Força Expedicionária Brasileira

unidade militar brasileira que lutou com os Aliados na Frente do Mediterrâneo na Segunda Guerra Mundial

A Força Expedicionária Brasileira (conhecida também pela sigla FEB) foi uma força militar aeroterrestre constituída na sua totalidade por 25 834 homens e mulheres, que durante a Segunda Guerra Mundial foi responsável pela participação brasileira ao lado dos Aliados na Campanha da Itália, em suas duas últimas fases — o rompimento da Linha Gótica e a Ofensiva Aliada final naquela frente. Tal força (incluídos todos rodízios e substituições) era formada por uma divisão de infantaria completa (também batizada como 1ª DIE, 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária), uma esquadrilha de reconhecimento, e um esquadrão de caças. Seu lema de campanha "A cobra está fumando", era uma alusão irônica ao que se afirmava à época de sua formação, que seria "Mais fácil uma cobra fumar cachimbo do que o Brasil participar da guerra na Europa".[1]

Força Expedicionária Brasileira
País  Brasil
Corporação Exército Brasileiro
Força Aérea Brasileira
Subordinação Forças Armadas do Brasil
Sigla FEB
Criação 9 de agosto de 1943
Extinção 1 de janeiro de 1945
História
Guerras/batalhas Segunda Guerra Mundial
Logística
Efetivo 25 700
Comando
Comandantes
notáveis
Mascarenhas de Moraes
Cordeiro de Farias
Euclides Zenóbio da Costa
Olympio Falconière da Cunha

Contexto histórico editar

 Ver artigo principal: Brasil na Segunda Guerra Mundial

Em 1939, com o início da Segunda Guerra Mundial, o Brasil manteve-se neutro, numa continuação da política do presidente Getúlio Vargas de não se definir por nenhuma das grandes potências, somente tentando se aproveitar das vantagens oferecidas por elas. Tal "pragmatismo" foi interrompido no início de 1942, quando os Estados Unidos e o governo brasileiro acertaram a cessão de bases aéreas na ilha de Fernando de Noronha e ao longo da costa norte-nordeste brasileira para o recebimento de bases militares americanas[2] (caso as negociações não tivessem efetuado resultado, com Vargas e os militares insistindo em manter a neutralidade, os EUA tinham planos para invadir o nordeste brasileiro, com o codinome Plan Rubber).[3][4]

A partir de janeiro do mesmo ano começa uma série de torpedeamentos de navios mercantes brasileiros por submarinos ítalo-alemães na costa litorânea brasileira, numa ofensiva idealizada pelo próprio Adolf Hitler, que visava isolar o Reino Unido, impedindo-o de receber os suprimentos (equipamentos, armas e matéria-prima) exportados do continente americano (como consta nos diários de Goebbels e nas memórias do almirante Donitz).[5][6][7] Considerados vitais para o esforço de guerra dos Aliados, estes suprimentos a partir de 1942 via Atlântico norte, se destinavam também à então União Soviética.[8]

Tinha também por objetivo a ofensiva submarina do Eixo em águas brasileiras intimidar o governo do Brasil a se manter na neutralidade,[9] ao mesmo tempo que seus agentes no país e simpatizantes fascistas brasileiros, pejorativamente denominados pela população pela alcunha de Quinta coluna, espalhavam boatos que os afundamentos de navios mercantes seriam obra dos anglo-americanos interessados em que o país entrasse no conflito do lado Aliado.[10][11]

Filme de propaganda americano Brazil at War, apontando a similaridade entre os dois países em 1943 (em inglês).

No entanto, a opinião pública não se deixou confundir. Comovida pelas mortes de civis e instigada também pelos pronunciamentos provocativos e arrogantes, emitidos pela Rádio de Berlim, passou a exigir que o Brasil reconhecesse o estado de beligerância com os países do Eixo. O que só foi oficializado no final de agosto do mesmo ano, quando foi declarada guerra à Alemanha nazista e à Itália fascista.[12] Após a declaração de guerra, diante da contínua passividade do então governo, a mesma opinião pública passa a se mobilizar para o envio à Europa de uma força expedicionária como contribuição à derrota do fascismo.[13][14] É notória a mobilização do Partido Comunista Brasileiro e da União da Juventude Comunista para a inserção do Brasil na guerra, tendo orientado seus militantes a priorizarem a luta antifascista e apresentar-se como voluntários após a realização do VII congresso da Internacional Comunista e da Conferência da Mantiqueira.[15][16] Posteriormente organizaram-se células comunistas na FEB, que contava com a participação de dois dirigentes nacionais do PCB (Salomão Malina e Jacob Gorender) e lutaram tanto na Guerra Civil Espanhola quanto na Resistência Francesa.[17][18]

