Revolução passiva: diferenças entre revisões

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'''Revolução passiva''' é um termo que foi reelaborado pelo [[filósofo]] e dirigente [[comunista]] italiano [[Antonio Gramsci]]. Ele retirou o conceito do livro ''Saggio storico sulla rivoluzione di Napoli'', de [[Vincenzo Cuoco]], que aborda a chamada [[República Napolitana (1799)|Revolução Napolitana]] de 1799. Em síntese, significa uma forma de revolução [[burguesia|burguesa]] em que é excluído o momento radical de tipo [[jacobino]]. Trata-se, em suma, de uma forma de transformação das sociedades com vistas à objetivação do modo de produção [[capitalismo]] sem que seja necessária uma participação popular, tal como aquela ocorrida na [[Revolução Francesa]] (1789-1799). A este conceito, Gramsci incorporou o sentido dado pelo historiador francês [[Edgar Quinet]] para o período da [[Restauração francesa|Restauração bourbônica]] (1815-1830) como de uma "[[revolução]]-[[restauração]]".
'''Revolução passiva''' é um termo cunhado pelo político, [[filósofo]] e dirigente [[comunista]] italiano [[Antonio Gramsci]] durante o [[período entreguerras]] na [[Itália]]. Gramsci cunhou o termo para se referir a uma mudança significativa não abrupta, mas uma metamorfose lenta e gradual que pode levar anos ou gerações para se realizar.{{sfn|GRAMSCI, Antonio & David Forgacs|1988|pp=}}
 
Gramsci usa "revolução passiva" em uma variedade de contextos com significados ligeiramente diferentes. O principal uso é contrastar a transformação passiva da sociedade burguesa na Itália do [[século XIX]] com o processo revolucionário ativo da [[burguesia]] na [[França]]. No entanto, Gramsci também associa o [[fascismo]] italiano com a noção de revolução passiva.<ref name="264-267">GRAMSCI, Antonio & David Forgacs, 1988, págs. 264-267.</ref>
 
A revolução passiva é uma transformação das estruturas políticas e institucionais sem processos sociais extremos. Ele também usa o termo para as mutações das estruturas da produção econômica capitalista que ele reconhece principalmente no desenvolvimento do sistema fabril americano das décadas de 1920 e 1930.
 
Mas, além desse uso do termo "revolução passiva" como uma ferramenta descritiva da análise histórica, Gramsci parece empregá-lo como uma sugestão como caminho para a luta. Numa sociedade inserida no [[capital (economia)|capital]], a única maneira que Gramsci vislumbrou para fazer uma revolução seria de forma relativamente "passiva" através das instituições da [[sociedade civil]].{{sfn|Hardt, Michael & Antonio Negri|2011|pp=365-366}}
 
'''RevoluçãoGramsci passiva'''reelaborou é umo termo que"revolução foi reelaborado pelo [[filósofo]] e dirigente [[comunista]] italiano [[Antonio Gramsci]]. Elepassiva", retirouretirando o conceito do livro ''Saggio storico sulla rivoluzione di Napoli'', de [[Vincenzo Cuoco]], que aborda a chamada [[República Napolitana (1799)|Revolução Napolitana]] de 1799. Em síntese, significa uma forma de revolução [[burguesia|burguesa]] em que é excluído o momento radical de tipo [[jacobino]]. Trata-se, em suma, de uma forma de transformação das sociedades com vistas à objetivação do modo de produção [[capitalismo]] sem que seja necessária uma participação popular, tal como aquela ocorrida na [[Revolução Francesa]] (1789-1799). A este conceito, Gramsci incorporou o sentido dado pelo historiador francês [[Edgar Quinet]] para o período da [[Restauração francesa|Restauração bourbônica]] (1815-1830) como de uma "[[revolução]]-[[restauração (Europa)|restauração]]".
 
