Indústrias Reunidas Ferro e Aço

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Indústrias Reunidas Ferro e Aço (IRFA) foi um fabricante brasileiro de locomotivas sediada no Rio de Janeiro, fundada em 1942 por Flávio Prado Uchôa e Fernando Galvão Antunes como uma subsidiária da Prado Uchoa & Cia. Ltda[1][2]. A IRFA foi criada sob a supervisão do pessoal da Comissão Provisória de Serviços Motorizados (CPSM) da Estrada de Ferro Central do Brasil, como embrião de um projeto para a formação de uma indústria de motores e locomotivas no Brasil[3].

IRFA
Indústrias Reunidas Ferro e Aço
O presidente Getúlio Vargas visita a fábrica da IRFA, em Santíssimo, Rio de Janeiro, 1951.
Arquivo Nacional
Razão social Indústrias Reunidas Ferro e Aço
Fundação 1942
Fundador(es) Flávio Prado Uchôa e Fernando Galvão Antunes
Destino fechada em 1958.
Encerramento 1958
Sede sede na Av. Almirante Barros, nº91, sala 901 e 903, posteriormente Rua Senador Dantas, 80, 9º andar, conjunto 907[ligação inativa] Rio de Janeiro, RJ
Produtos vagões

História editar

 
Uma das 20 automotrizes fabricadas pela IRFA para o Ministério da Viação no Museu da Estrada de Ferro Madeira Mamoré.
 
O engenheiro da IRFA Galvão Antunes (à esquerda) e o diretor da RVPSC Raul Zenha de Mesquita são recebidos em audiência pelo presidente Getúlio Vargas, 1952.
Arquivo Nacional.

Após trabalharem nos projetos de eletrificação da Estrada de Ferro Central do Brasil, os engenheiros Flávio Prado Uchôa e Fernando Galvão Antunes fundaram a Prado Uchoa & Cia. Ltda em 1942 e acabaram recebendo, sem concorrência, os trabalhos de eletrificação dos subúrbios da Central originalmente encomendados à empresa britânica Metropolitan-Vickers (que, envolvida no esforço de guerra britânico, teve de abandonar o contrato). Dentro do contrato de fornecimento da eletrificação, havia a previsão do fornecimento de locomotivas elétricas. Após montar uma locomotiva experimental para a Central, a Prado Uchoa abriu a Indústrias Reunidas Ferro e Aço (IRFA), empresa subsidiária para construir e montar locomotivas.[4][1]

Em 1945 a recém fundada IRFA recebeu, sem concorrência, um contrato de fornecimento de 20 automotrizes diesel para o Ministério de Viação e Obras Públicas pelo valor de 38,5 milhões de cruzeiros. Apesar das denúncias de favorecimento surgidas na imprensa e da falta de experiência da IRFA (que até aquele momento não havia fabricado/montado uma única automotriz), a Central antecipou o pagamento de 60% do contrato em seis meses.[1] O deputado federal Jurandir Pires denunciou em plenário que a IRFA cobrava preços sete vezes mais altos pelas automotrizes e era beneficiada pelo engenheiro da Central do Brasil e deputado Mauro Renault Leite, genro do presidente Dutra. Em outubro de 1946, apesar de 60% do contrato ter sido pago, nenhuma automotriz ainda havia sido entregue.[5][6] Pressionado por seus pares, o deputado Renault Leite admitiu que até 1945 fora funcionário da IRFA, embora tenha defendido que nunca trabalhou no setor comercial da empresa mas sim no setor técnico.[7] Mais tarde, surgiram denúncias de um outro contrato intermediado por Renault Leite de 12 automotrizes encomendadas pela Central do Brasil para a IRFA que nunca foram entregues, embora parte do contrato teria sido paga. Segundo denúncia do Jornal de Debates[8], Renault Leite estava adquirindo uma vinícola em Portugal com parte do dinheiro das automotrizes nunca entregues. [9]

Em uma reportagem publicada em 1952 no jornal A Noite, o ex ministro de Viação Macedo Soares (que assinou parte dos contratos das automotrizes com a IRFA em 1946) teceu elogios à empresa e ao engenheiro Galvão Antunes, suscitando suspeitas de favorecimento (dado que Galvão Antunes foi um antigo colaborador de Macedo Soares quando foi este foi presidente da Companhia Siderúrgica Nacional).[10]