Porém, por diversas razões de ordem política e operacional (internas e com o governo americano), somente quase dois anos depois em 2 de julho de 1944, teve início o transporte rumo ao front do primeiro contingente da Força Expedicionária Brasileira, sob o comando do general Zenóbio da Costa.[19] O General João Batista Mascarenhas de Morais assumiria oficial e posteriormente o comando da FEB, quando esta já estivesse em sua formação completa. As primeiras semanas foram ocupadas se aclimatando ao local, assim como recebendo o mínimo equipamento e treinamento necessário, sob a supervisão do comando americano, ao qual a FEB estava subordinada, já que a preparação no Brasil demonstrou ser deficiente,[20] apesar dos quase 2 anos de intervalo entre a declaração de guerra e o envio das primeiras tropas a frente. Muito embora entre os expedicionários combatentes se formasse um consenso no decorrer e após o conflito de que somente o combate é adequadamente capaz de preparar um soldado, independente da qualidade do treinamento recebido anteriormente.[21][22]

 
Manchete do jornal O Globo noticiando o afundamento do Buarque.

Embora o Brasil já tivesse declarado guerra, estava despreparado para a natureza fluida daquele conflito. A Aeronáutica estava apenas começando a se modernizar, com a aquisição de aviões de fabricação americana. A Marinha tinha uma série de embarcações obsoletas, pouco aptas à guerra submarina de então (modalidade de combate ao qual mesmo as modernas marinhas britânica, americana e soviética só se adequariam a partir do final de 1942, início de 1943). Além de igualmente mal equipado, o Exército carregava ainda uma filosofia elitista arcaica e focada em reprimir movimentos políticos internos que pouco havia mudado desde o século XIX e que levara ao fracasso a tentativa de modernizar seus métodos de treinamento para o combate externo e filosofia de ação, entre o final da década de 1910 e o início da década de 1920, tentativa esta trazida por uma missão contatada ao exército francês.[23]

Os brasileiros constituíam uma das vinte divisões aliadas presentes na frente italiana naquele momento, uma verdadeira torre de Babel, constituída por: norte-americanos (incluindo as tropas segregadas da 92ª divisão e do 442º regimento, ambas unidades de infantaria formadas respectivamente por afro-descendentes e nipo-descendentes, comandadas por oficiais brancos), italianos antifascistas, exilados europeus (poloneses, tchecos e gregos), tropas coloniais britânicas (canadenses, neozelandeses, australianos, sul-africanos, indianos, quenianos, judeus e árabes) e francesas (marroquinos, argelinos e senegaleses), em uma diversidade étnica que muito se assemelhava à da frente ocidental em 1918.[24][25]

A FEB foi criada no dia 9 de agosto de 1943 através da Portaria Ministerial Nº 4 744, após o Brasil ter declarado guerra as potências do Eixo.[26]

 
Presidente Getúlio Vargas visita soldados da FEB durante embarque para a Itália.

Segundo a denominação da época utilizada pelo exército americano; a composição dos elementos terrestres da FEB se subdividia em Três Regimentos de Infantaria (equivalente ao que se classifica contemporaneamente como Brigada)[27] respectivamente: o 6º regimento de Caçapava, o 1º baseado na então capital federal Rio de Janeiro, e o 11º de São João del Rey. Dentro destes, no total se abrigavam nove companhias de fuzileiros, Um Regimento de Artilharia transportada por caminhões, Um Batalhão de Engenharia militar e outro de Saúde, mais unidades de apoio, de Cavalaria, das quais se destacou o Esquadrão de Reconhecimento.[28][29] A 1ª Divisão Brasileira foi integrada ao IV corpo do exército americano, sob o comando do general Willis D. Crittenberger, este por sua vez adscrito ao V exército dos Estados Unidos comandado pelo general Mark W. Clark, que por sua vez estava inserido no XV Grupo de Exércitos Aliados.[30][31]

Devido ao forte sexismo presente na sociedade brasileira da época, a participação de mulheres na FEB não era vista com bons olhos pelas autoridades, sendo desencorajada oficial e extraoficialmente até mesmo na retaguarda em setores essenciais como enfermaria, sendo que nesta houve tentativa de boicote não apenas masculino, por parte de médicos militares brasileiros, mas inclusive de mulheres que se encontravam em posição de influência na política nacional.[32] Apesar do latente racismo de parte do alto oficialato da FEB[20][33] e da própria doutrina de então do exército brasileiro referente à formação de oficiais,[34] a mesma era ao final de 1944 a única força miscigenada não oficialmente segregacionista entre as tropas aliadas combatentes na Europa.

