Caverna de Altamira: diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
Linha 10:
|coordenadas = {{coor dms|43|22|57.1|N|4|06|58.2|O}}
}}
'''Altamira''' é o nome de uma [[caverna]] na qual se conserva um dos conjuntos pictóricos mais importantes da [[Pré-história]].<ref>{{Harv|Coma-Cros, D. e Tello, A.|2006|p=97|sp=sim}}</ref> Fica no [[município]] [[Espanha|espanhol]] de [[Santillana del Mar]], [[Cantábria]], num prado do qual tomou o nome.<ref>{{Harv|Rodríguez-Ferrer|1880|p=260|sp=sim}}</ref> Por volta de {{AC|11000}}, a queda de uma rocha bloqueou a entrada da caverna, impedindo a continuidade da ocupação humana e assim preservando o seu interior.
 
As [[pintura rupestre|pinturas e gravuras]] da caverna pertencem ao [[Paleolítico Superior]], principalmente aos períodos [[Magdaleniano]] (entre 14 500 e 12 000 a.C.) e [[Solutreano]] (16 500 a.C.)<ref name="4000antes" />, embora testes usando séries de urânio avalieavaliem a data para cerca de 32 000 a.C., no começo do [[Aurignaciano]].<ref name="Science2012">{{Harv|Pike|Hoffmann|García-Díez|Pettitt|2012|pp=1409-14013|sp=sim}}</ref><ref name="LasHetal20056-153-156"/><ref name="BerCab-270">{{Harv|Bernaldo de Quirós Guidolti|Cabrera Valdés|1994|pp=265, 268|sp=sim}}</ref><ref>{{Harv|García Guinea|1979|p=100|sp=sim}}</ref> O estilo de grande parte das suas obras enquadra-se na denominada "[[Arte francocantábrica|escola franco-cantábrica]]", caracterizada pelo realismo das figuras representadas. Contém pinturas policromaspolicromáticas, gravuras, pinturas pretas, vermelhas e ocres que representam animais, figuras [[Antropomorfismo|antropomorfas]], desenhos abstratos e não figurativos.<ref name="UNESCO37" />
 
Qualificativos como: "[[Capela Sistina]]" da [[Arte pré-histórica|arte rupestre]];<ref name="UNESCO37">{{Harv|Blas, L. al. (realização)|1999|p=37|sp=sim}}</ref><ref name="Muzquiz84">{{Harv|Múzquiz Pérez-Seoane|Saura|1999|p=84|sp=sim}}</ref><ref name="ReferenceA">{{Harv|García Guinea|1975|p=13|sp=sim}}</ref> "''...a manifestação mais extraordinária desta arte paleolítica...''",<ref>{{Harv|Breuil|Obermaier|1984|p=35|sp=sim}}</ref> "''... a primeira caverna decorada que se descobriu e que contínua sendo a mais esplêndida''";<ref name="ComaTelo-57">{{Harv|Coma-Cros, D. e Tello, A.|2006|p=57|sp=sim}}</ref> e "''...se a pintura rupestre <nowiki>[paleolítica]</nowiki> é o exemplo de uma grande capacidade artística, a caverna de Altamira representa a sua obra mais sobressalentesobresselente''",<ref name="Muzquiz86" /> indicam a qualidade e a beleza do trabalho do homem magdaleniano neste recinto.
 
Foi declarada [[Patrimônio da Humanidade|Património da Humanidade]] em 1985.<ref>{{Citar web|autor=Ministerio de Cultura |autorlink=Ministério de Cultura da Espanha |local=Espanha|título=Cueva de Altamira |url=http://museodealtamira.mcu.es/Prehistoria_y_Arte/patrimonio_mundial.html |obra=Museo de Altamira |acessodata=26 de abril de 2012}}</ref> Em 2008, a nomeação foi estendida para outras 17 cavernas do [[País Basco]], das [[Principado das Astúrias|Astúrias]] e da própria Cantábria, chamando o conjunto "[[Caverna de Altamira e arte rupestre paleolítica do norte da Espanha]]".<ref name="UNESCO37" /><ref>{{Citar notícia |autorlink=El Diario Montañés |autor=El Diario Montañés |título=La Unesco cataloga como Patrimonio de la Humanidad nueve cuevas cántabras |url=http://www.eldiariomontanes.es/20080708/cantabria/unesco-cataloga-como-patrimonio-20080708.html |formato=HTML |obra=eldiariomontanes.es |editora=editorial Cantabria Interactiva S.L. |data=8 de julho de 2008 |acessodata=26 de abril de 2012}}</ref>
 
==História da descoberta e reconhecimento==
A caverna de Altamira foi descoberta em 1868 por um caçador chamado Modesto Cubillas, que encontrou a entrada quando tentava libertar o seu cão, que estava preso entre as fendas de umas rochas por perseguir sua caça.<ref>{{Harv|García Guinea|1975|p=14|sp=sim}}</ref> Naquele momento, a notícia da descoberta de uma caverna não teve transcendência entre a vizinhança da zona, pois é um terreno [[karst|kárstico]], caracterizado por possuir já milhares de grutas, pelo qual a descoberta de uma, mais, não foi novidade.<ref name="GG14-15" />
 
