Revelações da vigilância global (1970–2013)

As revelações da vigilância global (1970–2013) referem-se à divulgação, a partir da década de 1970 até o ano de 2013, de informações sobre fatos e organizações relacionados com a prática de espionagem e vigilância globalizada - isto é, além das fronteiras internacionais - e com capacidade de intromissão nos meios de comunicações de todo o mundo.[8]

Cronologia
Os ataques de 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center levaram a reformas gigantescas nas agências americanas de inteligência, abrindo caminho para a criação da posição de Director of National Intelligence
  • Em 6 de dezembro de 2005, depois de não revelar a informação por um ano, o The New York Times publicou o artigo que dizia: "Bush deixa Estados Unidos espionar em ligações telefônicas sem autorização judicial (original:Bush Lets U.S. Spy on Callers Without Courts) [4]
Em 1 de janeiro de 2006, George W. Bush afirmou: "O programa é limitado e usado para prevenir ataques aos Estados Unidos. E repito, limitado".[5]
  • Em 11 de maio de 2006, o USA Today reportou que a NSA possui um banco de dados imenso das ligações telefônicas dos americanos. Depois disto, Bush reafirmou que a vigilância da NSA é limitada e dentro da lei.[6]
  • Em 6 de junho de 2013, o jornal britânico The Guardian publicou que a NSA estaria coletando diariamente os dados das ligações telefônicas de milhões de clientes da Verizon."[7]
    No dia 7 de junho de 2013, Barack Obama afirmou enfaticamente que o programa de vigilância do governo era para prevenir terrorismo.

A existência da National Security Agency (NSA), fundada em 1952, só foi conhecida pelo Congresso dos Estados Unidos durante as investigações do Church Committee, em 1975,[2][9] mas a ideia de que a organização pudesse ser parte de um eventual sistema de vigilância em massa (ou mesmo que existisse um tal sistema) era frequentemente associada à teorias da conspiração, mesmo após a descoberta do projeto Echelon, no final da década de 1980, quando uma funcionária da Lockheed Space and Missiles Corporation contou a um membro do Congresso que as chamadas telefônicas de um senador do Partido Republicano estavam sendo interceptadas pela NSA. Na época, os investigadores do Congresso concluíram que "atingir personalidades políticas dos Estados Unidos não é um acidente, mas algo planejado por dentro do sistema, desde o início."[10] No mesmo ano, um artigo intitulado "Somebody's Listening" ('Alguém Está Ouvindo'), escrito pelo jornalista investigativo Duncan Campbell, no New Statesman, descreveu sinais de atividades de coleta de informações para uma rede de computadores cujo codinome era "Echelon".[10]

Em 2013, o projeto Echelon passou a receber atenção da opinião pública mundial, após as revelações de Edward Snowden, que apresentaram milhares de documentos sobre as atividades de vigilância da NSA e sobre os programas que, até então, haviam sido relegados ao plano especulativo ou mesmo conspiratório.[11][12][13][14]

Cronologia editar

1970–1980 editar

Em 1972, Perry Fellwock, analista da NSA, revelou aos leitores da Ramparts a existência da NSA e do Tratado de Segurança UK-USA.[15] Em 1976, outro artigo publicado na Time Out revela a existência do Government Communications Headquarters (GCHQ).[16]

1980–1990 editar

Em 1982, o livro de James Bamford sobre a NSA, The Puzzle Palace, foi publicado. O segundo livro de Bamford, Body of Secrets: Anatomy of the Ultra-Secret National Security Agency, foi publicado duas décadas depois.

Em 1988, a rede de espionagem Echelon foi revelada por Margaret Newsham, funcionaria da Lockheed Corporation. Newsham contou aos membros do congresso americano que as ligações telefônicas de Strom Thurmond, membro do Partido Republicano, estavam sendo coletadas pela NSA. Investigadores do Congresso concluíram que não poderia ser por acaso que uma figura política fosse alvo de espionagem. Concluiu-se que a espionagem de Strom foi deliberada desde o princípio."[17]

Ao final da década de 1990, estimava-se que a rede Echelon já era capaz de monitorar 90% de todo o tráfego da internet. De acordo com a BBC em maio de 2001, o Governo dos Estados Unidos nega a existência da rede Echelon."[18]

2000–2010 editar

Depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, William Binney, oficial da inteligência americana por quase 40 anos, juntamente com J. Kirke Wiebe e Edward Loomis, solicitaram ao Departamento de Defesa que investigasse a NSA por gastos indevidos na ordem de milhões e milhões de dólares em um projeto chamado Projeto Trailblazer. Um sistema destinado a analisar dados de redes de comunicações como a Internet. Binney criticou publicamente a NSA por estar interceptando as comunicações dos americanos desde o ataque de 11 de setembro de 2001.[19] Binney declarou que a NSA havia fracassado em suas intenções de esclarecer as causas e os autores do 11 de setembro, apesar da captação e vigilância massiva de dados.[20]

