A Wynnea americana é uma espécie de fungo da família Sarcoscyphaceae. Essa espécie incomum é facilmente reconhecível por seus ascomas em forma de colher ou de orelha de coelho, que podem atingir até 13 cm de altura. Possui superfícies externas escuras, marrons e verrucosas, enquanto a superfície interna, onde os esporos são produzidos (himênio), varia de laranja a rosada ou marrom-avermelhada. Diferencia-se de outras espécies do gênero pelas pústulas (pequenos relevos) na superfície externa e, microscopicamente, pelos esporos grandes, assimétricos, com sulcos longitudinais e ponta aguda. Os esporos são formados em estruturas chamadas ascos, que possuem anéis espessados em uma extremidade, cobertos por uma estrutura articulada conhecida como opérculo — uma tampa que se abre para liberar os esporos.

Como ler uma infocaixa de taxonomiaWynnea americana

Classificação científica
Domínio: Eukaryota
Reino: Fungi
Filo: Ascomycota
Classe: Pezizomycetes
Ordem: Pezizales
Família: Sarcoscyphaceae
Género: Wynnea
Espécie: W. americana
Nome binomial
Wynnea americana
Thaxt. (1905)

No leste da América do Norte, onde geralmente é encontrada crescendo no solo sob árvores de madeira dura, pode ser observada desde Nova York até Michigan, e ao sul até o México. Também foi registrada na Costa Rica, Índia e Japão. Essa espécie não é comestível.

Taxonomia

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A Wynnea americana foi descrita pela primeira vez em 1905 pelo micologista americano Roland Thaxter. Thaxter encontrou vários grupos de ascomas em Burbank, Tennessee, em 1888, e inicialmente pensou que se tratava de Wynnea macrotis, uma das primeiras espécies identificadas do gênero Wynnea. Em 1896, uma nova visita ao mesmo local e a Cranberry, na Carolina do Norte, resultou na coleta de mais espécimes. Desta vez, Thaxter notou que os ascomas não estavam ligados ao húmus, como esperado, mas a "um corpo grande, irregularmente lobado, marrom, firme e semelhante a um tubérculo, enterrado a poucos centímetros de profundidade no húmus". A análise microscópica dessa estrutura e de outros tecidos do ascoma convenceu Thaxter de que o material era suficientemente distinto das espécies conhecidas de Wynnea para justificar a criação de uma nova espécie.[1] Os espécimes de Tennessee e da Carolina do Norte foram usados como sintipos para descrever o táxon;[1] o espécime de Tennessee foi posteriormente designado como lectótipo (o holótipo que define o nome).[2] Em 1946, a micologista francesa Marcelle Louise Fernande Le Gal determinou que o asco de W. americana tinha uma estrutura semelhante à das espécies que ela classificou na série suboperculada.[3]

Descrição

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Ascomas jovens em Virgínia Ocidental, Estados Unidos

Os ascomas (tecnicamente chamados de apotécios) são eretos, em forma de colher ou orelha, podendo alcançar até 13 cm de altura por 6 cm de largura, com as bordas geralmente curvadas para dentro. A superfície externa é marrom-escura com tons arroxeados,[4] enquanto a superfície interna — o himênio, onde os esporos são produzidos — varia de laranja-rosado a vermelho-arroxeado opaco ou marrom quando madura. A superfície externa pode desenvolver rugas na maturidade. Os apotécios, que aparecem isoladamente ou em grupos de até cerca de 25, surgem de um pequeno estipe. O estipe varia em comprimento, é sólido, escuro por fora e branco por dentro. Os estipes originam-se de um esclerócio, uma massa compacta de micélio endurecido. O esclerócio tem consistência quase gelatinosa, com lobos de formato irregular e câmaras internas, podendo atingir um diâmetro de 4 a 6 cm.[5] Acredita-se que o esclerócio forneça umidade e nutrientes,[1] ou atue como uma estrutura resistente para sustentar o fungo em períodos de estresse.[6] A W. macrotis é a única outra espécie do gênero que também possui esclerócio.[5]