Campanha editar

 
Roteiro da FEB na Campanha da Itália. Arquivo Nacional.

A 1ª etapa da campanha da FEB na Itália iniciou-se a partir de meados do mês de setembro de 1944;[35] com seu primeiro contingente a chegar à Itália (o 6º regimento) atuando junto com o 371º regimento afro-americano e outras unidades americanas menores (principalmente as de apoio da 1ª divisão blindada), formando a Task Force 45, liberando da ocupação alemã o Vale do rio Serchio (ao norte da cidade de Lucca, datando desta época suas primeiras vitórias ainda em setembro, com as tomadas de Massarosa, Camaiore e Monte Prano), e a maior parte da região de Gallicano-Barga, onde sofreu seus primeiros reveses.[36][37]

Posteriormente, a partir de novembro daquele ano, já atuando como uma Divisão completa; por seu desempenho na 1.ª etapa foi deslocada para o leste da ala do V Exército americano com a missão de expulsar dos Apeninos setentrionais as tropas alemãs que através do fogo de artilharia, dessas posições impediam o avanço dos aliados no setor principal da frente italiana sob responsabilidade do VIII Exército britânico (localizado entre o centro da Itália e o mar Adriático). Iniciava-se assim, a e mais longa etapa da FEB na Itália, quando é incumbida de tomar o complexo formado por Monte Castello,[35] Belvedere e outros posições montanhosas em seus arredores, no espaço de alguns dias. Após algumas tentativas fracassadas nos meses de novembro e dezembro, ficou claro que para a obtenção do sucesso em tal empreitada seria necessário um ataque conjunto pelo efetivo de duas divisões simultaneamente a Belvedere, Della Torraccia, Monte Castello e a Castelnuovo di Vergato, o que mesmo assim, alertava o comando brasileiro, não poderia ser levado a cabo em menos de uma semana.[38][39]

Soldados da FEB comemoram o 7 de setembro na Itália durante a II Guerra Mundial, 1944. Arquivo Nacional.
Artilharia brasileira na Itália fascista.
Dois soldados brasileiros comendo em cima de um M8 Greyhound.
Brasileiros capturam italianos fascistas em outubro de 1944.
Soldados brasileiros transportam um ferido durante a Batalha de Montese.
O General Otto Fretter-Pico em conversações com o Major Franco Ferreira sobre a rendição da 148ª Divisão de Infantaria à FEB, após a Batalha de Collecchio, em 29 de abril de 1945.

Durante o rigoroso inverno entre 1944 e 1945, nos Apeninos a FEB enfrentou temperaturas de até vinte graus negativos, não contando a sensação térmica. Muita neve, umidade e contínuos ataques de caráter exploratório por parte do inimigo, que através de pequenas escaramuças procurava tanto minar a resistência física, quanto a psicológica das tropas brasileiras, não acostumadas às baixas temperaturas. Condições climáticas e reações físicas se somavam aos mais de três meses de campanha ininterrupta, sem pausa para recuperação.[33] Testou-se ainda possíveis pontos fracos no setor ocupado pelos brasileiros para uma contraofensiva no inverno. Entretanto, neste aspecto, a atitude involuntariamente agressiva das duas tentativas de tomar Monte Castello no final de 1944, somada à atitude voluntária de responder às incursões exploratórias do inimigo no território ocupado pela FEB, com incursões exploratórias da FEB realizadas em território inimigo, fez com que os alemães e seus aliados escolhessem outro setor da frente italiana, ocupada pela 92ª divisão estadunidense, para sua contraofensiva.[40]

