Guerra da Restauração: diferenças entre revisões

Conteúdo apagado Conteúdo adicionado
m "Haver" no sentido de "existir" é impessoal.
Catrau (discussão | contribs)
m
Linha 31:
{{Guerras Luso-Espanholas}}
 
A '''Guerra de Restauração''' foi um conjunto de confrontos armados travados entre o [[Reino de Portugal]] e a [[Coroa de Castela]], desencadeados após o início da [[Guerra dos Segadores]] (ou Sublevação da [[Catalunha]]), e que se estenderam por um período de 28 anos, entre [[1640]] e [[1668]].<ref>{{Citar web|url=http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/EFEMERIDES/Restauracao/RI.htm|titulo=Efemérides {{!}} A Restauração (1640)|acessodata=2018-11-27|obra=hemerotecadigital.cm-lisboa.pt}}</ref><ref>{{Citar web|url=https://arqhist.exercito.pt/DetailsForm.aspx?id=99138|titulo=Campanhas da Guerra da Restauração (1640 - 1668).|acessodata=2018-11-27|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar periódico|ultimo=RTP|primeiro=RTP, Rádio e Televisão de Portugal - Christopher Marques -|titulo=1640-2017. Guerras, estatutos, crise. Como a Catalunha chegou até aqui|url=https://www.rtp.pt/noticias/mundo/1640-2017-guerras-estatutos-crise-como-a-catalunha-chegou-ate-aqui_es1028949|lingua=pt}}</ref><ref>{{Citar periódico|titulo=Portugueses nas revoltas da Catalunha|url=https://www.sabado.pt/mundo/europa/detalhe/portugueses-nas-revoltas-da-catalunha|lingua=pt-pt}}</ref> Os confrontos tiveram início no [[golpe de estado]] da [[Restauração da Independência|Restauração da Monarquia Portuguesa]] de [[1 de dezembro]] de [[1640]] — que pôs fim à [[União pessoal|monarquia dualista]] da [[Dinastia Filipina]] iniciada em 1580 — e terminaram com o [[Tratado de Lisboa (1668)|Tratado de Lisboa de 1668]], assinado em nome de [[Afonso VI de Portugal]] e [[Carlos II de Espanha]], pelo qual ficou definitivamente reconhecida a independência do reino de [[Portugal]].
 
O período de 1640 a 1668 caracterizou-se por confrontos periódicos entre Portugal e Espanha, tanto com pequenos enfrentamentos como graves conflitos armados, dos quais muitos deles foram ocasionados por conflitos de Espanha e Portugal com potências não ibéricas. A Espanha participou na [[Guerra dos Trinta Anos]] até 1648 e na [[Guerra Franco-Espanhola (1635-1659)|Guerra Franco-Espanhola]] até 1659, enquanto Portugal participou na [[Guerra Luso-Holandesa]] até 1663. A frente manteve-se estática, pois a Espanha esteve fundamentalmente à defensiva até 1659, dada a prioridade que a corte madrilena outorgou a sufocar a [[Guerra dos Segadores|Sublevação da Catalunha]].{{harvnp|White|2003|p=61}}
Linha 39:
== Antecedentes ==
[[Ficheiro:Philip II, King of Spain from NPG.jpg|esquerda|miniaturadaimagem|[[Filipe II de Espanha|Filipe II da Espanha]] e I de Portugal]]
Depois da morte sem herdeiros do rei [[Sebastião I de Portugal]] em [[1578]] e de seu sucessor [[Henrique I de Portugal]] em janeiro de [[1580]], instaurou-se um vazio de poder no trono de [[Portugal]] que provocaria uma crise dinástica.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=107}} A crise deveu-se em grande parte pela ausência de normas que regulassem adequadamente a situação e se produziu num momento de decadência nacional, pelas derrotas no norte de África, a redução do comércio e os embates com os piratas ingleses e franceses.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=107}} As Cortes deviam decidir quem dentre vários reclamantes deveria ocupar o trono português, mas antes de que a eleição fosse feita, [[Filipe II de Espanha]] antecipou-se à decisão e ordenou a invasão militar do país, amparado emnos seus direitos à sucessão à coroa portuguesa. Filipe tinha pactuado com os poderosos do país —a classe média, a nobreza e alto clero—,{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=108}} e não esperava uma resistência séria à ofensiva do [[Fernando Álvarez de Toledo y Pimentel|duque de Alba]].{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Na realidade, a união ibérica era muito provável, pois dos onze casamentos celebrados pela extinta [[dinastia de Avis]] emnas suas últimas três gerações, oito tinham-no sido com os Habsburgos espanhóis.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=107}} A relação entre as duas dinastias era tal, que quase formavam uma única família, com interesses similares.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=107}}
 
