Nau dos insensatos: diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
m
Linha 1:
{{ver desambiguação}}
[[Ficheiro:Narrenschiff (1549).jpg|thumb|A Nau dos Insensatos, retratada numa [[xilogravura]] alemã de 1549.]]
[[File:Wheel_of_fortune.png|ligação=https://en.wikipedia.org/wiki/File:Wheel_of_fortune.png|miniaturadaimagem|Ilustração por [[Albrecht Dürer]] em ''Stultifera navis'' por [[Sebastian Brant]], publicado por Johann Bergmann von Olpe, em [[Basel]], 1498.]]
[[File:Jheronimus Bosch 011.jpg|thumb|''A Nau dos Insensatos'', por [[Hieronymus Bosch]] ([[c.]] [[1490]]-[[1500]])]]
A '''nau dos insensatos''' ou o '''navio dos loucos''' é uma antiga [[alegoria]] muito usada na [[cultura ocidental]], na [[literatura]] e nas [[artes visuais]]. Imbuída de um senso de [[autocrítica]], ela descreve o mundo e seus habitantes humanos como uma [[nau]], cujos passageiros perturbados não sabem e nem se importam em saber para onde estão indo. Em composições literárias e artísticas dos séculos XV e XVI, o [[Motivo (artes plásticas)|motivo]] da nau dos insensatos era uma [[paródia]] da ''[[Arca de Noé|arca da salvação]]''.
 
A ideia já está presente na [[alegoria do navio]], apresentada no Livro VI da ''[[República (Platão)|República]]'' de [[Platão]] e que se refere a uma embarcação conduzida por uma tripulação disfuncional. A alegoria pretende representar os problemas de governança que prevalecem em um sistema político não baseado no conhecimento especializado, como as [[Democracia|democracias]] [[Demagogia|demagógicas]]:<blockquote>Há o armador, maior e mais forte do que todos no navio, mas um tanto surdo e um tanto míope, com um conhecimento de navegação que se compara à sua visão. Os marinheiros discutem entre si pela capitania do navio, cada um pensando que deveria ser capitão, embora nunca tenha aprendido essa habilidade, nem possa apontar quem o ensinou ou uma época em que a estava aprendendo. Além disso, eles dizem que ela não pode ser ensinada. Na verdade, eles estão preparados para cortar em pedaços qualquer um que diga que pode. O próprio comandante está sempre cercado por eles. Eles lhe imploram e fazem tudo o que podem para que ele lhes entregue o leme. Às vezes, se outras pessoas podem persuadi-lo e eles não podem, matam os outros ou os jogam ao mar. Então imobilizam seu digno comandante com drogas ou bebida ou por algum outro meio, e assumem o controle do navio, consumindo o que ele está carregando. Bebendo e festejando, eles navegam da maneira que você esperaria que pessoas assim navegassem. Mais do que isso, se alguém sabe encontrar para eles meios de persuadir ou obrigar o comandante a deixá-los assumir o controle, eles o chamam de um verdadeiro marinheiro, um verdadeiro capitão, e dizem que ele realmente entende de navios. Quem não consegue fazer isso é tratado com desprezo, chamando-o de inútil. Eles nem mesmo começam a entender que, se alguém deseja estar realmente apto para assumir o comando de um navio, um capitão de um navio de verdade deve necessariamente estar completamente familiarizado com as estações do ano, as estrelas no céu, os ventos e tudo mais a ver com sua arte. Quanto a como ele vai dirigir o navio - independentemente de alguém querer ou não - eles não consideram isso como uma habilidade ou estudo adicional que pode ser adquirido além da arte de ser o capitão de um navio. Se for esta a situação a bordo, você não acha que a pessoa genuinamente equipada para ser capitão será chamada de alguém com cabeça nas nuvens (μετεωροσκόπον, "olhador de estrelas"), tagarela, sem utilidade para eles, por quem navega em navios com esse tipo de tripulação?<ref>{{cite book|url=https://books.google.com/books?id=aPwPjVIxbGQC&pg=PA191|title=The Republic|last=Platão|primeiro=|editora=|ano=|local=|página=|páginas=|chapter=Livro 6, 488b-489a|editor-last=Ferrari|editor-first=G R F|translator-last=Griffith|translator-first=Tom|publisher=Cambridge University Press|page=191-192}}</ref></blockquote> Paula da Cunha Corrêa sugere que Platão se inspirou também num poema de [[Eveno de Paros|Eveno]] (fragmento 8b), que descreve em alegoria:<ref>Corrêa, Paula da Cunha (2016). [https://www.researchgate.net/publication/301582816_The_'Ship_of_Fools'_in_Euenus_8b_and_Plato's_Republic_488a-489a «The 'Ship of Fools' in Euenos 8b and Plato's ''Republic'' 488a–489a»]. In: Swift, Laura; Carey, Christopher. ''Iambus and Elegy: New Approaches'' (em inglês). [S.l.]: Oxford University Press</ref><blockquote>Se eu tivesse riqueza, Simônides, não me sentiria angustiado como agora me sinto na companhia dos nobres. Mas agora estou ciente de que ela passa por mim e estou sem voz por necessidade, embora eu saiba uma coisa ainda melhor do que muitos, que agora estamos sendo carregados com velas brancas abaixadas além do mar [[Melos|meliano]] através da noite escura, e eles se recusam a sair, mas o mar está inundando os dois lados. Na verdade, qualquer pessoa tem muita dificuldade em se salvar, porque estão fazendo essas coisas: depuseram o nobre timoneiro que habilmente vigiava; apoderam-se de bens à força, perde-se a disciplina e já não existe uma distribuição igual no interesse comum; mercadores comandam, e os inferiores estão acima dos nobres. Tenho medo de que talvez uma onda engula o navio. Que essas sejam minhas palavras enigmáticas com significado oculto para os nobres; mas mesmo um homem comum, se ele é sábio, pode reconhecer.</blockquote>[[Michel Foucault]], em ''[[Histoire de la folie à l'âge classique|Folie et Déraison. Histoire de la Folie à l'Âge Classique]]'', via na nau dos insensatos um símbolo da consciência viva do pecado e do mal, na mentalidade medieval e nas paisagens imaginativas da [[Renascença]] (no sentido esboçado acima e compendiado pelo ''[[Elogio da Loucura]]'' de [[Erasmo de Roterdam]] e ''Narrenschiff'' de [[Sebastian Brant]]). Em seu livro, Foucault descreve a importância da nau como [[metáfora]] recorrente nas artes e literatura quinhentista e seiscentista, mas apesar de alegar que de fato teriam existido essas naus, para a exclusão de insanos, não há prova de sua existência, e os únicos relatos são de encenações morais e procissões.<ref>{{Citar periódico |titulo=The ship of fools: Stultifera Navis or ignis fatuus? |url=https://psycnet.apa.org/record/1983-06077-001 |jornal=American Psychologist |data=1982 |issn=1935-990X |paginas=756–761 |numero=7 |acessodata=2020-10-08 |doi=10.1037/0003-066x.37.7.756 |primeiro=Winifred B. |ultimo=Maher |primeiro2=Brendan |ultimo2=Maher |publicado=}}</ref><ref>{{Citar periódico |titulo=“Border Liners”. The Ship of Fools Tradition in Sixteenth-Century England |url=http://journals.openedition.org/trans/421 |jornal=TRANS-. Revue de littérature générale et comparée |data=2010-07-08 |issn=1778-3887 |numero=10 |acessodata=2020-10-08 |doi=10.4000/trans.421 |lingua=en |primeiro=Zita |ultimo=Turi}}</ref>