Propriedades físico-químicas da água: diferenças entre revisões

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== História ==
As propriedades da água foram historicamente usadas para definir várias [[Temperatura#Unidades de temperatura|escalas de temperatura]]. Notavelmente, as escalas [[Kelvin]], [[Celsius]] e [[Fahrenheit]] foram, e ainda são, definidas pelos pontos de fusão e ebulição da água. As escalas menos comuns de [[Delisle]], de [[Newton]], de [[RéamurRéaumur]] e de [[Rømer]] foram definidas de maneira semelhante. O [[ponto triplo]] da água é ponto padrão usado mais comumente nos dias atuais.<ref>{{citar web|url=http://home.comcast.net/~igpl/Temperature.html|título=A Brief History of Temperature Measurement|língua=Inglês}}</ref>
 
A primeira decomposição científica de água em hidrogênio e oxigênio, por [[eletrólise]], foi feita no ano 1800 pelo químico inglês [[William Nicholson]]. Em 1805, [[Joseph Louis Gay-Lussac]] e [[Alexander von Humboldt]] mostraram que a água é composta de duas partes de hidrogênio e uma de oxigênio (em volume).
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[[Gilbert Newton Lewis]] isolou a primeira amostra de [[água pesada]] em 1933.
 
[[Ciência patológica|Poliágua]] foi uma forma [[polímero|polimerizada]] hipotética de água que foi alvo de controvérsia científica durante o fim da década de 1960. O consenso atual é o de que tal polímero não existe.
 
== Nomenclatura sistemática ==
A nomenclatura [[Nomenclatura química|IUPAC]] aceita para a água é simplesmente "água", mas há dois outros nomes que podem ser usados para descrever a molécula.
 
O primeiro e mais sistemático é '''óxido de hidrogênio'''. Esse nome é análogo ao de compostos correlatos, como o [[peróxido de hidrogênio]] (água oxigenada), o [[sulfeto de hidrogênio]] e o [[óxido de deutério]] (água pesada). Um outro nome sistemático, '''oxidano''', é aceito pela [[IUPAC]] como um nome pai para a nomenclatura sistemática de [[grupo substituinte|grupos substituintes]] baseados em oxigênio,<ref>{{citar periódico|autor=Leigh, G. J. ''et al.''|data=1998|url=http://www.iupac.org/publications/books/principles/principles_of_nomenclature.pdf|título=''Principles of chemical nomenclature: a guide to IUPAC recommendations''|editora=Blackwell Science Ltd, UK|língua=Inglês}}</ref> apesar de mesmo estes comumente terem outros nomes recomendados. Por exemplo, o nome [[hidroxila]] é recomentado no lugar de ''oxidanila'' para o grupo −OH. O nome [[oxano]]Oxano é explicitamente mencionado pela IUPAC como incompatível com esse propósito, pois já é o nome de um éter cíclico também conhecido como [[tetra-hidropirano]] no sistema de [[Hantzsch-Widman]]; dentre os compostos semelhantes, existem o [[dioxano]] e o [[trioxano]].
 
=== Nomenclatura sistemática e humor ===
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'''Monóxido de diidrogênio''' (às vezes '''Monóxido de di-hidrogênio'''), ou '''DHMO''' é um nome sistemático um tanto pedante para a água. O termo foi usado em [[paródia]]s de pesquisas químicas que clamavam pela abolição dessa "substância química letal". Na verdade, um nome sistemático mais realista seria simplesmente '''óxido de hidrogênio''', já que os prefixos "mono-" e "di-" são supérfluos. O [[sulfeto de hidrogênio]], H<sub>2</sub>S, nunca é chamado de "monossulfeto de diidrogênio", e o [[peróxido de hidrogênio]], H<sub>2</sub>O<sub>2</sub>, nunca é chamado de "dióxido de diidrogênio".
 
Algumas [[ficha de dados de segurança de material|fichas de dados de segurança de material]] a respeito da água, exagerando, dizem: ''"Cuidado! Pode causar afogamento!"<ref>{{citar web|url=http://www.davidgray.com.au/files/MSDS%20David%20Grays%20Distilled%20Water%20060106.pdf|título=MSDS David Grays Distilled Water|autor =David Grays|língua=Inglês}}</ref><ref>{{citar web|url=http://www.setonresourcecenter.com/msds/docs/wcd00008/wcd008c5.htm|título=MSDS for BATTERY WATER|língua=Inglês}}</ref>
 
Um outro nome sistemático para a água é '''ácido hidróxico''', ou '''ácido hidroxílico'''. De maneira semelhante, o nome para a água como base é '''hidróxido de hidrogênio''' — os dois nomes existem para a água porque ela pode reagir tanto como ácido quanto como base, dependendo da força do ácido ou da base com que reage ''(veja [[anfótero|anfoterismo]])''. Nenhum desses nomes é usado com frequência fora desses contextos humorísticos.
 