EfetivamenteEfectivamente, a oposição principal proveio do povo e do baixo clero,{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=108}} os que menos podiam esperar da mudança de dinastia.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Em [[20 de junho]] de 1580, adiantando à decisão do conselho regente, [[António de Portugal, Prior do Crato|António, Prior de Crato,]] proclamou-se rei de Portugal em [[Santarém (Portugal)|Santarém]],{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=20}} sendo aclamado em várias localidades do país; o seu governo durou 30 dias, já que as suas escassas tropas foram vencidas pelo exército espanhol mandado por [[Fernando Álvarez de Toledo y Pimentel|Fernando Álvarez de Toledo e Pimentel]], duque de Alba, na [[batalha de Alcântara]] em agosto de [[1580]]. Dom António, descendente ilegítimo do rei [[Manuel I de Portugal|Manuel I]], obteve o respaldo popular, inspirado num vadio sentimento patriótico, que não bastou, no entanto, para fazer frente às tropas do duque.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=108}} Seguiu sustentando a oposição aos Habsburgos durante décadas, infrutiferamente.{{harvnp|Bouza|1991|p=209}} Os privilegiados portugueses, pelo contrário, celebraram o fracasso de António. No ano seguinte, Filipe II foi proclamado rei [[Filipe II de Espanha|Filipe I de Portugal]] pelas [[Cortes de Tomar de 1581|Cortes de Tomar]].{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Filipe contava com o apoio dos grupos influentes do país: o alto clero, a nobreza e os mercadores.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Para ganhar o favor deles, o monarca espanhol prometeu respeitar e ampliar seus privilégios.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}}
 
Esse seria o começo de um período em que [[União Ibérica|Portugal junto com os demais reinos hispânicos]] foi governado por [[Vice-rei|vice-reis]] ou governadores dos [[Lista de monarcas de Espanha|reis de Espanha]], vivendo debaixo do domínio do ramo espanhol da [[casa de Habsburgo]], partilhando o mesmo monarca numa [[União dinástica|monarquia dual]] ''[[aeque principaliter]]'', que se iria prolongar até [[1640]].{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Em MadrideMadrid, passou a existir um Conselho de Portugal — composto em exclusivaexclusivamente por portugueses — para assessorar aoo rei sobre assuntos concernentes ao reino.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=21}} Portugal conservou, nesse início, suas próprias leis e instituições,{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=108}} que lhe permitiram manter-se manter como nação quase independente, com um importante império ultramarino que lhe outorgava grandes vantagens económicas.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} O rei comprometeu-se ademaisainda a defender o vasto império português, que se estendia por territórios americanos, africanos e asiáticos.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Os nobres aumentaram seus poderes político e económico à custa daqueles da Coroa.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=108}}
[[Ficheiro:Retrato_equestre_do_Conde-Duque_de_Olivares.jpg|alt=|miniaturadaimagem|[[Retrato equestre]] do [[Gaspar de Guzmán, Conde-Duque de Olivares|Conde-Duque de Olivares.]] Olivares tentou unificar os vários reinos que compunham a monarquia hispânica, já que após séculos de guerras e o esgotamento dos metais preciosos vindos da América, a [[Coroa de Castela]] estava esgotada militarmente e economicamente]]
A ilusão inicial das duas partes, que esperavam prosperar com a união, durou aproximadamente até a assinatura da [[Trégua dos doze anos|Trégua dos Doze Anos]] com as [[República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos|Províncias Unidas dos Países Baixos]] em 1609.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} A partir de então cresceu a tensão, afundada pelas incursões holandesas no [[Colonização do Brasil|Brasil]].{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=20}} A partir de 1630, estendeu-se o espírito da sublevação que se desatou finalmente em [[1640]].{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=20}} A principal causa do descontentamento eram os prejuízos portugueses ocasionados pelo conflito entre a Coroa e os holandeses.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=109}} A isso uniu-se, a princípios do reinado de [[Filipe IV de Espanha|Filipe IV]], quando o ''[[Favorito|valido]]'' [[Gaspar de Guzmán, Conde-Duque de Olivares|conde-duque de Olivares]] submeteu o comércio luso.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=20}} Outra das razões do descontentamento era a incapacidade real para defender as colónias de outras potências como França e Inglaterra.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|pp=21-22}} Um quarto motivo de queixa, a ausência do soberano, em realidade era hipócrita, pois a nobreza aproveitou-a para aumentar seu poder no território mediante a participação em juntas de administração que tratavam de rivalizar com o poder do vice-rei.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|pp=21-22}} Relacionada com essa achava-se o empenho real em recuperar as rendas que lhe correspondiam, entregadasentregues principalmente em usufructousufruto à nobreza, e reformar a tributação para aumentar as contribuições dos privilegiados, objetivosobjectivos que desagradaram profundamente aos portugueses.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=22}}
 
Os partidários da união, os que tinham saído favorecidos por ela (os membros da Administração, o alto clero e a alta nobreza) defendiam em general a interpretação da Coroa do pacto das Cortes de Tomar: uma graça real que o rei podia mudar quando desejasse.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=109}} Os preteridos, fundamentalmente a baixa nobreza,{{harvnp|Bouza|1991|p=217}} temiam perder as suas mordomias, ser vítimas das revoltas populares cada vez mais frequentes ou ser prejudicados pelos assaltos de ingleses e holandeses.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=109}}
 
