Metecos

(Redirecionado de Meteco)

Metecos (em grego: Μέτοικος) eram os estrangeiros residentes nas Pólis (sing. polis) gregas de Atenas.

Existiam em várias cidades, exceto em Esparta, que não recebia estrangeiros. Atenas, por sua riqueza e preponderância cultural, atraiu muitos estrangeiros que exerciam ofícios como professor, artesão, artista, comerciante. De fato, grande parcela da economia ateniense era realizada pelos metecos.

Apesar de constituírem uma grande parcela da população, eles não tinham nenhum direito político e nem podiam se casar com os cidadãos da Grécia. Tinham também de pagar uma taxa (imposto de residência) para viverem em Atenas, como também tinham de pagar para poder trabalhar. Também cumpriam serviço militar tal como os cidadãos e eram considerados homens livres. Eles se dedicavam ao comércio e à atividade manufatureira.

Apesar de não possuírem os mesmos direitos que os atenienses, os metecos eram assimilados pela população, gozando vários direitos que não implicassem na participação na política.

Etimologia editar

A palavra metoikos deriva junção da preposição meta ("no meio de", "com") com o nome oikos ("casa/família estendida/propriedade familiar"; o equivalente do inglês "household"), significando algo como "aquele que mora junto de". Alguns autores, como o historiador britânico David Whitehead, defende que a preposição meta indica também a ideia de movimento, trazendo ao termo metoikos a marca de uma migração.

Os metecos e a sociedade ateniense bem formada editar

Os metecos atenienses são uma categoria social da época clássica (séculos V e IV a. C.), cujos primeiros registros aparecem na época de Péricles e últimos no início do período helenístico.

A questão da função e do papel social que os metecos exerciam na sociedade ateniense é muito discutido entre os historiadores, que assumem posições que vão desde "os metecos eram maltratados como os escravos" até "os metecos eram quase-cidadãos". De todo modo, existem alguns pontos em comum entre todas as análises:

  • a população meteca cresceu com a formação do Império ateniense, que dinamizou a circulação de bens e pessoas no mar Egeu e Ásia Menor;
  • os metecos não formavam uma classe social homogênea, incluindo desde ricos proprietários de fábrica até comerciantes de retalhos;
  • os metecos não formavam um grupo étnico homogêneo, incluindo cidadãos gregos de outras poleis, cidadãos gregos sem pólis, não-gregos como egípcios, trácios, lídios etc;
  • o facto de pertencer à categoria trazia uma série de impedimentos legais, como o de participar da Assembléia, de comandar navios (havia exceções), de adquirir a propriedade da terra, de dirigir cultos públicos, entre outros, além de os metecos serem obrigados a pagar um imposto anual, a metoikia, equivalente a um dia de trabalho.
  • estes impedimentos poderiam ser amenizados ou até mesmo anulados por decisão da Assembléia democrática: a isotelia concedia igualdade tributária; a enktesis concedia o direito de possuir uma casa; e diversas outras formas de integração oficial;
  • os metecos serviam o exército ateniense tanto como marinheiros e remadores quanto como hoplitas, combatendo ao lado dos cidadãos; em casos raros, também poderiam ser eleitos comandantes de navios;
  • o estatuto de metecos também não impedia o indivíduo de participar de clubes aristocráticos ou associações religiosas ao lado de cidadãos;
  • os metecos mais ricos contribuíam, junto com os cidadãos ricos, com os custos militares, como a equipagem de navios, e artísticos, como o financiamentos dos coros teatrais;
  • o estatuto de meteco não significa discriminação econômica: os registros de custos de algumas obras públicas atenienses, conservados em pedra, revelam que metecos, escravos e cidadãos recebiam o mesmo valor pelo dia de trabalho.
  • entre as atividades exercidas pelos metecos (mas que não eram exclusivas deles: cidadãos também a exerciam) estão o comércio de varejo e atacado, como a importação e comercialização do trigo, a manufatura, como a fabricação de armas (caso de Céfalos), e as atividades intelectuais, como a docência de retórica (Górgias), de filosofia (Protágoras, Aristóteles), e a escrita de discursos judiciários para cidadãos (logografia: Lísias).

Os metecos e a política editar

Quanto à questão da participação política dos metecos na sociedade ateniense, as respostas variaram de acordo com a definição de política que os historiadores assumiram. Em geral, política foi e tem sido entendida como ação institucional, ou seja, a prática do debate e da decisão dentro das instituições reconhecidas como políticas, tais como a Assembléia (Ekklesia), o Conselho (Boule), os tribunais (dikasteria).

