Herodiano: diferenças entre revisões

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A respeito da sua nacionalidade, se tem de partir do único dado seguro que se conhece: a sua origem [[gregos|grega]] ou oriental. A esta conclusão chega-se pela circunstância de a sua obra estar escrita em [[Língua grega|grego]] e de Herodiano ser um derivado dum nome grego: Herodes. Precisamente, neste nome centraram-se muitos investigadores: enquanto Ἡρῴδῆς (''Hērōdēs'') é muito comum em todas as regiões de língua grega, Ἡρωδιανός (''Hērodianós'') era menos frequente. Ao longo da História, entre os que se chamam Herodiano encontramos certos personagens aos quais se pretendeu uma relação com o historiador:
 
* [[Herodiano de Alexandria]], gramático do {{séc|II}}, que viajou para [[Roma]] e pôs-se ao serviço de [[Marco Aurélio]]. Pretendeu-se ver nele o pai do historiador.;<ref>Cf. DOPP, “Herodianus” ''R.E. Pauly-Wissowa'', VIII, pág. 959</ref>
* Um tal [[Aurélio Herodiano Ptolomeu]] é também originário do [[Egito]], foi [[Guarda pretoriana|guarda pretoriano]] e faleceu em Roma ([[Corpus Inscriptionum Latinarum|CIL]] VI 13126).
* [[Tibério Claudio Herodiano]], senador e governador da [[Sicília (província romana)|Sicília]] pela mesma época em que viveu o historiador. Atualmente foi descartada a hipótese de que fosse parente ou até o mesmo historiador, dado que este possuía um conhecimento limitado da Sicília e é pouco provável que fosse senador.;<ref>WHITTAKER, C. R. ''op. cit.'', pp. XXXV-XXXVI.</ref>
 
* Em Colos, [[Ásia Menor]], foi descoberta uma inscrição (IGRR IV 1613) que em 256 gravou Aurélio Herodiano no túmulo da sua família. Devia ser de idade avançada, pois tinha filhos e netos. Possivelmente tivesse a mesma que o historiador, segundo afirmam os especialistas.<ref>Cf. ALFÖLDY, G. "Herodianos Person", em Ancien Society 2 (1971), pág. 226</ref> Isto dou pé a uma hipótese que afirma que este Aurélio Herodiano poderia ter sido o historiador se era um liberto de Marco Aurélio ou de [[Cômodo]], como sugerem algumas teorias sobre a sua vida. A zona onde apareceu igualmente coincide com a hipótese mais verossímil sobre a pátria de Herodiano, a qual afirma que o historiador poderia ser originário da [[Bitínia e Ponto]] ou da província da [[Ásia (província romana)|Ásia]]. Herodiano, quando fala dos povos orientais de além do [[Montes Tauro|Tauro]] ([[sírios]], [[judeus]], etc.), não parece ser considerado parte deles,<ref>Cf. HERODIANO, op. cit., III.11.8.</ref> e é inegável o interesse que mostra pela Ásia Menor. O seu conhecimento daquela região é evidente nas descrições detalhadas que sobre ela faz,<ref>Cf., por exemplo, a sua descrição da cordilheira do Tauro (III.3) ou a da baía de [[Issos]] (III.4.2-3).</ref> citando, além disso, as suas cidades com maior frequência na sua ''História'' que as cidades de outras regiões.<ref>Cf. ALFÖLDY, G. ''op. cit.,'' pp. 223-225.</ref>
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Embora a teoria que afirma que Herodiano era originário da Ásia Menor seja a mais verossímil, outras relacionam-no com outras regiões, assim como sucede com o seu nome:
* O historiador seria do Egito, concretamente de [[Alexandria]].<ref>Cf. o artigo de SIEVERS, R. "Über das Geschichtswerk des Herodianos", em ''Philologus'' 31 (1872), pp. 636-7.</ref> Contudo, o único argumento com o que contam os defensores desta hipótese é a descrição da matança de [[Alexandria|alexandrinos]] ordenada por [[Caracala]], vindo-se embaixo quando os detratores da teoria observam certas imprecisões do historiador na descrição da cidade.;<ref>Cf. WHITTAKER, C. R. ''op. cit.'', pp. LXVII-LXVIII.</ref>
* Herodiano seria sírio.<ref>SMITS, P. ''De Geschiedschrijver Herodianus en zijn Bronnen'', Leiden, 1913, pág. 16.</ref> Os seus defensores argumentam que Herodiano estava mais bem informado sobre a [[província romana]] da [[Síria (província romana)|Síria]] que sobre qualquer outro lugar, e que [[Antioquia]] (à qual considera a segunda cidade do império) foi o palco de muitos acontecimentos da ''História''. Contudo, pode-se argumentar que o interesse do historiador pela Síria é devido unicamente ao importantíssimo papel que teve nessa época. Adicionalmente, observou-se que não é verdade que Herodiano conhecesse tudo sobre a região,<ref>CASSOLA, F. "Sulla vita e sulla personalità dello storico Erodiano", em Nuova Rivista Storica 41 (1957), pág. 215.</ref> pois há erros na cronologia e na geografia da campanha de [[Sétimo Severo]] contra os partos (anos 197-198) e confunde regiões e reis limítrofes, coisa difícil em alguém oriundo dessa província.
 