== Formas da água ==
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|colspan="2"| <small>Os valores abaixo de {{fmtn|0|[[grau Celsius|°C]]}} referem-<br />-se à água [[Sobrefusão|superfundida]].</small>
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A forma sólida da maioria das substâncias é mais [[densidade|densa]] que a [[fase (química)|fase]] líquida; assim, um bloco de uma ''substância'' sólida pura afunda num recipiente cheio da mesma ''substância'' líquida pura. Mas, ao contrário, um bloco de [[gelo]] comum flutua num recipiente com água, porque a água sólida é ''menos'' densa que a água líquida. Essa é uma propriedade característica da água e extremamente importante. À [[temperatura ambiente]], a água líquida fica mais densa à medida que diminui a temperatura, da mesma forma que as outras substâncias. Mas a 4 [[grau Celsius|°C]] (3,98 [[grau Celsius|°C]], mais precisamente), logo antes de congelar, a água atinge sua [[densidade máxima]] e, ao aproximar-se mais do [[ponto de fusão]], a água, sob condições normais de pressão, expande-se e torna-se ''menos'' densa. Isso se deve à [[estrutura cristalina]] do [[gelo]], conhecido como [[Gelo Ih|gelo I<sub>h</sub>]] [[Hexagonal (cristalografia)|hexagonal]]. A água, o [[chumbo]], o [[urânio]], o [[neônio]] e o [[silício]] são alguns dos poucos materiais que se expandem ao se solidificar; a maioria dos demais elementos se contrai. Deve-se notar, porém, que nem todas as formas de gelo são menos densas que a água líquida pura. Por exemplo, o [[gelo amorfo de alta densidade]] é mais denso que a água pura na fase líquida. Assim, a razão pela qual a forma comum do gelo é menos densa que a água é um pouco não-intuitiva e depende muito das propriedades incomuns inerentes às [[ligação de hidrogênio|ligações de hidrogênio]].
 
Geralmente, a água se expande ao congelar devido à sua [[estrutura molecular]] aliada à [[elasticidade]] incomum das ligações de hidrogênio e à conformação [[cristal]]ina particular de baixa energia que ela assume em condições normais de pressão. Isto é, ao resfriar-se, a água tenta organizar-se numa configuração de [[estrutura cristalina|rede cristalina]] que alonga as componentes [[rotação|rotacionais]] e [[vibração|vibracionais]] das ligações, de forma que cada molécula de água é afastada das vizinhas. Isso efetivamente reduz a densidade da água quando se forma gelo sob condições normais de pressão.
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==== Compressibilidade ====
A [[compressibilidade]] da água é uma função da pressão e da temperatura. A 0 [[grau Celsius|°C]], no limite de pressão zero, a compressibilidade é de 5 × 10<sup>−5</sup>&nbsp;[[Bar (pressão)|bar]]<sup>−1</sup>.<ref>{{citar periódico|autor =Fine, R.A. and Millero, F.J. |ano=1973 |título=Compressibility of water as a function of temperature and pressure |volume=59 |número=10 |página=5529 |periódico=Journal of Chemical Physics |doi=10.1063/1.1679903 |língua=Inglês}}</ref> No limite de pressão zero a compressibilidade atinge um mínimo de 4,4 × 10<sup>−5</sup>&nbsp;bar<sup>−1</sup> por volta de 45 [[grau Celsius|°C]] antes de aumentar novamente com o aumento da temperatura. À medida que a pressão aumenta, a compressibilidade diminui, sendo de 3,9 × 10<sup>−5</sup>&nbsp;bar<sup>−1</sup> a 0 [[grau Celsius|°C]] e 1000&nbsp;bar. O [[módulo de compressibilidade]] da água é 2,2×10<sup>9</sup>&nbsp;[[Pascal (unidade)|Pa]].<ref name = nave>{{citar web |título= Bulk Elastic Properties |autor = R. Nave |obra= HyperPhysics |publicado= [[Georgia State University]] | url = http://hyperphysics.phy-astr.gsu.edu/hbase/hph.html |acessodata= 26 de outubro de 2007 |língua=Inglês}}</ref>
 
