Queima dos arquivos da escravidão no Brasil

A queima dos arquivos da escravidão no Brasil ocorreu no dia 13 de maio de 1891, por ordem de Ruy Barbosa, então Ministro da Fazenda.[1] No dia 14 de dezembro de 1890, um documento assinado pelo ministro anunciava a queima de todos os registros de cartório sobre compra e venda de escravos no Brasil, incluindo livros de matrícula, controles aduaneiros e registros de tributos. O documento também determinava que os registros fossem enviados para o Rio de Janeiro, capital da república, onde seriam queimados.[1][2][3]

Literatura da portaria ministerial que ordenou, a mando da lei do registro civil à época, a queima dos arquivos da escravidão no Brasil em 14 de dezembro de1890.

Contextos editar

Acredita-se que o ministro emitiu o documento com a intenção de que os ex-proprietários de escravos não pudessem pedir indenização após a abolição da escravidão pela Lei Áurea, em 1888.[4] Por outro lado, acredita-se que a queima dos documentos também tenha impedido que ex-escravos pudessem ter acesso às datas das suas compras, que, em tese, poderiam ser usadas para exigir recompensa por terem sido ilegalmente escravizados, já que desde 7 de novembro de 1831 o tráfico de escravos para o Brasil foi proibido. Havia a possibilidade de buscas por indenização por parte de ex-escravos porque a determinação do fim do tráfico não teria sido cumprida. Estima-se que, depois de 1831, em torno de 300 mil africanos escravizados entraram por meio do tráfico no Brasil.[1] A queima dos arquivos também teria inviabilizado a hipótese de uma retomada, pelo novo regime republicano, dos planos da Princesa Isabel de indenizar ex-escravos com terras e ferramentas para trabalhar.[1]

Após a abolição da escravidão no Brasil inicia-se um processo de tentativa de esquecimento do passado escravista.[5] Por conta disso, interpreta-se que a queima dos documentos relativos à escravidão brasileira esteve ligada à busca pelo apagamento de um passado vergonhoso e pela reconstrução da história por vias dos ideais de progresso, incorporando assim os escravos brasileiros ao projeto de modernização capitalista.[6] De acordo com a historiadora Lilia Schwarcz, mesmo não tendo obtido êxito em suas pretensões de eliminar todos os arquivos da escravidão, o episódio toma o significado de uma tentativa de esquecimento do passado escravagista e a tentativa de um recomeço da história brasileira a partir do presente no qual se encontrava o Brasil logo após a proclamação da república.[7]

Na época o jornal o Estado de São Paulo publicou, em edições distintas, sobre o tema:

"O Estado de S.Paulo - 23/12/1890 - Oposição à destruição. Em 20 de dezembro de 1890, uma moção de apoio ao despacho de Ruy Barbosa foi votada e aprovada no Congresso Nacional. Mas, não sem oposição. Representantes de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul se colocaram contra o despacho. A edição de 23 de dezembro do Estado trouxe mais detalhes sobre a sessão.

A nota contava que o deputado Francisco Coelho Duarte Badaró (MG) registrou seu protesto contra a queima de todo arquivo da escravidão no Brasil. Após colocar a ressalva que não se pronunciava contra a "obra meritória da abolição" mas contra a destruição dos documentos, disse: "não devemos fazer o papel de iconoclastas, devemos ter um arquivo".

"A nossa vida é nova, mas precisamos ter a nossa história escrita com provas verdadeiras. Pelo fato de mandar queimar grande número de documentos para a história do Brasil, a vergonha nunca desaparecerá, nunca se poderão apagar da nossa história os vestígios da escravidão", continuou o deputado.

Na edição de 21 de dezembro de 1890 o Estado publicou na sua capa uma crítica à ordem de Ruy Barbosa. Ela questionava o direito de um ministro sobre o destino dos documentos que "mais do que aos arquivos das repartições, pertecem à história".
[8]

Base legal editar

O documento assinado por Rui Barbosa tivera base legal autorizada pelo artigo 11, parágrafo único do decreto Nº 370, de 2 de maio de 1890,[9] que era a Lei do Registro Civil criada no governo provisório de Deodoro da Fonseca, o citado parágrafo único tem a seguinte redação orginal: " Paragrapho unico. Os livros do registro sob o n. 6, nos quaes era transcripto o penhor de escravos, serão incinerados, e si delles constarem outros registros, estes serão transportados com o mesmo numero de ordem para os novos livros de ns. 2, 4 ou 5." (Decreto nº 370, de 2 de Maio de 1890, artigo 11, parágrafo único)[10]

Ver também editar

Referências

  1. a b c d Bernardo 2020.
  2. Gomide 2020.
  3. Estadão 2015.
  4. Barbosa 1988.
  5. Cardoso 2013, p. 79.
  6. Cardoso 2013, p. 74.
  7. Schwarcz 2010, p. 80.
  8. A destruição dos documentos sobre a escravidão. Estadão, estadão acervos, página pesquisada em 24 de março de 2023.
  9. SANT"ANA, Moacir Medeiros de. A queima de documentos da escravidão. Maceió: Governo do Estado de Alagoas/Secretaria de Estado da Comunicação Social, 1988
  10. Coleção de Leis do Brasil - 1890, Página 798 Vol. 1 fas. V

Bibliografia editar

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