Mandarim (burocrata): diferenças entre revisões

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O símbolo mais característico da sua dignidade é o grande botão que colocam na parte traseira do seu chapéu. Os mandarins mais importantes ou de primeiro grau usam este botão feito de [[rubi]]s e os outros que lhes sucedem na hierarquia usam o botão feito de [[coral]], [[safira]]s, [[lápis-lazúli]], [[cristal]], [[madrepérola]], [[ouro]] ou [[prata]].
 
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O sistema de concursos na China imperial
 
Introdução
 
Não é nova a idéia de que a tarefa de administrar o Estado deva ser atribuída àqueles que estejam preparados intelectualmente para esta tarefa e tenham sido escolhidos por meio de um concurso: muito pelo contrário, ela é antiqüíssima e permeou o pensamento político chinês através dos séculos, sendo abolido apenas em 1905.
 
Durante o primeiro período de unificação do império chinês, o vasto império que resultou se colocou sob uma administração unificada. A concepção de um império central (a China se auto-denomina Império do Centro) exigiu a formação de uma burocracia dedicada à preservação e ao controle desse império único e unificado, dispensando o auxílio administrativo da aristocracia dominante até então. Como resposta, a estrutura governamental que se armou tinha base em uma filosofia capaz de sancionar a existência do governo central, filosofia esta posta em prática por uma classe de eruditos-funcionários (mandarins), numericamente pequena, mas que exercia todo o poder e era principal proprietária de grandes extensões de terra. As funções de administração pública e administração da justiça estavam a seu cargo, bem como o planejamento e execução das obras públicas.
 
Os mandarins integravam um serviço civil de carreira vitalícia, que, por sua vez, governava e dava ao regime imperial a sanção racional e ética de que este necessitava para o exercício de sua autoridade. Para exercer funções de gerência e de assessoria (na condição de conselheiros políticos), os mandarins eram doutrinados e preparados segundo os princípios da filosofia oficial, o confucionismo. O segredo de sua continuidade e sobrevivência estava no sistema de concursos únicos e competitivos para recrutar funcionários para o Estado.
 
Estes funcionários eram escolhidos em concursos públicos que, como regra geral, não testavam os conhecimentos do candidato em áreas específicas do conhecimento humano, mas, de uma forma geral, avaliavam seu conhecimento de textos clássicos do confucionismo, o que, supostamente, daria uma medida de sua capacidade intelectual geral (quase se poderia dizer abstrata). Isto é coerente com o fato de que os mandarins não eram especialistas, mas funcionários supostamente aptos a resolver todos e quaisquer problemas da administração pública com que se defrontassem. Por muito tempo, o sistema funcionou melhor que qualquer uma das alternativas existentes: a melhor prova disto encontra-se no fato de que, nas raras oportunidades em que a China foi conquistada por etnias estrangeiras, seus senhores voltaram a utilizar os indispensáveis serviços dos mandarins pata manter em funcionamento a máquina do Estado.
 
 
== O contexto histórico ==
Quando o primeiro imperador da dinastia Ch’in unificou o império chinês (221-207 a.C.), traçaram-se as linhas gerais da instituição imperial e do sistema de governo que seguiriam as dinastias posteriores para governar aquele vasto império. Embora o reinado da dinastia Ch’in tenha sido breve, pela primeira vez o país se colocou sob uma única administração, um Estado centralizado que tinha poder sem precedentes, controlava grandes recursos e mostrava tal magnificência que inspirava um sentimento de respeito e temor tanto a seus habitantes quanto ao exterior. Ao desaparecer, a dinastia Ch’in deixou como legado mais importante à dinastia Han, que a sucedeu (202 a.C.-220 d.C.), a concepção do império e a estrutura de governo que o mantinha. Os quatro séculos que durou essa dinastia constituíram um período de consolidação, durante os quais se moldaram todos os aspectos da vida chinesa, inclusive os da esfera intelectual. Os reflexos deste período perduraram até a época moderna não apenas na China, mas também na Coréia, Vietnam e, ainda, no Japão.
 
A China era uma grande sociedade agrária, muito desenvolvida, pré-industrial, não marítima, baseada em uma economia agrária, utilizava técnicas tradicionais e estava situada em um subcontinente que carece de articulação geográfica definida. As famílias camponesas, que constituíam a vasta maioria da população, viviam em autarquia econômica e espalhavam-se sobre um imenso território interligado principalmente por uma rede de canais fluviais. Bastavam a si próprias, mas recorriam a um sistema de intercâmbios mercantis, que se teria desintegrado se não tivesse recebido um impulso de organização imposto desde o alto.
 