A política fiscal da Coroa em prejuízo dos privilegiados, tanto laicos como eclesiásticos, teve um papel fundamental em originar a conjura de 1640.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=109}} O objetivoobjectivo da Coroa era aumentar{{harvnp|Bouza|1991|p=216}} a arrecadação e que a contribuição da nobreza e o clero crescesse; estas classes, por sua vez, recusaram qualquer infracção dedas suas mordomias fiscais, que as isentavam de impostos fixos.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=109}} Os fundos seriam para financiar novas frotas, necessárias para enfrentar aosos holandeses, que tinham tomado controlecontrolo de [[Pernambuco]].{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=111}} O plano reformista, que afetou aafectou todas as classes sociais,{{harvnp|Bouza|1991|p=216}} acelerou-se com a chegada da nova vice-rainha, [[Margarida de Saboia, Duquesa de Mântua|Margarida de Saboia]], duquesa de Mântua, em 1634.{{HarvRef|Bouza|1991|p=216}} Entre as medidas financeiras contou-se a elaboração em 1635 de um inventário de bens eclesiásticos com o fim de desamortizar alguns, cuja posse pela rica Igreja lusa era ilegal.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=24}} A medida suscitou a inimizade desta para a Coroa.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=24}} Especial desdém para os Habsburgos mostrava a [[Companhia de Jesus|Ordem Jesuíta]], que tinha tido vários conflitos com a Coroa e Castela desde o começo da união.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=109}} Em 1637 o rei ordenou a criação de um cadastro de propriedades da nobreza, outra medida que atiçou o descontentamento.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=25}} Em agosto desse mesmo ano, a imposição de um novo imposto ao vinho e à carne e o incremento das [[Sisa (imposto)|sisas]] num momento de crise económica e más colheitas desencadearam uma revolta popular que começou em [[Évora]] e estendeu-se velozmente pelo sul do reino.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=25}} A diferença da nobreza, que se absteve de participar nela, mas também não contribuiu para a sufocar, alguns membros da Companhia de Jesus apoiaram aos rebeldes.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=25}} O rei teve de enviar tropas castelhanas para aplastar a rebelião e seguidamente, em 1638, convocou a grande parte dos nobres a MadrideMadrid para criticá-los porpela sua passividade.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=24}}
 
Nesse mesmo ano de 1638 convocou-se em MadrideMadrid a Junta Grande de Portugal, para reformar o governo do reino.{{harvnp|Bouza|1991|p=218}} Suprimiu-se o Conselho de Portugal, substituído por duas juntas, uma situada em Lisboa e outra em MadrideMadrid —dominadas por secretários portugueses fiéis a Olivares—, e se pretendeu-se mudar o sistema governamental e permitir que os castelhanos participassem na gestão do reino português, algo proibido pelas Cortes de 1581.{{HarvRef|Bouza|1991|p=218}}
 
O fracasso das expedições para recuperar Pernambuco em 1638 e 1639 alimentaram a tensão.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|pp=28-29}} Os portugueses temiam que os holandeses ameaçassem também [[Angola]] e [[São Tomé e Príncipe|São Tomé]], de onde procediam os escravos que levavam ao Brasil.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}} Essa situação fez com que as colónias portuguesas do Atlântico estivessem cada vez mais descontentes com o governo madrileno.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|pp=28-29}}
Linha 61:
=== Primeiras revoltas ===
[[Ficheiro:Pourbus, Frans II - Marguerite of Savoy - Hermitage (cropped).jpg|miniaturadaimagem|265x265px|[[Margarida de Saboia, Duquesa de Mântua|Margarida de Saboia]], vice-rainha de Portugal, por [[Frans Pourbus, o Jovem|Frans Pourbus]]]]
O projetoprojecto de [[castelhanização]] dos territórios peninsulares impulsionado pelo [[Gaspar de Guzmán, Conde-Duque de Olivares|conde-duque de Olivares]] supôs o aumento da pressão fiscal.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} As petições financeiras e militares do [[Favorito|''valido'']] originaram várias revoltas já na década de 1620 e 1630.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} A essas somou-se o desencanto de parte das classes privilegiadas portuguesas, que tinham esperado beneficiar-se da união dos impérios coloniais mas tiveram que enfrentar os ataques reiterados dos inimigos do rei nas posses do ultramar.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}}
 
Existia o claro peso da pressão fiscal que deviam suportar os portugueses e o povo começava a manifestar-se nas ruas.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=130}} As revoltas contra a dominação espanhola tiveram como antecedentes, entre outros, o [[Motim das Maçarocas]], que estourouestalou no [[Porto]] em 1628.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} A [[Revolta do Manuelinho]] em [[Évora]], no ano de 1637, foi um precursor do movimento restaurador.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} Foi um levantamento popular anti-fiscal que contou com o apoio de alguns dos conjurados de 1640.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=113}} Os privilegiados atiçaram a revolta, mas não participaram nela.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=113}} Finalmente, tropas castelhanas sufocaram-na em [[1628|1638]].{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=113}} O [[João IV de Portugal|duque de Bragança]], esperança dos privilegiados para restaurar uma dinastia portuguesa no trono e figura necessária para isso, mostrou-se relutante em participar das conspirações. (ver [[Os Conjurados]]){{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=231}} O duque, principal proprietário do reino, era também seu maior aristocrata.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=114}} O povo, diferentemente do duque e exasperado pela pressão fiscal dos Habsburgos, estava disposto a rebelar-se.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=130}}
 
Esses movimentos propagaram-se por outras regiões do [[Monarquia|reino]], com a intenção de depor a [[dinastia filipina]] e entronizar novamente uma portuguesa. Desse modo estouraramestalaram insurreições e motins em localidades como [[Portel (Portugal)|Portel]], [[Sousel]], [[Campo de Ourique]], [[Vila Viçosa]], [[Farol|Faro]], [[Loulé]], [[Tavira]], [[Albufeira]], [[Coruche]], [[Montargil]], [[Abrantes]], [[Sardoal]], [[Setúbal]], [[Porto]], [[Vila Real]] e [[Viana do Castelo]], nas regiões de [[Alentejo (NUTSII)|Alentejo]] e [[Algarve]]. A causa imediata desses alvoroços foi a imposição de novos impostos e as difíceis condições de vida da população sob o domínio espanhol. O movimento não conseguiu destituir o governo instaurado em Lisboa, sucumbindo ao reforço de tropas castelhanas que foram em seu auxílio para reprimir a revolta.
 