Entretanto, esta visão da política tem sido criticada recentemente, e novas abordagens se tornam possíveis para o tratamento do tema da participação política dos metecos: se a política for entendida como prática da liberdade, e os espaços políticos forem entendidos como situações espaciais desta prática (como um debate na rua, ou dentro de casa durante um banquete, ou na praça; ou mesmo a guerra como ato político de manutenção da pólis), abrem-se brechas nos impedimentos políticos aos metecos - ao combater ao lado dos cidadãos, ao discutir política em espaços privados, ao escrever discursos para serem pronunciados em tribunal, os metecos fariam, também, política. Um dos eventos históricos nos quais esta participação é mais clara é a Restauração Democrática de 403 a.C., quando os metecos fizeram parte do exército que derrubou o regime oligárquico dos Trinta Tiranos e restabeleceram, junto dos cidadãos, o regime democrático.

Fontes para a história dos metecos atenienses editar

Apesar de pouco conhecido, é fato que existe uma abundante bibliografia escrita pelos próprios metecos atenienses, ou pelo menos atribuída a autores metecos. O caso mais conhecido é o do logógrafo Lísias, que viveu de meados do século V ao início do século IV a. C., que deixou, entre discursos completos e fragmentos, 34 textos (segundo a tradição, ele foi autor de mais de 120 discursos, figurando entre os Dez Oradores Áticos. Outro exemplo é o filósofo Aristóteles, que, sendo cidadão em Estagira, viveu como meteco em Atenas por mais de 40 anos. Um último exemplo é o historiador Heródoto de Halicarnasso, autor da primeira História (livro que narra a guerra entre gregos e persas, assim como faz descrições de vários povos mediterrânicos), também meteco ateniense.

É possível obter também relatos indiretos, ou seja, falas de metecos por meio de textos escritos por cidadãos. O caso mais exemplar é o dos diálogos platônicos, que dá voz a uma série de metecos ilustres, como Céfalos, Polemarco, Lísias, Protágoras, entre outros.

Felizmente, é possível obter estes textos em versão integral, no original grego e na tradução inglesa, na Internet, pelo site Perseus Digital Library.

Bibliografia básica editar

Específica sobre os metecos editar

BASLEZ, Marie-Françoise. (1984). L’étranger dans la Grèce Antique. Paris, Les Belles Lettres.

CLERC, M. A. E. A. (1893). Les Métèques athéniens : étude sur la condition légale, la situation morale et le rôle social et économique des étrangers domiciliés à Athènes. Paris, Thorin & fils.

ROMÁN, C. G. (1979). "Los metecos atenienses: un punto de vista sobre las clases sociales en la antigua Atenas". In: MOSSÉ, Claude, VIDAL-NAQUET, P. Clases y lucha de clases en la Grecia antigua. Madrid, 1979, p. 129 e seguintes.

WHITEHEAD, David. (1975). The ideology of the Athenian Metic. Cambridge: The Cambridge Philological Society (Supplementary Volume no. 4).

Sobre a pólis editar

ANDRADE, Marta M. de. (2002). A Vida comum – espaço, cotidiano e cidade na Atenas Clássica. Rio de Janeiro, DP&A.

AUSTIN, M. & VIDAL-NAQUET, P. (1972). Economia e sociedade na Grécia Antiga. Lisboa, Edições 70.

BRUNA, Jaime. (1969). “Lísias, Contra Eratóstenes”. In: Eloquência grega e latina. São Paulo, Cultrix.

CANFORA, L. (1990). Antologia della letteratura grega. Bari, Laterza.

CARDOSO, Ciro F. (1998). “Economia e sociedade antigas: conceitos e debates”. In: Sete olhares sobre a Antiguidade. Brasília, Editora da Universidade de Brasília, pp. 173–92.

CAREY, C. (ed.). (1989). Lysias, selected speeches. Cambridge, Cambridge University Press.

CARTLEDGE, P., MILLET, P. and TODD, S. (1990). Nomos: essays in Athenian law, politics and society. Cambridge, Cambridge University Press.

CLOCHÉ, P. (1915). La restauration democratique à Athènes (en 403 avant j-c). Paris, Ernest Leroux.

COHEN, E. E. (2000). The Athenian Nation. Princeton, Princeton University Press.

CONNOR, W. Robert. (1994). “The problem of Athenian civic identity”. In: Boegehold, Alan L. & Scafuro, Adele C. (ed.). Athenian identity and civic ideology. Baltimore/London, The Johns Hopkins University Press, pp. 34–44.

