Tibério: diferenças entre revisões

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|religião = [[Religião na Roma Antiga|Paganismo romano]]
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'''Tibério Cláudio Nero César''' (em [[latim]] ''Tiberius Claudius Nero Cæsar''; [[16 de novembro]] de [[42 a.C.]] – [[16 de março]] de [[37|37 d.C.]]), foi [[imperador romano]] [[18 de setembro]] de [[14]] até a sua morte, a [[16 de março]] de [[37]]. Era filho de [[Tibério Cláudio Nero (pretor)|Tibério Cláudio Nero]] e [[Lívia Drusa]].<ref name="guglielmo.ferrero.mulheres.cesares.2">[[Guglielmo Ferrero]], ''As mulheres dos césares'' (1911), Capítulo II, ''Lívia e Júlia'' [[s:en:The Women of the Caesars/Livia and Julia|<nowiki>[em linha]</nowiki>]] {{en}}</ref> Foi o segundo imperador de Roma pertencente à [[dinastia júlio-claudiana]], sucedendo ao padrasto [[Augusto]]. Foi durante o seu reinado que, na província romana da Palestina, [[Jesus]] foi crucificado.
 
Sua família aparentou-se com a família imperial quando a sua mãe, com dezenove anos e grávida, se divorciou do seu pai e contraiu matrimônio com [[Otaviano]] ([[38 a.C.]]), o futuro imperador Augusto.<ref name="guglielmo.ferrero.mulheres.cesares.2" /> Mais tarde, ele casou-se com a filha de Augusto, [[Júlia, a Velha]].<ref name="suetonio.augusto.63">[[Suetônio]], ''[[As vidas dos doze césares]]'', ''Vida de Augusto'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Augustus*.html#63 63]</ref> Foi adotado formalmente por Augusto a [[26 de junho]] de [[4|4 d.C.]], passando a fazer parte da [[gente (Roma Antiga)|gente]] [[Júlia (gente)|Júlia]]. Após a adoção, foram-lhe concedidos [[poder tribunício|poderes tribunícios]] por dez anos. Ao longo da sua vida, Tibério viu desaparecer progressivamente todos os seus possíveis rivais na sucessão graças a uma série de oportunas mortes.
 
Os descendentes de Augusto e Tibério continuariam a governar o império durante os próximos quarenta anos, até a morte de [[Nero]]. Como [[tribuno da plebe|tribuno]], reorganizou o [[exército da Roma Antiga|exército]], reformando a lei militar e criando novas [[legião romana|legiões]]. O tempo de serviço na legião passou para os vinte anos, para dezesseis anos na [[guarda pretoriana]]. Após cumprir o tempo de serviço, os soldados recebiam um pagamento, cujo valor provinha de um imposto de cinco porcento sobre as heranças. Porém, posteriormente, inimistou-se com o imperador Augusto, e viu-se obrigado a exilar-se em [[Rodes]]. Contudo, após a morte dos netos maiores de Augusto e previsíveis herdeiros do Império, [[Caio César]] e [[Lúcio César|Lúcio Júlio César]], ambos desterrados por traição do seu neto menor, [[Agripa Póstumo]], Tibério foi chamado pelo imperador e nomeado sucessor. Em [[13|13 d.C.]], os poderes de Augusto e de Tibério foram prorrogados por dez anos. Contudo, Augusto faleceu pouco depois ([[19 de agosto]] de [[14|14 d.C.]]), ficando Tibério como único herdeiro. Tibério sucedeu a Augusto em [[19 de agosto]] de "''767'' ''[[ab urbe condita]]''", correspondente ao ano [[14|14 d.C.]]. Após a sua entronização, todos os poderes foram transferidos para Tibério.
 
Tibério converteu-se num dos maiores generais de Roma. Nas suas campanhas na [[Panônia]], [[Ilírico (província romana)|Ilírico]], [[Récia]] e [[Germânia]], Tibério assentou as bases daquilo que posteriormente se tornaria a fronteira norte do império. Contudo, Tibério chegou a ser recordado como um obscuro, recluído e sombrio governante, que realmente nunca quis ser imperador; [[Plínio, o Velho]] chamou-o de "''tristissimus hominum''" ("o mais triste dos homens").<ref>Plínio, o Velho, ''Naturalis Historiæ'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/L/Roman/Texts/Pliny_the_Elder/28*.html#v XXVIII.5.23].</ref> Após a morte de seu filho, [[Júlio César Druso]] em [[23]], a qualidade do seu governo declinou e o seu reinado terminou em terror. Em [[26|26 d.C.]], Tibério auto-exilou-se de Roma e deixou a administração nas mãos dos seus dois [[prefeito do pretório|prefeitos pretorianos]] [[Lúcio Élio Sejano]] e [[Névio Sutório Macro|Quinto Névio Cordo Sutório Macro]]. Tibério adotou o seu sobrinho-neto [[Calígula]] para que o sucedesse no trono imperial.
 
