Xaizar,[1] Chaizar ou Saijar (em árabe: شيزر; romaniz.:Šayzar/Chayzar), também historicamente conhecida como Larissa ou Cesareia na Síria, foi uma cidade e fortaleza medieval situada no que é hoje o oeste-noroeste da Síria que teve um papel importante nos conflitos bélicos entre cristãos e muçulmanos na época das cruzadas.

Xaizar
Shayzar, Chayzar, Saijar, Sidzara,
Sezer, Larissa na Síria, Cesareia da Síria
(شيزر; Šayzar
Xaizar
Fortaleza de Xaizar
Localização atual
Xaizar está localizado em: Síria
Xaizar
Localização de Xaizar na Síria
Coordenadas 35° 16' N 36° 34' E
País Síria Síria
Província Hama
Distrito Muhardeh
Altitude 200 m
Dados históricos
Fundação Antes do século XIV a.C.

Nomes ao longo da história editar

Situada no vale do rio Orontes, entre Hama e Apameia, numa localização estratégica, a cidade é mencionada nas Cartas de Amarna egípcias (século XIV a.C. com o nome de Senzar ou Sezar. Os Gregos chamaram-lhe Sidzara e os Selêucidas rebatizaram-na Larissa, o nome da cidade grega homónima de onde eram originários muitos dos colonos. Os Romanos repuseram o nome original, e no período bizantino chamou-se Sezer. Os cruzados usavam frequentemente o nome de Cesareia (Cesareia da Síria), nunca usado antes, o que segundo Guilherme de Tiro se devia ao facto dos cruzados a confundirem com Cesareia (atualmente Kayseri, na Turquia), um local conhecido na história do cristianismo como o local onde viveu Basílio de Cesareia.[2]

Localização editar

A fortaleza da antiga cidade, cujas ruínas se encontram na cidade de Mhardeh, pertencente à província de Hama, situa-se num esporão rochoso que domina uma garganta do leito do Orontes.

História editar

A cidade foi conquistada pelos Árabes do Califado Ortodoxo aos Bizantinos em 638, tendo mudado várias vezes de mãos após isso entre os Árabes e Bizantinos nos anos seguintes. Nicéforo II Focas saqueou-a em 969; Basílio II Bulgaróctono conquistou-a em 999, passando então a ser um posto avançado na fronteira sul do Império Bizantino administrado pelo Bispo de Xaizar.

O emir árabe Ali ibne Munquide toma Xaizar aos Bizantinos em 19 de dezembro de 1081, e ali funda a dinastia munquídita (Banu Munquide). Os Bizantinos tentam inúmeras vezes retomar a cidade, mas sem sucesso.

Os munquíditas controlaram os territórios a leste de Xaizar e os montes An-Nusayriyah, até à costa do Mediterrâneo, a oeste, desde as cidades costeiras de Lataquia, a norte, até Tartus, a sul. Durante a Primeira Cruzada, o emir munquídita apoiou os cruzados que atravessaram as suas terras, fornecendo-lhes cavalos e provisões. Depois disso, Xaizar passou a estar na fronteira entre o Principado de Antioquia dos cruzados e os Império Seljúcida, e foi alvo de raides, tanto daquele principado como do Condado de Trípoli.

 
Vista da fortaleza com o rio Orontes em primeiro plano

Em 1106, os emires Murxide e Sultão derrotam o conde Guilherme-Jordão de Trípoli. O regente de Antioquia Tancredo da Galileia ataca-a em 1108 e 1110, e só depois de ser subornado é que assina um tratado de paz com os munquíditas. Em 1111, Tancredo, Balduíno I de Jerusalém e Beltrão de Trípoli assediam a fortaleza durante duas semanas, mas retiram após a intervenção de Maudade, o atabegue de Moçul, que lhes cortou o acesso a água e comida. O episódio ficou conhecido como batalha de Xaizar. Apesar do desaire, Tancredo constrói um castelo nas proximidades, Tel ibne Maxar (Tell ibn Ma'shar), a fim de manter Xaizar sob vigilância apertada.