Entre o fim de fevereiro e meados de março de 1945, como havia sugerido o comandante da FEB, se deu a Operação Encore, um avanço em conjunto com a recém-chegada 10.ª divisão de montanha estadunidense. Assim, foram finalmente tomados, entre outras posições, por parte dos brasileiros: Monte Castello e Castelnuovo, enquanto os americanos tomavam: Belvedere e Della Torraccia. A conquista destas posições pela divisão brasileira e a divisão de montanha estadunidense neste setor secundário, mas vital, possibilitou o início da ofensiva final de primavera. Ofensiva na qual, ocorreu tanto a última etapa da campanha da FEB (quando a divisão brasileira travaria em Montese, o combate que lhe causou mais baixas num mesmo dia), como as forças sob o comando do VIII exército britânico, mais à leste no setor principal da frente italiana, após meses de combate, por se verem finalmente livres do pesado e constante fogo de artilharia inimiga (que partia dos pontos tomados pela 1ª divisão brasileira e 10ª de montanha americana), puderam avançar sobre Bolonha, ultrapassando as últimas posições da Linha Gótica.[41][42][43]

Na 1ª semana de abril iniciou-se a fase final da ofensiva de primavera com o intuito de romper definitivamente esta linha de defesas, que recuara constantemente desde setembro do ano anterior, mas impedia o avanço das tropas aliadas na Itália rumo à Europa Central. No 1º dia da ofensiva no setor do IV corpo do V exército americano, ao qual a FEB estava incorporada (iniciada uma semana após o início da ofensiva no setor do VIII exército britânico, que seguia sem progressos); após sem grandes dificuldades ter sustado o ataque aliado principal naquele setor, efetuado pela 10ª Divisão de Montanha americana, causando expressivas baixas naquela unidade estadunidense; os alemães cometeram um erro ao considerar o ataque da divisão brasileira à região de Montese (que neste ataque, além do apoio de blindados americanos, também utilizou seus próprios carros de combate M8, M4 e M10); como sendo o principal alvo aliado naquele setor; tendo por conta disso disparado somente contra a FEB cerca de 1,8 mil tiros de artilharia (64%) do total dos 2,8 mil tiros empregados contra todas as 4 divisões aliadas naquele setor da frente italiana,[44] nos dias de luta que se seguiram pela posse daquela localidade ( no que foi o combate mais sangrento travado pela FEB). Com a fracassada tentativa alemã de retomar Montese e o consequente avanço das tropas das 10ª divisão de montanha e 1ª divisão blindada estadunidenses, efetivou-se o desmoronamento das defesas germânicas naquele setor central, do ponto de vista geográfico, embora secundário estrategicamente, ficando claro a impossibilidade por parte das tropas alemãs de manterem a partir daquele momento a linha gótica, tanto no setor terciário a oeste, próximo ao Mar da Ligúria, quanto no setor principal à leste, próximo ao Mar Adriático.[45][46]

Ainda nesta última etapa de sua campanha, em combates travados em Collecchio e Fornovo di Taro, em perfeita manobra e jogada ousada de seu comandante, os efetivos da FEB que se encontravam naquela região em inferioridade numérica cercaram e, após combates oriundos da infrutífera tentativa de rompimento do cerco por parte do inimigo seguidos de rápida negociação, obtiveram a rendição dos efetivos remanescentes de quatro divisões inimigas: duas alemãs (a 148ª divisão de infantaria comandada pelo general Otto Fretter-Pico, e a 90ª Panzergrenadier-Division) e duas italianas fascistas (a 1ª divisão bersaglieri Itália, comandada pelo general Mario Carloni, e a 4ª divisão de montanha "Monte Rosa"). Isso impediu que essas unidades que (sob o abrigo e comando único da 148ª), se retiravam da região de La Spezia e Gênova (que havia sido liberada pela 92ª divisão estadunidense), se unissem às forças ítalo-alemãs da Ligúria, que as esperavam para desfechar um contra-ataque contra as forças do V exército americano, que avançavam, como é inevitável nestas situações, de forma rápida, porém difusa e descoordenada, inclusive do apoio aéreo, tendo deixado vários clarões em sua ala esquerda e na retaguarda. Muitas pontes ao longo do rio Pó foram deixadas intactas pelas forças nazifascistas com esse intento. O comando dos exércitos C alemão, que já se encontrava em negociações de paz em Caserta há alguns dias com o comando Aliado na Itália, esperava com isso obter um triunfo a fim de conseguir melhores condições para rendição. Os acontecimentos em Fornovo di Taro involuntariamente impediram a execução de tal plano tanto pelo desfalque de tropas, como pelo atraso causado, o que aliado às notícias da morte de Hitler e a tomada final de Berlim pelas forças do Exército Vermelho, não deixou ao comando alemão outra opção senão ratificar a rápida rendição de suas tropas na Itália.[47] Em sua arrancada final, a FEB ainda chegou a cidade de Turim, e em 2 de maio de 1945, na cidade de Susa, onde fez junção com as tropas francesas na fronteira franco-italiana.[39]

Saldo de Campanha editar

 
Soldados da FEB sendo saudados por moradores de Massarosa. Final de setembro, 1944.
 
