Vicente Rovea

político brasileiro

Vincenzo Rovea, conhecido no Brasil como Vicente Rovea (Voghera, 25 de fevereiro de 1861 — Caxias do Sul, 20 de novembro de 1941) foi um comerciante e político ítalo-brasileiro.

Vicente Rovea
Vicente Rovea
Nascimento 25 de fevereiro de 1861
Morte 20 de novembro de 1941
Cidadania Brasil
Ocupação político

Biografia editar

Era filho dos italianos Remigio Rovea e Rosa Fiori.[1] Chegou a Caxias do Sul na década de 1880, e em 1890 fundou uma casa comercial. Localizada em uma das entradas da vila, tornou-se logo importante entreposto de abastecimento e comércio. Trabalhava com secos e molhados, miudezas, fazendas e itens de armarinho, além de ser uma parada obrigatória para os tropeiros que vinham negociar seus produtos, dispondo de um potreiro para o descanso dos animais.[2][3]

Ao mesmo tempo em que conduzia seus negócios, envolveu-se ativamente na vida política da vila. Quando Caxias foi emancipada, em 1890, passando da condição de distrito de São Sebastião do Caí para a de vila autônoma, foi instalada uma Junta de Governo, que teve de iniciar a estruturação do novo município em meio a um cenário turbulento, reflexo tanto da recente proclamação da República quanto da disputa pelo poder entre federalistas e republicanos. Além disso, a população de colonos era maciçamente católica e grande parte seguia uma corrente conservadora e radical, o ultramontanismo, que combatia ferrenhamente os maçons, os positivistas e os liberais, que dominavam os principais cargos públicos. Neste ambiente agitado Rovea tornou-se líder dos federalistas, sendo também maçom. Não demorou para que parte da população, dissentindo da orientação da Junta recém-empossada, se insurgisse nas duas Revoltas dos Colonos, nas quais Rovea tomou parte como um dos líderes. Os principais motivos de descontentamento eram os impostos atrasados cobrados com multas e juros e a má condição das estradas e transportes. Os revoltosos depuseram a Junta e o primeiro Conselho, assumindo o governo da vila uma Junta Revolucionária liderada por Affonso Amabile e Francisco Januário Salerno. Para apaziguar os ânimos o Governo do Estado reinstalou o Conselho admitindo em seu seio dois revolucionários, Luiz Pieruccini e Domingos Maineri. A tentativa não surtiu efeito, e pouco depois ocorreu a segunda revolta, a Junta oficial e o Conselho foram derrubados outra vez, e a Junta Revolucionária, agora composta por Rovea mais Pieruccini e Maineri, tomou o poder. O Governo do Estado teve de intervir novamente e dissolveu a Junta que havia indicado, em seu lugar nomeando um intendente, Antônio Xavier da Luz, tendo como seu vice Luiz Pieruccini, que assumiram no dia 1º de agosto de 1892.[4][2]

Enquanto isso, Rovea fazia seu comércio prosperar rapidamente. Na abertura do século XX ele havia se tornado o comerciante mais rico de Caxias,[5] e foi um dos fundadores da Associação dos Comerciantes, que reuniu os principais empresários.[6] Loraine Giron refere que ele era pouco ativo na entidade,[5] mas Mário Gardelin lembrou sua participação na comissão que promoveu a construção da Ponte do Korff, realização importante para dinamizar o comércio com os Campos de Cima da Serra,[7] sendo um dos empreiteiros da obra,[8] e na comissão que angariou verbas para uma Exposição-Feira que se realizaria em Porto Alegre.[7] A Associação em pouco tempo se tornou o principal motor da economia local e um influente porta-voz das reivindicações dos colonos. Foi basicamente devido à sua influência que Serafim Terra foi indicado intendente em 1904, levando para o governo, como seu vice, o próprio Rovea. Neste momento, porém, a Associação começava a enfrentar uma crise, dividida por disputas internas que levaram ao afastamento de vários membros, e com a ascensão de comerciantes à vice-Intendência e ao Conselho, seu papel de reivindicador se esvaziou. Esse processo de acentuou quando Rovea assumiu a titularidade com o licenciamento de Terra em 16 de maio de 1907 e quando foi eleito no ano seguinte para a Intendência.[5][9] Nas palavras de Giron, "em 12 de agosto de 1908 foi eleito como intendente Vicente Rovea, então a luta dos comerciantes se tornou a luta municipal. O intendente municipal assumiu a liderança da comunidade, conseguindo trazer para Caxias as obras que se faziam necessárias. Desta forma a luta da Associação Comercial deixa de ser essencial para o município. Não havendo causas a serem defendidas, visto que estas foram assumidas pelo intendente, o movimento sofre uma paralisação".[5]

 
A antiga casa e comércio de Vicente Rovea, hoje o Arquivo Histórico Municipal.