Em 1113, depois da morte de Raduano, é atacada pelos Assassinos (Nizaritas).[3] Xaizar participou na campanha de Ilgazi contra Antioquia em 1119. Quando Balduíno I de Jerusalém foi feito prisioneiro pelos Ortóquidas nas imediações de Edessa em 1123, foi mantido em Xaizar até ser libertado no ano seguinte. Como parte do seu resgate, foi obrigado a deixar a sua filha Ioveta como refém, que foi mantida em Xaizar até que o seu resgate foi pago em 1125. Xaizar passou a ter boas relações tanto com os seus vizinhos muçulmanos como com o Reino de Jerusalém, e Balduíno foi autorizado a visitar a sua filha. Porém, em 1125, foi incorporado nos territórios do emir de Moçul, Bursuque. Quando em 1127 Zengui sucedeu a Bursuque em Moçul, Xaizar reconheceu-lhe a suserania. Tanto Bursuque como Zengui eram atabegues (governadores)

Em 1137, o imperador bizantino João II chegou à região, para impor a sua autoridade em Antioquia, e prometeu a Raimundo de Antioquia um principado constituído por Xaizar, Alepo, Homs e Hama se Antioquia fosse devolvida aos Bizantinos. A 26 de abril de 1138, o exército bizantino, conjuntamente com os Francos de Antioquia e do Condado de Edessa, monta um cerco a Xaizar, mas Raimundo e Joscelino II de Edessa desentendem-se com o imperador e entretanto em maio chega uma força comandada por Zengui para forçar o fim do cerco. O emir de Xaizar prefere submeter-se aos Bizantinos do que a Zengui, e oferece-se para reconhecer João II como seu senhor. No entanto, nem João nem Zengui chegaram a impor realmente a sua autoridade sobre Xaizar, que na prática se manteve independente.

O castelo foi destruído em 1157 por um sismo, que fez ruir a cidadela e causando a morte a quase toda a família do emir, que ali estava reunida para celebrar uma circuncisão. Os únicos sobreviventes foram a mulher do emir e o seu sobrinho Osama, que estava ausente numa missão diplomática em Damasco. Os Assassinos tomaram imediatamente o controlo da cidade arruinada, que depois foram derrotados pelos cruzados. Estes acabaram por desistir do cerco a Xaizar devido a disputas entre eles. A cidade foi depois ocupada por tropas de Alepo. O soberano zênguida Noradine (r. 1146–1174) restaurou a cidade, que voltou a ser destruída por outro sismo em 1170. Em 1174 Saladino toma posse do que resta. A cidade é novamente reconstruída, mas em 1241 é saqueada pelos Corásmios.[4] e em 1260 é arrasada durante invasão mongol, ficando nesse ano nas mãos do sultão mameluco Baibars (r. 1260–1277). Este e o seu sucessor Anácer Maomé (reinou por três vezes entre 1293 e 1341) levaram a cabo o restauro do castelo, cuja traça atual data desse período.

Descrições da cidade pelos cruzados editar

 
Iluminura do cerco de Xaizar num exemplar do século XIV da obra de Guilherme de Tiro
 
O castelo de Xaizar numa fotografia do final do século XIX

Na sua descrição do cerco dos cruzados a Xaizar em 1157, Guilherme de Tiro refere:

A cidade de Xaizar encontra-se sobre o mesmo rio Orontes que corre em Antioquia. É chamada por alguns de Cesareia, os que acreditam que é a famosa metrópole da Capadócia sobre a qual presidiu em tempos os distinto professor São Basílio; mas os que assim pensa estão gravemente errados. Pois Cesareia fica a quinze dias de jornada ou mais de Antioquia. Esta cidade está na Celessíria (Coelesyria), uma província que está separada da Capadócia por muitas províncias intermédias- Nem o seu nome é Cesareia, mas sim Cesara. É uma das cidades sufragâneas que pertencem ao Patriarcado de Antioquia. Está muito bem situada. A parte baixa estende-se ao longo da planície, enquanto que no cimo das partes mais altas está a cidadela, relativamente longa em comprimento, mas bastante estreita. É bem fortificada, pois além das suas defesas naturais, o rio protege-a num lado e a cidade no outro, pelo que é inteiramente inacessível.[5]