[[Marcelino Sanz de Sautuola]], "mero afeiçoado" em [[paleontologia]],{{nota de rodapé|Assim se autonomeia na sua obra ''Breves apontes sobre alguns objetos pré-históricos da província de Santander'', segundo indica García Guinea.<ref>{{Harv|García Guinea|1979|p=27|sp=sim}}</ref>|group="nb"}} veio a conhecer a existência da caverna diretamente do mesmo Cubillas, [[parceria rural|sócio]] de sua fazenda; porém, não a visitou até pelo menos 1875, e muito provavelmente em 1876.{{nota de rodapé|Há discrepâncias na data concreta da primeira visita de Sautuola a Altamira. Não há referências diretas senão indiretas deduzidas dos textos do próprio Sautuola ou a partir de terceiros. García Guinea dá por certa a data de 1876 {{Harv|García Guinea|1979|p=15}}.|group="nb"}} Percorreu-a na íntegra e reconheceu alguns signos abstratos, como raias pretas repetidas, às quais não deu qualquer importância por não considerá-las obra humana. Quatro anos depois, no verão de 1879, voltou Sautuola pela segunda vez a Altamira. Nesta ocasião, acompanhado pela sua filha María Faustina Sanz Rivarola, de cerca de oito anos.<ref name="GG15">{{Harv|García Guinea|1979|p=15|sp=sim}}</ref>{{nota de rodapé|Segundo as diversas obras atribui-se a Maria, filha de Marcelino Sanz, a idade de 7, 8 ou 9 anos.<ref>{{Harv|Coma-Cros, D. e Tello, A.|2006|p=111|sp=sim}}</ref> anos no momento da descoberta.|group="nb"}} Tinha interesse por [[escavação arqueológica|escavar]] a entrada da caverna visando encontrar alguns restos de ossos e [[sílex]], como os objetos que vira na [[Exposição Universal de Paris (1878)|Exposição Universal de Paris em 1878]].<ref name="GG1979-16-18">{{Harv|García Guinea|1979|pp=16-18|sp=sim}}</ref>{{nota de rodapé|Assim o conta o próprio Sautuola no seu ''Breves apontes sobre alguns objetos pré-históricos da província de Santander'', segundo nos indica Almagro {{Harv|Almagro Basch|1969|pp=104-105}}: ''aguilhoado pela sua afeição a estes estudos e excitado muito principalmente pelas numerosas e curiosíssimas coleções de objetos pré-históricos que teve o gosto de contemplar repetidas vezes durante a [[Exposição Universal de Paris (1878)|Exposição Universal de 1878 em Paris]].'' {{Harv|Sanz de Sautoula|1880}}|group="nb"}}
 
[[Ficheiro:María Sanz de Sautuola2.jpg|thumb|150px|Maria exclamou ao ver as pinturas: ''Olha, pai, bois!''.<ref name="GG15" />]]
A descoberta realizou-a, na realidade, a menina. Enquanto o seu pai permanecia na boca da gruta, ela adentrou-se até chegar a uma sala lateral. Ali viu umas pinturas no teto e correu a dizer-lhe ao seu pai. Sautuola ficou surpreendido ao contemplar o grandioso conjunto de pinturas daqueles estranhos animais que cobriam a quase totalidade da abóbada.<ref name="GG14-15">{{Harv |García Guinea|1979|pp=14-15|sp=sim}}</ref>
 
No ano seguinte, 1880, Sautuola publicou um breve opúsculo intitulado ''Breves apontes sobre alguns objetos pré-históricos da província de Santander''. Nele sustinha a origem [[Pré-história|pré-histórica]] das pinturas e incluía uma reprodução gráfica. Expôs a sua [[tese]] ao [[catedrático]] de [[Geologia]] da [[Universidade de Madrid]], Juan Vilanova, que a adotou como própria. Porém, a opinião de Sautuola não foi aceitaaceite pelos franceses [[Émile Cartailhac|Cartailhac]], [[Gabriel de Mortillet|Mortillet]] e [[Édouard Harlé|Harlé]], os cientistas mais reconhecidos em estudos pré-históricos e paleontológicos na Europa.<ref>{{Harv|O Marquês de Cerralbo|1909|pp=443-449|sp=sim}}</ref><ref>{{Harv|García Guinea|1979|pp=20-26|sp=sim}}</ref>
 
