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Atualmente, a pintura faz parte do acervo do [[Museu Nacional de Belas Artes (Brasil)|Museu Nacional de Belas Artes]], no [[Rio de Janeiro (cidade)|Rio de Janeiro]], presente na exposição “Das Galés as Galerias: representações e protagonismos do negro no acervo no acervo do MNBA”, que busca proporcionar um olhar sobre as representações e protagonismos da população negra em 80 obras presentes no acervo do museu.<ref name="Museu Nacional de Belas Artes">{{citar web|url=http://mnba.gov.br/portal/imprensa/novidades-do-museu/145-das-gal%C3%A9s-%C3%A0s-galerias-representa%C3%A7%C3%B5es-e-protagonismos-do-negro-no-acervo-do-mnba.html|titulo=Mostra das Galés às galerias, no MNBA, reflete o papel do negro na arte|data=|acessodata=28 de outubro de 2018|publicado=Museu Nacional de Belas Artes|ultimo=|primeiro=|autor=MUSEU Nacional de Belas Artes}}</ref>
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A pintura '''A Redenção de Cam''' é fruto de um momento [[Emancipação|pós-emancipação]]<ref name="TATIANA">{{citar web|url=http://cral.in2p3.fr/artelogie/IMG/article_PDF/article_a254.pdf|titulo=Raça, gênero e projeto branqueador : "a redenção de Cam", de modesto brocos|data=|acessodata=23 de outubro de 2018|publicado=Catálago USP|ultimo=|primeiro=|autor=LOTIERZO, Tatiana; SCHWARCZ, Lilia}}</ref>, trazendo desde o nome, um reflexo do pensamento de Brocos sobre o período. O nome faz alusão a [[Gênesis|Gênesis 9]], presente na [[Bíblia|Bíblia Cristã]]. No episódio, Cam expõe a nudez e bebedeira de seu pai, [[Noé]], aos irmãos Sem e Lafet e, por isso, é condenado pelo pai a ser escravo juntamente com seu filho [[Canaã]]<ref name="TATIANA" />, que é amaldiçoado como "servo dos servos"<ref name="Itaú Cultural">{{citar web|url=http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra3281/a-redencao-de-cam|titulo=A Redenção de Cam|data=|acessodata=23 de outubro de 2018|publicado=Enciclopédia Itaú Cultural|ultimo=|primeiro=|autor=ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural}}</ref>. Noé profetizou que ele, Cam, seria "o último dos escravos de seus irmãos". Cam é apontado na Bíblia como suposto ascendente das raças africanas.<ref name="Itaú Cultural" />
Diante disso, nos séculos XVI, XVII e XVIII, os cristãos usavam a passagem bíblica para justificar a escravidão nas economias coloniais.<ref name="CAVALCANTI, Ana Maria Tavares">{{citar web|url=http://www.anpap.org.br/anais/2010/pdf/chtca/ana_maria_tavares_cavalcanti.pdf|titulo=Artistas brasileiros entre territórios: A relação com a Europa e o sentimento de exílio a própria pátria no século XIX|data=25 set. 2010|acessodata=19 de novembro de 2018|publicado=Anais do 19º Encontro da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas “Entre Territórios”|ultimo=|primeiro=|autor=CAVALCANTI, Ana Maria Tavares}}</ref>
A tela é crítica quando mostra um caminho para reverter a "maldição" (ser afro-descendente), branqueando os personagens.<ref name="ANA PAULA" /> É perceptível o [[Naturalismo (arte)|naturalismo]] presente na obra, que traz gradações de cores entre as três gerações dos personagens. O bebê é o mais branco, seguido pelo pai, sentado ao lado da mãe, que segura a criança no colo. No canto esquerdo da tela, quem tem a pele mais escura é a avó, com mãos erguidas ao céu em agradecimento. Por nascer branco, seu neto foi livrado da "maldição" de ser negro, já que sua filha, miscigenada, casou-se com um homem branco.<ref name="Ellen Pereira Lopes de Souza">{{citar web|url=https://repositorio.bc.ufg.br/tede/bitstream/tede/3921/5/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20-%20Ellen%20Pereira%20Lopes%20de%20Souza%20-%202014.pdf|titulo=Estudos sobre a formação de professores de ciências no contexto da lei 10.639/03|data=|acessodata=3 de novembro de 2018|publicado=Universidade Federal de Goiás|ultimo=|primeiro=|autor=SOUZA, Ellen Pereira}}</ref> ▼
==Descrição e análise da pintura==
A obra traz uma negação da [[Cultura da África|cultura africana]] aparente quando reparamos nas vestes das personagens femininas, já que ambas usam roupas ocidentalizadas, e não trajes que remetem à cultura africana.<ref name="ANA PAULA" /> Aqui, está presente uma ideia de ajustamento das mulheres negras à moral cristã e a um ideal de reprodução branqueador.<ref name="ANA PAULA" /> ▼
▲A tela
▲A obra traz uma negação da [[Cultura da África|cultura africana]] aparente quando reparamos nas vestes das personagens femininas, já que ambas usam roupas ocidentalizadas, e não trajes que remetem à cultura africana.<ref name="ANA PAULA" /> O corpo da mulher sentada está todo coberto por roupas, fazendo com que pareça mais europeu do que africano.<ref name="ANA PAULA" /> Aqui, está presente uma ideia de ajustamento das mulheres negras à moral cristã e a um ideal de reprodução branqueador.<ref name="ANA PAULA" />