A baixa compressibilidade dos materiais não-gasosos, e a da água em particular, faz com que sejam frequentemente tidos por incomprimíveis. A baixa compressibilidade da água significa que, nos [[oceano]]s profundos, a 4000&nbsp;[[metro]]s de profundidade, onde as pressões são acima de 4×10<sup>7</sup>&nbsp;Pa, há uma redução de apenas 1,8% no volume.<ref name = nave/>
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=== Tensão superficial ===
As gotas de água são estáveis devido à alta [[tensão superficial]] da água, 72,8 [[Newton (unidade)|mN]]/[[metro|m]], a mais alta dos líquidos não-metálicos. Isso pode ser visto quando se coloca pequenas quantidades de água numa superfície como o vidro: a água se mantém unida sob a forma de gotas. Essa propriedade é importante para a vida. Por exemplo, quando a água é transportada por um [[xilema]] em caules de plantas, as fortes atrações intermoleculares mantêm a coluna de água unida. Forças coesivas poderosas mantêm unida a coluna de água, e as propriedades fortemente adesivas da água a mantêm presa ao xilema, e impedem o rompimento da tensão causado pela [[corrente de transpiração]]. Outros líquidos de tensão superficial menor teriam uma maior tendência a “quebrar”, formando bolsas de vácuo ou de ar que fariam parar de funcionar o transporte de água pelo xilema.
 
=== Propriedades elétricas ===
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A água pode ser separada em seus elementos constituintes, hidrogênio e oxigênio, fazendo-se passar uma corrente elétrica por ela. Esse processo se chama [[eletrólise]]. Neste processo, as moléculas de água se dissociam naturalmente em íons H<sup>+</sup> e OH<sup>−</sup>, que são induzidos em direção aos eletrodos denominados [[cátodo]] e [[ânodo]]. No cátodo, dois íons H<sup>+</sup> ganham elétrons e formam gás H<sub>2</sub>. No ânodo, quatro íons OH<sup>−</sup> se combinam e liberam gás O<sub>2</sub>, moléculas de água, e quatro elétrons. Os gases produzidos borbulham até a superfície, onde podem ser coletados.
 
Sabe-se que a [[resistividade elétrica]] máxima teórica da água é de aproximadamente 182&nbsp;[[Ohm|kΩ]]·m²/m (ou 18,2&nbsp;MΩ·cm²/cm) a 25&nbsp;[[grau Celsius|°C]]. Esse valor é compatível com o que tipicamente se vê na [[osmose inversa]] e em sistemas de [[água ultrapura]] ultrafiltrada e deionizada usados, por exemplo, em fábricas de semicondutores. Um nível de contaminante salino ou ácido que exceda 100 partes por trilhão em volume (ppt v:v) em água ultrapura começa a baixar perceptivelmente seu nível de resistividade em até vários kΩ·m²/m (uma variação de várias centenas de [[Siemens (unidade)|nS]]/m de condutância).
 
==== Condutividade elétrica ====
A água pura apresenta ''baixa'' [[condutividade elétrica]], mas essa propriedade aumenta significativamente com a adição de uma pequena quantidade de um eletrólito, como o [[cloreto de hidrogênio]]. Assim, o risco de [[choque elétrico]] é muito maior em água com impurezas não encontradas na água pura. (Convém notar, porém, que o risco de choque elétrico diminui quando a concentração de impurezas é tal que torna a água um melhor condutor que o corpo humano. Por exemplo, o risco de choque elétrico na água do mar é maior que em água doce, porque a água do mar tem uma concentração muito maior de impurezas, particularmente o sal comum, e a corrente principal flui pelo melhor condutor. Isso não é sempre garantido, contudo, e subsiste um risco substancial na água salgada.) Todas as propriedades elétricas observáveis na água provêm dos [[íon]]s de sais minerais e de [[dióxido de carbono]] misturados nela. De fato, a água se [[auto-ionização da água|auto-ioniza]], processo em que duas moléculas de água se tornam um ânion [[hidróxido]] e um cátion [[hidrônio]], mas não o bastante para carregar [[corrente elétrica]] suficiente para exercer qualquer trabalho ou dano na maioria dos casos. Em água pura, um equipamento sensível pode detectar uma ligeira [[condutividade elétrica]] de 0,055&nbsp;[[Siemens (unidade)|μS]]/[[Centímetro|cm]] a 25 [[grau Celsius|°C]]. A água também pode, por meio de uma [[eletrólise]], separar-se nos gases hidrogênio e oxigênio, mas, na ausência de íons dissolvidos, esse é um processo muito lento, porque apenas uma corrente muito pequena pode ser conduzida. Enquanto os elétrons são os principais portadores de carga na água (e nos metais), no gelo (e em alguns outros eletrólitos) os [[prótons]] são os principais portadores (veja [[condutor de prótons[[próton]]s).
 