== Juventude ==
=== Origens ===
[[Ficheiroimagem:Drusus the elder bust.jpg|thumb|direita|upright=0.7|Busto de [[Nero Cláudio Druso]], irmão de Tibério.]]
Tibério Cláudio Nero Germânico Augusto (''Tiberius Claudius Nero Germanicus Augustus'') nasceu a [[16 de novembro]] de [[42 a.C.]], em Roma.<ref>Suetônio, ''[[As vidas dos doze césares]], Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#5 5]</ref> Era filho de [[Tibério Cláudio Nero (pretor)|Tibério Cláudio Nero]] e [[Lívia Drusila]], sendo irmão de [[Nero Cláudio Druso]].<ref name="guglielmo.ferrero.mulheres.cesares.2" /> Em [[38 a.C.]], a sua mãe divorciou-se do seu pai e casou-se com o imperador Caio Júlio César Octaviano pouco depois, enquanto estava ainda grávida de [[Druso o Maior|Nero Cláudio Druso]], que nasceu três meses depois do casamento, em [[38 a.C.]].<ref name="guglielmo.ferrero.mulheres.cesares.2" />
 
Há poucos dados sobre a juventude de Tibério. Em [[32 a.C.]], realizou a sua primeira aparição pública com a idade de nove anos ao emitir a oração fúnebre pela morte do seu pai biológico.<ref name="suetonius-tiberius-6">Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#6 6]</ref> Em [[29 a.C.]], tanto ele como o seu irmão participaram no desfile triunfal do seu pai adotivo, que comemorava a derrota de [[Marco Antônio]] e [[Cleópatra]] na [[Batalha de Áccio]].<ref name="suetonius-tiberius-6"/> Em [[26 a.C.]] Augusto ficou gravemente doente, instalando-se a ameaça do mundo romano cair novamente no caos. Embora os historiadores antigos defendam a teoria de que [[Marco Vipsânio Agripa]] ou [[Marco Cláudio Marcelo (sobrinho de Augusto)|Marco Cláudio Marcelo]] poderiam sucedê-lo aquando da sua morte, o assunto sucessório converteu-se no maior problema de Augusto.
 
Como resposta, selecionou uma série de possíveis herdeiros, entre eles Tibério e o seu irmão Druso. Em [[24 a.C.]], com dezessete anos de idade, Tibério começou na política sob comando de Augusto, sendo nomeado [[questor]].<ref name="paterculus-roman-history-ii-94">Veleio Patérculo, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#94 II.94]</ref> Foi-lhe concedido o direito de se apresentar às eleições de [[Cônsul (Roma Antiga)|cônsul]] e [[pretor]] cinco anos antes da idade requerida pela lei.<ref name="suetonius-tiberius-9">Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#9 9]</ref> Os mesmos direitos foram concedidos ao seu irmão Druso.
 
=== Carreira civil e militar ===
 
[[Ficheiroimagem:Marcus agrippa louvre portrait.jpg|thumb|upright|esquerda|''[[Marco Vipsânio Agripa]]'', rival de Tibério na sucessão. [[Museu do Louvre]].]]
Pouco depois, Tibério iniciou na corte a sua carreira como advogado,<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#8 8]</ref> e é de supor que foi nesse momento que despertou a sua paixão pela retórica grega. Em [[20 a.C.]] Tibério foi enviado ao Oriente sob o comando de Agripa com o objetivo de recuperar as águias das legiões que os partos arrebataram a [[Marco Licínio Crasso]] ([[Batalha de Carras]], [[53 a.C.]]), [[Lúcio Decídio Saxa]] ([[40 a.C.]]) e [[Marco Antônio]] ([[36 a.C.]]).<ref name="suetonius-tiberius-9"/> Após vários anos de negociação, Tibério liderou uma potente força ao interior da [[Reino da Armênia (Antiguidade)|Armênia]] com o objetivo de tornar o antigo reino num estado-cliente de Roma e criar com isso uma ameaça sobre a fronteira parta. Augusto chegou a um compromisso segundo o qual eram devolvidos os poderes ao Reino permitindo-lhe permanecer neutral entre os dois poderes.<ref name="suetonius-tiberius-9"/>
 