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A data de composição da obra foi amplamente debatida, mas atualmente prevalece a teoria de que Herodiano a escreveu no final do reinado de [[Filipe, o Árabe]] ou a princípios do de [[Décio]] (por volta de 250).<ref>Cf. BLAUFUSS, J. ''Ad Herodiani rerum Romanarum scriptoris livros V VI observationes'', Diss., Erlangen, 1893, págs. 5-6.</ref> Há, além disso, uma série de circunstâncias que apoiam esta ideia:
 
* Existem paralelos na ''História'' com a vida de Filipe que se tratam favoravelmente, com a intenção, seguramente, de bajular ao imperador (por exemplo, e ao contrário de [[Dião Cássio]], trata favoravelmente a [[Macrino]], quem ascendeu ao poder de uma forma similar a como o fez Filipe).;<ref>Cf. CASSOLA, F. "Sulla vita e sulla personalità dello storico Erodiano", em Nuova Rivista Storica 41 (1957), pág. 218.</ref>
* Durante o reinado de Filipe houve igualmente uma ocasião muito oportuna para que os escritores contassem com o apoio imperial na publicação das suas obras: os [[Jogos Seculares]] de 248, nos quais se celebrava o milenário da fundação de Roma. O anúncio dos jogos em 247, quando Filipe voltou da campanha do [[Danúbio]], deveu ser a causa pela qual Herodiano terminou precipitadamente a sua obra, segundo se vislumbra no estilo apressado dos últimos livros frente à elegância retórica dos primeiros.;<ref>Cf. WIDMER, W. ''Kaisertum,Rom und Welt in Herodianos "Metà Márkon basileias historia"'', Zurich, 1967, pp. 70-71.</ref>
* Além disso, frente à teoria de que Herodiano compôs a ''História'' durante o reinado de Gordiano III (totalmente recusada hoje) argumentou-se que devido às críticas do historiador, a publicação da obra nesse período se tornasse perigosa para ele.<ref>Cf. JOUBERT, S. ''Reserche sur la composition de l'Histoire d'Heródien'', Thèse dactyl., Paris-Sorbona, 1981, págs. 124-127.</ref>
 
