Júlia Lopes de Almeida

Júlia Valentim da Silveira Lopes de Almeida (Rio de Janeiro, 24 de setembro de 1862Rio de Janeiro, 30 de maio de 1934) foi uma escritora, cronista, teatróloga e abolicionista brasileira.[1][2][3]

Júlia Lopes de Almeida
Júlia Lopes de Almeida
Nome completo Júlia Valentim da Silveira Lopes de Almeida
Nascimento 24 de setembro de 1862
Rio de Janeiro, MN
Império do Brasil
Morte 30 de maio de 1934 (71 anos)
Rio de Janeiro, DF
Estados Unidos do Brasil
Nacionalidade brasileira
Cônjuge Filinto de Almeida (1887 - 1934)
Filho(a)(s) Afonso Lopes de Almeida (n. 1888)
Albano Lopes de Almeida (n. 1894)
Margarida Lopes de Almeida (n. 1896)
Ocupação escritora e abolicionista
Magnum opus Ânsia eterna
Assinatura

Foi uma das idealizadoras da Academia Brasileira de Letras (ABL).[4][5] Tem uma produção grande e importante para a literatura brasileira, de literatura infantil a romances, crônicas, peças de teatro e matérias jornalísticas.[6][7] Foi casada com o poeta português Filinto de Almeida, e mãe dos também escritores Afonso Lopes de Almeida, Albano Lopes de Almeida e Margarida Lopes de Almeida.[7][8]

Biografia editar

Vida pessoal editar

Nascida na cidade do Rio de Janeiro em 1862, era filha do médico Valentim José da Silveira Lopes, mais tarde Visconde de São Valentim, e de Adelina Pereira Lopes, ambos portugueses emigrados para o Brasil. Mudou-se ainda na infância para a cidade de Campinas,[4] no estado de São Paulo, onde, em 1881, publicou seus primeiros textos na Gazeta de Campinas, apesar de na época a literatura não ser vista como uma atividade própria para mulheres.[9] Numa entrevista concedida a João do Rio entre 1904 e 1905, confessou que adorava escrever versos, mas o fazia às escondidas.[6] Três anos depois, em 1884, começa a escrever também para o jornal carioca O País, trabalho que durou mais de três décadas.

Carreira editar

Em 1886, mudou-se para Lisboa, onde se lança como escritora e junto de sua irmã publica Contos Infantis, em 1887.[10] Em 28 de novembro de 1887 casou-se com Filinto de Almeida, à época diretor da revista A Semana Ilustrada, editada no Rio de Janeiro.[11] Passou a ser colaboradora sistemática da publicação. Também escreveu para a revista Brasil-Portugal (1899-1914).[12] Júlia retornou ao Brasil em 1888, onde publica seu primeiro romance, Memórias de Marta, que sai em folhetins em O País.[4] Seu textos em jornais da época tratam sempre de temas pertinentes como a República, a abolição e direitos civis.[4][5][7]

Também colaborou com periódicos da imprensa de mulheres, como a revista A Mensageira, de São Paulo, dirigida pela escritora Presciliana Duarte de Almeida entre 1897 e 1900.

Pioneira da literatura infantil no Brasil, seu primeiro livro, Contos Infantis (1886), foi uma reunião de 33 textos em verso e 27 em prosa destinados às crianças, escrito em parceria com sua irmã, Adelina Lopes Vieira.[6] Em 1887, em Portugal, publicou Traços e iluminuras, outro livro de contos.[13][14]

Escreveu também para teatro, com dois volumes publicados e cerca de 10 textos inéditos.[15][16]

Foi presidente honorária da Legião da Mulher Brasileira, sociedade criada em 1919.[16][17][18] Sua coletânea de contos Ânsia Eterna, 1903, sofreu influência de Guy de Maupassant e uma das suas crônicas veio a inspirar Artur Azevedo ao escrever a peça O dote.[19] Em colaboração com o marido, escreveu, em folhetim do Jornal do Commercio, seu último romance, A Casa Verde, em 1932.[4][14]

Magnum opus editar

A crítica literária Lúcia Miguel-Pereira, em História da literatura: prosa de ficção – de 1870 a 1920, considera Ânsia eterna como magnum opus de Júlia Lopes de Almeida. Ela afirma que "os contos de Ânsia eterna parecem todavia a sua melhor obra, aquela em que, sem nada perder de sua singeleza, ela aproveitou com mais arte os seus recursos de escritora e deixou mais patente a sua sensibilidade."[20]