Após regressar do Oriente em [[19 a.C.]], Tibério casou-se com [[Vipsânia Agripina]], filha do melhor amigo e general de Augusto, Marco Vipsânio Agripa.<ref name="suetonius-tiberius-7">Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#7 7]</ref> Foi nomeado [[pretor]] e enviado, no comando das suas legiões, a unir-se às campanhas do seu irmão Druso no Ocidente. Enquanto Druso centrou as suas forças na [[Gália Narbonense]] e ao longo dos [[Alpes]], Tibério combateu as tribos dos [[Alpes]] e da [[Gália Transalpina]]. Em [[16 a.C.]] descobriu a fonte do [[Danúbio]] e cruzou-o pela metade do seu curso. Quando voltou para Roma em [[13 a.C.]], Tibério foi designado [[Cônsul (Roma Antiga)|cônsul]], e por volta desse mesmo ano nasceu o seu filho [[Júlio César Druso]].
 
A morte de Agripa em [[12 a.C.]] elevou Druso e Tibério na escala sucessória. Tibério solicitou a Augusto divorciar-se da sua esposa e casar-se com [[Júlia, a Velha]], filha de Augusto e viúva de Agripa.<ref name="suetonius-tiberius-7"/> Este matrimônio implicou um ponto de inflexão na vida de Tibério. O matrimônio com Júlia nunca foi feliz e produziu um só filho que faleceu durante a infância.<ref name="suetonius-tiberius-7"/> Segundo antigas fontes, um dia Tibério foi para a casa de Vipsânia chorando, para lhe rogar o seu perdão.<ref name="suetonius-tiberius-7"/> Pouco depois acordou com Augusto que Tibério e Vipsânia nunca se voltariam a encontrar. A carreira de Tibério continuou crescendo e, depois das mortes de Agripa e do seu irmão Druso em [[9 a.C.]], converteu-se num claro candidato à sucessão. Em [[12 a.C.]], foi-lhe concedido o comando dos exércitos da [[Panônia]] e da [[Germânia]], províncias muito instáveis. Regressou a Roma e foi designado cônsul pela segunda vez em [[7 a.C.]] e em [[6 a.C.]] concederam-lhe [[poder tribunício|poderes tribunícios]] (''potestas tribunícia'') e o controle do Oriente..<ref name="cassius-deu-rhistory-lv-9">Dião Cássio, ''[[História romana (Dião Cássio)|História romana]]'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/55*.html#9 LV.9]</ref>
 
=== Retiro em Rodes ===
[[Ficheiroimagem:SperlongaVillaTiberio.jpg|thumb|direita|upright=1.3|''Villa'' de Tibério em [[Sperlonga]], a meio caminho entre [[Roma]] e [[Nápoles]].]]
Em [[6 a.C.]], quando estava prestes a assumir o comando do Oriente e a tornar-se assim no segundo homem mais poderoso de Roma, anunciou a sua retirada da política e mudou-se para [[Rodes]]. Os motivos desta repentina retirada não são claros.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#10 10]</ref> Antigos historiadores especularam com a possibilidade de Tibério sentir-se como uma solução provisória quando Augusto adotou os filhos de Júlia e Agripa, [[Caio César]] e [[Lúcio César]] e os favoreceu ao longo da sua carreira tal e qual fizera com Druso e com o próprio Tibério. O futuro imperador pode ter pensado que quando os seus enteados atingissem a maioridade substituí-lo-iam. Também pode ter influido o conhecido comportamento promíscuo da sua esposa.<ref>Veleio Patérculo, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#100 II.100]</ref> Segundo Tácito, foram motivos pessoais os que impulsionaram Tibério a retirar-se para Rodes, onde começou a odiar a sua esposa e a ansiar pela sua ex-esposa Vipsânia.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#53|I.53]]</ref> Tibério encontrava-se casado com uma mulher que o aborrecia, que o humilhava com as públicas escapadas noturnas que protagonizava, e que o proibia ver a mulher que amava.
 
