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O problema do mal é uma questão a qual indaga se é possível conciliar a existência do mal e do sofrimento com um Deus onipotente, onibenevolente e onisciente.[1][2] Existem diferentes formas de interpretar estes conceitos. A apresentação mais conhecida do problema foi concebida pelo filósofo grego Epicuro. Foi popularizado por David Hume.

Além de ser uma temática vital na área da filosofia da religião, o problema do mal também é um campo importante na teologia e na ética. Existem também várias discussões do mal e problemas conectados em outros campos filosóficos, como na ética secular[3][4][5] e na ética evolucionista.[6][7] Mas em sua forma usual, o problema do mal é debatido no contexto teológico.

Respostas contra o problema do mal tradicionalmente se dividem em três tipos: refutações, defesas e teodiceias.

O problema do mal é geralmente formulado em dois formatos: o problema lógico do mal e o problema evidencial do mal. A forma lógica do argumento tenta demonstrar uma impossibilidade lógica da coexistência entre o mal e Deus,[1][8] enquanto que a forma evidencial argumenta que dado a existência do mal no mundo, é improvável que exista um Deus onipotente, onibenevolente e onisciente.[2] O problema do mal tem sido ampliado para formas de vida não-humanas, a fim de incluir o sofrimento dos animais pelo mal natural e da crueldade dos humanos contra eles.[9]

Definições editar

Mal editar

Em um conceito mais brando o mal é qualquer tipo de dor e sofrimento,[10] ainda que, de acordo com John Kemp, o mal não pode ser corretamente entendido como "simplesmente uma escala hedônica em que o prazer está no topo, e a dor no final desta mesma escala".[11][10] De acordo com a Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos, a dor é essencial para a sobrevivência: "sem qualquer dor, o mundo seria um lugar impossível de se viver devido a seus perigos".[12][13] Marcus Singer aponta que uma definição compreensível do mal deve se basear que: "se algo é realmente do mal, não pode ser necessário, e se é necessário, não pode ser considerado do mal".[14]:186

Enquanto que muitos argumentos contra um Deus todo poderoso sejam baseados na definição mais ampla de mal, "muitos filósofos contemporâneos estão interessados na natureza do mal como primordialmente concebida em um senso mais estrito".[15] O conceito mais estrito envolve a condenação moral, e é aplicado apenas baseado em agentes morais capazes em fazer decisões independentes, e suas ações; entende-se a existência de alguma dor e sofrimento sem identificar que é algo mal.[16]:322 O cristianismo é baseado "nos valores salvadores do sofrimento".[17]

O filósofo Eve Gerrard sugere que a terminologia "mal" não pode ser usada para simplesmente escrever as ações ruins ordinárias, "porque existe uma diferença qualitativa e não meramente quantitativa entre os atos do mal e outras erradas; os atos do mal não são apenas atos muito ruins ou errados, mas ao invés disso possuí alguma qualidade horrenda".[16]:321 Calder sustenta que o mal deve envolver a tentativa ou desejo em infligir dano significativo contra a vítima sem uma justificação moral.[10]

O mal é visto de diferentes significados quando visto de diferentes sistemas de crenças, e enquanto o mal pode ser visto em termos religiosos, também pode ser entendido em termos naturais ou seculares, como vício social, egoísmo, criminalidade e sociopatologia.[18] John Kekes escreve que uma ação é maligna se: (1) causa um grave dano contra uma (2) vítima inocente, e é (3) deliberado, (4) malevolente motivado e (5) moralmente injustificado.[19]

Onipropriedades editar

O termo "onisciência" é traduzido como "conhecimento máximo".[20] De acordo com Edward Wierenga, um estudioso clássico e doutor em filosofia e religião na Universidade de Massachusetts, "máximo" não pode ser caracterizado como ilimitado, mas limitado ao "conhecimento de Deus sobre o que é conhecível".[21] Esta é a visão mais amplamente aceita da omnisciência entre estudiosos do século XXI, e é o que William Hasker chama de "livre-arbítrio-teísmo". Dentro dessa visão, eventos futuros que dependem de escolhas feitas por indivíduos com livre arbítrio são desconhecidos até que ocorram.[22]:104; 137[20]:18–20

O termo "onipotência" é o poder máximo de causar eventos dentro dos limites do possível, mas novamente o máximo não é ilimitado.[23] De acordo com os filósofos Hoffman e Rosenkrantz: "Um agente onipotente não é obrigado a causar um estado de coisas impossível... o poder máximo tem limitações lógicas e temporais, incluindo a limitação de que um agente onipotente não pode causar a decisão livre de outro agente".[23]

