Teoria de género
Teoria de gênero, também chamada de ideologia de gênero, é um termo criado no meio neoconservador católico para se referir aos estudos de gênero, pós-feminismo e pós-generismo. Aqueles que usam essa expressão argumentam que os estudos de gênero fundamentam uma conspiração que visa destruir "a família" e uma suposta “ordem natural” que fundamenta a sociedade.[2] O termo também é utilizado por pós-estruturalistas e pós-modernistas, como contra-ataque, para se referir à crença de que se deve reforçar os papéis sociais de gênero de acordo com as arbitrariedades culturais associadas a cada designação sexual ao nascer.[3][4][5][6][7][8][9]

A ideia da ideologia de gênero tem sido descrita como um pânico moral[10][11] ou uma teoria conspiratória que alega que existe um uma conspiração global para minar a sociedade,[12] sendo frequentemente aplicada como retórica anti-LGBT em geral.
BrasilEditar
No Brasil, a Igreja Católica tem um papel importante na difusão da teoria.[13] O termo ideologia de gênero foi empregado no país pela primeira vez pelo arcebispo católico Orani Tempesta e foi popularizado pelo padre Paulo Ricardo. Tempesta definiu gênero como técnica marxista, que objetiva, junto aos partidos de esquerda e fundações internacionais, através do sistema educacional destruir os valores familiares.[14][13]
Projetos de lei, propostos por defensores da Escola sem Partido, visam proibir a educação sexual nas escolas, bem como o uso neolinguístico de flexão de gênero para neutralizar palavras e a discussão sobre gênero.[15][16][17][18][19] Em abril de 2020, o STF determinou a inconstitucionalidade destas propostas.[20] Outros projetos foram apresentados para a proibição do gênero neutro.[21][22][23][24][25] Em Santa Catarina, a linguagem neutra foi proibida em escolas públicas e privadas.[26] Além disto, existem projetos para a proibição desta em ao menos outros 14 estados.[27] Profissionais da educação que usam a linguagem não sexista têm sofrido perseguição desde então.[28][29]
Criticismo de gêneroEditar
Feministas radicais que se opõem ao reconhecimento do gênero tendem a se identificar como "críticas de gênero" (do inglês, gender critical).[30] TERFs (feministas radicais trans-excludentes) também usam termos como "lobby trans",[31] similar a "lobby gay", tratando a causa como uma teocracia de gênero,[32] por ter fundamentos no ativismo pelos direitos trans e no transfeminismo,[33][34] visto como algo "masculinista" por TERFs. Tais teorias da conspiração sobre pessoas trans tendem a ser replicadas também por conservadores de direita.[35][36][37][38][39][40][41]
Críticos de gênero também são contra o ativismo queer, pois consideram que o conceito de gênero se baseia em regras de gênero, um sistema inerentemente patriarcal de opressão e misoginia, logo a diferença de gênero e sexo seria o advento da socialização feminina ou masculina.[42][43][44][45][46][47]
Ver tambémEditar
Referências
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