Em 16 de dezembro de 2005, depois esconder por um ano a informação, o The New York Times publicou um artigo que diz: "Bush deixa os Estados Unidos espionar em ligações telefônicas sem autorização judicial", escrito por Eric Lichtblau e pelo jornalista James Risen, ganhador do Prêmio Pulitzer.[21]

Em 2006, mais detalhes sobre o sistema de vigilância doméstica emergiram através do USA Today. O jornal reportou que a NSA possuía um banco de dados imenso das ligações telefônicas dos americanos. De acordo com o jornal, os dados desta coleta em massa de dados de telefonemas foram fornecidos pelas próprias companhias telefônicas, entre elas a AT&T, a Verizon e a BellSouth.[22]

Em 2008, o analista de segurança Babak Pasdar revelou a existência do chamado Circuito de Quântico, que ele e seu grupo de trabalho haviam criado em 2003. O sistema dava ao governo americano acesso de backdoor a um provedor de serviço de wireless. Na ocasião não foi revelado quem era o provedor, porém mais tarde foi identificada a firma - a Verizon.[23]

2010–2013 editar

Em 2011, detalhes da indústria de vigilância em massa forma expostos através de WikiLeaks. De acordo com Julian Assange, "Estamos agora em um mundo em que não apenas e teoricamente possível gravar quase todo o tráfico de telecomunicações de um país, todas as ligações telefônicas, mas também há uma indústria internacional de vigilância em massa vendendo o que se faz necessário para estabelecer a vigilância.[24][25]

2013–presente editar

Em 5 de junho de 2013, através do The Guardian e juntamente com vários outros jornais, incluindo o The New York Times, o The Washington Post e o Der Spiegel, Greenwald iniciou as publicações com as revelações de vigilância eletrônica global americana executada pela Agência de Segurança Nacional (NSA), baseadas em documentos vazados pelo ex-consultor da NSA, o analista de segurança de redes Edward Snowden.[26][27]

No Brasil, o programa Fantástico do dia 8 de setembro de 2013, baseado em documentos fornecidos por Snowden a Greenwald, revelou que a NSA vem espionando a Petrobras com fins de beneficiar os americanos nas transações com o Brasil.[28] Ainda em 2013, em reportagem com a jornalista Sônia Bridi, Grenwald revelou que além de grandes empresas como a Petrobras, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, foi espionada pelo governo americano.[29]

A partir de então, as revelações têm se tornado mais alarmantes a cada dia e têm provocado reação em todos os países do mundo e na comunidade de especialistas em proteção da internet.[30][31] Elas vão desde a participação nos programas de vigilância de empresas como Google, Facebook, Microsoft, a contaminação de computadores no mundo todo e a quebra dos códigos de criptografia da internet, fazendo toda a internet vulnerável a ataques tanto pela NSA americana como por criminosos.[32]

As revelações da vigilância global trouxeram à tona as alegações de que Google, Yahoo!, Facebook e Microsoft estão entre as muitas empresas intencionalmente cooperando com a NSA, oferecendo acesso aos seus sistema via uma backdoor criada especialmente para atender aos interesses da Agência. As empresas negam tal participação.[33]

No caso de sistemas operacionais como o Linux, criado por Linus Torvalds, do departamento de ciência da computação da Universidade de Helsinque, na Finlândia, a agência americana NSA pediu a Torvalds para criar uma backdoor no GNU/Linux através do qual eles poderiam acessar o sistema.[34] Apesar de Linus Torvalds não ter esclarecido a resposta a NSA, um acesso de backdoor se torna impossível devido à natureza de código aberto do Linux.

No caso do sistema de código aberto, se fossem deixados acessos para a NSA, eles seriam encontrados, expostos e erradicados pela comunidade, eliminando qualquer acesso possivelmente concedido a NSA.

Propósitos editar

De acordo com documentos revelados por Snowden, os programas não visavam combater terrorismo e eram empregados para espionagem comercial, industrial e por vários outros motivos, conforme mostravam os documentos.

Em depoimento ao Congresso Brasileiro, Greenwald, que tinha acesso a todos os documentos (em fevereiro de 2014, cerca de apenas 2% dos documentos foram publicados), afirmou que os objetivos dos programas são espionagem industrial, controle social e manipulação diplomática. Edward Snowden confirmou as afirmações de Greenwald e ainda declarou que, tendo visto a operação dos sistemas e como eles vinham sendo usados, ele poderia garantir que tais programas jamais tiveram a ver com terrorismo, mas sim com manipulação diplomática, controle de pessoas, espionagem para dar vantagem aos Estados Unidos e seus colaboradores.[35][36]

Resposta do Governo Americano editar

A administração de Obama defendeu as atividades afirmando serem:

"uma ferramenta fundamental para proteger a nação de ameaças terroristas".