Independentemente dos motivos de Tibério, a retirada foi desastrosa para os planos sucessórios de Augusto. Caio e Lúcio estavam ainda na adolescência, e Augusto, que contava então 57 anos, não tinha um sucessor imediato. A retirada de Tibério punha em perigo uma transferência pacífica de poder após a morte de Augusto e deixava de existir a garantia de que, após a morte do [[príncipe (Roma Antiga)|príncipe]], o poder seguiria nas mãos da sua família ou dos aliados da sua família.
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Com a retirada de Tibério, a sucessão recaía exclusivamente nos dois novos netos de Augusto, Caio e Lúcio César. A situação tornou-se de repente mais precária com a morte de Lúcio em [[2]]. Augusto, a pedido de [[Lívia Drusa]], permitiu a Tibério regressar a Roma, mas apenas como cidadão romano.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#13 13]</ref> Em [[4]], Caio faleceu na [[Reino da Armênia (Antiguidade)|Armênia]] e Augusto não teve outra solução senão recorrer a Tibério.<ref name="tacitus-annals-i-3">Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#3|I.3]]</ref><ref name="penelope.uchicago.edu">Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#15 15]</ref>
 
A morte de Caio em [[4|4 d.C.]] foi o começo duma frenética atividade palaciana. Tibério foi adotado como filho e herdeiro de pleno direito. Por seu lado, Tibério viu-se obrigado a adotar o seu sobrinho, [[Júlio César Germânico|Germânico]], filho do seu irmão [[Nero Cláudio Druso]] e de [[Antônia Menor]].<ref name="tacitus-annals-i-3"/><ref>Dião Cássio, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/55*.html#13 LV.13] (do site [[LacusCurtius]])</ref> Tibério recebeu poderes tribunícios e assumiu parte do ''maius imperium'' de Augusto, algo com o que nem Agripa fora recompensado.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#21 21].</ref> Em [[7]], [[Agripa Póstumo]] foi repudiado por Augusto e exilou-se na [[ilha Pianosa]], onde viveu confinado em solitário.<ref name="penelope.uchicago.edu"/><ref>Dião Cássio ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/55*.html#32 LV.32]</ref> Em [[13]], os poderes de Tibério igualaram os do próprio Augusto. Tibério tornou-se co-príncipe e, caso Augusto morresse, apenas deveria sucedê-lo com normalidade.
 
Augusto faleceu em [[14|14 d. C.]], com 76 anos de idade.<ref>Veleio Patérculo, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#123 II.123]</ref> Augusto foi enterrado com todas as cerimônias estabelecidas e deificado. Tibério, por seu lado, foi confirmado como único sucessor.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#8|I.8]]</ref>
 
== Imperador ==
=== Primeira etapa ===
 
[[Ficheiroimagem:Statue-Augustus.jpg|right|thumb|upright|''[[Augusto de Prima Porta]]'', [[Museus Vaticanos]].]]
[[Ficheiroimagem:Tiberius Capri Louvre Ma1248.jpg|thumb|upright|Estátua de Tibério em [[Capri (ilha)|Capri]].]]
Conforme o método de [[Augusto]] e às aparências que ele tomara a princípio frente ao [[Senado romano|senado]], Tibério teve a precaução de evitar pôr em evidência a extensão do seu poder pessoal. Decidiu não adotar o nome de [[imperator]]: apenas acrescentou o apelido de Augusto ao nome de '''Tibério Júlio César''', que tinha desde a sua adoção; e, nas inscrições e moedas o nome de <cite>''Tiberius Caesar Augustus''</cite> sucedeu ao de <cite>''Imperator Caesar Augustus''</cite>. Jamais deixou outorgar-se o título de pai da pátria.
 
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=== Direitos e funções do imperador ===
 
[[Imagem:Tiberius - Paestum (M.A.N. Madrid) 01.jpg|thumb|upright|esquerda|Estátua idealizada de Tibério ([[Museu Arqueológico Nacional de Espanha|M.A.N.]]) encontrada em [[Pesto (cidade)|Pesto]] (atual [[Pesto (cidade)|Peto]] em [[1860]]. Realizada após a sua morte para lhe render culto.]]
O imperador ([[príncipe (Roma Antiga)|príncipe]]; ''princeps'') dispunha de todos os [[poder tribunício|poderes tribunícios]] (''Tribunicia potestas''), dos quais tinha um procônsul no governo das [[província romana|províncias]] (poder que o Imperador podia exercer em qualquer parte do território), e seguramente dos poderes de um [[Cônsul (Roma Antiga)|cônsul]], pois se o desejava ostentava o cargo de cônsul ordinário (''Consul ordinarius''). Era, além disso, [[pontífice máximo]] (''pontifex maximus'') e com frequência exercia também as funções censoriais (embora não ostentasse o título de censor, magistratura "ressuscitada" por [[Cláudio]]). Eram-lhe atribuíam várias qualificações: [[Pai da pátria (Roma Antiga)|pai da pátria]] (''pater patriae''), [[príncipe do senado]], ''Imperator'' e [[Augusto (título)|Augusto]].
 