=== A natureza bipolar da água ===
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[[Ficheiro:Spider web Luc Viatour.jpg|thumb|Gotas de [[orvalho]] aderidas a uma [[teia de aranha]].]]
 
A água adere a si mesma (por [[coesão (química)|coesão]]) por ser [[molécula polar|polar]]. Pelo mesmo motivo, também apresenta fortes propriedades de [[adesão]]. Numa superfície de [[vidro]] muito limpa, a água ali depositada pode formar uma fina camada, porque as forças moleculares entre o vidro e a água (forças adesivas) são mais fortes que as coesivas. Nas células e em suas [[organela]]s, a água está em contato com superfícies [[hidrofilia|hidrofílicas]], que apresentam forte atração pela água. [[Irving Langmuir]] observou uma grande força repulsiva entre superfícies hidrofílicas. Desidratar superfícies hidrofílicas, isto é, remover as camadas de água fortemente aderidas a elas requer esforço significativo contra as forças de hidratação. Essas forças são grandes, mas diminuem rapidamente a uma distância de um nanômetro ou menos. A importância dessas forças para a biologia foi exensivamente estudada por [[V. Adrian Parsegian]], do [http://en.wikipedia.org/wiki/National_Institute_of_Health Instituto Nacional de Saúde] dos Estados Unidos (NIH).<ref>{{citar livro|autor=V. Adrian Parsegian|título=Physical Forces Organizing Biomolecules|língua=Inglês|url=http://www.biophysics.org/education/parsegian.pdf|acessadoem=7 de março de 2007|ref=harv}}</ref>
 
==== Tensão superficial ====
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=== A água como solvente ===
[[Ficheiro:Havasu Falls 1a md.jpg|thumb|esquerda|Altas concentrações de [[cal]] dissolvido dão cor de turquesa às águas das [[Cataratas de Havasu]].]]
 
Também devido à sua [[molécula polar|polaridade]], a água é um bom [[solvente]]. Substâncias que se misturam bem e se dissolvem na água (por exemplo, os [[sal|sais]]) são conhecidas como substâncias [[hidrofilia|hidrofílicas]], ao passo que as que não se misturam bem em água (por exemplo, [[lipídio|gorduras e óleos]]) são chamadas [[Hidrofobia#Química|hidrofóbicas]]. A capacidade de uma substância se dissolver em água depende de ela poder ou não igualar ou superar as grandes [[força dipolo permanente|forças atrativas]] que as moléculas de água exercem umas sobre as outras. Se uma substância tiver propriedades que a impeçam de superar essas grandes forças intermoleculares, suas moléculas são “[[Precipitação (química)|expulsas]]” da água, e não se dissolvem. Ao contrário do que normalmente se acredita, a água e as substâncias hidrofóbicas não se “repelem”, e a hidratação de uma superfície hidrofóbica é favorável energeticamente, mas não [[entropia|entropicamente]].
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=== Ligações de hidrogênio na água ===
Uma molécula de água pode formar, no máximo, quatro [[ligação de hidrogênio|ligações de hidrogênio]] porque pode receber dois hidrogênios e perder dois. Outras moléculas, como o [[fluoreto de hidrogênio]], a [[amônia]] e o [[metanol]], também formam ligações de hidrogênio, mas não apresentam os comportamentos anômalos de propriedades [[termodinâmica]]s, [[cinética]]s ou estruturais que se observam na água. A resposta para a aparente diferença entre a água e os demais líquidos que formam ligações de hidrogênio é que, com a exceção da água, nenhuma das moléculas que formam ligações de hidrogênio pode formar quatro ligações por não poderem perder ou receber hidrogênios ou devido a [[efeito estérico|efeitos estéricos]] em resíduos volumosos. Na água, uma ordem [[tetraedro|tetraédrica]] devida às quatro ligações de hidrogênio leva a uma estrutura aberta e a uma rede de ligações tridimensional, que contrasta com as estruturas mais unidas de [[líquido]]s simples. Há uma grande semelhança entre a água e a [[sílica]] em seu comportamento anômalo, apesar de a água ser um líquido que tem uma rede de ligações de hidrogênio e a sílica ter uma rede covalente com um ponto de fusão muito alto. Uma razão pela qual a água é apropriada para a vida é a de que suas propriedades únicas aparecem num regime de temperatura compatível com [[processo biológico|processos biológicos]] diversos, como a [[hidratação]].
 
Acredita-se que as ligações de hidrogênio na água se devem em grande parte a forças eletrostáticas e alguma parcela de covalência. A natureza parcialmente covalente das ligações de hidrogênio, prevista por [[Linus Pauling]] na década de 1930, ainda não foi provada conclusivamente por experimentos e cálculos teóricos.