=== Portugal e a política de Olivares ===
O [[Gaspar de Guzmán, Conde-Duque de Olivares|conde-duque de Olivares]], [[Favorito|''valido'']] do rei [[Filipe IV de Espanha]], alegando desejar constituir uma junta de pessoas notáveis, chama a MadrideMadrid os fidalgos de mais alto nível. Ao mesmo tempo, com o pretexto da [[Guerra Franco-Espanhola (1635-1659)|guerra com França]], manda recrutar tropas por todo Portugal e ordena ao Duque de Bragança o envio de 1000 soldados armados. Consciente de que parte da nobreza portuguesa era a favor do duque, tentou em vão trazer esse a [[Madrid|Madride]] ou afastá-lo de Portugal, oferecendo o governo do [[Ducado de Milão]].{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=232}}
 
As reformas reais foram mal vistas pela nobreza média — a alta nobreza, assim como o alto clero, achava-se assimilada à dinastia —, que não sabia se iria se submeter a elas ou rebelar-se.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=29}} A Coroa esperava que ela optasse por se adaptar à nova situação que pretendia implantar com as novas medidas, mas a eliminação da vantagem militar espanhola no final da década de 1630 pela derrota das [[Batalha das Dunas|Dunas]] e o surgimento da [[Guerra dos Segadores|Insurreição da Catalunha]] levou ao caminho do levantamento.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}} A perda dos barcos necessários para bloquear a costa no combate com os holandeses uniu-se a falta de tropas de terra para sujeitar Portugal, pois as forças disponíveis na península estavam tentando sufocar o levantamento catalão.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}}
Linha 76:
=== Os conjurados ===
[[Ficheiro:Joao IV.jpg|miniaturadaimagem|O duque de Bragança, futuro [[João IV de Portugal]]]]
O [[Restauração da Independência|levantamento de 1640]] foi planejado em Lisboa pelos fidalgos D. [[Antão de Almada (7º Conde de Avranches)|Antão de Almada]], D. [[Miguel de Almeida, 4.º conde de Abrantes|Miguel de Almeida]] e pelo Dr. [[João Pinto Ribeiro]] e outros 40 homens da [[nobreza]], do [[clero]] e [[Militar|militares]], para considerar os males de que sofria então Portugal. Pertenciam fundamentalmente àqueles que se consideravam postergados na obtenção de graças, fundamentalmente os setores médios.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=112}} O objetivoobjectivo que foram alcançados era a destituição dos Habsburgo e a proclamação de novo rei de origem portuguesa. Finalmente chegou-se à conclusão da necessidade de realizar uma revolução, resolvendo enviar a [[Vila Viçosa]] um emissário, encarregado de propor ao duque de Bragança que aceitasse o trono. Essas reuniões ocorreram no palácio de D. Antão de Almada, hoje conhecido por essa razão como [[Palácio da Independência]].
 
O eleito pelos conjurados, João, oitavo duque de Bragança,{{harvnp|Bouza|1991|p=206}} achava-se retirado em seu palácio de Villa Viçosa, dedicado a sua paixão: a música.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=29}} Era um dos nobres assimilados à dinastia reinante, da qual não só tinha obtido a confirmação de suas mordomias, senão que as tinha aumentado.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=114}} Estava aparentado ademais com várias linhagens de Castela e sua [[Luísa de Gusmão|esposa]] era irmã do duque de [[Ducado de Medina-Sidonia|Medina-Sidonia]].{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=114}} Apesar das sugestões e ameaças dos conjurados e as esperanças de libertação que o povo depositava nele, o duque não parecia disposto a participar da rebelião.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}} No princípio, negou-se a isso.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=114}} Sua participação era importante para justificar o levantamento como restauração da [[Casa de Bragança]], nativa, em frente aos estrangeiros Habsburgos.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}} Apesar das justificativas vagamente nacionalistas, os conjurados pretendiam em realidade implantar uma nova dinastia mais favorável a seus interesses.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|pp=29-30}} Apresentavam seu ideário nacional para ganhar o apoio do povo, farto do aumento da pressão fiscal.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=30}}
Linha 82:
O duque aceitou o trono somente em 1640, após a perda da armada espanhola na [[Batalha das Dunas]] e o envio das tropas para sufocar a [[Guerra dos Segadores|Revolta Catalã]] desvanecessem o perigo do rápido sufocamento da revolução.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=29}} Ante sua negativa inicial, os conjurados trataram em vão de oferecer o trono a seu irmão [[Duarte de Bragança, senhor de Vila do Conde|Duarte]], que evitou se comprometer.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|pp=115-116}} Em 1639, a rede de conjurados cresceu, mas não o bastante para que o duque aceitasse unir-se a eles: voltou a recusar fazê-lo.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|pp=115-116}} O número seguiu crescendo em 1640 e de novo trataram ganhar ao duque, que novamente se recusou a participar.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=116}} Incapazes de convencer o duque, os conspiradores ameaçaram-no com proclamá-lo rei sem seu consentimento em agosto ou setembro ou inclusive com instaurar uma república; a ameaça mostrou-se infrutífera e João continuou recusando as propostas dos conjurados.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=116}} O apelo de [[Filipe IV de Espanha|Filipe IV]] para que fossem com seus vassalos combater na Catalunha desagradou os nobres, favorecendo assim aos conspiradores, que se mostraram por fim mais dispostos a sustentar o duque, que acabou por aceitar unir-se ao plano.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=117}} João aceitaria a coroa quando a revolução triunfasse: enquanto isso, permaneceria em [[Vila Viçosa|Villa Viçosa]].{{HarvRef|Bouza|1991|p=206}}
 
