Califado de Córdova: diferenças entre revisões

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|ano_fim = 1031
|evento_início = Abderramão proclama-se Califa
|evento_fim = [[Fitna do Al-AndalusAlandalus]]
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|bandeira_s1=Reinos de Taifas 1080.png
}}
O '''Califado de Córdova''' ([[929]][[1031]]) foi a forma de governo [[Islão|islâmico]] que dominou a maior parte da [[Península Ibérica]] e do [[Norte de África]] com capital em [[Córdova (Espanha)|Córdova]]. O Califado sucedeu ao [[Emirado de Córdova|Emirado Independente]] instaurado por [[{{lknb|Abderramão |I]]}} em [[756]]. O título de [[califa]] foi reclamado por [[{{lknb|Abderramão |III]]}} a [[16 de Janeiro]]janeiro de [[929]], que já era reconhecido como [[emir]] de Córdova. Todos os califas de Córdova foram membros da [[Omíadas|dinastia omíada]], a mesma que detinha o título de emir de Córdova e governava praticamente o mesmo território desde [[736]].
 
O Califado de Córdova foi a época de máximo esplendor político, cultural e comercial de [[AlAlandalus]]. O Califado perdurou oficialmente até 1031, ano em que foi abolido, após um [[Guerra Civil no Alandalus|período de revoltas]], fragmentando-Andalusse em múltiplos reinos conhecidos como [[Taifa]]s.
 
O Califado perdurou oficialmente até [[1031]], ano em que foi abolido, após um [[Guerra Civil no Al-Andalus|período de revoltas]], fragmentando-se em múltiplos reinos conhecidos como [[Taifa]]s.
 
== Proclamação do Califado ==
A partir de [[912]], o novo emir Abderramão III empreendeu a tarefa de reduzir os múltiplos focos rebeldes que surgiram no Emirado desde meados do [[século IX]]. Em 913 iniciou a [[campanha de Monteleón]], que conseguiu recuperar numerosos castelos e sufocar a rebelião na Andaluzia Oriental. Durante os anos seguintes recuperou [[Sevilha]] e efetuou as primeiras [[razia]]s contra os reinos cristãos do norte. Derrotou um exército de [[Reino de Leão|Leão]] e [[Reino de Navarra|Navarra]] na [[batalha de Valdejunquera]] ([[920]]); saqueou [[Pamplona]] em [[924]] e submeteu os [[Banu Qasi]] esse mesmo ano. Finalmente, em [[928]] ocupou a fortificação de [[Bobastro]] através de uma série de campanhas iniciadas em [[917]], terminando assim com a rebelião iniciada por [[Omar ibn Hafsun]], o derradeiro foco de rebeldia no Al-AndalusAlandalus. Em [[929]] tomou o título de [[califa]] com o apelido ''Nasir li-din Allah'', ''aquele que faz triunfar a religião de Deus''.
 
Abderramão III justificou a sua autoproclamação como [[califa]], ou seja, como chefe político e religioso dos muçulmanos e sucessor de [[Maomé]], baseando-se em quatro feitos: ser membro da tribo de [[Quraysh]] a que também pertencia [[Maomé]], ter liquidado as revoltas internas, freado as ambições dos núcleos cristãos do norte peninsular, e criado o [[Califado Fatímida]] na [[África do Norte]], oposto aos califas [[Abássidas]] de [[Bagdade]]. A proclamação tinha um duplo propósito: por um lado, no interior, os [[Omíadas]] iriam reforçar a sua posição; por outro, no exterior, visando consolidar as rotas marítimas para o comércio no [[Mediterrâneo]], garantia as relações econômicas com o [[Império Bizantino]] e assegurava o fornecimento de ouro.
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== Apogeu do Califado ==
[[Ficheiroimagem:Gran portico.jpg|thumb|200px|Alcácer de [[Medina Azahara]].]]
[[Ficheiroimagem:Castillo de Gormaz.jpg|thumb|200px|O [[Castelo de Gormaz]]]]
Os reinados de [[Abderramão III|Abd-al-Rahman III]] ([[929]]-[[961]]) e o seu filho [[al-Hakam II]] ([[961]]-[[976]]) constituem o período de apogeu do califado omíada, em que se consolida o aparato estatal cordovês.
 