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Germânico, porém, reuniu os amotinados e liderou-os numa breve campanha ao longo do [[rio Reno|Reno]], em território germânico, afirmando que qualquer pilhagem que pudessem conseguir constituíria a prometida prima.<ref>Dião Cássio, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/57*.html#6 LVII.6]</ref> Germânico e o seu exército cruzaram o Reno e ocuparam todo o território entre esse rio e o [[rio Elba]]. Tácito escreve que Germânico recuperou as águias perdidas após a ignominiosa derrota na [[Batalha da floresta de Teutoburgo]], na qual três legiões romanas, sob comando de [[Públio Quintílio Varo]], foram aniquiladas numa emboscada germana.<ref name="tacitus-annals-ii-41">Tácito, Anais [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#41|II.41]]</ref> Apesar da indolência militar de Tibério, Germânico proporcionara um duro golpe aos inimigos de Roma na Germânia, sufocara um amotinamento de tropas e ademais trouxera para Roma as águias perdidas. Estas heroicas ações posicionaram Germânico num lugar privilegiado na linha sucessória.
 
Após a sua campanha na Germânia,<ref>Tácito, Anais [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#26|II.26]]</ref> Germânico celebrou um [[triunfo romano|triunfo]] em [[Roma]] em [[17]].<ref name="tacitus-annals-ii-41"/> Este triunfo era o primeiro que contemplava Roma desde os do imperador [[Augusto]] em [[29 a.C.]] Em [[18|18 d.C.]], foram concedidas a Germânico as províncias orientais do Império, como se tinha feito com [[Marco Vipsânio Agripa]] e com o próprio Tibério. Esta nomeação supunha que Germânico era o claro favorito para suceder a Tibério.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#43|II.43]]</ref> Germânico faleceu ao ano seguinte, provavelmente envenenado pelo governador da província da [[Síria (província romana)|Síria]], [[Cneu Calpúrnio Pisão (cônsul 7 a.C.)|Cneu Calpúrnio Pisão]].<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#71|II.71]]</ref> Os ''Pisoni'' tinham sido partidários dos ''Claudii'' e haviam-se aliado com o jovem Octaviano após o seu casamento com Lívia, a mãe de Tibério; portanto o imperador estava suspeitoso. No juízo, Pisão ameaçou implicar Tibério,<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#16|III.16]]</ref> embora não se saiba com certeza se realmente o governador da Síria seria capaz de implicar o imperador. Quando se generalizou no [[Senado romano|senado]] uma atitude hostil contra Pisão, este suicidou-se.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#52 52]</ref><ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 3#15|III.15]]</ref>
 
Tibério, pela sua vez, parecia estar cansado da política. Em [[22|22 d.C.]], começou a compartilhar poderes tribunícios com o seu filho [[Druso, o Jovem]]<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 3#56|III.56]]</ref> e começou a realizar excursões à [[Campânia]] que se tornavam mais longas cada ano. Em [[23|23 d.C.]], o filho de Tibério faleceu em estranhas circunstâncias<ref>Tácito, ''Annales'' , [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#7|IV.7]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#8|IV.8]]</ref><ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares, Vida de Tibério'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#62 62]</ref> e Tibério decidiu retirar-se para a [[Capri (ilha)|ilha de Capri]] ([[26]]).<ref name="tacitus-annals-iv-67">Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#67|IV.67]]</ref>
 
=== Tibério em Capri, Sejano em Roma ===
[[Imagem:Tiberius&Livia Aureus.jpg|esquerda|thumb|upright=1.3|Tibério e Lívila.]]
{{Artigo principal|[[Sejano]]}}
Lúcio Élio Sejano tinha servido a família imperial por mais de vinte anos quando foi eleito [[Prefeito do pretório]] em [[15|15 d.C.]]. À medida que Tibério ia detestando mais a sua posição no poder, começou a depender com maior intensidade da [[guarda pretoriana]] e do seu líder Sejano. Em [[17]]/[[18|18 d.C.]], Tibério delegou à guarda pretoriana a tarefa de defender a cidade, e transladou-os a acampamentos situados no exterior das muralhas da cidade,<ref name="suetonius-tiberius-37">Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#37 37]</ref> dando com isso a Sejano o comando de entre 6.000 e 9.000 soldados. A morte de Druso elevou Sejano ao olhos de Tibério, que se referia a ele como "''o meu companheiro''". Tibério erigiu estátuas de Sejano por toda a cidade<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#2|IV.2]]</ref><ref>Dião Cássio, ''História romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/57*.html#21 LVII.21]</ref> e foi retirando-se gradualmente do poder que foi cedido a Sejano. Quando Tibério se retirou finalmente em [[26]], Sejano estava ao cargo da administração do Estado e da capital.
 
