Adé Dudu - Grupo de Negros Homossexuais

O Adé Dudu - Grupo de Negros Homossexuais, foi fundado na cidade de Salvador, no dia 14 de março de 1981. O nome do grupo é originado do iorubá e significa “negro homossexual”, e contou em sua fundação com nomes importantes do Movimento Negro Unificado (MNU) como Tosta Passarinho, o jornalista Hamilton Vieira que na época utilizava o pseudônimo Estêvão dos Santos, Ermeval da Hora e Wilson Bispo dos Santos, hoje Wilson Mandela. O grupo manteve intensa atuação na primeira metade da década de 1980, denunciando principalmente o racismo enquanto estrutural na sociedade brasileira e o "duplo preconceito" vivido por negros LGBT+.

Adé Dudu - Grupo de Negros Homossexuais
Gênero Movimento social
Fundação 14 de março de 1981
Fundador(es) Antonio Carlos Conceição, Dionisius Filho, Ermeval da Hora, Ernani Filho, Evilásio Santos, Genildo Souza, Jorge Santos, Marco Argolo, Marcus Mahallia, Roquinho, Sóstenes, Tosta Passarinho, Wilson Santana e Wilson Santos.
Sede Salvador, Bahia,  Brasil

História editar

A fundação do grupo Adé Dudu aconteceu na noite de 14 de março de 1981, na cidade de Salvador, após um longo período de articulação, contatos e discussões. No ano de 1978, muitos movimentos socias passaram a se articular abertamente. Esse é o caso do MNU, que intensificou e nacionalizou o Movimento Negro. Nesse mesmo período o Movimento Homossexual Brasileiro começou a se organizar politicamente e teve no tabloide carioca Lampião da Esquina um importante catalizador. O Lampião nacionalizou a "bixórdia", retirou os homossexuais dos guetos e trouxe importantes discussões em suas páginas. Tendo distribuição nacional o periódico construiu uma grande rede de leitores, dentre os quais estavam muitos dos futuros integrantes do Adé Dudu.

Os sujeitos que viviam o duplo preconceito foram se posicionando e abrindo caminho para a aproximação entre o Movimento Homossexual e o Movimento Negro. A participação do Somos: Grupo de Afirmação Homossexual, um dos primeiros de seu tipo no Brasil, nas atividades realizadas pelo MNU para o Dia da Consciência Negra de 1978, revelam a construção de um espaço de solidariedade entre os dois movimentos. Todavia, os homossexuais negros de São Paulo, que anteriormente compunham o grupo SOMOS reconheceram a importância de debater as próprias experiências e assim criaram em 1980, o Grupo de Negros Homossexuais de São Paulo (GNH-SP), mas o grupo teve vida curta e acabou 9 meses depois de sua criação.

Em março de 1979 a icônica edição nº 4 do jornal anarquista O Inimigo do Rei trouxe em sua capa em letras garrafais, a manchete “Além de Preto, Bicha!”, que buscava evidenciar a profunda discriminação contra homossexuais negros por parte da sociedade e convidá-los a se organizar politicamente. O autor da matéria era o estudante de jornalismo da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Hamilton Vieira, que no futuro iria integrar o grupo Adé Dudu. A expressão “Além de preto, bicha”[1], foi apontada no depoimento de um bailarino de 20 anos, que usava o pseudônimo “Nega Fulô”, que na verdade era Dionisius Filho, que dois anos depois participou da fundação do Adé Dudu .

Na carta de fundação do Adé Dudu o grupo destacou a necessidade de se discutir suas próprias questões e se organizar para que assim pudessem “trabalhar em conjunto com outras pessoas e grupos de homossexuais, negros, mulheres, setores populares”.[2] É nesse contexto de muita euforia que o Adé Dudu promove diversas ações para denunciar o racismo enquanto estruturante da sociedade brasileira e o "duplo preconceito" vivido por negros LGBT+, visto que aquela época era "proibido"[3] o negro ser.

