 de junho de 2000 decreta a criação da medalha Quintino de Lacerda, a ser concedida anualmente a três pessoas físicas e três pessoas jurídicas que tenham merecido a distinção, pela relevância do seu trabalho em defesa da integração racial, solidariedade e fraternidade, em quaisquer área de atividade. A medalha é entregue desde 2000, no dia 13 de maio, na sala Princesa Isabel.
 
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