A posição de Sejano não era exatamente a de um sucessor, pois pedira a mão de [[Lívila]],<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#39|IV.39]]</ref> a sobrinha de Tibério em [[25]], e ficara obrigado retirar a solicitude sob pressões.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#40|IV.40]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#41|IV.41]]</ref> Sejano e a guarda controlavam o correio imperial e portanto estavam em posse de toda a informação que Tibério enviava a Roma e que Roma enviava a Tibério.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#41|IV.41]]</ref> Contudo o poder acumulado, a presença de [[Lívia Drusila]] limitava a área de ação dos pretorianos, porém, a sua morte em [[29|29 d.C.]] mudou tudo.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 5#3|V.3]]</ref> Sejano iniciou uma série de juízos amanhados de senadores e ricos cavaleiros procedentes da [[ordem equestre]] com os que eliminou todos os seus rivais políticos e aumentou o tesouro público (e o seu próprio). A viúva de Germânico, [[Agripina]] e dois dos seus filhos, [[Nero César]] e [[Druso César]] foram detidos e exilados em [[30]], falecendo posteriormente em suspeitosas circunstâncias.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#53 53], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#54 54]</ref>
 
[[Ficheiroimagem:Villa Jovis.jpg|thumb|upright=1.3|direita|Ruínas de ''Villa Jovis'', residência de Tibério em [[Capri (ilha)|Capri]].]]
Em [[31|31 d.C.]], Sejano ostentou o consulado com Tibério ''[[In Absentia]]'',<ref name="suetonius-tiberius-65">Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#65 65]</ref> começando com isso a consolidar seriamente o seu poder. O que ocorreu por esta época é difícil de determinar, embora seja provável que Sejano tentasse de congraçar-se com as famílias pertencentes à [[dinastia júlio-claudiana]] com vistas a ser adotado no seio da família ''Júlia'', ocupando com isso o posto de regente ou inclusive de ''[[Princepspríncipe (título)|príncipe]]''.<ref name="suetonius-tiberius-65"/> Mais tarde, Lívila implicou-se no argumento ao descobrir-se que fora a amante de Sejano.<ref>Dião Cássio, ''História romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/57*.html#22 LVII.22]</ref> É provável que o objetivo do complô fosse derrocar Tibério e, com o apoio dos Júlios, assumir o principado eles mesmos ou agir como regentes dos jovens [[Tibério Gemelo]] e [[Calígula]]. Os que se interpuseram no seu caminho foram acusados de traição.
 
Contudo, as cruéis ações de Sejano foram as que o fizeram cair finalmente, os juízos de senadores e cavaleiros que se produziram após a retirada de Tibério ganharam um bom número de inimigos que não eram dispostos a permitir Sejano assumir o [[Principado romano|principado]]. Em [[31|31 d.C.]], Sejano foi convocado ao [[Senado romano|senado]], no qual foi lida uma carta assinada por Tibério que o acusava de traição e o condenava a ser executado de imediato.<ref name="deu-history-lviii-10">Dião Cássio ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/58*.html#10 LVIII.10]</ref> Sejano foi julgado e ele e vários das suas colegas foram executados na mesma semana. À sua morte, foi substituído como Prefeito do Pretório por [[Névio Sutório Macro]].<ref name="deu-history-lviii-10"/>
 
Após a morte de Sejano, em Roma decorreram numa série de juízos que parecia não ter final. Apesar da apatia e da indecisão que caracterizaram o princípio do seu reinado, no final do seu reinado decidiu fazê-lo sem reparos. Tibério dizimou as filas do senado. Todos os que colaborassem ou se relacionassem com o senado foram julgados e executados e as suas propriedades foram confiscadas.<ref name="tacitus-annals-vi-19">Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 6#19|VI.19]]</ref> Tácito descreve-o assim:
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{{Quote1|As execuções tornaram-se num estímulo para a sua fúria, e condenou à morte a todos os encarcerados acusados de colaborar com Sejano. Ali encontram-se, separados ou em montes, um sem-número de mortos de todos os sexos e idades. Não foi permitido que parentes e amigos estivessem perto deles, chorassem a sua morte ou apenas os olhassem. Espias estabeleceram rondas para anotar os que ousavam acercar-se. Quando os cadáveres estavam putrefatos, foram arrastados para o [[rio Tibre]], a cujas águas foram arrojados. A força do terror e da crueldade extinguiram a pena.<ref name="tacitus-annals-vi-19"/>}}
 
Começaram a surgir rumores sobre os ignominiosos atos que Tibério protagonizava no seu lugar de retiro. [[Suetônio]] descreve situações de total perversão sexual, onde eram presentes o [[sadomasoquismo]] e a [[pedofilia]].<ref name="suetonius-twelve-caesars-43">Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#43 43], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#44 44], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#45 45]</ref><ref name="suetonius-twelve-caesars-60">Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#60 60], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#62 62], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#63 63], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#64 64]</ref> Embora seja provável que fosse uma invenção dos seus inimigos em Roma, estes rumores dão uma ideia da opinião que teve o povo romano do seu ''[[Princepspríncipe (título)|príncipe]]'' durante os seus 23 anos de reinado.
 
