Novas Cartas Portuguesas: diferenças entre revisões

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Maria Madalena (discussão | contribs)
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O livro foi concebido em 1971, três anos antes da [[Revolução dos Cravos]] e da consequente independência das colónias portuguesas em África. Enquanto obra literária, ''NCP'' não é facilmente classificável. Se não se trata de um romance ou ensaio, também não é apenas um manifesto feminista. Como indica a estudiosa Darlene Sadlier, as próprias três Marias se referem ao seu livro como “uma coisa” inclassificável, o que sugere não tanto a dificuldade, mas antes a relutância das autoras em categorizar o livro, rejeitando assim a lógica das formas literárias tradicionais.<ref>Sadlier, Darlene. ''The Question of How: Women Writers and New Portuguese Literature''. Westport, Connecticut: Greenwood Press, 1989, p. 7.</ref> ''NCP'' reúne cartas, ensaios, poemas e fragmentos de vária ordem, “saltando” entre o uso das línguas portuguesa e francesa. O livro abre com uma carta datada de 1 de Março, 1971 e termina com um fragmento escrito a 25 de Outubro, 1971. Porém, as entradas obedecem a duas dimensões temporais distintas: a das três Marias, e a das Marianas, Marias, Anas e Cavaleiros que por elas são inventados/as. Se todos os fragmentos surgem datados (o que aponta para uma cronologia baseada nos diálogos reais entre as três Marias), só um pequeno número de cartas é numerado, oferecendo ao leitor ou leitora uma breve fonte de ordem narrativa sem que esta constitua, porém, uma narrativa unitária. Em geral, as três Marias optam por uma forma radicalmente fragmentada.
 
Após publicação, a obra foi considerada deletéria ao regime e proibida pela censura. Foi aberto um processo contra as autoras, tornando o texto e o caso da sua supressão internacionalmente famosos. [[António Quadros]], foi, entre outros, uma das testemunhas do processo, em favor das acusadas. O processo foi suspenso e as autoras absolvidas somente após o 25 de Abril de 1974, tendo como Advogado José Armando da Silva Ferreira. Os textos foram considerados “imorais” e “pornográficos”, pois retratavam mulheres livres, que questionam a sua identidade e expressam o desejo de acessar novas ideias sociais e religiosas; em tom de revelação, com várias vozes narrativas, a obra propõe-se a resolver todos os paradoxos possíveis na relação entre homens e mulheres.
 
O livro pode ser considerado um marco crucial na evolução do pensamento feminista na literatura portuguesa. As mulheres começam a falar sobre seu corpo, sobre os prazeres e sofrimentos de sua relação carnal com os homens, e chocam a sociedade portuguesa por conta disso. O livro é composto de fragmentos, o que expressa a própria concepção da mulher portuguesa, mas transmitindo uma só mensagem: a mulher também tem voz, e sabe falar.