Os membros do grupo tinham trajetórias e experiências de vida bem diferentes. Wilson Santos era economista e funcionário público. Já Ermeval da Hora era operário numa fábrica e Tosta Passarinho alternava entre serviços temporários desde que voltou de um auto-exílio que o fez percorrer a América Latina durante a década de 1970. Outro que integrou o grupo foi o jornalista Hamilton Vieira. homossexual.

Atuação editar

A primeira atividade realizada pelo Adé Dudu, uma pesquisa com os homossexuais[4] de Salvador, ocorreu entre os meses de março e setembro de 1981. Com o intuito de entender melhor o perfil social, econômico e cultural de pessoas negras e homossexuais, a pesquisa foi realizada estrategicamente logo após o feriado de Carnaval, época em que a cidade de Salvador ficava cheia de homossexuais vindos de cidades menores da região. Foram entrevistados 102 pessoas, o que possibilitou a montagem de um importante panorama acerca da comunidade LGBT+ da região ainda no período da redemocratização. Uma das principais conclusões que o grupo chegou a partir das entrevistas foi a hesitação da comunidade em falar sobre a LGBTfobia e o racismo. A pesquisa foi muito importante para a elaboração e divulgação de uma agenda de problemas comuns. Os resultados da empreitada do grupo foram divulgados ainda em 1981, nos eventos e atividades que compunham semana da Consciência Negra.

Além de muito presente na comunidade o Adé Dudu foi muito atuante dentro do Movimento Negro e do Movimento Homossexual. Ainda nos seus primeiros meses de existência o grupo participou do II Congresso do MNU em Belo Horizonte, onde foi apresentado um conjunto de propostas que incluíam o mapeamento de homossexuais em grupos de militância negra, o debate interno sobre sexismo, e o início do diálogo sistemático com grupos do Movimento Homossexual. Entre os dias 8 e 15 de julho de 1981 participaram da 33ª reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) que aconteceu na UFBA, em Salvador, também compuseram a Comissão Organizadora do II EBHO – o Segundo Encontro Brasileiro de Homossexuais, em 1984, em Salvador, além de várias outras ações[5].

Fim do grupo e legado editar

O grupo chegou ao fim sem muito alarde, 10 anos após a sua fundação e os seus membros migraram para outros campos de atuação. O militante Wilson Santos concluiu seu curso de Direito, e deu continuidade a sua militância no Movimento Negro e na política partidária. Já Ermeval da Hora concluiu seus cursos de Administração e Pedagogia, e atuou no ensino, na política educacional e na vereança (1993-1997) em Itaparica-BA. O jornalista do grupo Hamilton Vieira (1955-2012) foi fundamental para ainda na década de 1980 a inclusão da agenda do movimento negro na imprensa local. A herança do Adé Dudu se perpetuou e, em 1995 foi fundado em Salvador o Quimbanda-Dudu, um grupo de negros homossexuais ligados ao Grupo Gay da Bahia (GGB), que ao longo de uma década, mais ou menos, atuou em favor dos direitos humanos e contra o racismo, o machismo, a homofobia e também contra a epidemia do vírus HIV e da AIDS.[5]

Ver também editar

Referências

  1. PINHEIRO, Bruno; RABELO, Elson. «Adé Dudu - Caminhos LGBT+ na luta negra». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  2. PINHEIRO, Bruno; OLIVEIRA, Marcus Vinicius. «Adé Dudu - Caminhos LGBT+ na luta negra». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  3. DUDU, Adé. «Pesquisa: Negros Homossexuais». Consultado em 16 de fevereiro de 2023 
  4. DUDU, Adé. «Negros Homossexuais - pesquisa realizada pelo grupo Adé Dúdú». Consultado em 16 de fevereiro de 2023 
  5. a b JUNIOR, João Gomes. «40 anos do Adé Dudu: a história do Grupo de Negros Homossexuais»