Acanthochelys spixii

espécie de réptil

Acanthochelys spixii é uma espécie popularmente chamada de “cágado-negro” (por conta de sua coloração que varia de cinza-escura a negra) e de “cágado-de-espinhos” (em consequência de estruturas tuberculares pontiagudas alongadas que recobrem seu pescoço).[6]

Acanthochelys spixii
Classificação científica edit
Domínio: Eukaryota
Reino: Animalia
Filo: Chordata
Classe: Reptilia
Ordem: Testudines
Subordem: Pleurodira
Família: Chelidae
Gênero: Acanthochelys
Espécies:
A. spixii
Nome binomial
Acanthochelys spixii
Sinónimos[5]
  • Emys depressa
    Spix, 1824: 4
    (homônimo júnior)
    [3]
  • Emys aspera
    Gray, 1830: 16 (10:7)
    (nomen dubium et oblitum)
  • Platemys spixii
    A.M.C. Duméril & Bibron, 1835: 409[2]
    (nomen novum)
  • Acanthochelys spixii
    — Gray, 1873: 305
    (recombinação)
    [4]

Etimologia editar

O nome genérico Acanthochelys tem origem grega e pode ser traduzido como “tartaruga com espinhos", fazendo referência aos tubérculos pontiagudos no pescoço dos indivíduos. Já o nome nome específico spixii é uma homenagem a Johann Baptist von Spix, naturalista alemão que promoveu expedições ao Brasil entre os anos de 1817 a 1820.[7]

Taxonomia e Sistemática editar

A espécie foi descrita pela primeira vez no ano de 1824 por Spix, como Emys depressa. Contudo, este nome já havia sido adotado para outra espécie de cágado, descrita por Blasius Merrem. Em 1830, o naturalista francês Georges Cuvier descreveu a espécie com o nome Emys aspera, mas sua descrição ficou esquecida e este nome é hoje desconsiderado pelos zoólogos. Em 1835, naturalistas franceses André Marie Constant Duméril e seu assistente Gabriel Bibron descreveram Platemys spixii, a partir de um exemplar coletado no Brasil pelo também francês Auguste de Saint-Hilaire.[8]

Após sua descrição original, Platemys spixii passou por mudanças taxonômicas, tendo sido renomeada Hydraspis spixii e até mesmo sendo considerada uma subespécie, Platemys radiolata spixii . Mais recentemente, foi mostrado que o gênero Platemys é monotípico, ou seja, possui uma única espécie, Platemys platycephala, tendo as demais sido agrupadas no gênero Acanthochelys, com base em diferenças morfológicas e genéticas.[9]

Morfologia editar

Espécie de porte médio (a comprimento da carapaça), sem dimorfismo sexual aparente (ou seja, machos e fêmeas têm tamanho semelhante). Na região do pescoço possui tubérculos pontiagudos e alongados. O formato da carapaça é achatado e elíptico; entre o 1° escudo vertebral até a porção anterior entre o 5° escudo vertebral, apresenta um sulco superficial dorsal. Em indivíduos adultos, o 1º e o 5º escudo vertebral têm maior largura do que comprimento, sendo o 1º escudo vertebral mais largo que os demais. Do 2º ao 4º escudo vertebral o comprimento e largura são iguais, por vezes, mais compridos do que largos.[8]


Os indivíduos jovens não possuem o sulco superficial dorsal mediano, com a possibilidade de terem uma quilha medial baixa. A carapaça nos adultos é cinza-escura ou preta, ocasionalmente amarela na base das pleurais, provavelmente de origem pedomórfica, já que os neonatos têm manchas amarelas, alaranjadas ou vermelhas no plastrão. A cauda é relativamente curta e todas as partes macias do corpo são verde oliváceo a cinza. Machos com plastrão côncavo e fêmeas com plastrão plano.[8]

Distribuição geográfica editar

A presença da espécie foi registrada desde a Argentina, passando pelo Uruguai e no Brasil, sendo que neste país possui uma ampla distribuição, ocorrendo nas bacias dos rios São Francisco, Paraguai, Paraná e na região hidrográfica do Atlântico Sul, no Rio Grande do Sul, além de também ocorrerem no cerrado brasileiro.[10][11]