Os grupos de ascomas estão conectados por grandes massas subterrâneas de micélios compactados, conhecidas como esclerócios. Micélio de Armillaria é comumente encontrado no tecido subterrâneo, embora não esteja claro se há uma relação parasitária.[4]

A Wynnea americana não tem odor perceptível, e seu sabor é desconhecido.[7] É considerada não comestível devido à sua textura dura.[8]

Características microscópicas

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Características microscópicas de W. americana. As figuras 3, 6 e 7 mostram os esporos de: (3) W. americana, (6) W. macrotis e (7) W. gigantea.[1]

Em muitos fungos em forma de taça, a análise microscópica da anatomia e estrutura do apotécio é essencial para a identificação precisa da espécie ou para diferenciar espécies relacionadas com aparência externa semelhante. Em W. americana, o excípulo ectal (a camada externa de tecido que compõe os apotécios) tem 125 μm de espessura e é formado por células escuras, angulares a aproximadamente esféricas, com 40–70 μm de diâmetro. Essas células angulares formam verrugas piramidais na superfície externa. O excípulo medular (a camada interna carnosa sob o excípulo ectal) é quase gelatinoso, composto por hifas entrelaçadas de 10 μm de diâmetro.[2]

Vários componentes estruturais estão envolvidos na liberação de esporos em W. americana, como o asco, o opérculo e o subopérculo.[9] Os ascos, células que produzem esporos, medem 330–400 μm de comprimento por 16–20 μm de largura.[2] O asco possui um anel apical espessado, coberto por um opérculo articulado, uma tampa que se abre para liberar os esporos. A presença do anel apical sob o opérculo e a abertura inclinada resultante caracterizam a condição "suboperculada",[10] compartilhada com Cookeina tricholoma e Phillipsia domingensis, também da família Sarcoscyphaceae.[9]

Os esporos são em forma de barco (escifoides), com dimensões de 35–38 por 12–14 μm. Eles possuem sulcos longitudinais proeminentes e, quando maduros, terminam em uma ponta curta e aguda.[2] Geralmente contêm várias gotículas de óleo. As paráfises (células estéreis entre os ascos) têm 8–9 μm de comprimento e possuem septos internos.[2] A estrutura dos septos foi investigada por microscopia eletrônica de transmissão, revelando que W. americana tem um poro único bloqueado por uma "matriz em forma de leque" — uma região densa em elétrons com um anel em forma de toro de tecido translúcido enrolado ao redor. Esse tampão de poro é semelhante aos encontrados nas espécies de Sarcoscyphaceae Sarcoscypha occidentalis e Phillipsia domingensis.[11]

Espécies semelhantes

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A espécie relacionada Wynnea sparassoides tem um ascoma que lembra uma couve-flor marrom-amarelada sobre um estipe longo e marrom.[12] Comparada a W. americana, W. gigantea possui apotécios menores, mais arredondados nas extremidades, mais numerosos em um único espécime e de cor mais clara.[1] Donald H. Pfister, em sua monografia de 1979 sobre o gênero Wynnea, sugere que a aparência pustulosa da superfície externa distingue claramente W. americana das outras espécies do gênero.[2]

Também pode se assemelhar a Otidea smithii, de cor marrom-arroxeada e relativamente robusta, e a Mitodis lingua, cuja parte interna é mais escura que a externa; mas nenhuma dessas espécies está conectada a tecidos densos subterrâneos.[4]

Distribuição e habitat

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Na América do Norte, a W. americana foi coletada em vários locais, incluindo Tennessee, Nova York, Virgínia Ocidental, Carolina do Norte, Ohio e Pensilvânia.[13][14][15] Também foi registrada no México,[16] Costa Rica,[5] Índia,[17] e Japão.[18]