Fulquério de Chartres, uma testemunha ocular do cerco de 1111, não sabia o nome clássico romano ou grego do local, mas referiu que os Turcos lhe chamavam Sisara, mas os locais lhe chamavam usualmente Chezar.[6]

Vida na cidade medieval editar

Acerca dos habitantes, Guilherme de Tiro escreve que «tinham muito poucos conhecimentos de armas; a sua atenção estava devotada quase inteiramente para o comércio.» Muitos eram cristãos, que no entender de Guilherme sofriam como escravos sob os seus governantes muçulmanos, mas os Munquíditas parecem ter sido senhores tolerantes e tanto cristãos como muçulmanos de várias seitas viviam ali pacificamente.

O príncipe local Osama escreveu um relato muito vívido da vida em Xaizar e de outros lugares do mundo muçulmano na sua obra Kitab al-I'tibar ("O Livro de Aprendizagem por Exemplo"), a qual dá uma excelente perspetiva interior da sociedade muçulmana no século XII. Os emires munquiditas são apresentados como patronos da literatura, que se deliciam caçando e praticando outros desportos, fazendo a guerra e negociando a paz com os seus vizinhos muçulmanos e cristãos.

Emires de Xaizar editar

Notas e referências editar

Bibliografia editar

  • Lewis, Bernard T.; Gama, Mauro (2003). Os Assassinos. São Paulo: Zahar. ISBN 8571107092 
  • Fulquério de Chartres (século XII), Historia Hierosolymitana , Gesta Francorum Jerusalem Expugnantium (História da Expedição a Jerusalém)  Tradução em inglês:Ryan, Frances Rita (1969), «XLV.7-9», A History of the Expedition to Jerusalem, II, University of Tennessee Press 
  • Guilherme de Tiro (século XII), História dos Feitos Realizados no Ultramar  Edição em inglês: *Babcock, E.A.; Krey, A.C. (1943), A History of Deeds Done Beyond the Sea, Columbia University Press 
  • Pillement, Georges, Liban, Syrie, et Chypre inconnus: itinéraires archéologiques (em francês), Albin Michel, consultado em 15 de dezembro de 2012 
  • Gibb, H.A.R. (1932), The Damascus Chronicle of the Crusades, Extracted and Translated from the Chronicle of Ibn al-Qalanisi 
  • Hitti, Philip Khuri (1929), An Arab-Syrian Gentleman and Warrior in the Period of the Crusades; Memoirs of Usamah ibn-Munqidh (Kitab al i'tibar) (em inglês), Nova Iorque 
  • Runciman, Steven (1952), A History of the Crusades (em inglês), II: The Kingdom of Jerusalem, Cambridge University Press 
  • Setton, Kenneth Meyer; Baldwin, Marshall Whithed (2006), A History of the Crusades : The First Hundred Years, ISBN 978-029904834-1 (em inglês), University of Wisconsin Press, consultado em 15 de dezembro de 2012 
  • Setton, Kenneth Meyer; Hazard, Harry W.; Wolff, Robert Lee; Zacour, Norman P.; Baldwin, Marshall Whithed (2005), A History of the Crusades : The Later Crusades, 1189-1311, ISBN 9780299048440 (em inglês), University of Wisconsin Press, consultado em 15 de dezembro de 2012 
  • Usama; Miquel, André (trad.) (1983), Des enseignements de la vie : souvenirs d'un gentilhomme syrien du temps des Croisades, ISBN 9782110807854 (em francês), Imprimerie Nationale 

Ligações externas editar

 
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