=== Final ===
[[Ficheiroimagem:JPaul Laurens The Death of Tiberius.jpg|thumb|upright=1.3|esquerda|''A morte de Tibério'' por [[Jean-Paul Laurens]], [[1864]], no [[Museu dos Agostinhos]], [[Tolosa (França)|Tolosa]]. Retrata o assassinato do imperador por ordens de [[Névio Sutório Macro]].]]
O assassinato de [[Sejano]] e os juízos por traição danificaram a reputação de Tibério. Após a queda de Sejano, a retirada de Tibério foi completa; o Império seguiu funcionado através da inércia burocrática estabelecida por [[Augusto]], em vez de ser dirigido pelo ''princeps''príncipe. Tibério tornou-se completamente paranoico<ref name="suetonius-twelve-caesars-60"/> e passou cada vez mais tempo isolado após a morte do seu filho. Enquanto Tibério estava retirado, segundo Suetônio, os [[Pártia|partos]] iniciaram uma breve invasão, e as tribos [[dácia]]s e as tribos germânicas do [[rio Reno]] realizavam incursões em território romano.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#41 41]</ref>
 
Tibério não fez disposições para garantir uma sucessão pacífica. Após a morte de muitos dos Júlios, dos seus partidários e do seu próprio filho, os únicos candidatos sérios para o suceder eram o seu neto [[Tibério Gemelo]]<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 6#46|VI.46]]</ref> e o filho de [[Júlio César Germânico|Germânico]], [[Calígula]]. Apesar de tudo, Tibério seguiu sem realizar nenhuma disposição sucessória e somente há notícias de uma tentativa no final da sua vida de nomear Calígula [[questor]] honorário.<ref>Dião Cássio, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/57*.html#23 LVII.23]</ref>
 
Tibério faleceu em [[Miseno]] a [[16 de março]] de [[37|37 d.C.]] aos 77 anos.<ref name="tacitus-annals-vi-51">Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 6#50|VI.50]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 6#51|VI.51]]</ref> Segundo Tácito, a morte do imperador foi recebida com entusiasmo entre o povo romano, somente para silenciar-se repentinamente quando teve notícias da sua recuperação e voltar a regozijar-se quando [[Calígula]] e Macro o assassinaram.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 6#50|VI.50]]</ref> Contudo, os escritos de Tácito são provavelmente apócrifos pois não são confirmados por nenhum outro historiador antigo. O relato de Tácito pode indicar o sentimento predominante no senado para com Tibério no momento da sua morte. No testamento de Tibério, o finado imperador delegava a Calígula e a Tibério Gemelo o reinado conjunto.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Tibério [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#76 76]</ref><ref name="cassiusdio-lix-1">Dião Cássio, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/59*.html#1 LIX.1]</ref> A primeira coisa que Calígula fez foi assumir os poderes de Tibério e assassinar Tibério Gemelo.<ref name="cassiusdio-lix-1"/>
 
A queda de Tibério não se deveu ao seu abuso de poder, mas ao facto de negar-se a usá-lo. O seu reinado, apático comparado com o do seu predecessor, fez ganhar a aversão do povo. O senado funcionara sob o comando de Augusto durante anos e, quando Tibério quis devolver-lhe a sua autonomia, este não soube agir sozinho. Após fracassar, Tibério pareceu ficar desinteressado da sua posição.
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== Historiografia ==
Tibério, à sua morte em [[37|37 d.C.]], poderia ter sido recordado como um exemplo de como reinar.<ref name="tacitus-annals-iv-6">Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 4#6|IV.6]]</ref> Apesar da geral hostilidade com que o recordam os historiadores seus contemporâneos e posteriores, Tibério deixou no Tesouro três mil milhões de [[sestércio]]s.<ref name="cassiusdio-lix-1"/><ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Calígula [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Caligula*.html#37 37]</ref> Em lugar de embarcar em custosas campanhas no estrangeiro, Tibério decidiu fortalecer o Império mediante a construção de defesas, o uso da diplomacia e mantendo uma política de passividade nas disputas de monarcas estrangeiros.<ref name="suetonius-tiberius-37"/> O resultado da política de Tibério foi um Império mais forte e consolidado. Dos autores cujos textos sobre o imperador sobreviveram, apenas quatro descrevem com pormenor o seu reinado: [[Tácito]], [[Suetônio]], [[Dião Cássio]] e [[Veleio Patérculo]], além de pequenos fragmentos escritos por [[Plínio, o Velho]], [[Estrabão]] e [[Sêneca, o Velho]]. O próprio Tibério escreveu uma autobiografia que Tácito descreve como "''breve e sucinta''"; porém, este trabalho perdeu-se.<ref>Suetônio, ''As vidas dos doze césares'', Vida de Calígula [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Suetonius/12Caesars/Tiberius*.html#61 61]</ref>
 