Comportamento editar

Hábitat editar

Acanthochelys spixii pode ser encontrada em cursos hídricos lênticos, ou seja, em nos quais a água não está em constante movimentação, como lagos, lagoas e pântanos. Está presente em charcos permanentes ou estacionais e semipermanentes, cursos de água temporários, em regiões de extração de areia dos rios (cavas).[12] De outra forma, em regiões urbanas e industriais constatou-se a existência de populações em riachos, sugerindo que estão sob forte pressão antrópica mas também podem estar adaptados a ambientes altamente modificados.[13] Também foi observado o deslocamento de um ambiente aquático efêmero para o outro durante a noite.[14] A locomoção terrestre foi percebida em espécimes criados em cativeiro permaneciam durante o dia sob a incidência direta do sol.[12] A mudança de hábitat em ambientes efêmeros parece estar relacionada à disponibilidade de alimento, o que proporciona um melhor crescimento e a reprodução.[15]

Alimentação editar

Os indivíduos de A. spixii são animais oportunistas, possuindo uma dieta predominantemente carnívora. Utilizam sucção na alimentação, e entre alguns componentes de sua dieta estão: ninfas de Odonata, larvas aquáticas de insetos, ninfas de Aeshinidae, Hemiptera, Diptera e até mesmo anuros adultos.[16]

Reprodução editar

Acasalamento: Estende-se de novembro a janeiro. Ocorre sempre dentro d’água, com temperatura entre 20º e 27ºC. O macho aproxima-se da fêmea por trás, aproximando suas narinas da região cloacal. Caso a fêmea não se afaste, o macho monta-a de imediato. Na pré-cópula, o macho – com as garras das quatro patas – segura os escudos marginais da carapaça da fêmea. Na cópula, o macho posiciona-se sobre a fêmea, mantendo oas patas posteriores sob a face ventral de seus escudos marginais posteriores.[17]

Nidificação: A espécie é caracterizada por desovar durante a noite nidificando a cerca de 10metros dos corpos d’água em áreas abertas com vegetação rasteira. O período de nidificação ocorre de fevereiro a maio. A fêmea procura na areia um local para fazer seu ninho, usando o olfato para guiá-la ao melhor lugar. Durante a abertura da cova, a fêmea usa os membros posteriores alternadamente. Os ninhos de A. spiixi apresentam um “pescoço” e uma câmara de incubação, com profundidade média de 7 cm. Após a postura dos ovos, a fêmea volta imediatamente para a água. Os números de ovos por ninho variam de apenas 1 a 4. Possuem cor branca, casca calcárea e lisa, com aproximadamente 9g e 2,7 cm.[17]

Conservação editar

Acanthochelys spixii é uma espécie difícil de ser encontrada, portanto rara. As áreas de reprodução da espécie no Rio Grande do Sul estão altamente impactadas pelo cultivo de arroz.[18] Também há relatos de filhotes que são traficados e utilizados como animais de estimação no Rio Grande do Sul, pois possuem coloração atrativa.[19] Ainda assim, seu estado de conservação é considerado pouco preocupante no Brasil, segundo a edição de 2018 do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção.[20] Em nível global a espécie é considerada quase ameaçada, mas trata-se de uma avaliação realizada em 1996 e ainda não atualizada.[21]