O corpo da mulher sentada está todo coberto por roupas, fazendo com que pareça mais europeu do que africano.<ref name="ANA PAULA" /> Existe a teoria de que a mãe (sentada, ao centro da tela) seria a representação da [[Maria (mãe de Jesus)|Virgem Maria]] e o bebê, o [[Jesus|menino Jesus]].<ref name="TATIANA" /> Isso se deve graças a cor azul do xale em que está envolta, pois faz alusão ao manto usado pela Virgem Maria.<ref name="TATIANA" /> ▼
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Sentados, estão a mãe da criança, que a carrega em cima dos joelhos e um homem com as pernas cruzadas, supostamente o marido branco e responsável pelo "branqueamento" do descendente. A posição das mãos e olhares entre os personagens trazem coerência à mensagem que [[Modesto Brocos]] quis passar.<ref name="Itaú Cultural" /> A obra lhe rendeu a medalha de ouro no [[Salão Nacional de Belas Artes]] de [[1895]] e mostra os rumos da [[Artes do Brasil|arte brasileira]] no final do [[século XIX]].<ref name="Itaú Cultural" />
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No [[século XIX]], difundiu-se no Brasil a ideia de “branqueamento” da sociedade, que pretendia apagar os traços negros da população brasileira.<ref name="Vera Lucia Dal Santos da Cruz">{{citar web|url=http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/727-4.pdf|titulo=Refletindo sobre Gênero e Etnia no Ensino de História|data=|acessodata=29 de outubro de 2018|publicado=Dia a Dia Educação PR|ultimo=|primeiro=|autor=CRUZ, Vera Lucia Dal Santos}}</ref> Durante as primeiras décadas do [[século XX]], a industrialização, imigração e urbanização trouxe uma visão mais pessimista e de nacionalismo ao país.<ref name="A eugenia brasileira e suas conexões internacionais: uma análise a partir das controvérsias entre Renato Kehl e Edgard Roquette-Pinto, 1920-1930">{{citar web|url=http://ojs.ufgd.edu.br/index.php/historiaemreflexao/article/viewFile/1877/1041|titulo=A eugenia brasileira e suas conexões internacionais: uma análise a partir das controvérsias entre Renato Kehl e Edgard Roquette-Pinto, 1920-1930|data=|acessodata=29 de outubro de 2018|publicado=História em Reflexão|ultimo=|primeiro=|autor=SOUZA, Vanderlei Sebastião}}</ref> As duas guerras mundiais trouxeram a expansão do nacionalismo, aliando a ideia de raça à construção das nacionalidades.
[[Imagem:Francis Galton 1850s.jpg|direita|miniatura|Francis Galton, responsável por disseminar o ideal eugenístico.]] No final da primeira década do XIX, começamos a ver os primeiros traços do [[Eugenia|eugenismo]] no Brasil. O ideal eugênico foi disseminado por '''[[Francis Galton]]''' ([[Birmingham]], [[16 de fevereiro]] de [[1822]] — Haslemere, [[Surrey]], [[17 de janeiro]] de [[1911]])<ref name="Francis Galton - Wikipedia">{{citar web|url=https://pt.wikipedia.org/wiki/Francis_Galton|titulo=Francis Galton - Wikipedia|data=|acessodata=19 de novembro de 2018|publicado=Wikipedia, a Enciclopédia Livre|ultimo=|primeiro=|autor=WIKIPEDIA}}</ref> em [[1883]]. Primo de [[Charles Darwin]], afirmava que a [[seleção natural]] também era válida aos humanos. Sua crença era de que a capacidade intelectual não é individual, e sim [[Hereditariedade|hereditária]].<ref name="Tiago Ferreira">{{citar web|url=https://www.geledes.org.br/o-que-foi-o-movimento-de-eugenia-no-brasil-tao-absurdo-que-e-dificil-acreditar|titulo=O que foi o movimento de eugenia no Brasil: tão absurdo que é difícil acreditar|data=|acessodata=29 de outubro de 2018|publicado=Geledes.org|ultimo=|primeiro=|autor=FERREIRA, Tiago}}</ref> Seu projeto analisou a árvore genealógica de aproximadamente 9 mil famílias e tentava justificar a exclusão de diversos grupos: deficientes, negros, asiáticos e todos que não se encaixavam no "padrão europeu".<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Esse padrão era baseado na tese de que o europeu era o detentor da maior beleza, competência civilizacional e saúde em comparação às "demais raças", como a “amarela” (asiáticos), a “vermelha” (povos indígenas) e a negra (africana).<ref name="FERNANDES, Cláudio">{{citar web|url=https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiadobrasil/tese-branqueamento.htm|titulo=Tese do branqueamento: A tese do branqueamento teve grande repercussão no Brasil, no início do século XX, entre intelectuais, como João Baptista de Lacerda|data=|acessodata=19 de novembro de 2018|publicado=Mundo Educação|ultimo=|primeiro=|autor=FERNANDES, Cláudio}}</ref>