Para evitar no último momento o levantamento, Olivares convocou o duque a MadrideMadrid no final de 1640.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=30}} Pressionado pelos conjurados, o duque se recusou e afirmou que marcharia à capital mais adiante; a convocação só serviu para acelerar o plano de rebelião.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=30}}
 
Aproveitando a concentração das tropas espanholas na [[Guerra dos Segadores|Catalunha]], os conjurados proclamaram a independência o 1 de dezembro de 1640.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=232}} A iniciativa não partiu do povo, mas da classe dirigente portuguesa.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=232}}
Linha 91:
Aclamaram ao Duque de Bragança como rei, com o título de [[João IV de Portugal]], dando início à quarta dinastia, a [[Casa de Bragança|Dinastia de Bragança]]. O novo governante autorizou a [[Margarida de Saboia, Duquesa de Mântua|Margarida de Saboia]] que partisse para Espanha nos primeiros dias de dezembro desse mesmo ano. O momento foi oportunamente escolhido, já que a casa de Habsburgo enfrentava nessa época os problemas derivados da [[Guerra dos Trinta Anos|Guerra dos trinta anos]] e a [[Guerra dos Segadores|Revolta Catalã.]]
 
A confirmação do triunfo do levantamento chegou a MadrideMadrid em 7 de dezembro, onde se proibiu sob pena de morte que se falasse do assunto.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=31}} Até mediados de mês, o Governo confiou em poder retomar o controle do reino vizinho.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=31}} Devido aos outros conflitos que se encontrava envolvida, a Espanha acabaria adotando uma posição defensiva em relação a Portugal.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=31}} Durante as seguintes duas décadas, este frente ficou praticamente paralisado.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=31}}
 
== Extensão do levantamento: os territórios do ultramar ==
Linha 108:
Após ganhar várias pequenas vitórias, João tratou de fazer as pazes com rapidez. No entanto, sua exigência de que Filipe reconhecesse a nova dinastia reinante em Portugal não se cumpriu até o reinado de seu filho, [[Afonso VI de Portugal|Afonso VI]], durante a regência de Pedro de Bragança, outro de seus filhos, que mais tarde se converteu no rei [[Pedro II de Portugal]]. Os confrontos com Espanha duraram vinte e oito anos.
 
Tanto MadrideMadrid como Lisboa decretaram bloqueios comerciais com o inimigo.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=133}} O espanhol manteve-se teoricamente até o final do conflito, ainda que o contrabando tenha tornado os dois bloqueios ineficazes.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=133}} As tentativas espanholas de que os ingleses se comprometessem a não comerciar com Portugal fracassaram; os próprios territórios da Coroa hispânica burlavam o bloqueio.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=133}} O novo Governo português acabou com os impostos mais odiados durante o período Habsburgo, porém depois implantou outros mais onerosos, que justificou pela necessidade de sufragar a guerra de independência.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=133}} A continuidade da pressão fiscal fomentou de novo o desencanto popular, que gerou revoltas menores que as da década de 1630, já em 1661.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=133}}
 
== Situação internacional: as relações entre as potências europeias ==
Linha 115:
''Ver também: [[Guerra Franco-Espanhola (1635-1659)|Guerra Franco-Espanhola]], [[Guerra dos Trinta Anos]]''
 
Em [[1640]], o [[Cardeal de Richelieu]], então primeiro ministro de [[Luís XIII de França]], era plenamente consciente do facto de que a [[França]] estava a lutar sob difíceis circunstâncias. Nessa altura, estava em [[Guerra Franco-Espanhola (1635-1659)|guerra com Espanha]] e ao mesmo tempo tinha de controlar as [[Rebelião|rebeliões]] que se estavam a ocorrer em França, as quais foram apoiadas e financiadas por [[Madrid|Madride]], e para isso teve que enviar [[Exército de Terra Francês|exércitos franceses]] para lutar contra os Habsburgos espanhóis em três frentes diferentes. Além de sua fronteira comum nos [[Pirenéus]], [[Filipe IV de Espanha]], anteriormente [[Filipe IV de Espanha|Filipe III de Portugal]], reinou baixo diversos títulos, em [[Flandres]] e o [[Franco-Condado]], ao norte e ao este da França respectivamente. Também, Filipe IV controlava grandes territórios na[[Itália]], onde poderia, a seu desejo, impor uma quarta frente para atacar Saboia, então controlada pela França e governada por [[Cristina da França|Cristina Maria da França, duquesa de Saboia]], quem atuava como [[Regência (governo)|regente]] em nome do seu filho, [[Carlos Emanuel II, Duque de Saboia|Carlos Emanuel II]], duque de [[Saboia]].
 