Os reinados de [[{{lknb|Abderramão III|Abd-al-Rahman III]]}} ([[{{nwrap|r.|929]]-[[|961]])}} e o seu filho [[al-Hakam {{lknb|Aláqueme|II]]}} ([[{{nwrap|r.|961]]-[[|976]])}} constituem o período de apogeu do califado omíada, em que se consolida o aparato estatal cordovês.
Para alicerçar o aparato estatal, os soberanos recorreram a oficiais fiéis à dinastia Omíada, configurando uma aristocracia palaciana de ''[[fata'ls]]'' (escravos e libertos de origem europeia), cujo poder civil e militar foi progressivamente aumentando, suplantando assim a aristocracia de origem árabe. No exército incrementou especialmente a presença de contingentes berberes, devido à intensa política do Califado no Magrebe. Abd-al-Rahman III submeteu os senhores feudais, os quais pagavam tributos ou serviam no exército, contribuindo para o controlo fiscal do Califado.
 
Para alicerçar o aparato estatal, os soberanos recorreram a oficiais fiéis à dinastia Omíada, configurando uma aristocracia palaciana de ''[[fata'ls]]'' (escravos e libertos de origem europeia), cujo poder civil e militar foi progressivamente aumentando, suplantando assim a aristocracia de origem árabe. No exército incrementou especialmente a presença de contingentes berberes, devido à intensa política do Califado no Magrebe. Abd-al-RahmanAbderramão III submeteu os senhores feudais, os quais pagavam tributos ou serviam no exército, contribuindo para o controlo fiscal do Califado.
As campanhas militares consolidaram o prestígio dos omíadas fora de Al-Andalus e visavam garantir a segurança das rotas comerciais. A política exterior concentrou-se em três direções: os reinos cristãos do norte peninsular, o norte da África, e o Mediterrâneo.
 
As campanhas militares consolidaram o prestígio dos omíadas fora de Al-AndalusAlandalus e visavam garantir a segurança das rotas comerciais. A política exterior concentrou-se em três direções: os reinos cristãos do norte peninsular, o norte da África, e o Mediterrâneo.
 
=== Relações com os reinos cristãos ===
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=== Relações com o Magrebe ===
A política cordovesa no [[Magrebe]] foi igualmente intensa, particularmente durante o reinado de al-HakamAláqueme II. Na África, os [[omíadas]] enfrentaram o [[Califado Fatímida]], que controlavam cidades como [[Tahart]] e [[Sijilmassa]], pontos fundamentais das rotas comerciais entre a África subsaariana e o Mediterrâneo, se bem que este confronto não foi direto: os omíadas apoiaram-se nos [[zanatas]] e nos [[idríssidas]], e o Califado Fatímida nos [[ziridas]] e [[sinhaia]].
 
Eventos importantes foram a ocupação de [[Melilha]], [[Tânger]] e [[Ceuta]], ponto donde se podia impedir o desembarque fatímida na Península. Após a tomada de Melilha em 927, em meados do {{séc|X}}, os omíadas controlaram o triângulo formado por [[Argel]], Sijilmassa e o [[oceano Atlântico]], enquanto promoviam revoltas que chegaram a pôr em perigo a estabilidade do Califado Fatímida.
 
Contudo, a situação mudou após a ascensão de [[Almuiz Aldim Alá]] ao [[Califado Fatímida]]. [[Almeria]] foi saqueada e os territórios africanos sob autoridade omíada passaram a ser controlados pelos fatímidas, retendo os cordoveses apenas Tânger e Ceuta. A entrega do governo de [[Ifríquia]] a [[{{ilc|ibne Manade||Ibn Manad]]}} provocou o confronto direto, que se tentara evitar anteriormente, mas [[{{ilc|Jafar ibne Ali|Jafar ibne Ali, o Andalusino|Ja'far ibn Ali al-Andalusi]]}} conseguiu deter o [[zirida]] ibnibne ManadManade.
 
Em 972 estourou uma nova guerra no norte da África, provocada nesta ocasião por [[{{ilc|Haçane ibne Canune||Hasan ibn Qannun]]}}, senhor de [[Arzila (Marrocos)|Arzila]], que foi vencido pelo general GalibGalibe. Esta guerra teve como consequência o envio de grandes quantidades de dinheiro e tropas para o Magrebe e a contínua imigração de [[berberes]] para al-AndalusAlandalus.
 
=== Política no Mediterrâneo ===
Um terceiro objetivo da atividade bélica e diplomática do califado esteve orientada para o Mediterrâneo.
 