"Onibenevolência" vê Deus como todo-amoroso. Se Deus é onibenevolente, ele age de acordo com o que é melhor, mas se não houver o melhor disponível, Deus tenta, se possível, trazer estados de coisas que são criáveis e são ótimas dentro das limitações da realidade física.[24]

Defesas e teodiceias editar

Respostas ao problema do mal ocasionalmente foram classificadas como defesas ou teodiceias, embora autores discordem das definições exatas.[1][2][25] Geralmente, uma defesa refere-se a tentativas de abordar o argumento lógico do mal e tentar responder a seguinte afirmação dos céticos: "é logicamente impossível - não apenas improvável - que Deus exista". A defesa nesse caso não requer uma explicação completa do mal e não precisa ser logicamente verdadeira, ou mesmo provável; ela só precisa ser possível, já que defender a mera possibilidade da existência de Deus e o mal invalida a lógica da impossibilidade.[8]

Por outro lado, uma teodiceia é mais ambiciosa, pois tenta fornecer uma justificação plausível - uma razão moral ou filosoficamente suficiente - para a existência do mal. Isso é destinado a enfraquecer o argumento evidencial de que a realidade da existência do mal mostra a impossibilidade da existência de Deus.[2][26]

Secularismo editar

Na visão do filósofo Forrest E. Baird, pode-se ter um problema secular do mal sempre que os seres humanos procuram explicar por que o mal existe e sua relação com o mundo.[27] Ele acrescenta que qualquer experiência que "questione nossa confiança básica na ordem e estrutura de nosso mundo" pode ser vista como mal,[27] portanto, de acordo com Peter L. Berger, os seres humanos precisam de explicações do mal "para que as estruturas sociais permaneçam em si mesmas estáveis contra as forças caóticas".[28]

Referências

  1. a b c The Stanford Encyclopedia of Philosophy, "The Problem of Evil", Michael Tooley
  2. a b c d The Internet Encyclopedia of Philosophy, "The Evidential Problem of Evil", Nick Trakakis
  3. Nicholas J. Rengger, Moral Evil and International Relations, in SAIS Review 25:1, Winter/Spring 2005, pp. 3–16
  4. Peter Kivy, Melville's Billy and the Secular Problem of Evil: the Worm in the Bud, in The Monist (1980), 63
  5. Kekes, John (1990). Facing Evil. Princeton: Princeton UP. ISBN 978-0-691-07370-5 
  6. Timothy Anders, The Evolution of Evil (2000)
  7. Lawrence C. Becker; Charlotte B. Becker (2013). Encyclopedia of Ethics. [S.l.]: Routledge. pp. 147–49. ISBN 978-1-135-35096-3 
  8. a b The Internet Encyclopedia of Philosophy, "The Logical Problem of Evil", James R. Beebe
  9. Peter van Inwagen (2008). The Problem of Evil. [S.l.]: Oxford University Press. pp. 120, 123–26, context: 120–33. ISBN 978-0-19-954397-7 
  10. a b c Calder, Todd. «The Concept of Evil». Stanford Encyclopedia of Philosophy. Stanford University. Consultado em 17 de janeiro de 2021 
  11. Kemp, John (25 fevereiro de 2009). «Pain and Evil». Philosophy. 29 (108): 13. doi:10.1017/S0031819100022105. Consultado em 8 janeiro de 2021 
  12. Committee on Advancing Pain Research, Care, and Education, Institute of Medicine (US). «Relieving Pain in America: A Blueprint for Transforming Prevention, Care, Education, and Research.». NCBI Bookshelf. National Academies Press (US). Consultado em 21 fevereiro de 2021 
  13. «Reviews». E. Bell. The Humane Review. 2 (5–8): 374. 1901 
  14. Marcus G. Singer, Marcus G. Singer (abril de 2004). «The Concept of Evil». Cambridge University Press. Philosophy. 79 (308): 185–214. JSTOR 3751971. doi:10.1017/S0031819104000233 
  15. Calder, Todd C. (2007). «Is the Privation Theory of Evil Dead?». American Philosophical Quarterly. 44 (4): 371 
  16. a b Garrard, Eve (abril de 2002). «Evil as an Explanatory Concept» (PDF). Oxford University Press. The Monist. 85 (2): 320–336. JSTOR 27903775. doi:10.5840/monist200285219 
  17. Taliaferro, Charles. «Philosophy of Religion». Stanford Encyclopedia of Philosophy. Sanford University. p. 3.1. Consultado em 7 de dezembro de 2020 
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  24. Haji, Ishtiyaque (2009). «A Conundrum Concerning Creation». Sophia. 48 (1): 1–14. doi:10.1007/s11841-008-0062-7. ProQuest 203892905 
  25. Honderich, Ted (2005). «theodicy». The Oxford Companion to Philosophy. ISBN 978-0-19-926479-7 
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