A Espanha tinha desfrutado da reputação de ter a [[Forças armadas|força militar]] mais formidável da [[Europa]], uma reputação que tinha ganhado com a introdução do [[arcabuz]] e a chamada Escola Espanhola. No entanto, esta reputação e táctica tinha diminuído com a [[guerra dos Trinta Anos]]. Richelieu, obrigou Filipe IV a lutar contra seus próprios problemas internos. Com o fim de desviar as [[Exército da Espanha|tropas espanholas]] que [[Cerco|sitiavam]] a França, [[Luís XIII de França|Luís XIII]], seguindo o conselho de Richelieu, apoiou as reivindicações de [[João IV de Portugal]] durante a guerra. Isto ocorreu pois a França queria dispersar as forças espanholas para outras frentes de batalha.
Linha 124:
''Ver também: [[Tratado dos Pirenéus]]''
 
Para o cumprimento dos interesses comuns da política estrangeira de Portugal e França, uma [[Tratado|aliança]] entre os dois países foi assinada em [[Paris]] no dia [[1 de junho]] de 1641,{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=232}} obrigando Portugal a continuar e manter uma guerra contra Espanha, procurando invadir os domínios de Castela e atacando às frotas das Índias. Esse tratado durou dezoito anos até que o sucessor de Richelieu, um ministro de Assuntos Exteriores, o [[Jules Mazarin|cardeal Mazarin]], rompesse o tratado abandonando a seus aliados portugueses e catalães para assinar uma paz por separado com [[Madrid|Madride]].
 
Em 1647, João propôs a Mazarin entregar o território peninsular português ao [[Gastão, Duque d'Orleães|duque de Orleães]], que ficaria como regente enquanto a corte retirar-se-ia a um novo reino que formaria com o Brasil e os [[Açores]], dividindo assim o reino.{{harvnp|Valladares Ramírez|1995|p=129}} O duque teria de casar a sua filha com o príncipe [[Teodósio, Príncipe do Brasil|Teodósio]], que herdaria depois o trono do Portugal peninsular.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=129}} A desesperada proposta surgia do temor português em perder a aliança francesa quando as [[República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos|Províncias Unidas]] começavam a tratar a paz com Espanha.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=63}} [[Jules Mazarin|Mazarino]] recusou a oferta.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1995|p=129}}
Linha 147:
=== As relações entre Portugal e Inglaterra ===
[[Ficheiro:Catherine of Braganza, Queen of England.jpg|esquerda|miniaturadaimagem|[[Catarina de Bragança]], rainha da Inglaterra. Por [[Peter Lely]]]]
[[Reino da Inglaterra|Inglaterra]] estava, nesse momento, envolvida em sua própria [[Guerra Civil Inglesa|guerra civil]]. Apesar disso, assinou um acordo com Portugal no final de janeiro de 1642.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=232}}{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=60}} Os portugueses reconheciam as possessões ingleses na Guiné, obtinham dois anos de prazo para decidir se concediam mordomias comerciais a Londres no Brasil e prorrogavam a trégua vigente na Índia.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=60}} Na realidade, o acordo demonstrou a habilidade diplomática portuguesa, que obteve a ajuda dos [[Casa de Stuart|Stuarts]] sem conceder nada que estes já tivessem.{{harvnp|Valladares Ramírez|1998|p=60}} O objetivoobjectivo português era empregar a marinha mercante inglesa para assegurar o abastecimento do reino.{{HarvRef|Valladares Ramírez|1998|p=60}} Surgiram problemas aos portugueses nas relações com Inglaterra quando o Parlamento inglês venceu na guerra contra o rei e, ao mesmo tempo, o [[Corte (realeza)|corte real]] portuguesa continuou recebendo e reconhecendo a [[Príncipe|príncipes]] e [[Nobreza|nobres]] ingleses. Estas tensas relações persistiram durante o breve [[Comunidade da Inglaterra|período da Comunidade Inglesa]], quando o governo republicano que tinha deposto e decapitado o rei [[Carlos I de Inglaterra|Carlos I]] governou [[Inglaterra]], [[Irlanda]] e [[Escócia]].
 
Depois da restauração da [[Casa de Stuart|dinastia Stuart]], foi possível a Portugal compensar a perda do limitado apoio da [[França]] com a renovação de sua tradicional aliança com Inglaterra. A eficaz ajuda dos ingleses na guerra contra Espanha derivou-se, em [[1654]], num tratado que concedia mordomias aos comerciantes ingleses de Portugal, como a [[liberdade religiosa]], [[Direito civil|justiça civil]] própria e [[Livre-comércio|liberdade de comércio]] com diminuição de [[taxa]]s. Assim mesmo, Inglaterra reteve os territórios coloniais adquiridos anteriormente a Portugal.<ref name="SXVII">[http://books.google.co.il/books?id=TFfZvPzgx8sC&pg=PA49&dq=tratado+de+lisboa+1668&hl=es&sa=X&ei=dZUOUeKpCsj74QSxm4DQCQ&ved=0CEAQ6AEwBA#v=onepage&q=tratado%20de%20lisboa%201668&f=false El siglo XVII - De la contrarreforma a las luces]</ref>
Linha 176:
Para recuperar Portugal, os espanhóis organizaram dois exércitos: um principal na [[Estremadura (Espanha)|Extremadura]] e outro na [[Galiza]].{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=308}} Na Galiza recrutaram-se dezasseis mil homens, sendo que menos serviram na frente, em más condições e mal pagos, situação que fomentou a propagação de epidemias e as deserções.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=309}} Para melhorar a situação, decidiu-se reduzir o número de soldados, para contar com um contingente pseudo profissional melhor pago e tratado.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=309}} A primeira redução feita para permitir que parte dos soldados pudessem retomar as tarefas agrícolas, se realizou em 1644.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=238}} Em 1649, serviam na frente [[Galiza|galega]] quatro mil infantes e oitocentos ginetes.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=308}}
 