DAVIES, John K. (2004). “Athenian Citizenship: the Descent Group and the Alternatives”. In: RHODES, P. J. (ed). Athenian Democracy. Oxford/New York, Oxford University Press, pp. 18–39. [1a. Edição : 1977].

DERRIDA, Jacques. (2003). “Questão do estrangeiro: vinda do estrangeiro”. In: Anne Dufourmantelle convida Jacques Derrida a falar Da Hospitalidade. São Paulo, Escuta.

DE STE. CROIX, G. E. M. (1981). The Class Struggle in the Ancient Greek World: from the Archaic Age to he Arab Conquests. London, Duckworth.

FINLEY, Moses I. (1985). Política no Mundo Antigo. [1ª edição: 1983].

_______________. (1986). A Economia Antiga. 2ª edição, Porto, Afrontamento. [1ª edição: 1973].

_______________. (1988). Os gregos antigos. Lisboa, Edições 70.

_______________. (1989). “A cidade antiga: de Fustel de Coulanges a Max Weber e além”. In: Economia e sociedade na Grécia Antiga. São Paulo, Martins Fontes. [1ª edição: 1977].

__________. (1998). O legado da Grécia: uma nova avaliação. Brasília, EdUNB.

FLORENZANO, Maria Beatriz B. (2000). “Oikos e Polis, o público e o privado na Grécia Antiga”. In: Coletâneas do nosso tempo. Hist. Rondonópolis, no. 4 e 5.

FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. (1995). A cidade antiga. 3ª edição. São Paulo, Martins Fontes. [1ª edição: 1863].

GARLAN, Y. (1982). Les esclaves em grèce ancienne. Paris, La Découverte.

___________. (1991). Guerra e economia na Grécia Antiga. Campinas, Papirus.

GERNET, Louis. (1955). Droit e société dans la Grèce Ancienne. Paris, Université de Paris.

_____________. (1968). Anthropologie de la Grèce Ancienne. Paris, Maspero.

_____________. (1982). Droit et institutions en Grèce Antique. Paris, Flammarion.

_____________. (1983). Les grecs sans miracle. Paris, La Découverte/Maspero. GLOTZ, Gustave. (1980). A cidade grega. Rio de Janeiro, DIFEL. [1ª edição: 1928].

GUARINELLO, Norberto Luiz. (2003). “Uma morfologia da História: as formas da História Antiga”. In: Politeia: Hist. e Soc. v. 3, Vitória da Conquista, pp. 41–61.

HALL, Jonathan M. (2001). “Quem eram os gregos”. In: Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia. São Paulo, no. 11. pp. 213–225.

HANSEN, Mogens H. (1974). The Sovereignty of the People’s Court in Athens in the Fourth Century BC and the Public Action against Unconstitutional Proposals, Odense.

__________________. (1993). La démocratie athénienne à l’époque de Démosthène : structure, principes et idéologie. Paris, Les Belles Lettres. [1ª edição: 1991].

__________________. (1995). “The ‘Autonomous City-State’. Ancient fact or modern fiction?”. In: HANSEN, Mogens Herman and RAAFLAUB, Kurt. (eds). Studies in the Ancient Greek Polis. Stuttgart, Franz Steiner Verlag, pp. 21-43.

__________________. (1997a). “Polis as the generic term for State”. In: NIELSEN, Thomas Heine (ed.). Yet more studies in the Ancient Greek Polis. Stuttgart, Franz Steiner Verlag, pp. 9–15.

__________________. (1997b). “A tipology of dependent poleis”. In: NIELSEN, Thomas Heine (ed.). Yet more studies in the Ancient Greek Polis. Stuttgart, Franz Steiner Verlag, pp. 29–37.

__________________. (1998). Polis and City-State: an ancient concept and its modern equivalent. Copenhagen, Munksgaard.

__________________. (2000). A comparative study of Thirdy City-State Cultures: a investigation conduced by the Copenhagen Polis Centre. Copenhagen, C. A. Reitzels Forlag.

__________________ and NIELSEN, Thomas Heine. (2004). An inventory of archaic and classical poleis. Oxford / New York, Oxford University Press.

HORDEN, Peregrine and PURCELL, Nicholas. (2000). The Corrupting Sea: a study of Mediterranean history. Oxford/Massachusetts, Blackwell Publishers.