O Califado manteve relações com o [[Império Bizantino]] de [[Constantino VII]], mantendo emissários cordoveses em [[Constantinopla]]. O poder do califado estendia-se também para norte, e ao redor do ano [[950]] o [[Sacro Império Romano-Germânico]] intercambiava embaixadores com Córdova, do qual fica registro dos protestos contra a pirataria muçulmana praticada desde [[Fraxineto]] e [[as ilhas orientais dedo Al-Andalus]]Alandalus. Igualmente, alguns anos antes, [[Hugo de Arles]] solicitara salvo-condutos para que os seus barcos mercantes pudessem navegar pelo Mediterrâneo, dando ideia portanto do poder marítimo que Córdova detinha. A partir de 942 foram estabelecidas relações mercantis com a [[República amalfitana]], e no mesmo ano foi recebida uma embaixada da [[Sardenha]].
 
A partir de [[942]] foram estabelecidas relações mercantis com a [[República amalfitana]], e no mesmo ano foi recebida uma embaixada da [[Sardenha]].
 
=== Política interior ===
O apogeu do califado cordovês manifestava-se na sua capacidade de centralização fiscal, que geria as contribuições e rendas do país: impostos territoriais, [[dízimo]]s, arrendamentos, [[pedágio]]s, impostos de capitação, taxas alfandegárias sobre mercadorias, bem como os direitos percebidos nos mercados sobre [[joia]]s, aparelhos de [[navio]]s, peças de [[ourivesaria]], etc. Mesmo os cortesãos estavam sujeitos a contribuição.
 
A opulência do califado durante estes anos fica refletida na palavras do geógrafo [[Ibnibne HawqalHaucal]]:
{{quote1|… A abundância e a despreocupação dominam todos os aspectos da vida; o gozo dos bens e os meios para adquirir a opulência são comuns aos grandes e aos pequenos, pois estes benefícios chegam até mesmo aos operários e artesãos, graças às imposições leves, à condição excelente do país e à riqueza do soberano; além disso, este príncipe não faz sentir o gravoso das prestações e dos tributos … }}
Para realçar a sua dignidade e seguindo o exemplo de outros califas anteriores, Abd-al-RahmanAbderramão III edificou a sua própria cidade palaciana, [[Medina Azahara]]. Esta foi a etapa da presença islâmica na Península Ibérica de maior esplendor, embora de curta duração, pois na prática terminou em [[1009]] com a [[Fitna no Al-AndalusAlandalus|''fitna'' (guerra civil)]] pelo trono entre os partidários do último califa legítimo, [[Hisham {{lknb|Hixam|II]]}}, e os sucessores do seu primeiro-ministro ou "hájibe" [[Almançor]]. Oficialmente, porém, o califado continuou até [[1031]], com [[Hisham {{lknb|Hixam|III]]}}, ano em que foi abolido dando lugar à fragmentação do estado omíada em múltiplos reinos conhecidos como [[Taifa]]s.
 
== A fitna ==
{{AP|[[Fitna do Al-Andalus]]Alandalus}}
A [[Fitna do Al-Andalus|fitna]] começou em [[1009]] com um [[golpe de Estado]] que implicou o assassinato de [[Abderramão Sanchuelo]], filho de [[Almançor]], a deposição de [[HishamHixam II]] e a ascensão ao poder de [[Maomé II de Córdoba|Maomé II]], bisneto de [[Abderramão III]]. No fundo os problemas também advinham da sufocante pressão fiscal necessária a custear os esforços bélicos.
 
Ao longo deste conflito, os diversos contendores recorreram à ajuda dos reinos cristãos. Córdova e os seus arrabaldes foram saqueados repetidas vezes, e os seus monumentos, entre eles o [[Alcázar de los Reyes Cristianos|Alcácer]] e a [[Medina Azahara]], destruídos. A capital chegou a mudar-se temporariamente para [[Málaga]]. Em pouco mais de vinte anos sucederam-se 10 califas diferentes (entre eles HishamHixam II restaurado), três deles pertencentes a uma dinastia diferente da Omíada, a [[Dinastia hamúdida|hamúdida]].
 
No meio desta desordem foram-se tornando paulatinamente independentes as [[taifa]]s de [[Taifa de Almeria|Almeria]], [[Taifa de Múrcia|Múrcia]], [[Taifa de Alpuente|Alpuente]], [[Taifa de Arcos|Arcos]], [[Taifa de Badajoz|Badajoz]], [[Taifa de Carmona|Carmona]], [[Taifa de Denia|Denia]], [[Taifa de Granada|Granada]], [[Taifa de Huelva|Huelva]], [[Taifa de Morón|Morón]], [[Taifa de Silves|Silves]], [[Taifa de Toledo|Toledo]], [[Taifa de Tortosa|Tortosa]], [[Taifa de Valência|Valência]] e [[Taifa de Saragoça|Saragoça]]. O último califa, [[HishamHixam III]], foi deposto em [[1031]], e proclamou-se em [[República de Córdova|Córdova a república]]. Por essa altura todas as ''[[Cora (divisão territorial)|cora]]'' (províncias) do Al-AndalusAlandalus que restavam tornaram-se independentes.
 