Alega também que a coleta se refere exclusivamente a metadados dos telefonemas e não o conteúdo das próprias chamadas. Metadados se assemelham ao "envelope" de uma ligação telefônica ou de um e-mail mas contendo informações mais detalhadas do que apenas destinatário e remetente com respectivos endereços. Metadados contêm as informações detalhadas sobre a comunicação, sejam e-mails, ligações telefônicas ou mensagens de texto. Metadados informam em detalhes, por exemplo, destino, a duração de uma chamada, data, localização da origem de onde foi iniciada a comunicação, localização do usuário que iniciou e do recipiente, tipo de computador ou telefone usado.[37] A coleta de metadados foi, no passado, parte fundamental do sistema de vigilância da Alemanha Oriental. Documentos históricos, obtidos apenas após a queda do regime, mostram que coleta de metadados um dos instrumentos utilizados pela Stasi, a polícia secreta da Alemanha Oriental, para determinar as conexões sociais de indivíduos considerados perigosos para o regime da RDA.[38]

Após as primeiras publicações na imprensa, especialistas em tecnologia e defensores de direitos civis imediatamente apontam para o fato da Casa Branca minimizar a importância de metadados que, na verdade, fornecem informações mais detalhadas sobre a vida de indivíduos do que o próprio conteúdo uma vez que podem ser usados para traçar o perfil das relações e atividades pessoais com maior abrangência. Jameel Jaffer, diretor jurídico da União Americana pelas Liberdades Civis, disse:[37]

"Do ponto de vista das liberdades civis, o programa não poderia ser mais alarmante. É um programa em que um número incontável de pessoas inocentes foram colocados sob a vigilância constante de agentes do governo americano. É além de orwelliano, e fornece uma evidência adicional da dimensão em que direitos democráticos básicos estão sendo destruídos em segredo para atender as demandas dos órgãos de inteligência irresponsáveis".

Em fevereiro de 2014, revelações sobre os programas de vigilância continuavam a emergir.

