Relações étnico-raciais

As relações étnico-raciais se referem às questões concernentes à população afro-brasileira,[1] a fim de sair do impasse e da postura dicotômica entre os conceitos raça e etnia. Para se compreender a realidade do negro brasileiro, não somente as características físicas e a classificação racial devem ser consideradas, mas também a dimensão simbólica, cultural, territorial, mítica, política e identitária. É neste contexto que a pesquisadora Gomes,[2] vai definir relações étnico-raciais como sendo "relações imersas na alteridade e construídas historicamente nos contextos de poder e das hierarquias raciais brasileiras",[2] onde segundo a autora a "raça opera como forma de classificação social, demarcação de diferenças e interpretação política e identitária",[2] num processo histórico, social, político, econômico e cultural.

Ressignificação de raça e etnia editar

A partir das discussões acerca das relações estabelecidas sobre o conceito de raça pela sociedade brasileira, um grupo de intelectuais, juntamente com o Movimento Negro adota uma ressignificação para o termo, portanto rejeitando como coloca Gomes[3] “o sentido biológico de raça, uma vez que os avanços da ciência postulam que não existem raças humanas.” As raças, acrescenta a pesquisadora, são compreendidas com um significado político e identitário e como construções sociais, políticas e culturais produzidas no contexto das relações de poder ao longo do processo histórico.

Outro aspecto é o conceito de etnia, que é utilizado por alguns “por acharem que, se falarmos em raça, mesmo que de forma ressignificada, acabamos presos ao determinismo biológico, o qual já foi abolido pela biologia e pela genética. A intenção era enfatizar que os grupos humanos não são marcados por características biológicas, mas, sim, por processos históricos e culturais."[3] Todavia, ainda segundo a autora, há questionamentos sobre o alcance do conceito de etnia no que diz respeito aos negros brasileiros devido à forma como esses indivíduos se veem e são vistos por meio de classificações raciais e experiências vivenciadas e intensificadas por conta da origem africana e negra. Ao ser dissociado da interpretação ressignificada de raça, o conceito de etnia se torna insatisfatório para a compreensão do racismo e suas implicações na vida dos negros. Dessa forma a expressão étnico-racial vem sendo adotada para se referir às questões concernentes à população negra brasileira, sobretudo, no campo da educação.[3]

Relações Étnico-raciais e educação editar


Gomes aponta a Lei nº 10.639/03[4] que estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileiras e africanas nas escolas públicas e privadas do ensino fundamental e médio; o Parecer do CNE/CP 03/2004, que aprovou as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras e Africanas; e a Resolução CNE/CP 01/2004,[5] que detalha os direitos e as obrigações dos entes federados ante a implementação da lei compõem um conjunto de dispositivos legais considerados como indutores de uma política educacional voltada para a afirmação da diversidade cultural e da concretização de uma educação das relações étnico-raciais nas escolas, desencadeada a partir dos anos 2000. É nesse mesmo contexto que foi aprovado, em 2009, o Plano Nacional das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2009).[6]

Segundo a pesquisadora a sanção de tal legislação significa uma mudança não só nas práticas e nas políticas, mas também no imaginário pedagógico e na sua relação com o diverso. Mesmo sendo um preceito de caráter nacional, a Lei nº 10.639/03[4] se volta para a correção de uma desigualdade histórica que recai sobre um segmento populacional e étnico-racial específico, ou seja, os negros brasileiros. Ao fazer tal movimento, o Estado brasileiro, por meio de uma ação educacional, sai do lugar da neutralidade estatal diante dos efeitos nefastos do racismo na educação escolar e na produção do conhecimento e se coloca no lugar de um Estado democrático, que reconhece e respeita as diferenças étnico-raciais e sabe da importância da sua intervenção na mudança positiva dessa situação. Entretanto, mesmo com essas ações afirmativas, há muito o que ser feito no que diz respeito à formação de professores para de fato promover uma educação étnico-racial pautada na perspectiva decolonial.[7]

A doutora em Ciências Humanas, Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva[8] sinaliza que para pensar a educação levando-se em conta as relações étnico-raciais em contextos de sociedades multiculturais como no Brasil, deve-se estar aberto a diversidade cultural brasileira, onde indígenas, afrodescendentes, descendentes de europeus e de asiáticos, precisam conviver sem medo das tensões e diminuindo os conflitos.[8] Além destas pesquisadoras existem também outros autores e outras autoras como por exemplo, Kabengele Munanga, Vilma Reis, Carlos Moore, Luiza Bairros que defendem este mesmo ponto de vista.

Ver também editar

Referências

  1. Ferreira, Marcelo Benedicto. «IBGE mostra as cores da desigualdade». IBGE - Agência de Notícias. Consultado em 12 de dezembro de 2018 
  2. a b c «Educação, relações étnico-raciais e a Lei 10.639/03 | A Cor da Cultura». antigo.acordacultura.org.br. Consultado em 12 de dezembro de 2018 
  3. a b c www.acaoeducativa.org.br (PDF) http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-content/uploads/2012/10/Alguns-termos-e-conceitos-presentes-no-debate-sobre-Rela%C3%A7%C3%B5es-Raciais-no-Brasil-uma-breve-discuss%C3%A3o.pdf. Consultado em 12 de dezembro de 2018  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  4. a b «Lei 10639/03 | Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, Presidência da Republica». Jusbrasil. Consultado em 12 de dezembro de 2018 
  5. «Diretrizes Curriculares - Cursos de Graduação». portal.mec.gov.br. Consultado em 12 de dezembro de 2018 
  6. portal.mec.gov.br http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=1852-diretrizes-curriculares-pdf&category_slug=novembro-2009-pdf&Itemid=30192. Consultado em 12 de dezembro de 2018  Em falta ou vazio |título= (ajuda)
  7. Ribeiro, Débora; Gaia, Ronan da Silva Parreira (6 de abril de 2021). «Uma perspectiva decolonial sobre formação de professores e educação das relações étnico-raciais». Linhas Crí­ticas: e35968–e35968. ISSN 1981-0431. doi:10.26512/lc.v27.2021.35968. Consultado em 19 de agosto de 2022  soft hyphen character character in |jornal= at position 11 (ajuda)
  8. a b revistaseletronicas.pucrs.br http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/download/2745/2092. Consultado em 12 de dezembro de 2018  Em falta ou vazio |título= (ajuda)

Ligações externas editar