Gramsci utiliza o conceito de "revolução passiva" para descrever o processo do ''[[Risorgimento]]'' italiano no século XIX, mas também é explícita sua utilização para a análise de outras formações sociais, como pode ser apreendido no seguinte trecho, retirado do seu Caderno 4: "O conceito de revolução passiva me parece exato não só para a Itália, mas também para os outros países que modernizaram o Estado através de uma série de reformas ou de guerras nacionais, sem passar pela revolução política de tipo radical-jacobino." Assim, Gramsci utiliza o conceito para analisar o [[fascismo]] italiano e a conexão entre o padrão [[fordista]] de produção e a cultura norte-americana.
 
Existe semelhança entre o conceito de revolução passiva de Gramsci e o de "[[via prussiana]]" desenvolvido por [[Lenin]], no texto "O programa agrário da social-democracia russa na primeira revolução russa" (1905-1907). Neste texto, Lenin concebe duas formas de resolução do problema agrário, a via norte-americana e a via prussiana. Segundo Lenin, nos EUA "não existem domínios latifundiários ou são liquidados pela revolução ([[Guerra Civil Americana|Guerra Civil]], [[evolução territorial dos Estados Unidos|expansão para o Oeste]])", enquanto na [[Prússia]] "a exploração feudal do latifundiário transforma-se lentamente numa exploração burguesa-[[junker]], condenando os camponeses a decênios de exploração, ao mesmo tempo em que se distingue uma pequena minoria de ''Grossbauers'' (lavradores abastados)". Em suma, não existe uma resolução jacobina da questão agrária; não há uma reforma agrária na Prússia, tal como houve na França e nos EUA.
 
Na [[sociologia]] histórica norte-americana, há no trabalho de [[Barrington Moore Jr.]] uma ideia similar expressa no conceito de "[[modernização conservadora]]". No seu livro "Origens sociais da ditadura e democracia", Barrington Moore faz uma comparação entre as formas de resolução do problema agrário e o tipo de sociedade criada a partir de então, comparando as histórias dos [[EUA]], do [[Japão]] e da [[China]].
 
== Táticas ==
 
{{Mais informações|Marxismo cultural}}
 
[[Imagem:Gramsci 1915.jpg|thumb|x200px|direita|Antonio Gramsci, pai da revolução passiva.]]
 
Gramsci descreve várias táticas principais para realizar uma revolução passiva. Todas essas táticas funcionariam em conjunto para, gradual e organicamente, mudar uma sociedade de tal maneira que atendesse às demandas da [[classe dominante]]. Este é o conceito de "mudança orgânica", mudança que parece ser autoiniciada e natural na [[Evolucionismo social|evolução de uma sociedade]].<ref name="264-267"/> Gramsci analisou movimentos como o [[reformismo]] e o [[fascismo]], assim como os métodos da "administração científica" e da [[linha de montagem]] de [[Frederick Taylor]] e [[Henry Ford]], respectivamente, como exemplos de revolução passiva iniciada pela [[burguesia]].
 
=== Ensino ===
 
Gramsci teorizou que, para transformar uma sociedade, era preciso estar firme no controle das [[mente]]s das [[criança]]s, já que sua [[visão de mundo]] ainda está em formação. Assim, ele apoiava o [[ensino]] nacionalizado obrigatório, de modo que cada criança aprendesse e adotasse os [[valor (pessoal e cultural)|valor]]es, a [[moral]] e a visão de mundo que lhes fossem ensinadas. Isso garante que as gerações futuras tenham um histórico de pensamento nos princípios, ''[[ethos]]'' e logotipos revolucionários. Além de dar à parte controladora a capacidade de lidar diretamente com a próxima geração, evitando assim o filtro criterioso dos [[pais]] do indivíduo.{{sfn|GRAMSCI, Antonio & David Forgacs|1988|pp=269}}
 
=== Linguagem ===
 
As teorias de Gramsci giravam em torno da ideia de criar uma nova [[hegemonia cultural]] na sociedade. O [[Novilíngua|controle da linguagem]] se tornaria um aspecto chave desta nova hegemonia. Controlando e influenciando a [[linguagem]] de uma sociedade, a nova hegemonia poderia controlar como a sociedade fala e, assim, eventualmente, como ela pensa. Isso começa em grande parte nas [[escola]]s, mas deve ser repetido em muitos âmbitos da sociedade. Quando se controla o modo como a linguagem é usada, ela pode influenciar a forma como as pessoas pensam sobre qualquer assunto, com base no que é socialmente permitido dizer ou não.{{sfn|GRAMSCI, Antonio & David Forgacs|1988|pp=250-251}}
 