Apesar das denúncias, a IRFA manteve forte influência nos governos Dutra, Vargas e Café Filho, angariando várias encomendas públicas[11] e isenções fiscais para importação de equipamentos.[12] Em vídeo de 1950 mostra uma visita do Presidente Vargas a fabrica da IRFA, é possível ver locomotivas fabricadas, provavelmente o modelo entregue para a VFFLB, R. F. do Nordeste, E. F. Bragança ou Leopoldina. Essa situação iria mudar após a eleição de Juscelino Kubitschek, que optou pela importação de locomotivas americanas da GM e GE através de financiamentos do Export-Import Bank of the United States (Eximbank). Outro fator que contribuiu para a queda de encomendas de locomotivas da IRFA foram problemas técnicos de seus produtos, com destaque para as locomotivas elétricas fornecidas para a Viação Férrea Federal do Leste Brasileiro entre 1954 e 1958, classificadas em relatórios da Rede Ferroviária Federal como imprestáveis em poucos anos de uso.[13]

Sem novas encomendas, a IRFA foi vendida por seus donos em outubro de 1958 para a Willys Overland do Brasil. A produção de locomotivas foi encerrada após a conclusão das 3 últimas máquinas do contrato com a Viação Férrea Federal do Leste Brasileiro. Posteriormente, a planta industrial, localizada no bairro de Santíssimo, acabou transformada em linha de montagem de jipes até ser desativada na década de 1970.[14]

Produção editar

 
Locomotiva IRFA com um trem de passageiros na Estrada de Ferro Bragança, anos 1950
 
Locomotiva de fabricação IRFA da Estrada de Ferro Leopoldina

Entre 1942 e 1958 a IRFA produziu 36 locomotivas (montou outras 36), 46 conjuntos de automotrizes diesel e 250 vagões-tanque[15]:

Tipo Quantidade Clientes
Locomotivas elétricas 18 5 para a Estrada de Ferro Central do Brasil
13 para a Viação Férrea Federal Leste Brasileiro
Locomotivas diesel-elétricas 500 hp 8 Departamento Nacional de Estradas de Ferro
Locomotivas diesel-elétricas 1000 hp 10
Locomotivas diesel-hidráulicas 1900 hp 23 (montagem) 13 para a Leopoldina

10 para a VFRGS

Automotrizes diesel-elétricas 46 conjuntos (motor+reboque) Departamento Nacional de Estradas de Ferro
Vagões-tanque 250 Ferrocarril General Roca

Locomotivas e Automotrizes editar


Ferrovia Potência (HP) Tipo Rodagem Bitola (m) Quantidade Ano de Fabricação Obs.:
VFFLB 1001 a 1013 800 ou 900 Elétrica B-B 1,000 13 1954 a 1958 Modelo 4800
Brown Boveri (parte elétrica)
VFFLB 626 e 627 725 Diesel-Elétrica B-B 1,000 2 1951
RFN DE1 a DE3 675 Diesel-Elétrica B-B 1,000 3 1952
E.F.Bragança 1 e 2 675 Diesel-Elétrica B-B 1,000 2 1952
Leopoldina 1000 675 Diesel-Elétrica B-B 1,000 1 1950
Leopoldina [1] 1001 a 1013 2x950 ESSLINGEN 1900 PS
locomotiva Diesel-Hidráulica
C-C 1,000 13 1954 Intermediação na compra de
locomotivas da Esslingen Machine Works
com Motor Diesel MAN
EFMM Automotriz B-B 1,000 2 1946 Receberam os nomes
de Presidente Vargas e
Presidente Dutra[2]
E.F.Ilhéus Automotriz B-B 1,000 2
EFSC Automotriz + Reboque B-B 1,000 2 + 2 1948 Motor Suíço Sauer
VFRGS 201-203 220 Automotriz B-B 1,000 3 1954 Motor Diesel "BUDA" [3]
VFRGS 2000 a 2009 2x950 ESSLINGEN 1900 PS
locomotiva Diesel-Hidráulica
C-C 1,000 10 1948 - 1949 Intermediação na compra
de locomotivas da Esslingen Machine Works
com Motor Diesel MAN
VFRGS 2x400 Trem Diesel-Hidráulica
Minuano
M-R-M 1,000 12 1954 - 1956 Montagem do Minuano
produzido pela MAN - Alemanha

Obs.: Existe divergência quanto a montagem dos Minuano, fotografias mostram que foram descarregados montados em porto gaúcho.

VFFLB editar

 
Locomotiva IRFA da VFFLB partindo da estação Calçada, em Salvador

Produziu 13 locomotivas para a VFFLB entre 1954 (1001-1010) e 1958 (1011-1013), possuíam rodagem B-B com potência de 900 hp, com tensão de 3.000 V em corrente continua. Todas as locomotivas foram construídas com material elétrico Brown Boveri.

Estas locomotivas apresentavam péssimo desempenho operacional, que tinham baixa potência e chegaram a ser qualificadas de "imprestáveis" nos relatórios da Leste Brasileiro. O fechamento da IRFA piorou a situação, pois passou a haver falta de sobressalentes. A partir de 1983, chegaram para operar junto com as locomotivas IRFA, cinco locomotivas elétricas Metropolitan-Vickers anteriormente usadas na Rede Mineira de Viação e Rede de Viação Paraná-Santa Catarina.

