e/ou é uma expressão corriqueira mas polêmica usada para indicar que um, mais ou mesmo todos os casos que ela conecta podem ocorrer. A alternância de conjunções expressada pela barra visa a simplificar construções como

"Ele fala ou inglês ou francês, ou fala as duas línguas (ele fala inglês e/ou francês)" [1]

A conjunção ‘‘e/ou’’ encontra-se difundida na língua escrita e é encontrada até mesmo em dicionários, junto às descrições de verbetes outrem[2][3]. Encontra-se também em outras línguas, como a inglesa (and/or), sob mesma demanda[4].

“e/ou” é controversa em áreas onde a norma culta da língua[5] ou a formalidade da Lógica mostrem-se requeridas, como na área jurídica[6], sendo seu uso desencorajado em alguns guias de estilo. A expressão não encontra-se no VOLP [5] e também não encontra-se como verbete distinto nos principais dicionários de português [2][3].

Embora encontrada na língua escrita, "e/ou" não é corrente na língua falada.

Críticas editar

Opositores afirmam que, além de esteticamente feia, a expressão "e/ou" é ambígua em sua construção, pois decorre de compreensão em senso comum da conjunção “ou” como excludente, sendo que pela Língua Portuguesa e pela Lógica, “ou” é por definição inclusivo[7][8][9]. Ademais, alega-se que a alternância entre “e” e “ou” promovida pela barra mostra-se confusa, devendo-se por vezes escolher se ou vale o “e” ou vale o “ou” na expressão[6][10][11].

Lógica e Semântica Culta editar

A Língua Portuguesa define alguns conectivos lógicos, como “e”, “ou”, “ou … ou ...”, “nem … nem …”, “se … então”, “se e somente se” e outros [7][8] que visam a expressar as portas[12] e raciocínios lógicos inerentes a um ramo estudado na matemática conhecido como lógica [13]. Na lógica combinacional atribuem-se valores lógicos às sentenças (verdadeiro ou falso) e um valor lógico à sentença formada pela justaposição destas sentenças mediadas por uma ou mais conectivos cada qual com sentido predefinido. A relação entre os valores lógicos das sentenças de entrada e o valor lógico da sentença formada com o uso de um conectivo (sentença de saída) é declarada na assim chamada tabela verdade da porta lógica utilizada.

Seguem as tabelas verdades oficiais da porta “e”, da porta “ou” e da porta "ou ... ou ..." para fins de análise [14][7].

Tabela verdade da porta "e":

a b a e b
V V V
V F F
F V F
F F F

Tabela verdade da porta "ou":

a b a ou b
V V V
V F V
F V V
F F F

Tabela verdade do "ou exclusivo" ( "ou... ou ...")

a b ou a ou b
V V F
V F V
F V V
F F F


A ideia por trás da expressão "e/ou" é suprimir, derivado de uma compreensão em senso comum, o entendimento do "ou" como "ou exclusivo". Ocorre que no Português o "ou exclusivo" é gerado na pronúncia e na escrita mediante a repetição do termo ou: "ou isto ou aquilo", o que é diferente de "isto ou aquilo".

A expressão "isto ou aquilo" já abarca em si o caso onde isto é verdadeiro e aquilo é verdadeiro (conforme visto na primeira linha da tabela verdade da porta "ou").

O uso de "e/ou" para esta finalidade é plenamente redundante e não oficializado nos estudos de lógica.

Exemplo explicativo editar

"Marcos vai ao cinema e João vai ao teatro."

"Marcos vai ao cinema ou João vai ao teatro."

"Ou Marcos vai ao cinema ou João vai ao teatro."

Pela consulta imediata às tabelas verdades vemos que as três sentenças acima exprimem cada qual um conjunto de situações diferente.

A sentença:

"Marcos vai ao cinema e/ou João vai ao teatro",

por comparação mostrar-se-ia plenamente equivalente à segunda das três sentenças antes apresentadas.

O uso de "e/ou" deve ser suprimido na língua culta em favor do uso de um "ou" simples.

Importância editar

A importância da definição de "ou" como inclusivo, ou seja, plenamente equivalente ao famigerado "e/ou", deriva do fato que implicações lógicas relevantes decorrem da definição correta e elas seriam invalidadas caso se interpretasse o "ou" simples como exclusivo. Tem-se por exemplo os teoremas de De Morgan[12][13], que ensinam a fazer, entre outros, as negações corretas de frases que envolvem os conectivos lógicos ou "e" ou "ou".

Segundo os teoremas de De Morgan, para negar corretamente um sentença que contenha o conectivo "e", devem-se negar cada uma das partes da sentença individualmente e trocar-se o conectivo "e" pelo conectivo "ou". Algo similar ocorre na negação de uma sentença envolvendo o conectivo "ou": devem-se negar cada uma das partes da sentença e trocar-se o conectivo "ou" pelo conectivo "e".

A negação correta da sentença: "Marcos vai ao cinema E João vai ao teatro." é "Marcos não vai ao cinema OU João não vai ao teatro."

De forma similar, a negação correta da sentença: "Marcos vai ao cinema OU João vai ao teatro." é "Marcos não vai ao cinema E João não vai ao teatro."

Vale ressaltar que as regras acima são teoremas: podem ser demonstradas via tabelas verdade. Mas só são válidas com o sentido de "ou" em sua acepção correta, inclusivo (ou seja, plenamente equivalente a "e/ou"). Assim justifica-se a redundância declarada, conforme pretendido.

A negação correta da sentença envolvendo "ou ... ou ..." (ou seja, o ou exclusivo) fica como exercício, a cargo do leitor.

Referências

  1. Monnerat, Rosane Santos Mauro (2001). "A expressão da contra (dis) junção no texto publicitário Implicações semântico-discursivas". Revista Linguagem & Ensino, 4 (2), p. 123-142.
  2. a b Dicionário Priberam | https://dicionario.priberam.org/
  3. a b Dicionário Aurélio, "e/ou" | https://www.dicio.com.br/pesquisa.php?q=e%2Fou
  4. «and, conj.1, adv., and n.1». OED Online. Oxford University Press. Consultado em 16 de agosto de 2012 
  5. a b VOLP - Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa | https://www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no-vocabulario
  6. a b CABRAL, Guilherme Castro . Teoria do "e/ou":: solidariedade x subsidiariedade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12 , n. 1287, 9 jan. 2007 . Disponível em: https://jus.com.br/artigos/9373. Acesso em: 7 ago. 2022.
  7. a b c Infoescola: Conectivos Lógicos Disponível em https://www.infoescola.com/matematica/conectivos-logicos/ , acessado em 16/08/2022.
  8. a b Novíssima gramática da língua portuguesa -Domingos Paschoal Cegalla
  9. Nova Gramática do Português Contemporâneo - Celso Cunha
  10. Shuy, Roger (17 de abril de 2008). «Legal uses of and/or…or something». Language Log 
  11. Sabbag, Eduardo. Manual de direito tributário - 8ed. [S.l.]: Saraiva Educação S.A. 
  12. a b Bedregal, Benjamín René Callejas; Acióly, Benedito Melo (2002), Lógica para a Ciência da Computação,Versão Preliminar, Natal, RN.
  13. a b Em particular a álgebra de Boole: Álgebra de Boole e Simplificação de Circuitos Lógicos - Universidade de São Paulo (USP)| https://dcm.ffclrp.usp.br/~augusto/teaching/aba/AB-Algebra-Boole-Simplificacao-Circuitos.pdf
  14. Eletrônica digital básica, páginas 28 e 29 e 35| https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/13988/1/_Eletronica.pdf

Ver também editar