As pinturas de Altamira foram o primeiro conjunto pictórico pré-histórico de grande extensão conhecido até então,<ref name="ComaTelo-57" /><ref>{{Harv|García Guinea|1979|p=38|sp=sim}}</ref> mas tal descoberta determinou que o estudo da [[caverna]] e o seu reconhecimento levantaralevantasse toda uma polêmica a respeito dos enfoques aceitosaceites na ciência pré-histórica do momento.{{nota de rodapé|Se bem que a polêmica envolveu importantes cientistas do momento, esta não teve uma repercussão tão grande quanto outros temas dessas datas: [[criacionismo]] contra [[Uniformismo|atualismo]], "alta antiguidade do homem", etc. {{Harv|Moro Abadía|González Morales|2004|p=129}}|group="nb"}} A novidade da descoberta era tão surpreendente que provocou a lógica desconfiança dos estudiosos. Chegou-se a sugerir que as tinha pintado o próprio Sautuola entre as duas visitas que tinha feito à caverna,<ref>{{Harv|Coma-Cros, D. e Tello, A.|2006|p=100|sp=sim}}</ref> negando assim a sua origem paleolítica, ou até mesmo atribuindoatribuíndo a obra a um pintor francês que fora alojado na casa do guia da caverna,<ref name="Perelló53">{{Harv|Perejón|2005|p=53|sp=sim}}</ref> embora a maior parte dos ''experts'' franceses considerasse Sautuola como um dos enganados.<ref>{{Harv|García Guinea|1979|p=45|sp=sim}}</ref>
 
[[Ficheiro:Breves apuntes sobre algunos objetos prehistóricos de la provincia de Santander. Marcelino Sanz de Sautuola.jpg|thumb|left|[[Marcelino Sanz de Sautuola]] publicou em 1880 este escrito, onde fez a conhecer as pinturas encontradas no ano anterior, incluindo um desenho do teto da grande sala de policromos.]]
Linha 185:
 
;Hominídeos
Parece que foi o homem atual, ''[[Homo sapiens]]'',{{nota de rodapé|O ''Homo'' que habitou a Europa há cerca de 100 mil anos até então era conhecido anteriormente como "homem de Cro-Magnon" e desde a década de 1990, a literatura anglo-saxónica passou a denominá-lo "homem anatomicamente moderno" (HAM) {{Harv|Fullola Pericot|2002|pp=59-63}}.|group="nb"}} o que pintou as cavernas de Altamira e realizou todas as pinturas e gravuras encontradas na Cornija Cantábrica.<ref name="GCRA-56">{{Harv|Garcia de Cortazar e Ruiz de Aguirre|González Vesga|2002|p=56|sp=sim}}</ref> O outro habitante da [[península ibérica]], o [[Homo neanderthalensis|homem de neandertal]], havia já mais de 13 mil anos que se extinguira ([[circa|c.]] 28 000 [[Antes do Presente|AP]]).<ref>{{Harv|Finlayson|al.|2006|pp=850-853|sp=sim}}</ref><ref>{{Harv|Wong|2009|pp=16-21|sp=sim}}</ref> Embora as evidências recolhidas no nível 18 do sitiosítio arqueológico da [[caverna de El Castillo]] parecem demonstrar a convivência de ambos ''Homo'' há cerca de 30 mil anos, milênios antes das primeiras pinturas nessa caverna e nas de Altamira.<ref name="Sap-Neard">{{Citar notícia |título=Neanderthales y homo sapiens convivieron en la cueva del Castillo : El director de las excavaciones, Federico Bernaldo de Quirós, avanza los resultados de la última campaña |url=http://www.eldiariomontanes.es/v/20110731/cantabria/neanderthales-homo-sapiens-convivieron-20110731.html |data=31 de julho de 2011 |acessodata=1 de agosto de 2011 |formato=HTML |obra=ediariomontanes.es |editora=El Diario Montañés (Grupo Vocento) |autor=Pérez, José Luis |local=Puente Viesgo (Cantábria)}}</ref>
 
==Sociedade e tecnologia pré-históricas==
Os povoadores da zona de Altamira eram tribos de [[caçadores-coletores]] nômadesnómadas, formados por volta de entre 20 e 30 indivíduos,<ref name="Fullola-65" /> que usavam os abrigos naturais ou entradas das cavernas como habitação,<ref name="Muzquiz86" /> mas não o seu interior,<ref name="BerCab-266" /> e faziam uso do fogo para se iluminar e para cozinhar.<ref name=AF2009-66 /> As escavações fizeram pensar aos arqueólogos que durante o Paleolítico superior os lumes eram limpados e renovados periodicamente, ao contrário do Paleolítico Meio, no qual os lumes eram mantidos de modo constante.<ref name="Sap-Neard" /> Adicionalmente, devia existir uma estrutura social hierarquizada que permitisse organizar partidas de caça de grandes animais, pois tais presas teriam sido inacessíveis sem organização.<ref name="Fullola-65" />
 
No Solutreano, há cerca de 21 mil anos, apareceu uma nova técnica de talhe, "retoque mapa", que permitiu realizar aparelhos de grande detalhe, como as pontas de projétil. Esta técnica, por motivos totalmente desconhecidos, parou de ser usada no início do seguinte período, o Magdaleniano, e não se voltaria a retomar até 10 mil anos depois.<ref name="Fullola-64-65">{{Harv|Fullola Pericot|2002|pp=64-65|sp=sim}}</ref>