Soldados da FEB posando com prisioneiros alemães.
 
Rendição do Generalleutnant Otto Fretter-Pico, comandante da 148ª DI (esquerda, com binóculos), ao General Olympio Falconière da Cunha após a Batalha de Collecchio.

Antes da rendição das forças alemãs ser oficializada a 2 de maio de 1945, a 148ª divisão foi a única divisão alemã capturada integralmente, incluindo seu comando, por uma força aliada (no caso, a 1ª Divisão Brasileira) durante toda a campanha da Itália. Pois desde a invasão da Sicília em julho de 1943 até a ofensiva na primavera de 1945, todas as demais divisões alemãs, independente das perdas sofridas, conseguiram se retirar ao norte sem se renderem.[48]

A FEB permaneceu ininterruptamente duzentos e trinta e nove dias em combate. Como exemplo de comparação, das quarenta e quatro divisões americanas que combateram nos teatros de operações do norte da África e Europa (frentes italiana e ocidental) entre novembro de 1942 e maio de 1945, apenas doze estiveram ininterruptamente mais dias em combate que a divisão brasileira.[49]

O Brasil perdeu nesta campanha, mortos em ação, quatrocentos e cinquenta e quatro homens do exército,[50] e cinco pilotos da força aérea.[51] A divisão brasileira ainda teve cerca de duas mil mortes decorrentes dos ferimentos de combate, e mais de doze mil baixas em campanha por mutilação ou outras diversas causas incapacitantes para a continuidade no campo de batalha.[49] Tendo assim, somadas as substituições, turnos e rodízios, dos cerca de vinte e cinco mil homens enviados, mais de vinte e dois mil participado das ações. O que, incluso mortos e incapacitados, deu uma média de 1,7 homens usados para cada posto de combate, um grau de aproveitamento apreciável se comparado ao de outras divisões que estiveram ao mesmo tempo em campanha em condições semelhantes. Ao final da campanha, a FEB havia aprisionado mais de vinte mil soldados inimigos, quatorze mil, setecentos e setenta e nove só em Fornovo di Taro, oitenta canhões, mil e quinhentas viaturas e quatro mil cavalos.

Com a recusa do então governo brasileiro ao convite do comando aliado em colaborar com tropas para a ocupação da Áustria,[52][53][54] em 6 de junho de 1945, enquanto a divisão brasileira ainda atuava na ocupação pós-guerra das províncias de Piacenza, Lodi e Alessandria, o Ministério da Guerra ordenou que as unidades da FEB se subordinassem ao comandante da primeira região militar (1ª RM), sediada na cidade do Rio de Janeiro, o que, em última análise, significava a dissolução do contingente.[55] Mesmo com sua desmobilização relâmpago, o regresso da FEB após o final da guerra contra o fascismo, ao longo do segundo semestre de 1945, ajudou a precipitar a queda de Getúlio Vargas e o fim do Estado Novo no Brasil.[56]

Em 1960, as cinzas dos brasileiros mortos na campanha da Itália foram transladadas do cemitério de Pistoia para o Brasil, e hoje jazem no monumento aos mortos que foi erguido no Aterro do Flamengo, zona sul da cidade do Rio de Janeiro, em homenagem e lembrança aos sacrifícios dos mesmos.

Participação da Força Aérea Brasileira na Campanha da Itália editar

Chegada de aviadores da Força Aérea Brasileira que participaram da FEB, 1945. Arquivo Nacional.
Um P-47 brasileiro escoltando um bombardeiro estadunidense.
O caça-bombardeiro P-47 foi um avião de fabricação estadunidense, usado por várias Forças Aéreas aliadas durante a Segunda Guerra Mundial. Na foto, o modelo D utilizado pelo 1º Grupo de Caça da FAB na Itália.
Caça da Força Aérea Brasileira danificado pelas forças alemãs.
Forças estadunidenses e brasileiras na Base Aérea de Natal.
Distintivo da FAB.