Grêmio Júlia Lopes editar

Instituição cultural feminina fundada em 26 de novembro de 1916 por um grupo de intelectuais cuiabanas.[21] A escolha de Júlia Lopes como patrona foi proposta pela professora Maria Dimpina Lobo Duarte após a leitura do "Livro das Noivas".[21] O Grêmio Júlia Lopes se dedicava principalmente a produção literária através da revista A Violeta, proposta da professora Maria da Glória Figueiredo, e que seria dirigida por vinte anos anos pela professora Bernardina Maria Elvira Rich.[22] O periódico contava com a contribuição da própria Júlia Lopes, e dentre várias outras intelectuais cuiabanas, de modo mais constante com Maria Dimpina, Bernardina Rich e a professora Maria de Arruda Müller.[22] A revista A Violeta circulou mensalmente de 1916 até 1950, e sempre foi laborado apenas por mulheres.[22]

Fundação da ABL editar

Júlia Lopes de Almeida integrava o grupo de escritores e intelectuais que planejou a criação da Academia Brasileira de Letras (ABL).[17] Seu nome constava da primeira lista dos 40 "imortais" que fundariam a entidade, elaborada por Lúcio de Mendonça.[23]

Na primeira reunião da ABL, porém, seu nome foi excluído.[23] Os fundadores optaram por manter a Academia exclusivamente masculina, da mesma forma que a Academia Francesa, que lhes servia de modelo.[24] No lugar de Júlia Lopes entrou justamente o seu marido, Filinto de Almeida, que chegou a ser chamado de "acadêmico consorte".[25]

O veto à participação de mulheres só terminou em 1977, com a eleição de Rachel de Queiroz para a cadeira nº 5.[4][7][26]

Morte editar

Almeida morreu em 30 de maio de 1934, na cidade do Rio de Janeiro, por complicações renais e linfáticas decorrentes da febre amarela.[27][28] Foi sepultada no cemitério São Francisco Xavier, no bairro do Caju, Zona norte do Rio.[29]

Postumamente, no mesmo ano, foi publicado seu último romance, Pássaro Tonto.[4][14]

Obras publicadas editar

 
Wikisource

Romances editar

  • A família Medeiros, Companhia Editora Fluminense, 1892.[30]
  • Memórias de Marta, Livraria Francesa e Estrangeira, 1899.[31]
  • A viúva Simões, 1897.[32]
  • A falência, 1901.[33]
  • A intrusa, Francisco Alves, 1908.[34]
  • Cruel amor, Francisco Alves, 1911.[35]
  • Correio da roça, Francisco Alves, 1913.[36][37]
  • A Silveirinha, Francisco Alves, 1914.[38]
  • A casa verde (com Felinto de Almeida).
  • Pássaro tonto, Companhia Editora Nacional, 1934.[39]
  • O funil do diabo (póstumo), Mulheres, 2015.[40]

Novelas e contos editar

Teatro editar

  • 1909 - A herança (peça em um ato)
  • 1917 - Teatro
  • O caminho do céu
  • A última entrevista
  • A senhora marquesa
  • O dinheiro dos outros
  • Vai raiar o sol
  • Laura

Diversos editar

  • O livro das noivas, Typographia da Companhia Nacional, 1896[47]
  • Livro das donas e donzelas, 1906.[48]
  • Jardim florido, Editora Livraria Leite Ribeiro,1922[49]
  • Jornadas no meu País, Editora Francisco Alves, 1920.[50]
  • Eles e elas
  • Oração à Santa Doroteia, Francisco Alves, 1923.[51]
  • Maternidade (obra pacifista).[52]
  • Brasil, 1922. (conferência).