Apresentações da NSA reveladas em 2013 editar

Referências

  1. Schorr, Daniel (29 de janeiro de 2006). «A Brief History of the NSA». NPR. Consultado em 2 de fevereiro de 2014 
  2. a b Ewen MacAskill, Julian Borger and Glenn Greenwald (6 de junho de 2013). «The National Security Agency: surveillance giant with eyes on America». The Guardian. Consultado em 2 de fevereiro de 2014 
  3. Andrew Bomford (3 de novembro de 1999). «Echelon spy network revealed». BBC 
  4. Risen, James; Lichtblau, Eric. «Bush deixa Estados Unidos espionar em ligações telefonicas sem autorização judicial original:Bush Lets U.S. Spy on Callers Without Courts». The New York Times. Consultado em 14 de Agosto de 2013. The White House asked The New York Times not to publish this article 
  5. «President Visits Troops at Brooke Army Medical Center». White House. 1 de janeiro de 2006. Consultado em 15 de agosto de 2013 
  6. JOHN O'NEIL (11 de maio de 2006). «Bush reafirma que a vigilância da NSA é limitada e dentro da Lei (Ingles-Bush Says U.S. Spying Is Not Widespread)». The New York Times 
  7. Glenn Greenwald (6 de junho de 2013). «NSA collecting phone records of millions of Verizon customers daily». The Guardian. Consultado em 16 de setembro de 2013 
  8. Webb, Maureen (2007). Illusions of Security: Global Surveillance and Democracy in the Post-9/11 World 1. ed. San Francisco: City Lights Books. ISBN 0872864766 
  9. «How a 30-year-old lawyer exposed NSA mass surveillance of Americans—in 197. Project SHAMROCK allowed the NSA to intercept telegrams sent by US citizens.»  Por Nate Anderson. 30 de junho de 2013.
  10. a b Campbell, Duncan (12 de agosto de 1988). «Somebody's Listening» (PDF). New Statesman. Consultado em 27 de novembro de 2013 
  11. «NSA violou normas e lei de espionagem milhares de vezes». VEJA. 16 de agosto de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022  Espionagem dos Estados Unidos:Cronologia- VEJA - 16 de agosto de 2013
  12. Edward Snowden fala sobre o que é a vigilância da NSA (Video em inglês) - Debates Munk, Toronto, Canada, Maio 2014 - Snowden
  13. «Brasil sabe desde 2001 que os EUA espionam internet». Folha de S. Paulo. 11 de julho de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 
  14. Barton Gellman (23 de dezembro de 2013). «Edward Snowden, after months of NSA revelations, says his mission's accomplished» (em inglês). The Washington Post. Consultado em 19 de abril de 2022 
  15. «USA Espionagem Eletronica : Memorias». Ramparts. Agosto de 1972. pp. 35–50. A comunidade de SIGINT foi definida por um tratado secreto assinado em 1947. Chamava-se o tratado UKUSA. A Agência Nacional de Segurança assinou em nome dos Estados Unidos e se torna a chamada "Parte primeira" do Tratado. 
  16. Norton-Taylor, Richard (21 de agosto de 2013). «Surveillance secrecy: the legacy of Government Communications Headquarters's years under cover». The Guardian. Consultado em 30 de novembro de 2013. Government Communications Headquarters's cover was first blown in 1976 by an article, The Eavesdroppers, published by the London magazine, Time Out. 
  17. «Somebody's Listening» (em inglês). New Statesman. Consultado em 19 de abril de 2022 
  18. «Q&A: O que voce precisa saber sobre a rede Echelon». BBC. 29 de maio de 2001. Consultado em 18 de dezembro de 2013 
  19. Shorrock, Tim (15 de abril de 2013). «A estoria nao contada: Obama ataque os que revelam irregularidades: Os quatro da NSA revelam como uma combinacao toxica de velhacaria e fraude cegou a agencia antes de 9/11». The Nation 
  20. Mayer, Jane (23 de maio de 2011). «The Secret Sharer: Is Thomas Drake an enemy of the state?». The New Yorker 
  21. JAMES RISEN and ERIC LICHTBLAU (16 de dezembro de 2005). «Bush Lets U.S. Spy on Callers Without Courts». The New York Times 
  22. Leslie Cauley (5 de novembro de 2006). «NSA has massive database of Americans' phone calls». USA Today 
  23. Poulsen, Kevin. «Whistle-Blower: Feds Have a Backdoor Into Wireless Carrier—Congress Reacts». Wired. Consultado em 14 de agosto de 2013 
  24. «WikiLeaks: quem lucra com a espionagem digital». CartaCapital. 5 de setembro de 2013. Consultado em 21 de março de 2014 
  25. «Wikileaks disclosure shines light on Big Brother». CBS News. 1 de dezembro de 2011 
  26. «Entenda o caso de Edward Snowden, que revelou espionagem dos EUA». G1. 2 de julho de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 
  27. «'Brasil é um grande alvo', diz jornalista sobre vigilância dos EUA». Fantástico. 7 de julho de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 
  28. «Petrobras foi espionada pelos EUA, apontam documentos da NSA». Fantástico. 8 de setembro de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 
  29. «Documentos da NSA apontam Dilma Rousseff como alvo de espionagem». G1. 1 de setembro de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 
  30. «Revelações mostram que NSA pode quebrar barreiras de proteção da internet». G1. 5 de setembro de 2013. Consultado em 14 de março de 2014 
  31. «NSA violava privacidade milhares de vezes por ano». G1. 16 de agosto de 2013. Consultado em 14 de março de 2014 
  32. «NSA capta dados de rede social para traçar perfil de americanos. Agência do governo dos EUA reúne informações telefônicas e bancárias. "New York Times" obteve novos documentos de Edward Snowden». G1. 28 de setembro de 2013. Consultado em 14 de março de 2014 
  33. «Empresas de tecnologia negam colaboração com espionagem dos EUA - Jornal O Globo». oglobo.globo.com 
  34. OMG! Ubuntu!: NSA Queria acesso uma Backdoor de acesso ao Linux, diz o criador do Linux Linus Torvalds' | OMG! Ubuntu!
  35. «Greenwald diz que espionagem dá vantagens comerciais e industriais aos Estados Unidos». Federal Senate of Brazil. Consultado em 13 de Agosto de 2013 
  36. «Greenwald diz que EUA espionam para obter vantagens comerciais». Deutsche Welle. Consultado em 13 de Agosto de 2013 
  37. a b «Anger swells after NSA phone records court order revelations | World news | The Guardian». www.theguardian.com 
  38. «Quem mais coletava Metadados? A Stasi»  - (original em inglês:You Know Who Else Collected Metadata? The Stasi.) - ProPublica]
  39. «NSA slides explain the PRISM data-collection program - The Washington Post». www.washingtonpost.com 
  40. «Brasil foi alvo de espionagem dos EUA, diz O Globo». G1. 7 de julho de 2013. Consultado em 19 de abril de 2022 

Ver também editar

Ligações externas editar