=== Religião ===
 
Gramsci viu na [[Igreja Católica]] uma força poderosa na sociedade italiana e ficou impressionado com sua capacidade de influenciar os corações e mentes dos indivíduos. Como resultado, a Igreja Católica tornou-se uma hegemonia rival em sua teórica revolução passiva. Assim, Gramsci teorizou que a Igreja deveria ser silenciada como uma hegemonia rival na sociedade. Isso poderia eventualmente ser feito à força, mas uma estratégia mais bem-sucedida seria infiltrar-se com o senso revolucionário de [[moral]], [[ética]] e [[lógica]]. Esta não poderia ser uma medida ativa, mas uma mudança gradual, como as outras táticas de revolução são implementadas. Controle ou infiltração na [[religião]] seriam de crucial importância. A religião deve ecoar a "mudança orgânica" na sociedade; deve servir para ajudar a nova hegemonia. A religião é um excelente meio para esse fim porque, por sua própria natureza, as pessoas estão dispostas a acreditar no que vem do [[púlpito]], como sendo objetivamente bom.{{sfn|GRAMSCI, Antonio & David Forgacs|1988|pp=266-267}}
 
=== Mídia ===
 
A [[mídia]] é o eixo do modelo de Gramsci. Deve ser usada com inteligência para repetir organicamente, edificar e reforçar os [[valor (pessoal e cultural)|valor]]es e a moral revolucionários que estão sendo disseminados por toda a sociedade (por meio do [[ensino]], da [[língua natural|língua]] e da religião). A mídia une as outras táticas de Gramsci e preenche as lacunas que elas podem deixar. Deve ecoar a moral revolucionária e promover as visões sociais da linguagem, ensino, religião e valores sociais. A mídia tem um grande controle sobre a [[opinião pública]], e isso deve ser utilizado, e não deve ser permitido influenciar em contraste com a revolução.{{sfn|GRAMSCI, Antonio & David Forgacs|1988|pp=267-269}}
 
== Ver também ==
 
* [[Crise orgânica]]
* [[Hegemonia cultural]]
* [[Subversão]]
 
{{Referências}}
 
*GRAMSCI, Antonio. Risorgimento italiano (Caderno 19). In. GRAMSCI, A. ''[[Cadernos do cárcere]]''. Vol. 5. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p.&nbsp;11-128.
=== Bibliografia ===
 
*GRAMSCI, Antonio & David Forgacs. ''The Gramsci Reader: Selected Writings, 1916-1935.'' Lawrence and Wishart, 1988, {{en}}
*Hardt, Michael & Antonio Negri. ''Commonwealth.'' [[Harvard University Press]], 2011, {{en}} ISBN 9780674060289
*GRAMSCI, Antonio &. Risorgimento italiano (Caderno 19). In. GRAMSCI, A. ''[[Cadernos do cárcere]]''. Vol. 5. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p.&nbsp;11-128.
*[[Ruy Braga|BRAGA, Ruy]]. “Risorgimento, fascismo e americanismo: a dialética da passivização.” In. DIAS, Edmundo Fernandes et alli. ''O outro Gramsci''. São Paulo: Xamã, 1996, p.&nbsp;167-182.
*[[Carlos Nelson Coutinho|COUTINHO, Carlos Nelson]]. “As categorias de Gramsci e a realidade brasileira”. In ''Gramsci: um estudo sobre seu pensamento político''. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999, p.&nbsp;191-219.
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*[[Luiz Werneck Vianna|VIANNA, Luíz Werneck]].'' A revolução passiva: iberismo e americanismo no Brasil''. Rio de Janeiro: Revan, 1997.
 
{{Portal3|Política|Sociologia|Comunismo}}
== Ver também ==
* [[Antonio Gramsci]]
* [[Hegemonia]]
* [[Crise orgânica]]
 
{{esboço-política}}