Foram sendo desativadas a partir de 1975, quanto somente 7 unidades estavam em operação, sendo as últimas encostadas e sucateadas na oficina de Aramari em 1992.

VFRGS editar

 
Locomotiva Esslingen montada pela IRFA para a Estrada de Ferro Leopoldina

Efetuou a montagem de locomotivas diesel-hidraúlicas do tipo ESSLINGEN 1900 PS da Esslingen Machine Works destinadas a VFRGS (10 unidades) e E. F. Leopoldina (13 unidades). Posteriormente, as unidades da Leopoldina foram transferidas para a VFRGS.

EFSC editar

 
Automotriz de fabricação IRFA trafegando na EFSC, 1957

Foram adquiridas em 1948 duas automotrizes (motor + reboque), totalizando 4 unidades fabricadas pela IRFA, utilizando motor diesel da empresa Suíça Sauer com 200 hp de potência. As automotrizes vieram ao Porto de Itajaí em 1948, sendo trazidas por um Lanchão da Sulamita, através do Rio Itajaí-Açu até o Porto Fluvial de Itoupava Seca, que localizava-se próximo das Oficinas da ferrovia e da Estação Ferroviaria de Blumenau. Entretanto as automotrizes somente começaram a operar somente em 1954.[16]

Referências

  1. a b c «As revelações de três contratos». Diário de Notícias, edição 6906, página 1/ republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 29 de abril de 1945. Consultado em 19 de novembro de 2020 
  2. «Auto-suficiência do Brasil no fabrico de locomotivas». Tribuna da Imprensa, ano IV, edição 853, página 10/ republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 8 de outubro de 1952. Consultado em 19 de novembro de 2020 
  3. Setti, João Bosco (1993). A Era Diesel na EFCB. Rio de Janeiro: Sociedade de Pesquisa e Memória do Trem. p. 32 
  4. Antonio Augusto Gorni (11 de março de 2003). «1933: Os Subúrbios do Rio de Janeiro». A Eletrificação nas Ferrovias Brasileiras. Consultado em 19 de dezembro de 2020 
  5. Rafael Correia de Oliveira (18 de outubro de 1946). «Automotrizes de ouro». Diário de Notícias, edição 7358, página 4/ republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. Consultado em 19 de novembro de 2020 
  6. «Muito mais grave doque se supunha a epidemia de tifo:aquisição de automotrizes para a Central do Brasil por preço 7 vezes superior ao normal». Diário de Notícias, edição 7353, página 3/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 12 de outubro de 1946. Consultado em 20 de dezembro de 2020 
  7. «O caso das automotrizes tal qual ele se apresenta». Gazeta de Notícias, ano 71, edição 255, páginas 1,6 e 11/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 31 de outubro de 1946. Consultado em 20 de dezembro de 2020 
  8. Carlos Eduardo Leal. «Jornal de Debates». Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas. Consultado em 20 de dezembro de 2020 
  9. Jornal de Debates (3 de fevereiro de 1951). «Mauro Leite está gastando na Europa o dinheiro das automotrizes». Careta, edição 551, páginas 3 e 4/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. Consultado em 20 de dezembro de 2020 
  10. «Já é realidade a fabricação de locomotivas no Brasil». A Noite, ano XLII, edição 14219, página 11/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 8 de outubro de 1952. Consultado em 19 de novembro de 2020 
  11. «Renova-se o Parque Ferroviário do Piauí». "A Noite Ilustrada", ano XVIII, edição 1206, página 16/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. 16 de abril de 1952. Consultado em 31 de outubro de 2021 
  12. Opinião (24 de agosto de 1955). «Isenção de direitos». Tribuna da Imprensa, ano VII, edição 1721, página 4/republicada pela Biblioteca Nacional - Hemeroteca Digital Brasileira. Consultado em 19 de novembro de 2020 
  13. Antonio Augusto Gorni (6 de abril de 2002). «Viação Férrea Federal do Leste Brasileiro». A Eletrificação nas Ferrovias Brasileiras. Consultado em 20 de dezembro de 2020 
  14. «Fábrica de locomotivas de Santíssimo encerra produção e vai agora aumentar jipes». Jornal do Brasil, ano LXVIII, edição 242, página 13. 16 de outubro de 1958. Consultado em 6 de janeiro de 2013 
  15. Conjuntura Econômica, ano VII, edição 6, páginas 29-34 (Junho de 1953). «Indústria de locomotivas». Fundação Getúlio Vargas. Consultado em 21 de dezembro de 2020 
  16. Frotscher Marcelo (2013). "Automotrizes da EFSC". Santa Catarina: [s.n.] 

Ligações externas editar

 
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