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Herodiano foi elogiado e criticado em partes iguais.<ref>Cf. TORRES ESBARRANCH (1985), pp. 70 e ss.</ref> A primeira pessoa que se conhece que fez uma crítica da ''História'' de Herodiano foi o [[patriarca de Constantinopla]], [[Fócio]], no {{séc|IX}}. De Herodiano escreveu "''que não exagera com a hipérbole nem omite nada essencial. Em definitiva, em todas as virtudes da historiografia há poucos homens que são os seus superiores''".<ref>Foc. Bibl. code. 99.</ref> [[Zósimo (historiador)|Zósimo]] usou-o como fonte, assim como João de Antioquia, quando escreveu a sua Crônica. Séculos mais tarde, Altheim elogiou a visão ampla da sua época que teve Herodiano,<ref>Cf. ALTHEIM, F. ''Literatur und Gesellschaft in ausgehenden Alterum'' (1948), Halle, pág. 165.</ref> e F. A. Wolf aclamou por não se deixar levar pelos prejuízos nem pela superstição.<ref>Cf. WOLF, F. A. Herod. ed., Halle, 1792.</ref> Contudo, nem todos os julgamentos sobre Herodiano são positivos: por exemplo, Wolf também disse que Herodiano tinha uma deficiência na capacidade crítica, e embora os autores da ''História Augusta'' se servissem de Herodiano como fonte, também o censuraram pela sua parcialidade.<ref>Cf. ''Scriptores Historiae Augustae'', Max. XIII, 4.</ref> Adicionalmente, está constatado que Herodiano não foi a principal fonte de Zósimo. Do mesmo jeito, parece que Zonaras apenas usou Herodiano onde a história de Dião Cássio era pouco válida.
 
Herodiano foi criticado pela falta de precisão histórica, ainda que estudos recentes tendessem a valorizá-lo novamente, a legitimar os seus comentários históricos e a pôr a sua ''História'', até mesmo, ao mesmo nível que a de [[Dião Cássio|Dião]]<ref>Cf. Q. Cataudella (''História da literatura grega'', trad. esp., Barcelona, 1954, pág. 316) escreve: "''Herodiano, embora seja menos conhecido, não é inferior a Dião Cássio e superior certamente a ele em aspecto artístico''".</ref> a pesar dos erros que apresenta: no livro segundo, o historiador afirma que a sua intenção era apresentar ''"uma narração por ordem cronológica das ações mais sobressalentes conseguidas''" (II.15.7). Devido a isto, às vezes contam-se um grande número de eventos numa sozinha referência ou duas. Por exemplo, todos os fatos da campanha de Caracala ao norte durante 213 e 214 condensam-se em duas curtas alusões. Do mesmo jeito, numa referência soma ao Inverno em [[Sirmio]] todas as batalhas de [[Maximino Trácio]] no [[Rio RenoARenoReno]] e o [[Rio Danúbio|Danúbio]] de 236 a 238. Por vezes, Herodiano também fica curto nas suas descrições geográficas: confunde Arábia Escenita com [[Arábia FélixFeliz]] (III.9.3-9) e afirma que em [[BatalhoBatalha de Isso|Isso]] foi travada a batalha final entre [[Alexandre, o Grande]] e [[Dario III]]. Em que pese a estes erros e omissões, é reconhecido como um historiador com um notável esforço por ser objetivo e por oferecer uma visão ordenada e clara dos fatos que considera decisivos.<ref>Cf. CASSOLA, F. ed.: Erodiano, ''Storia dell'impero romano dopo Marco Aurelio'', Florença, 1967, Introd., pp. XVI-XVII.</ref> Fatos, por outro lado, dos quais foi testemunha e dos quais não ficariam apenas testemunhos de não ser pela sua ''História''.
 
A respeito de Dião Cássio, tanto ele como Herodiano apresentam muitos erros nas suas histórias. Dião é reconhecido como o experto que se trata do [[Senado romano|senado]]. Porém, Herodiano avantaja a Dião na sua descrição da reação das pessoas ante os acontecimentos que sucediam naquela época. O trabalho de Dião não é sempre o mais exato dos dois (apresentando uma leve tendência a elogiar Septímio Severo)<ref>Cf. CATAUDELLA, Q. ''op. cit.'', pp. 45-47.</ref> e pensa-se que não deve ser tratado como um texto de maior categoria que o de Herodiano.<ref>ALTHEIM, F. ''op. cit.'', pág. 165.</ref>