Escolares editar

Referências

  1. Knapp, Cristina Löff; Zinani, Cecil Jeanine Albert (2022). Interpretações e reverberações em Júlia Lopes de Almeida. Caxias do Sul: EDUCS. 218 páginas. ISBN 978-65-5807-193-8 
  2. «Júlia Lopes de Almeida, a primeira escritora profissional do Brasil». MultiRio. Consultado em 26 de agosto de 2021 
  3. Alex dos Santos Guimarães (ed.). «Júlia Lopes de Almeida e o Cânone Literário: Memória e Exclusão» (PDF). Associação Nacional de História. Consultado em 9 de setembro de 2021 
  4. a b c d e f g Itaú Cultural (ed.). «Júlia Lopes de Almeida». Itaú Cultural. Consultado em 9 de agosto de 2017 
  5. a b Adriana Mattoso (ed.). «Julia Lopes de Almeida: uma mulher que a pátria desconhece». Blogueiras Feministas. Consultado em 9 de agosto de 2017 
  6. a b c Cátia Toledo Mendonça (ed.). «Júlia Lopes de Almeida: A Busca da Liberação Feminina pela Palavra» (PDF). Revista Letras. Consultado em 9 de dezembro de 2014 
  7. a b c d Ivanir Ferreira, ed. (3 de agosto de 2017). «Escritora mais publicada da Primeira República foi vetada na ABL». Jornal da USP. Consultado em 9 de agosto de 2017 
  8. «"As Mensageiras" - Primeiras Escritoras do Brasil». Câmara dos Deputados. Consultado em 9 de setembro de 2021 
  9. Fanini, Michele Asmar; Fanini, Michele Asmar (setembro de 2018). «Júlia Lopes de Almeida on the scene: outlines of the writer's personal archive and unpublished theater». Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (71): 95–114. ISSN 0020-3874. doi:10.11606/issn.2316-901x.v0i71p95-114. Consultado em 15 de maio de 2021 
  10. a b Fangueiro, Maria. «Júlia Lopes de Almeida». Biblioteca Nacional do Brasil. Consultado em 15 de maio de 2021 
  11. Luca, Tania Regina de (10 de setembro de 2018). A ilustração [1884-1892]: Circulação de textos e imagens entre Paris, Lisboa e Rio de Janeiro (em inglês). [S.l.]: SciELO - Editora UNESP 
  12. Rita Correia (29 de Abril de 2009). «Ficha histórica: Brasil-Portugal : revista quinzenal illustrada (1899-1914).» (pdf). Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 26 de Junho de 2014 
  13. a b ZINANI; Cecil Jeanine Albert; BARP, Guilherme. Traços e iluminuras: obra esquecida de Júlia Lopes de Almeida. In: KNAPP, Cristina Löff; ZINANI, Cecil Jeanine Albert (orgs.). Interpretações e reverberações em Júlia Lopes de Almeida. Caxias do Sul: EDUCS, 2022. p. 53-87. Disponível em: https://www.ucs.br/educs/livro/interpretacoes-e-reverberacoes-em-julia-lopes-de-almeida/. Acesso em: 22 out. 2022.
  14. a b c SILVA, Marcelo Medeiros da (2011). Júlia Lopes de Almeida e Carolina Nabuco: uma escrita bem-comportada? (Tese). Paraíba: Universidade Federal da Paraíba. Consultado em 9 de agosto de 2017 
  15. Fanini, Michele Asmar (dezembro de 2013). «Júlia Lopes de Almeida teatróloga: apontamentos sobre a peça inédita "O Caminho do Bem"». Revista Estudos Feministas (3): 1099–1119. ISSN 0104-026X. doi:10.1590/S0104-026X2013000300019. Consultado em 15 de maio de 2021 
  16. a b Amed, Jussara Parada. «Escrita e experiência na obra de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934)». Consultado em 15 de maio de 2021 
  17. a b Ruy, José (8 de março de 2016). «O brilho permanente da escrita feminina». Vermelho. Consultado em 15 de maio de 2021 
  18. Bispo, Antônio (2010). «A Legião da Mulher Brasileira e a direita social-nacionalista e católico-restaurativa na música Concepções estético-musicais de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934)». Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira. Consultado em 15 de maio de 2021 
  19. Almeida, Júlia Lopes de (24 de março de 2021). Ânsia Eterna. [S.l.]: Vermelho Marinho 
  20. MIGUEL-PEREIRA, Lúcia (1973). História da literatura brasileira: prosa de ficção – de 1870 a 1920. Rio de Janeiro: José Olympio. p. 271 
  21. a b «Durante 40 anos mulheres editaram revista feminina em Mato Grosso». 24 de março de 2019. Consultado em 15 de maio de 2021 
  22. a b c Costa, Laís (2013). «FACTOS E COUSAS NAS CRÔNICAS DA REVISTA MATOGROSSENSE A VIOLETA» (PDF). Revista Estação Literária (Universidade Estadual de Londrina). Consultado em 15 de maio de 2021 
  23. a b Michele Asnar Fanini (ed.). «Júlia Lopes de Al meida: entre o salão literário e a antessala da Academia Brasileira de Letras». Revista Estudos de Sociologia. Consultado em 9 de agosto de 2017 