Na campanha da Itália, a FAB atuou com duas unidades aéreas, a 1ª E.L.O., e o 1º Grupo de Aviação de Caça.[57] O Esquadrão de caça teve abatidos dezesseis aviões, com morte em ação de cinco de seus aviadores, além da morte de mais três por acidentes. Apesar de, entre novembro de 1944 e abril de 1945, ter voado apenas 5% do total das missões efetuadas por todos os esquadrões sob o XXII comando aéreo tático aliado, neste período foi responsável (entre outras tarefas) pela destruição de 85% dos depósitos de munição, 36% dos depósitos de combustível, e 15% dos veículos motorizados (caminhões, tanques e locomotivas) inimigos destruídos por este comando aéreo aliado, tendo por este desempenho, recebido honrosa citação do congresso dos Estados Unidos.[58] Já ao final da campanha, devido às baixas sofridas, estava reduzido ao tamanho padrão de um esquadrão convencional.[59]

Embora tenha dado cobertura aérea à divisão brasileira em várias ocasiões, ao contrário da Esquadrilha de Reconhecimento aéreo (E.L.O.), o esquadrão de caças brasileiro não estava subordinado ao comando da FEB e sim (sendo um dos quatro esquadrões do 350º Grupo de caças da 62ª Ala da 12ª Força aérea do exército americano), subordinado ao XXII Comando Aéreo Tático Aliado.[60]

Sumário estatístico editar

Total das Operações [61]
Total de missões executadas 445
Total de saídas ofensivas 2 546
Total de saídas defensivas 4
Total de horas de voo em operações de guerra 5 465
Total de horas de voo realizadas 6 144
Total de bombas lançadas 4 442
Bombas incendiárias (FTI) 166
Bombas de fragmentação (260 lb) 16
Bombas de fragmentação (90 lb) 72
Bombas de demolição (1000 lb) 8
Bombas de demolição (500 lb) 4 180
Total aproximado de tonelagem de bombas 1 010
Total de munição calibre 50 1 180 200
Total de foguetes lançados 850
Total de litros de gasolina consumida 4 058 651
Total das Operações [61]
Destruídos Danificados
Aviões 2 9
Locomotivas 13 92
Transportes motorizados 1 304 686
Vagões e carros tanques 250 835
Carros blindados 8 13
Viaturas de tração animal 79 19
Pontes de estradas de ferro e de rodagem 25 51
Pontes em estradas de ferro e de rodagem 412
Plataformas de triagem 3
Edifícios ocupados pelo inimigo 144 94
Acampamentos 1 4
Postos de comando 2 2
Posições de artilharia 85 15
Alojamentos 3 8
Fábricas 6 5
Instalações diversas 125 54
Usinas elétricas 5 4
Depósitos de combustível e munição 31 15
Depósitos de material 11 1
Refinarias 3 2
Estações de radar 2
Embarcações 19 52
Navios 1

Pós-guerra editar

Associação dos Veteranos da FEB editar

 
Veteranos se encontram com a ex-presidente Dilma Rousseff na cerimônia de comemoração pelos 70 anos do Dia da Vitória.
 
Monumento aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, no Rio de Janeiro, no Brasil.

A partir de Outubro de 1945, formaram-se as primeiras Associações de Ex-Combatentes. O não planejamento por parte das autoridades militares brasileiras da época, em relação a uma política de assistência e reintegração social de seus veteranos, em especial a grande maioria de civis sem alta qualificação profissional, colaborou para o crescimento de tais associações que, a partir da desvinculação deste objetivo do órgão público que havia sido criado para tal (a LBA), passaram a funcionar como único ponto de apoio social para os veteranos.[62][63]

Entre 1946 e 1950, a disputa política entre grupos de veteranos comunistas e conservadores pela liderança nas Associações, que girou entre - se as Associações deveriam buscar uma maior participação na política nacional ou se ater às reivindicações imediatas dos veteranos; e que foi vencida pelos conservadores, com o apoio das lideranças militares da época, antecipou certas práticas que se tornariam padrão nas discussões de questões internas do Exército e demais Forças Armadas, nas décadas de 1950-1960.[64]

 
Detalhe do Monumento ao Expedicionário, no Parque Farroupilha, em Porto Alegre.