Os ascomas crescem solitários ou em grupos no solo de florestas decíduas, preferindo solos úmidos e ricos em matéria orgânica.[7] Tanto na Ásia quanto na América do Norte, os ascomas são mais frequentemente produzidos em agosto e setembro. A única coleta na América Central, na Costa Rica, foi feita no início de novembro.[5]

Ver também

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Referências

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  1. a b c d e Thaxter R. (1905). «A new American species of Wynnea». Botanical Gazette. 39 (4): 241–47. doi:10.1086/328614 
  2. a b c d e f Pfister DH. (1979). «A monograph of the genus Wynnea (Pezizales, Sarcoscyphaceae)». Mycologia. 71 (1): 144–59. JSTOR 3759228. doi:10.2307/3759228 
  3. Le Gal M. (1946). «Les discomycetes subopercules» [The suboperculate discomycetes]. Bulletin de la Société Mycologique de France (em francês). 62: 218–40 
  4. a b c Audubon (2023). Mushrooms of North America. [S.l.]: Knopf. 46 páginas. ISBN 978-0-593-31998-7 
  5. a b c d Pfister DH, Gomez-P LD (1978). «On a collection of Wynnea americana new record from Costa Rica with some comments on the distribution and delimitation of Wynnea species in the neotropics». Brenesia. 14–15 (1): 395–400 
  6. Corner EJH. (1930). «Studies in the morphology of discomycetes. IV. The evolution of the ascocarp». Transactions of the British Mycological Society. 15 (1–2): 121–34. doi:10.1016/S0007-1536(30)80011-1 
  7. a b Bessette A, Miller OK Jr, Bessette AR, Miller HR (1995). Mushrooms of North America in Color: a Field Guide Companion to Seldom-Illustrated Fungi. Syracuse: Syracuse University Press. pp. 146–47. ISBN 0-8156-2666-5 
  8. Miller HR, Miller OK (2006). North American Mushrooms: A Field Guide to Edible and Inedible Fungi. Guilford, CT: FalconGuides. p. 533. ISBN 978-0-7627-3109-1 
  9. a b Samuelson DA. (1975). «Apical apparatus of suboperculate ascus». Canadian Journal of Botany. 53 (22): 2660–79. doi:10.1139/b75-295 
  10. Alexopoulos CJ, Mims CW, Blackwell M (1996). Introductory Mycology. New York: Wiley. p. 416. ISBN 0-471-52229-5 
  11. Li LT, Kimbrough JW (1995). «Septal structures in the Sarcoscyphaceae and Sarcosomataceae (Pezizales)». International Journal of Plant Sciences. 156 (6): 841–48. JSTOR 2475116. doi:10.1086/297308 
  12. Sundberg W, Bessette A (1987). Mushrooms: A Quick Reference Guide to Mushrooms of North America (Macmillan Field Guides). New York: Collier Books. p. 6. ISBN 0-02-063690-3 
  13. Overholts LO. (1924). «Mycological notes for 1921–22». Mycologia. 16 (5): 233–39. JSTOR 3753263. doi:10.2307/3753263 
  14. Henry LK. (1943). «Wynnea americana in western Pennsylvania». Mycologia. 35 (1): 131–32. JSTOR 3754977 
  15. Korf RP. (1949). «Wynnea americana». Mycologia. 41 (6): 649–51. JSTOR 3755021. doi:10.2307/3755021 
  16. Vanelzuela R, Guzman G, Castillo J (1981). «Descriptions of little known species of higher fungi from Mexico with discussions on ecology and distribution». Boletin de la Sociedad Mexicana de Micologia (em espanhol) (15): 67–120 
  17. Batra LR, Batra SW (1963). «Indian Discomycetes». University of Kansas Science Bulletin. 44 (1/14): 109–256 
  18. Otani Y. (1980). «Sarcoscyphineae of Japan». Nippon Kingakukai Kaiho (em japonês). 21 (2): 149–79 

Ligações externas

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