  24. «Academia francesa de letras inspirou a brasileira». Superinteressante. Editora Abril. 31 de janeiro de 1996. Consultado em 15 de maio de 2021 
  25. FANINI, Michele Asnar. Júlia Lopes de Almeida em "retrato e prosa": a propósito dos diálogos entre as imagens da escritora e sua produção literária. Cad. Pagu no.41 Campinas July/Dec. 2013
  26. «Rachel de Queiroz». Academia Brasileira de Letras. Consultado em 15 de maio de 2021 
  27. Nascimento, Patrícia (29 de outubro de 2020). «JÚLIA LOPES DE ALMEIDA, UMA ILUSTRE MORTAL». Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Consultado em 15 de maio de 2021 
  28. Trevisan, Gabriela (2020). «A ESCRITA FEMINISTA DE JÚLIA LOPES DE ALMEIDA» (PDF). Universidade Estadual de Campinas. Consultado em 15 de maio de 2021 
  29. Luca, Leonora. «O "feminismo possível" de Júlia Lopes de Almeida (1862-1934)» (PDF). Universidade Federal de Santa Catarina. Consultado em 15 de maio de 2021 
  30. Almeida, Júlia Lopes de (1892). A família Medeiros. [S.l.]: Companhia Editora Fluminense 
  31. Almeida, Júlia Lopes de (1899). Memorias de Marta. [S.l.]: Livraria Francesa e Estrangeira 
  32. Lopes, Julia. «A viuva Simoes». Biblioteca Nacional do Brasil. Consultado em 15 de maio de 2021 
  33. ALMEIDA, Julia Lopes de (1901). A fallencia. Rio de Janeiro: Typ. A Tribuna. 442 páginas 
  34. Lopes, Julia. «A intrusa / Julia Lopes de Almeida.». Biblioteca Nacional do Brasil. Consultado em 15 de maio de 2021 
  35. Lopes, Julia. «Cruel amor / Júlia Lopes de Almeida.». Biblioteca Nacional do Brasil. Consultado em 15 de maio de 2021 
  36. ALMEIDA, Júlia Lopes de (1913). Correio da roça. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 209 páginas 
  37. GUIMARÃES, Rafael Eisinger; CARNIEL, Morgana. A (re)escrita de si e a imaginação da nação: o redimensionamento do papel do feminino e do rural na construção do Brasil República no romance epistolar Correio da roça. In: KNAPP, Cristina Löff; ZINANI, Cecil Jeanine Albert (orgs.). Interpretações e reverberações em Júlia Lopes de Almeida. Caxias do Sul: EDUCS, 2022. p. 125-167. Disponível em: https://www.ucs.br/educs/livro/interpretacoes-e-reverberacoes-em-julia-lopes-de-almeida. Acesso em: 22 out. 2022.
  38. ALMEIDA, Júlia Lopes de (1914). A Silveirinha. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 305 páginas 
  39. «Pássaro Tonto». Enciclopédia Itaú Cultural. Consultado em 15 de maio de 2021 
  40. KNAPP, Cristina Löff; GUERRA, Gisele Troian; MORAES, Raissa. Relações familiares na obra O funil do diabo, de Júlia Lopes de Almeida. In: KNAPP, Cristina Löff; ZINANI, Cecil Jeanine Albert (orgs.). Interpretações e reverberações em Júlia Lopes de Almeida. Caxias do Sul: EDUCS, 2022. p. 168-211. Disponível em: Disponível em: https://www.ucs.br/educs/livro/interpretacoes-e-reverberacoes-em-julia-lopes-de-almeida/. Acesso em: 22 out. 2022.
  41. Almeida, Júlia Lopes de (1903). Ancia eterna. Paris, Rio de Janeiro: Garnier. 260 páginas 
  42. Almeida, Júlia Lopes de (1940). Ânsia eterna. Rio de Janeiro: A Noite 
  43. Almeida, Júlia Lopes de (2013). Muzart, Zahidé Lupinacci, ed. Ânsia eterna. contos. Florianópolis: Mulheres. 247 páginas. ISBN 9788580470352 
  44. Almeida, Júlia Lopes de (2020). Ânsia eterna. Col: Coleção escritoras do Brasil. 2 2 ed. Brasília: Senado Federal. 191 páginas. ISBN 9786556760582 
  45. Almeida, Julia (1917). «Era uma vez...». Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Consultado em 15 de maio de 2021 
  46. Almeida, Julia Lopes de (1922). A Isca (em inglês). [S.l.]: Editora Raredes 
  47. Costruba, Deivid Aparecido (2011). «Conselho às minhas amigas: os manuais de ciências domésticas de Júlia Lopes de Almeida (1896 e 1906)». Universidade Estadual Paulista. Consultado em 15 de maio de 2021 
  48. Almeida, Julia. «Domínio Público - Detalhe da Obra». Domínio Publico. Consultado em 15 de maio de 2021 
  49. «Jardim Florido». Goodreads. Consultado em 15 de maio de 2021 
  50. Almeida, Julia (1920). «Jornadas no meu país». Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Consultado em 15 de maio de 2021 
  51. «Oração a Santa Dorotea». Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Consultado em 15 de maio de 2021 
  52. Almeida, Julia. «Maternidade». Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Consultado em 15 de maio de 2021