Uma pensão aos veteranos que suprisse a sobrevivência veio apenas em 1988, com a Constituinte de 1988, quando todos os veteranos brasileiros sobreviventes da Segunda Guerra passaram a ter direito legal a uma compensação especial, equivalente à pensão deixada por um segundo-tenente do exército.[65] Tal benefício não apenas se estendia também aos veteranos que não haviam estado nas campanhas da Itália ou do Atlântico, como não os diferenciava entre si ou daqueles que haviam servido no território continental brasileiro durante a guerra. O debate que o antecedeu, somado a ressentimentos acumulados em quatro décadas, também serviu para aumentar a rixa já existente entre veteranos que tiveram participação ativa nas campanhas citadas e aqueles que serviram na retaguarda.[66]

No tempo decorrido entre o término da guerra e a concessão desta pensão, os veteranos conseguiram algumas pequenas vitórias, como o acesso ao funcionalismo público para os não analfabetos (o que excluía um número apreciável de veteranos), e a construção de um Conjunto Habitacional para ex-combatentes (no Bairro de Benfica), no Rio de Janeiro, inaugurado no início da década de 1960.[67] Àqueles que não conseguiram se readaptar à vida civil, não tiveram outra alternativa que não a de "se virar", depender da caridade alheia, muitas vezes ficando na dependência das próprias associações, ou definhar.[64][68]

Condecorações da FEB editar

Filmes e documentários editar

  • Estrada 47 - é um filme de 2015 escrito e dirigido por Vicente Ferraz.
  • A Cobra Fumou - documentário de 2003 sobre a FEB
  • O Lapa Azul - documentário brasileiro de 2007 que relata as experiências dos pracinhas brasileiros, do III Batalhão do 11º Regimento de Infantaria da FEB durante a II Guerra.