Os portugueses fixaram seu quartel geral em [[Elvas]], enquanto os espanhóis faziam-no na vizinha Badajoz, transladando-o desde [[Mérida (Espanha)|Mérida]], onde tinha estado nos primeiros meses de guerra.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=196}} A zona, intensamente militarizada depois da aclamação de João IV em Lisboa, foi o teatro principal da guerra.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=196}} Em 1641, dada a falta de capacidade dos adversários, os dois abstiveram de acometer-se.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=196}} Os dois bandos concentraram-se em melhorar as defesas de seus territórios.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=201}} Os choques, determinados pelas ordens de MadrideMadrid e Lisboa, foram limitados a escaramuças.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=201}} Em 1642 a guerra avivou-se: os portugueses levaram a cabo uma incursão na [[serra de Gata]], aproveitando as desavenças entre os comandos militares de [[Cáceres (Espanha)|Cáceres]] e [[Salamanca]].{{harvnp|Caro del Corral|2012|pp=200, 203-204}} No resto do ano ocorreram as escaramuças, de resultado incerto.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=206}} Durante 1643 e 1644, os portugueses devastaram a fronteira de Cáceres, com notável sucesso.{{harvnp|Caro del Corral|2012|pp=206-208}} Assaltaram ademais em vão [[Badajoz]].{{harvnp|White|2003|p=67}} Também atacaram a Galiza, onde se apoderaram de [[Salvatierra]].{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=196}}
 
O exército real destinado em Extremadura, privado das melhores tropas e escasso de financiamento, teve de completar sua força com soldados novatos e iniciantes na carreira militar.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=194}} A falta de costume marcial favoreceu a indisciplina, à que se uniu a péssima qualidade dos oficiais.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=195}} A falta de fundos para financiar as despesas do exército fizeram que este tivesse que viver das populações locais.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=195}} A população civil sofria com os ataques portugueses e com abuso de soldados espanhóis.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=195}} Como consequência, se formaram unidades de voluntários estremenhos, dedicados tanto à defesa de suas terras como a saques por Portugal e ao contrabando, de longa tradição na zona fronteiriça.{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=210}} Apesar das atividades ilegais destes bandos armados, eles eram fundamentais para a defesa fronteiriça, dada a ineficácia do exército regular.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=210}}
Linha 197:
 
=== Alcance da guerra ===
A guerra deu-se em três teatros diferentes ao longo do primeiro período, mas a atividade bélica centrou-se no frente norte, para perto de [[Galiza]], e na fronteira central, entre a região portuguesa do [[Alentejo (NUTSII)|Alentejo]] e a espanhola de [[Estremadura (Espanha)|Extremadura]]. O frente sul, onde a região meridional portuguesa do [[Algarve]] fazia fronteira com a Andaluzia na Espanha, era um objetivoobjectivo lógico para Portugal, mas nunca foi objeto de um ataque luso, provavelmente devido a rainha consorte de Portugal, [[Luísa de Gusmão]], ser irmã do [[Ducado de Medina-Sidonia|duque de Medina Sidonia]], principal nobre da [[Andaluzia]].
 
=== Desgaste e corrupção ===
Espanha, em princípio, fez uma guerra defensiva. Portugal, por sua vez, não sentia nenhuma necessidade de tomar território espanhol com o fim de ganhar, e também estava disposto a fazer da guerra uma competição defensiva. As campanhas normalmente consistiam em ''correrias'' (incursões de cavalaria) para [[Terra queimada|queimar os campos]], [[Pilhagem|saquear]] as populações e roubar grandes rebanhos de gado e de outros animais do inimigo. Os soldados e oficiais, muitos deles [[Mercenário|mercenários]], estavam principalmente interessados no despojo e propensos à deserção. Durante longos períodos, sem homens nem dinheiro, nenhum dos lados montou campanhas formais, e quando as ações foram tomadas, eram conduzidas com frequência tanto por considerações políticas, como pela necessidade de Portugal de impressionar a potenciais aliados, bem como por claros objetivosobjectivos militares. Ano após ano, considerando os problemas de enfrentar a campanha no inverno, e o calor e a seca do verão, a maioria dos combates importantes limitavam-se a duas "estações de campanha" relativamente curtas, em primavera e outono.
 
A guerra instalou-se num padrão de destruição mútua. Já em dezembro de 1641, era comum escutar dos espanhóis de todo o país que "Extremadura está acabada". Os arrecadadores de impostos, agentes de recrutamento, os soldados acantonados, e as depredações por parte das tropas espanholas e estrangeiras eram odiados e temidos pela população espanhola, tanto como as incursões do inimigo. Em Extremadura, as milícias locais levaram o peso da luta até 1659, e a ausência destes soldados a tempo parcial era sumamente prejudicial para a agricultura e as finanças locais. Dado que com frequência não se tinha dinheiro para pagar ou apoiar às tropas (ou para recompensar a seus comandantes), a coroa espanhola pouco fez para combater o contrabando, a especulação, e a destruição que se tinha convertido em algo endêmico na fronteira. Condições similares também existiam entre os portugueses.
Linha 214:
Nos anos 1650 foram indecisos militarmente, mas importantes nas frentes políticas e diplomáticas. A morte do rei [[João IV de Portugal]] em 1656 marcou o começo da regência de sua esposa, que seguiu uma crise pela sucessão e o [[golpe palaciano]] de [[1662]].{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=221}}Parte da nobreza lusa impugnou a sucessão.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=221}} Apesar destes problemas internos, a [[Batalha dos Guararapes|expulsão dos holandeses do Brasil]] (1654) e a assinatura de um tratado com Inglaterra (também em [[1656|1654]]) melhorou a posição diplomática e financeira de Portugal temporariamente e lhe deu a proteção necessária contra um ataque naval sobre [[Lisboa]].
 