Em 25 de janeiro de 1910 licenciou-se do governo para tratamento de saúde, assumindo interinamente Tancredo Appio Feijó. Porém, só retornaria ao governo efetivo em 1º de dezembro de 1911 com a renúncia de Feijó, entregando o cargo em 12 de agosto de 1912 para José Pena de Moraes, que Rovea havia nomeado vice-intendente ao reassumir em 1911.[10][11] Nesta época já havia sido promovido a tenente-coronel-comandante do Estado Maior do 97º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional, nomeado em 8 de maio de 1912, corporação da qual era oficial há muitos anos.[12] Sua administração se destacou por ser o início de um processo de consolidação do poder dos descendentes de italianos, quando até então a Intendência vinha regularmente sendo entregue a agentes de origem luso-brasileira,[13] e foi elogiado por conseguir pacificar o ambiente depois de muitos anos de intensa agitação,[14] colaborando ativamente "na consolidação definitiva da política local, de que resultou o congraçamento da família caxiense".[15] Recebeu, contudo, criticas na imprensa da época pelos altos impostos cobrados e pela grande elevação da dívida pública.[16][17][18]

No início de 1909 anunciara na imprensa a liquidação do seu negócio e a venda de várias propriedades rurais,[19][20] mas em setembro de 1910 estava de volta à ativa como representante de uma pedreira e olaria de Pedro Jacob Rodrigues,[21] e em 1911 sua casa comercial havia sido recomposta.[22] Ainda em 1911 foi um dos fundadores do Tiro de Guerra, assumindo um lugar no Conselho Fiscal,[23] em 1913 foi nomeado para uma das diretorias da Associação dos Comerciantes,[24] que havia sido reativada em 1912, e em 1914 é citado como o banqueiro local da agência de seguros A Mundial, sediada no Rio de Janeiro.[25] Em meados da década de 1920 seu comércio encerrou suas atividades.[3]

Em 8 de julho de 1941, pouco antes de falecer, foi festejado solenemente pela Associação dos Comerciantes como um dos cinco fundadores ainda vivos, quando recebeu com os outros o título de sócio honorário.[26] Vicente Rovea foi casado com Bortola Venzon (1871-1939), deixando descendência.[3] A casa onde viveu e manteve seu comércio depois serviu de sede ao Hospital Carbone e ao Hospital Beneficente Santo Antônio e, seguindo-se a muitas reivindicações populares, foi tombada pelo Estado em 1986 e pelo Município em 2002, hoje abrigando o Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.[3][27] Seu nome batiza uma rua de Caxias do Sul.

Referências

  1. Gardelin, Mário & Costa, Rovílio. Os Povoadores da Colônia Caxias. EST / FH, 1992, p. 467
  2. a b Giron, Loraine Slomp & Heloísa Eberle Bergamaschi. Casas de Negócio: 125 anos de imigração italiana e o comércio regional. EDUCS, 2001, pp. 54-57
  3. a b c d Lopes, Rodrigo. "O pioneirismo da família Rovea". Pioneiro, 14/03/2014
  4. Centro de Memória da Câmara Municipal de Caxias [Geni Salete Onzi (org.)]. Palavra e Poder: 120 anos do Poder Legislativo em Caxias do Sul. Ed. São Miguel, 2012, pp. 32-40
  5. a b c d Giron, Loraine Slomp. "Subsídios para uma História Econômica de Caxias". História Daqui, 14/04/2013
  6. "Comemorar-se-á solenemente o 40º aniversário da Associação Comercial". A Época, 06/07/1941
  7. a b Gardelin, Mário. "A contribuição de Vacaria para o desenvolvimento da região dos Campos de Cima de Serra". In: Kramer, Annamaria de Lemos et al. (orgs.). Raízes da Vacaria — VII Encontro dos Municípios Originários de Santo Antônio da Patrulha. EST, 1996
  8. "Ponte do Korf". A Federação, 21/07/1906
  9. Tissott, Ramon Victor. "A família Eberle e o início do desenvolvimento industrial de Caxias do Sul". In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de História da ANPUH. São Paulo, jul/2011
  10. "Sucessão Intendencial". O Brazil, 29/01/1910
  11. "Caxias — Resumo Histórico". A Federação, 01/01/1934
  12. "Guarda Nacional". A Federação, 29/05/1912
  13. Magie, Nicole Jean. A Pearl in a World on the Move: Italians and Brazilians in Caxias, Brazil (1870 –1910). Tese de Doutorado. Michigan State University, 2014, pp. 137-144
  14. Ramos, Christiano. "Caxias progride". O Brazil, 24/07/1909
  15. '"Sucessão Intendencial". 'O Brazil, 13/12/1909
  16. "Impostos". Correio do Município, 07/02/1909
  17. "Impostos". Correio do Município, 04/07/1909
  18. "Relatório". Correio do Município, 21/02/1909
  19. "O Sr. Vicente Rovea". Correio do Município, 18/02/1909
  20. "Grande liquidação". O Brazil, 14/02/1909
  21. "Pedro Jacob Rodrigues". O Brazil, 03/09/1910
  22. "Vicente Rovea". O Brazil, 12/06/1911
  23. O Tiro de Guerra de Porto Alegre em Caxias". O Brazil, 04/06/1911
  24. "Associação dos Commerciantes". O Brazil, 13/12/1913
  25. "A Mundial". O Brazil, 12/09/1914
  26. "Com um brilhantismo inexcedível realisou-se a solenidade comemorativa, no dia 8 do corrente". A Época, 13/07/1941
  27. Dal Bó, Juventino. "Museu e Arquivo Histórico Municipal". In: Acervo, 1997; 10 (2):219-221

Ver também editar

Prefeitos de Caxias do Sul
Precedido por
Serafim Terra
 
Vicente Rovea
12 de agosto de 1908 – 12 de agosto de 1912
Interino: Tancredo Appio Feijó
Sucedido por
José Pena de Moraes