Em [[1917]], o médico e farmacêutico [[Renato Kehl]], foi o responsável por ampliar e disseminar o [[Eugenia|eugenismo no Brasil]].<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Kehl acreditava que a única forma do país prosperar era com um projeto que focasse no predomínio da raça branca, prezando pelo branqueamento da população negra.<ref name="Tiago Ferreira" /> Dentro de seus ideias, se encontravam a segregação pela cor da pele e dos deficientes, sejam físicos ou mentais.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Defendia a esterilização dos criminosos, regulamentação de um exame pré-nupcial (para garantir que a noiva era virgem), exames que assegurassem o divórcio caso a mulher tivesse 'filhos ilegítimos' ou fosse comprovado defeitos hereditários em sua família, educação eugênica obrigatória nas escolas e teste para medir a capacidade mental em crianças de 8 a 14 anos<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" />. Ele apresentou seus pensamentos em diversos congressos, e teve impacto em grupos de professores, médicos e adeptos do [[Higienismo|higienismo social]]. Assim, foi fundada, em [[1918]], a primeira sociedade eugênica da América latina, a Sociedade Eugênica de São Paulo (SESP).<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Alguns nomes conhecidos faziam parte do grupo.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" />
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==A Redenção de Cam como símbolo do branqueamento==
[[Imagem:Joao-baptista-de-lacerda.jpg|esquerda|miniatura|João Batista de Lacerda, [[Medicina|médico]], [[Ciência|cientista]] [[Brasil|brasileiro]] e um dos principais expoentes da "tese do [[Branqueamento racial|embranquecimento]]".<ref name="João Batista de Lacerda - Wikipedia" />]] Além do simbolismo já mencionado, a obra é considerada uma das pinturas mais racistas e reacionárias do século XIX. <ref name="Vanderlei Sebastião de Souza
">{{citar web | autor=RONCOLATO, Murilo | titulo=A tela ‘A Redenção de Cam’. E a tese do branqueamento no Brasil| publicado = Jornal Nexo| url=https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/06/14/A-tela-%E2%80%98A-Reden%C3%A7%C3%A3o-de-Cam%E2%80%99.-E-a-tese-do-branqueamento-no-Brasil| acessodata=3 de novembro de 2018}}</ref> A pintura aparece num processo [[Abolicionismo no Brasil|pós-abolicionista]] da nova república, que buscava pelo progresso usando a [[Europa]] como modelo.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Aos olhos da elite, o branco, era representava progresso, enquanto o negro, o atraso, passado.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> Nesse contexto surge o eugenismo e branqueamento mencionado anteriormente, que propunha a miscigenação como solução para deixar a população cada vez com um perfil mais europeu.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" /> A pintura é simplesmente uma representação visual do assunto presente no discurso dos "intelectuais" da época.<ref name="Vanderlei Sebastião de Souza" />
Em 1911, [[João Batista de Lacerda]] ([[Campos dos Goytacazes|Campos dos Goitacases]], [[12 de julho]] de [[1846]] — [[Rio de Janeiro (cidade)|Rio de Janeiro]], [[6 de agosto]] de [[1915]])<ref name="João Batista de Lacerda - Wikipedia">{{citar web|url=https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Batista_de_Lacerda|titulo=João Batista de Lacerda - Wikipedia|data=|acessodata=19 de novembro de 2018|publicado=Wikipedia, a Enciclopédia Livre|ultimo=|primeiro=|autor=WIKIPEDIA}}</ref>, um dos principais expoentes da "tese do [[Branqueamento racial|embranquecimento]]", usou ''A Redenção de Cam'' como ilustração para provar a legitimidade do que acreditava. Batista apresentou seu artigo
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* [[Democracia racial no Brasil]]
* [[Racismo no Brasil]]
* [[Emancipação]]
* [[Segregação racial nos Estados Unidos]]
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<references />
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* BROCOS, Modesto. ''Viaje a Marte''. Valencia: Ed. Arte y Letras, 1930.
* LACERDA, João Baptista. ''Sur les métis au Brésil''. Londres: Premiere Congrès Universel des Races, 1911.
* STEPAN, Nancy Leys. ''A hora da eugenia: raça, gênero e nação na América Latina''. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2014.
* SCHWARCZ, Lilia Moritz. ''O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil - 1870-1930''. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
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