No entanto, Portugal seguiu sem conseguir o objetivoobjectivo primordial: um pacto formal com França; a debilidade e o isolamento portugueses tinham sido confirmados na virtual exclusão das negociações do principal pacto europeu do momento, a [[Paz de Vestfália]] em [[1648]], triunfo da nova ''[[realpolitik]]''. Graças à assinatura deste tratado e do fim das [[Guerra dos Segadores|hostilidades na Catalunha]] em [[1652]], Espanha pôde novamente concentrar sua atenção em Portugal,{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=234}} ainda que sofreu uma falta de homens, recursos e, sobretudo, de bons chefes militares para realizar a submissão do território.
 
A partir de 1658, a frente galega adquiriu importância.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=234}} Os galegos conquistaram [[Lapela]] nesse ano e ao seguinte [[Salvatierra]].{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=234}} Os espanhóis podiam por fim promover a recuperação de Portugal, que, por sua vez, solicitou o aumento da ajuda exterior para o evitar.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=234}}
Linha 224:
Depois da assinatura do [[Tratado dos Pirenéus]] de [[1659]], a [[independência de Portugal]] estava ameaçada pela Espanha. O alto comando espanhol planejava usar parte do exército de Flandres na frente portuguesa para contar com forças veteranas que pudessem pôr fim à longa guerra mediante uma invasão.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=84}} Para combater o risco, em 1661, os portugueses contrataram os serviços de um [[Nobreza|nobre]] militar [[Alemanha|alemão]], [[Frederico Armando de Schomberg]], como conselheiro militar de [[Lisboa]], por recomendação do militar francês [[Henrique de La Tour de Auvérnia, Visconde de Turenne|Turenne]], junto com outros oficiais estrangeiros e mais de dois mil soldados ingleses para reforçar as forças portuguesas. [[Luís XIV de França|Luís XIV]] de da França, para não infringir o tratado assinado com Espanha, privou a Von Schönberg de seus oficiais franceses.
 
Os espanhóis, por sua vez, tiveram problemas para enviar tropas de Flandres à Península Ibéria: os soldados eram no geral pouco inclinados em marchar aos duros combates de Portugal.{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=86}} A primeira remessa de soldados, quatro mil de infantaria e mil quatrocentos ginetes sem os seus arreios além de certos especialistas, partiu desde [[Oostende|Ostende]] à península em fevereiro de 1662.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=86}} O contingente embarcou-se numa frota de dezoito navios, quatro deles de guerra que escoltavam aos demais; entre os de transporte achavam-se várias fragatas corsárias, que depois ficaram nas águas peninsulares para estorvar o comércio português.{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=88}} Apesar das dificuldades financeiras do exército de Flandres, dependentes do sustento financeiro externo, cada vez mais escasso, MadrideMadrid não deixou de solicitar contínuos envios de soldados para a frente portuguesa.{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=88}} Em 1663 outros dois mil e quinhentos soldados marcharam ao sul em seis fragatas; foi o último grupo em fazê-lo, pois a partir de então a falta de soldados em Flandres interrompeu os traslados.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=86}}
 
Na Espanha um dos problemas principais o constituía a dificuldade para conservar as unidades.{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=111}} As penúrias que passavam os soldados, como a falta de financiamento por parte da coroa de Castela fomentavam as deserções para tentar fugir da miséria.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=111}}
Linha 236:
Nesse mesmo ano de 1665, os portugueses desencadearam uma ofensiva na Galiza, com o fim de apoderar do porto de [[Vigo]], que os franceses desejavam obter.{{harvnp|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=235}} Esta acometida acabou com a série de vitórias galegas no frente norte e permitiu aos portugueses ocupar o vale do Ronsal e sitiar [[Guarda (Galiza)|Guarda]].{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=235}} Depois deste ataque não houve combates do importância na frente galega, que se manteve paralisada.{{HarvRef|Castilla Soto|Cuba Regueira|1996|p=235}}
 
Com falecimento de Filipe IV em 1665, apesar falta de meios para empreender novas ofensivas e o começo em 1667 da [[guerra de Devolução]] que, apesar dos avisos do governo flamenco, surpreendeu à corte de MadrideMadrid,{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=212}} a rainha regente viúva ainda se recusava a perder Portugal, opondo-se ao pessimismo dos seus ministros.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=212}} Porém, a nova guerra com França acelerou o fim da guerra.{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=215}} Para poder defender Flandres, a Coroa devia firmar a paz com os portugueses, tendo a regente [[Maria Ana de Áustria, Rainha de Espanha|Maria Ana da Áustria]] finalmente aceitado.{{HarvRef|Rodríguez Hernández|2007|p=212}}
 
Ambas partes voltaram a campanhas de escaramuças. Portugal, com a interseção de seu aliado inglês, tinha solicitado uma trégua, mas a decisiva vitória portuguesa em Montes Claros e a assinatura do Tratado de Lisboa de 1667 entre França e Portugal precipitaram o fim do conflito: os Habsburgos espanhóis finalmente acederam a reconhecer a [[Independência de Portugal|independência]] portuguesa{{harvnp|Caro del Corral|2012|p=226}} e à [[Casa de Bragança]] como a nova dinastia reinante de Portugal em [[13 de fevereiro]] de [[1668]].{{harvnp|Rodríguez Hernández|2007|p=216}} A paz assinou-se nesse dia no Convento de Santo Elói de Lisboa.{{HarvRef|Caro del Corral|2012|p=226}}