A queda do califado implicou para Córdova a perda definitiva da [[hegemonia]] de Al-AndalusAlandalus e o seu declínio como metrópole.
 
== Economia e população ==
A economia do Califado baseou-se numa considerável capacidade econômica -fundada num comércio muito importante-, uma indústria artesã muito desenvolvida, e técnicas agrícolas mais desenvolvidas que em qualquer outra parte da [[Europa]]. Baseava a sua economia na moeda, cuja cunhagem teve um papel fundamental no seu esplendor financeiro. A moeda de ouro cordovesa tornou-se das mais importantes à época, sendo provavelmente imitada pelo [[Império Carolíngio]].
 
À cabeça da rede de urbes estava a capital, [[Córdova (Espanha)|Córdova]], a cidade mais importante do Califado, que superava os 250 000{{fmtn|250000}} habitantes em [[935]] e aflorou os 500 000{{fmtn|500000}} em [[1000]] (alguns historiadores ainda falam de 1 000 000{{fmtn|1000000}} de habitantes, baseando-se em recentes achados arqueológicos de dimensões superiores às acreditadas, confirmando muitas crônicas até então tidas por exageradas), sendo durante o [[século {{séc|X]]}} uma das maiores cidades do [[Terra|Mundo]] e um centro financeiro, cultural, artístico e comercial de primeira ordem.
 
Outras cidades importantes foram [[Toledo]] (37 000{{fmtn|37000}}), [[Almeria]] (27 000{{fmtn|27000}}), [[Saragoça]] (17 000{{fmtn|17000}}) e [[Valência (Espanha)|Valência]] (15 000{{fmtn|15000}}).
 
== Cultura ==
[[Ficheiroimagem:Spain Andalusia Cordoba BW 2015-10-27 13-54-14.jpg|thumb|right|300px|O interior da [[Catedral de Córdova|Grande Mesquita]], em [[Córdova (Espanha)|Córdova]], um dos exemplos máximos da [[Arte mourisca|arquitetura islâmica]] da [[Omíadas|dinastia omíada]] na [[Península Ibérica]].]]
 
Abderramão III não somente fez de Córdova o centro nevrálgico de um novo império muçulmano no Ocidente, mas converteu-a na principal cidade da [[Europa Ocidental]], rivalizando ao longo de um século com [[Bagdade]] e [[Constantinopla]] (capitais do [[Califado Abássida]] e do [[Império Bizantino]], respectivamente) em poder, prestígio, esplendor e cultura. Segundo fontes árabes, sob o seu governo, a cidade alcançou o milhão de habitantes,<ref>Mais provavelmente 100 000.</ref> que dispunham de mil seiscentas mesquitas, trezentas mil moradias, oitenta mil lojas e inúmeros banhos públicos.
 
Este califa omíada foi também um grande impulsionador da cultura: dotou Córdova com cerca de setenta [[biblioteca]]s, fundou uma [[universidade]], uma escola de medicina e outra de [[tradutor]]es do [[língua grega|grego]] e do [[língua hebraica|hebraico]] para o [[língua árabe|árabe]]. Fez ampliar a [[Mesquita de Córdova]], reconstruindo as ameias, e mandou construir a extraordinária cidade palaciana de [[Medina Azahara|Madinat al-Zahr]], na qual residiu até à morte.
 
O aspecto do desenvolvimento cultural não é menos relevante com a chegada ao poder do califa [[al-Hakam {{lknb|Aláqueme|II]]}}, a quem é atribuída a fundação de uma biblioteca que teria atingido os 400 000{{fmtn|400000}} volumes. Talvez isso provocou a assunção de postulados da [[filosofia]] clássica -tanto grega quanto latina- por parte de intelectuais da época como foram [[Ibnibne Masarra]], [[Ibnibn Tufail]], [[Averróis]] e o judeu [[Maimônides]], embora os pensadores de Al-AndalusAlandalus se destacassem, sobretudo, em [[medicina]], [[matemáticas]] e [[astronomia]].
 
== Califas ==
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== Ver também ==
*[[Guerra civil no Al-AndalusAlandalus]]
 
{{Referências}}