Referências

  1. Tortoise & Freshwater Turtle Specialist Group (1996). «Acanthochelys spixii ». Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas. 1996: e.T76A97260200. doi:10.2305/IUCN.UK.1996.RLTS.T76A13075785.en . Consultado em 11 de janeiro de 2018 {{citar iucn}}: erro: |doi= / |page= mismatch (ajuda)
  2. a b Duméril AMC, Bibron G (1835). Erpétologie Générale ou Histoire Naturelle Complète des Reptiles, Tome Second [Volume 2]. Paris: Librairie Encyclopédique de Roret. ii + 680 pp. (Platemys spixii, new name, p. 409). (in French).
  3. Spix JB von (1824). Animalia nova; sive, Species novae Testudinum et Ranarum, quas in itinere per Brasiliam annis 1817-20 collegit et descripsit. Munich: F.S. Hübschmann. iv + 53 pp. (Emys depressa, new species, p. 4). (in Latin).
  4. Gray JE (1873). "Observations on Chelonians, with Descriptions of new Genera and Species". Annals and Magazine of Natural History, Fourth Series 11: 289-308. (Acanthochelys spixii, new combination, p. 305).
  5. Turtle Taxonomy Working Group (van Dijk PP, Iverson JB, Rhodin AGJ, Shaffer HB, Bour R) (2014). "Turtles of the world, 7th edition: annotated checklist of taxonomy, synonymy, distribution with maps, and conservation status". In: Rhodin AGJ, Pritchard PCH, van Dijk PP, Saumure RA, Buhlmann KA, Iverson JB, Mittermeier RA (Editors) (2014) Conservation Biology of Freshwater Turtles and Tortoises: A Compilation Project of the IUCN/SSC Tortoise and Freshwater Turtle Specialist Group. Chelonian Research Monographs 5 (7): 000.329–000.479, doi:10.3854/ crm.5.000.checklist.v7.2014.
  6. Group, Tortoise & Freshwater Turtle Specialist (1 de agosto de 1996). «IUCN Red List of Threatened Species: Acanthochelys spixii». IUCN Red List of Threatened Species. doi:10.2305/iucn.uk.1996.rlts.t76a13075785.en. Consultado em 18 de julho de 2021 
  7. «The Eponym Dictionary of Reptiles | Johns Hopkins University Press Books». jhupbooks.press.jhu.edu. Consultado em 18 de julho de 2021 
  8. a b c Ernst, Carl H. (1983). «Platemys spixii» (em inglês). doi:10.15781/T2HD7NX7V. Consultado em 22 de agosto de 2021 
  9. Huebinger, Ryan M.; Bickham, John W.; Rhodin, Anders G. J.; Mittermeier, Russell A. (julho de 2013). «Mitochondrial DNA Corroborates Taxonomy of the South American Chelid Turtles of the GeneraPlatemysandAcanthochelys». Chelonian Conservation and Biology (1): 168–171. ISSN 1071-8443. doi:10.2744/ccb-0800.1. Consultado em 22 de agosto de 2021 
  10. Turtle Taxonomy Working Group (2017). «Turtles of the World: Annotated Checklist and Atlas of Taxonomy, Synonymy, Distribution, and Conservation Status (8th Ed.)». Conservation Biology of Freshwater Turtles and Tortoises: A Compilation Project of the IUCN/SSC Tortoise and Freshwater Turtle Specialist Group. Chelonian Research Monographs: 1-292 
  11. Rhodin, Anders G. J.; Silva, Roberto da Rocha e; Mittermeier, Russell A. (1984). «Distribution of the South American Chelid Turtles Platemys radiolata and P. spixii». Copeia (3): 780–786. ISSN 0045-8511. doi:10.2307/1445169. Consultado em 18 de julho de 2021 
  12. a b «(PDF) Distribution and habitat of the freshwater turtles (Testudines, Chelidae) from State of Paraná, Brasil». ResearchGate (em inglês). Consultado em 18 de julho de 2021 
  13. D'Amato, A.F.; Morato, S.A.A. «Notas biológicas e localidades de registro de Platemys spixii( Duméril & Bibron, 1835) (Testtudines: Chelidae) para o Estado do Paraná, Brasil.». Acta Biológica Leopoldensia: 119-130 
  14. Lema. «Contribuição ao conhecimento dos Testudines do Rio Grande do sul (Brasil) - lista sistemática comentada (Reptilia).». Acta Biológicas Leopoldensia: 125-164 
  15. Kennett, Rodney M.; Georges, Arthur (1990). «Habitat Utilization and Its Relationship to Growth and Reproduction of the Eastern Long-Necked Turtle, Chelodina longicollis (Testudinata: Chelidae), from Australia». Herpetologica (1): 22–33. ISSN 0018-0831. Consultado em 18 de julho de 2021 
  16. Brasil, Marcela Ayub (2008). «Ecologia alimentar de Acanthochelys spixii (Testudines, Chelidae) no Parque Nacional de Brasília, Distrito Federal». Consultado em 18 de julho de 2021 
  17. a b Souza. «Uma revisão sobre padrões de atividades reprodutivas e alimentação de cágados brasileiros (Testudines, Chelidae)». Phyllomedusa: 15-27 
  18. Bager. «Contribution to the biological and ecological knowledge of Acanthochelys spixii in the South of Brazil». Annals of 2003 Joint Meeting of Ichthyologists and Herpetologists 
  19. «Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Página inicial». www.icmbio.gov.br. Consultado em 18 de julho de 2021 
  20. ICMBio, (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) (2018). Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Brasília: Ministério do Meio Ambiente 
  21. Group, Tortoise & Freshwater Turtle Specialist (1 de agosto de 1996). «IUCN Red List of Threatened Species: Acanthochelys spixii». IUCN Red List of Threatened Species. Consultado em 22 de agosto de 2021