=== Públio Cornélio Tácito ===
 
[[Imagem:Wien- Parlament-Tacitus.jpg|thumb|upright|[[Públio Cornélio Tácito]], estátua no parlamento austríaco, em [[Viena]].]]
A informação mais detalhada sobre o reinado de Tibério é a de [[Públio Cornélio Tácito]] e os seus ''[[Annales (Tácito)|Annales]]'', cujos seis primeiros livros versam o tema. Tácito foi um cavaleiro pertencente à [[ordem equestre]] que nasceu durante o reinado de [[Nero]] em [[56|56 d.C.]]. A sua obra é baseada na maior parte na ''acta senatus'' (a ata de sessão do [[Senado romano|senado]]) e a ''[[Acta Diurna|acta diurna populi Romani]]'' (coleção de relatos e informações de atuações governamentais e cortesãs), na autobiografia de Tibério e nos historiadores contemporâneos como [[Clúvio Rufo]], [[Fábio Rústico]] e [[Plínio, o Velho]], cujos escritos se perderam. A descrição do imperador realizada por Tácito é geralmente negativa e faz-se mais dura gradualmente à medida que o seu estado piora.<ref name="ReferenceA">Tácito, ''Annales'' , [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#6|I.6]]</ref> O historiador menciona uma clara degradação do estado psicológico do imperador a partir da morte do seu filho em [[23]].<ref name="tacitus-annals-iv-6"/>
O historiador Tácito descreve o reinado da [[dinastia júlio-claudiana]] como injusto e cruel<ref name="ReferenceA"/> e as boas ações no princípio do seu reinado são atribuídas a pura [[hipocrisia]].<ref name="tacitus-annals-vi-51"/> Tácito também recorre no desequilíbrio de poder entre os imperadores e o senado e põe em evidência a corrupção e a tirania derivadas dos governantes, dedicando uma importante parte do seu relato aos juízos e perseguições que surgiram por causa da restauração da lei de ''maiestas''.<ref>Tácito, ''Annales'' [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#72|I.72]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 1#74|I.74]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 2#27|II.27-32]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 3#49|III.49-51]], [[wikisource:The Annals (Tacitus)/Book 3#66|III.66-69]]</ref> A última alegação do seu sexto livro é o melhor exemplo da sua opinião sobre o imperador:
 
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=== Veleio Patérculo ===
O historiador [[Veleio Patérculo]] constitui uma das poucas fontes contemporâneas de Tibério que fala dele e do seu reinado. Patérculo serviu sob as ordens de Tibério durante oito anos na [[Germânia]] e [[Panônia]] na qualidade de prefeito de cavalaria e [[legado]]. A obra de Patérculo estende-se pelo período compreendido entre a queda de [[Troia]] e a morte de Lívia ([[29]]), e dá uma opinião muito favorável do imperador<ref name="paterculus-roman-history-ii-94"/><ref>Veleio Patérculo, ''História Romana'', [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#103 II.103-105], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#129 II.129-130]</ref> e do seu [[Prefeito do Pretório]], [[Sejano]].<ref>Veleio Patérculo, ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Velleius_Paterculus/2D*.html#127 II.127-128]</ref> Embora não se saiba com certeza se o tom tendencioso da obra se deve a uma verdadeira admiração ou ao medo de represálias, é importante conhecer o dado de que Patérculo foi assassinado em [[31|31 d.C.]] na qualidade de amigo de Sejano, o que nos pode dar a ideia de que existira uma verdadeira amizade entre os dois.<ref>Cruttwell, C.T. (1877). '' A History of Roman Literature '' . Oxford, Livro 3, capítulo 1.</ref>
 
=== Arqueologia ===