HUMPHREYS, Sally C. (2004). “Public and Private Interests in Classical Athens”. In: RHODES, P. J. (ed). Athenian Democracy. Oxford/New York, Oxford University Press, pp. 225–36. [1a. Edição: 1977].

MARX, K. (1977). Formações econômicas pré-capitalistas. São Paulo, Paz e Terra.

MEIER, Christian. (1995). La naissance du politique. Paris, Gallimard. [1ª edição: 1980].

MEYER, Eduard. (1955). El historiador y la Historia antigua: estúdios sobre la teoria de la Historia y la Historia econômica y política de la Antiguedad. México/Buenos Aires, Fondo de Cultura Econômica. [1ª edição: 1910].

MENESES, Ulpiano T. B. de. (1983). “A cultura material no estudo das sociedades antigas”. In: Revista de História, n. 115.

_______________. (2004). “The Greeks: The Political Revolution in World History”. In: RHODES, P. J. (ed). Athenian Democracy. Oxford/New York, Oxford University Press, pp. 328–48. [1ª edição: 1982].

MILLETT, Paul & von REDEN, Sitta (eds). Kosmos: essays in order, conflict, and community in classical Athens. Cambridge/New York, Cambridge University Press.

MOSSÉ, Claude. (1979). Atenas: a história de uma democracia. Brasília, UnB.

MURRAY, Oswyn. (1991). “Cities of Reason”. In: MURRAY, Oswyn and PRICE, Simon (ed.). The Grrek City : from Homer to Alexander. Oxford, Clarendon Press, pp. 1–25

OBER, Josiah. (1996). The Athenian Revolution: essays on Ancient Greek democracy and political theory. Princeton, Princeton University Press.

POLIGNAC, François de. (1984). La naissance de la cité grecque : cultes, espace et société VIIIe-VIIe siècles avant J.-C. Paris, La Découverte.

_____________________. (1997). “Anthropologie du Politique en Grèce Ancienne”. In : Annales : Histoire, Scienses Sociales, 52e anné, n. 1, pp. 31–9.

RHODES, P. J. (ed). (2004). Athenian Democracy. Oxford/New York, Oxford University Press.

ROSTOVTZEFF, Mikhail. (1973). História da Grécia. Rio de Janeiro, Zahar Editores. [1ª edição: 1925].

ROY, James. (1998). “The threat from the Piraeus”. In: CARTLEDGE, Paul,

TODD, Stephen. (2003). The shape of Athenian Law. Oxford, Clarendon.

UTCHENKO, Sergej. (1984). “Classes e estrutura de classes na sociedade escravista antiga”. In : PINSKY, Jaime (org.). Modos de produção na antiguidade. 2ª ed. Rio de Janeiro, Global Editora, pp. 157–68. [1ª edição: 1957].

VERNANT, Jean-Pierre. (1968). “Préface”. In: GERNET, Louis. Anthropologie de la Grèce Ancienne. Paris, Maspero.

___________________. (1972). As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro, DIFEL. [1ª edição: 1962].

___________________. (1983). “Préface”. In: GERNET, Louis. Les grecs sans miracle. Paris, La Découverte/Maspero.

___________________. (1985). A morte nos olhos : figurações do outro na Grécia Antiga, Ártemis e Gorgó. Rio de Janeiro, Zahar. VIDAL-NAQUET, P. (1990). La démocratie grecque vue d'ailleurs: essais d'historiographie ancienne et moderne. Paris, Flammarion.

VON REDEN, Sitta. (1995). The Piraeus – a world apart. Greece & Rome, 42 (1): 24-37.

WATANABE, Lígia. (2001). “Sobre o envolvimento histórico do livro I da República de Platão”. In: BENOIT, Hector & FUNARI, Pedro Paulo de Abreu (orgs.). Ética e política no mundo antigo. Campinas, UNICAMP/IFCH.

WEBER, Max. (1999). Economia e Sociedade (2 volumes). Brasília/São Paulo, Editora UnB/Imprensa Oficial. [1ª edição: 1921].

WILL, E. “Trois quarts de siècle de recherches sur l’économie grecque antique”. In: Annales ESC, n. 9, v. 1, pp. 7–22.

WOOD, Ellen Meiksins. (1988). Peasant-citizen and Slave: the foundations of athenian democracy. London / New York, Verso.

_____________. (2003). Democracia contra capitalismo: a renovação do materialismo histórico. São Paulo, Boitempo Editorial.

Ver também editar

  Este artigo sobre História da Grécia é um esboço. Você pode ajudar a Wikipédia expandindo-o.