Despachante aduaneiro

Um despachante aduaneiro é o profissional especializado no desembaraço de mercadorias que transitam por alfândegas (aduana)[1].

Portugal

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Um despachante oficial em Portugal é um representante por conta de outrem, em qualquer parte do país e sob qualquer forma de representação, nos atos e formalidades previstos na legislação aduaneira, incluindo nas declarações e na promoção dos documentos respeitantes a mercadorias sujeitas a impostos especiais sobre o consumo e noutras declarações com implicações aduaneiras, ou cuja gestão ou recepção venha a ser atribuída à Direção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo[2].

Brasil

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No Brasil a figura do despachante aduaneiro é prevista na Classificação Brasileira de Ocupações sob o número 3422-10 e tem como função desembaraçar mercadorias e bagagens atuando junto a todos os órgãos envolvidos, tais como Receita Federal , anuentes e secretarias estaduais da fazenda[3].

Conforme sustenta a doutrina de Marcelo de Castro Ferreira e Diogo Bianchi Fazolo (Desembaraçando a História: Conjecturas sobre a Origem e Transformação dos Despachantes Aduaneiros Brasileiros desde 1808, Revista Direito Aduaneiro, Marítimo e Portuário, n.º 84, jan./fev. 2025), a origem da profissão de Despachante Aduaneiro no Brasil não decorre de práticas acessórias do comércio privado, tampouco é um desdobramento da figura do caixeiro. Trata-se, ao contrário, de uma função pública, nomeada, técnica e autônoma, cuja presença normativa pode ser identificada de forma clara já no início do século XIX.

Em 7 de junho de 1809, o Príncipe Regente Dom João VI publicou o decreto que institui o cargo de Despachante das Embarcações no porto do Rio de Janeiro. Esses profissionais eram nomeados diretamente pela Coroa e exerciam uma função tripla, que antecipava a estrutura moderna da atividade aduaneira:

1. Registro e controle das embarcações que saíam do porto;

2. Intermediação oficial dos despachos, incluindo passaportes, cargas e documentos alfandegários;

3. Recolhimento de emolumentos e tributos, em nome do Estado, atuando como agente auxiliar da Fazenda.

Desde sua criação, portanto, o despachante se posicionava como figura técnica de confiança pública, com atribuições bem definidas perante a administração fazendária. Ao mesmo tempo, coexistia com o caixeiro, empregado das casas comerciais, sem prerrogativas de representação ou autonomia legal. Os dois exerciam papéis distintos, ainda que ambos circulassem no ambiente portuário.

Nas décadas seguintes, essa distinção foi sendo progressivamente normatizada. O Decreto de 31 de janeiro de 1832 suspendeu novas admissões de despachantes na Alfândega do Rio, como medida de controle. O Regulamento de 16 de julho de 1832, e especialmente o de 22 de junho de 1836, deram forma mais precisa à estrutura alfandegária: estabeleceram que apenas os despachantes habilitados por fiadores poderiam representar terceiros, enquanto os caixeiros só poderiam operar em nome de seu empregador, com termo de responsabilidade. Essa diferenciação aparece de forma explícita no art. 191 do Regulamento de 1836.

A promulgação do Código Comercial de 1850 (Lei n.º 556/1850) consolidou a figura do caixeiro como agente subordinado e interno do comerciante, voltado às operações privadas, sem função pública. Já o despachante, mesmo ainda não designado como “aduaneiro”, era reconhecido como representante técnico perante o Estado.

O Decreto n.º 2.647, de 19 de setembro de 1860, marca a consolidação dessa trajetória. Em seu Capítulo VII, regulamenta a figura do Despachante (e do Ajudante de Despachante), fixando os critérios para exercício da função, sua nomeação, fiança, conduta e responsabilidade. Com isso, encerra-se a trajetória da função tripla original de 1809, que havia acumulado tarefas de controle, representação e arrecadação, dando lugar a um modelo funcional especializado e institucionalizado.

Essa trajetória demonstra, conforme sustenta a doutrina, que o Despachante Aduaneiro não é fruto do improviso histórico, nem uma derivação do comércio privado, mas sim um agente originário da própria formação do território aduaneiro brasileiro, criado, moldado e legitimado pela estrutura do Estado.

Durante a segunda metade do século XIX, o despachante atuava nos grandes portos do Império — como Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Belém e Santos — sendo figura presente e estratégica nas rotinas da importação e exportação de mercadorias. Seu papel era reconhecido pela Receita como essencial para o bom funcionamento da alfândega.

Com a Proclamação da República em 1889, e ao longo das primeiras décadas do século XX, o modelo imperial foi mantido, mas passou a conviver com pressões por organização de classe e maior normatização profissional. O exercício da função ainda dependia de nomeação formal e cadastro junto à Alfândega local, mas surgem as primeiras tentativas de associativismo — embriões dos sindicatos e federações da categoria.

Nas décadas de 1930 e 1940, com o fortalecimento da administração pública federal e a criação do Ministério da Fazenda como órgão centralizador, a fiscalização sobre os despachantes se intensifica. Já a partir da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, a estrutura sindical brasileira permite o reconhecimento formal dos Sindicatos dos Despachantes Aduaneiros como representantes legais da categoria, o que impulsiona a defesa institucional da profissão.

A legislação moderna sobre despachantes aduaneiros vai ganhando corpo entre os anos 1950 e 1970, especialmente com a criação de registros profissionais, exigência de provas de habilitação, e participação em processos administrativos de comércio exterior. Em 1983, é criado o Registro de Despachantes Aduaneiros junto à Receita Federal, ampliando o controle técnico da atuação.

Já no final do século XX, com a implantação do Siscomex, e no início do século XXI com a Nota Fiscal Eletrônica, o Portal Único de Comércio Exterior e a DUIMP, o papel do despachante aduaneiro se transforma profundamente. De intermediário documental, ele passa a ser também gestor de conformidade, analista de risco e articulador entre operadores privados e os sistemas públicos, em uma função de alta complexidade técnica.

Em 2009 a Receita Federal do Brasil alterou a regulamentação de atuação do despachante aduaneiro por meio do Decreto 6.759 de 5 de fevereiro de 2009, passando a exigir exame de qualificação técnica.

Os Despachantes Aduaneiros somente podem atuar mediante procuração outorgada pelos interessados (importadores, exportadores e viajantes procedentes do exterior) e após credenciamento específico no SISCOMEX – Sistema Integrado de Comércio Exterior.[4]

A principal função do despachante aduaneiro é a formulação da declaração aduaneira de importação ou de exportação, que nada mais é que a proposição da destinação a ser dada aos bens submetidos ao controle aduaneiro, indicando o regime aduaneiro a aplicar às mercadorias e comunicando os elementos exigidos pela Aduana para aplicação desse regime.[5]

Referências

Ligações externas

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Brasil
Portugal