Ver também editar

Referências

  1. Ferraz, 2005. Págs 50-51.
  2. Alves, 2002. Capítulos I & II.
  3. ISTOÉ - EUA planejavam tomar o País caso Getúlio não entrasse na guerra contra os nazistas
  4. DW-World - O Pentágono quis invadir o Brasil. Entrevista de Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira para a DW-World.
  5. Goebbels/Lochner, 1948. Citações referentes ao Brasil, entre março e agosto de 1942.
  6. Donitz, 1997. págs 239-40 & 252-53.
  7. Alves, 2002. Do último parágrafo da pág.163 (em especial a partir do 2.º parágrafo da pág. 170) à pág. 184.
  8. Morison, 1947. Capítulos: X, seçao 4 ("The Anti-Submarine Fleet"); XIV, seção 5 ("North Russia Convoys"); XV ("Deus é Brasileiro, September 1941-April 1943"), e XVII.
  9. Seitenfus, 2000. Págs 308 a 313.
  10. Ibidem, Alves 2002 - Do último parágrafo pág.180 à pág.182
  11. Congresso Nacional Brasileiro. "Anais da Assembleia Constituinte (1946)" Imprensa Nacional, 1950 - Volume I, pág. 203 & Vol. XXII, pág. 184
  12. Ibidem, Alves 2002 - Págs.174 à 176.
  13. Ferraz, 2005. Capítulo "A cobra vai fumar?".
  14. Morais (Fernando), 1994. Páginas 431 a 434
  15. «Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina -Pronunciamento». www.alesc.sc.gov.br. Consultado em 10 de dezembro de 2020 
  16. «A Significação Histórica da Conferência da Mantiqueira». www.marxists.org. Consultado em 10 de dezembro de 2020 
  17. «BBC resgata vozes e sambas esquecidos dos soldados brasileiros na 2ª Guerra». BBC News Brasil. 14 de março de 2018. Consultado em 10 de dezembro de 2020 
  18. Ferreira, Lilian Zanvettor (2016). «Fomos, somos e seremos comunistas : a educação dos trabalhadores do Partido Comunista do Brasil de 1920 a 1950». Consultado em 10 de dezembro de 2020 
  19. Alves, 2007. Capítulo III.
  20. a b Vários autores; "Depoimento de Oficiais da Reserva sobre a F.E.B."; Editora Cobraci; 1949
  21. Maximiano, 2010. Capítulo 5, da página 222 ao 1º paragrafo da pág.223
  22. Sobre o tema Combate; Treinamento Para; e Desintoxicação do; v.tb Grossman, Dave: "Matar! Um Estudo Sobre O Ato De Matar" Biblioteca do Exército, 2007. ISBN 8570113994;
    Assim como: Beah, Ishmael Muito Longe De Casa; Memórias de um Menino Soldado. Ediouro/RJ, 2007 - Final da pág. 102 ao começo da pág. 167 - ISBN 8500021217
  23. Maximiano, 2010. Capítulo 6
  24. Corrigan, 2011. Pág. 523
  25. O'Reilly, 2001. Pág. 118, 3º §
  26. «Força Expedicionária Brasileira (FEB)». Brasil Escola. Consultado em 18 de abril de 2023 
  27. Doherty, 2014. Pag. 136 2º parágrafo.
  28. Maximiniano, 2010. Página 40.
  29. Referente à Cavalaria, é importante ressaltar que esta Arma (fosse na forma de unidades maiores, como Divisões de Exército ou menores - como no caso da FEB, pequenas unidades de apoio integradas às Divisões de Infantaria); em todos os exércitos durante aquele conflito, não se restringiu à sua utilização mecanizada com carros de combate. Não apenas, mas especialmente em terreno montanhoso, como era a Frente Italiana, a utilização de animais como a mula (entre outros) e veículos menores como bicicletas, e/ou motocicletas militares eram fundamentais para a mobilidade das tropas. Mais sobre este tema pode ser visto, entre outros, em: Nafziger 2000, e Worley 2006 (Pág.85).
  30. Crittenberger, 1951
  31. Doherty, 2014. Capítulo I.
  32. Moser, Benjamin. "Clarice," ISBN 9788575038444 Ed.Cosac Naify 2009; último parágrafo, pág. 212.
  33. a b Udihara, 2002.
  34. Dennison de Oliveira, "Os soldados alemães de Vargas" ISBN 8536220767 Ed.Jurua 2008; pags. 55 & 56
  35. a b «História das Guerras: FEB - O dia em que a cobra fumou». Toda Disciplina. 16 de maio de 2019. Consultado em 16 de maio de 2019 
  36. Morais, 1947. "Título" (Capítulo) IV, seção "Os Ataques da Task Force 45 a Monte Castello"
  37. Brayner, 1968. Págs 237 a 240.
  38. Ibidem. Morais, 1947.
  39. a b Ibidem. Brayner, 1968.
  40. Morais, 1947. "Título" (Capítulo) IV, seção "A defensiva no Vale do Reno"
  41. Clark, 1950. (Visualização da) Pág.608, da reedição de 2007 (em inglês).
  42. Morais, 1947. "Título" (Capítulo) V, seções "Monte Castello" & "Castelnuovo"
  43. Brayner, 1968. Capítulo XII "Operações contra Monte Castelo"
  44. Dennison de Oliveira, "Os soldados alemães de Vargas" ISBN 8536220767 Ed.Jurua 2008; pag.117 1ºparágr.
  45. Crittenberger, 1951.
  46. Brayner, 1968. Capítulo XIV
  47. Bohmler; 1966. Final do Capítulo IX
  48. Fernandes, 2009. Pág.273
  49. a b Castro, Izecksohn & Kraay, 2004. Capítulos 13 e 14
  50. Donato, 1987. Pág. 168
  51. Ibidem Donato, 1985 - pág. 214
  52. (em inglês) Segundo o historiador norte-americano Frank McCann UNH (Página acessada em 12 de novembro de 2010), o Brasil foi convidado a integrar a força de ocupação da Áustria.
  53. (em português) Estadão - País foi chamado a ocupar a Áustria. Página acessada em 2 de janeiro de 2011.
  54. (em português) Portal FEB - FEB – Do Início ao Fim Uma história esquecida sobre brasileiros que lutaram na Itália. Página acessada em 28 de Setembro de 2014.
  55. Brayner, 1968. Pág. 524
  56. Ribeiro, 2010. Pág. 4, Penúltimo parágrafo.
  57. Lima, 1989.
  58. Tenente-brigadeiro Nelson Freire Lavanére-Wanderley; "A Força Aérea Brasileira na Segunda Guerra Mundial"
  59. Buyers, 2004. Págs 98-99.
  60. Buyers, 2004. Pág 391.
  61. a b Tenente-brigadeiro Nelson Freire Lavanére-Wanderley (2002). A Força Aérea Brasileira na Segunda Guerra Mundial 2ª ed. Brasília: CECOMSAER. 35 páginas. ISBN 85-89018-01-6 
  62. Castro, Izecksohn & Kraay, 2004 - "Os veteranos da FEB e a sociedade brasileira".
  63. Ribeiro, 2010. Págs. 4 (final) e 5.
  64. a b Ibidem. Castro, Izecksohn & Kraay, 2004.
  65. Motta, 2001. Pág. 296
  66. Soares, 1985. A partir da pág.339.
  67. Castro, Erik de. "A Cobra Fumou" Documentário Brasileiro de 2002. Produção: BSB Cinema, Limite Produções e Raccord Produções. Diretor: Vinícius Reis. Duração: 92 min.
  68. Ibidem. Soares, 1985.

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