Na base da pirâmide social encontravam-se os camponeses; um pouco deslocados dentro deste sistema estavam os mercadores e os artesãos, que eram poucos, carentes de autonomia, tinham uma posição inferior e não eram respeitados. O topo da sociedade encontravam-se os eruditos-funcionários (ou mandarins), pouco numerosos, mas poderosos, influentes e prestigiados. Essa elite derivava sua força do trabalho que desempenhava, a função socialmente necessária e indispensável de coordenar e supervisionar o trabalho produtivo de ouros a fim de fazer funcionar todo o organismo social.
 
Todas as tarefas da administração e jurisdição estavam a seu cargo: eles elaboravam o calendário, organizavam o transporte e o comércio, supervisionavam a construção das estradas, canais, diques e represas e eram encarregados de todas as obras públicas, especialmente aquelas destinadas a prevenir as secas e inundações; formavam estoques contra a fome e estimulavam todo tipo de projetos de irrigação. Eram arquitetos, engenheiros, mestres, administradores e governantes ao mesmo tempo – eram tudo isto, mas sem serem apenas isto: não eram especialistas em nada. Sua única profissão era a de governar. Constituíam a essência do Estado, que estava erigido à sua imagem: hierárquico e autoritário, paternal e tirânico, iluminista e totalitário.
 
Nada escapava à a regulamentação oficial. A vida econômica, os ritos, a música, a educação, em suma, toda a vida pública e grande parte da vida privada estavam sob seu domínio.
 
== A base filosófica ==
 
Os intelectuais do império Han formularam o mais importante e permanente dos conceitos filosóficos da China: o de que o céu, a terra e o homem formavam uma trindade eterna. O homem deveria estudar as leis do céu, tanto em seu sentido metafísico quanto físico. E o governo, feito pelos homens, devia atender sempre aos assuntos relacionados com a terra, em especial os que se relacionavam à irrigação, seu uso, controle e de inundações, etc. Os sábios Han insistiam em que o bem-estar econômico era a base da moralidade popular. As pessoas desejavam ter riqueza e bem-estar, e, se não fosse possível obtê-os por meios honestos, iriam buscá-los por outros modos. Portanto, o governante devia fazer com que todos obtivessem, por meios honestos, aquilo de que necessitavam para viver, pois o mesmo caminho levaria à prosperidade e à virtude. Por essa razão, o governo e o próprio imperador eram responsáveis pela conduta moral do povo. Se um homem pobre roubava, era porque não podia viver honestamente. Logo, esse homem não era culpado de sua situação, mas sim o sistema econômico e social, na figura do imperador; se este corrigisse os próprios erros, então permitiria a seu povo ser virtuoso.
 
Nesse processo, o primeiro passo era promover a paz e a prosperidade; o segundo, era o treinamento moral ou educação. Os graus mais elevados de cultura só eram acessíveis os homens inteligentes e que não estivessem dedicados à agricultura: o produto final de todo esse processo era o sábio, o homem bem educado, que, por seus conhecimentos, possuía o sentido moral mais agudo e refinado possível. Assim, seu lugar na sociedade estava no serviço público.
 
== O funcionamento do funcionalismo ==
 
Aliando-se com o sistema imperial da dinastia Han, os eruditos tiveram vários êxitos significativos: conseguiram que o confucionismo fosse declarado filosofia oficial do Estado, fundaram uma universidade estatal, estabeleceram um sistema de concursos públicos e, em tempos de paz, ocuparam a posição socialmente dominante. O conceito do Estado e da função do governante, que abarcava todos os aspectos da vida da nação e de sua gente, expresso nos termos mais elevados, foi um dos maiores sucessos do pensamento chinês. Os teóricos políticos da época Han, para deixar claro o repúdio total as experiências e teorias da centralização do poder autocrático e total do imperador, vigentes na dinastia Chin, rodearam com habilidade a pessoa imperial com um aura de mistério divino e insistiram em que o governante não devia incomodar-se em tomar decisões específicas o levar a cabo atos de governo, mas deixar essas questões em mãos de seus ministros, os quais, ao menos em teoria, haviam sido selecionados com base em sua virtude e habilidades pessoais.
 
Como um símile autocrático do parlamentarismo, o imperador reinava mas não governava: na concepção dos filósofos Han, o imperador era o representante vivo de todo o ordenamento hierárquico dos seres humanos e ele mesmo era um reflexo da ordem maior do universo. Uma vez que, no pensamento chinês, o céu, a terra e o homem formavam uma tríade inseparável, assim o imperador, como cabeça do terceiro membro, era responsável por manter o gênero humano em harmonia com os outros membros e levá-lo a exercer sua dignidade humana.
 
O meio principal pelo qual o governante cumpria sua tarefa era o convencimento moral: o imperador era o responsável por dar exemplo perfeito tanto para os próprios funcionários quanto para seu povo, de tal modo que todos fossem influenciados pelo poder de sua bondade e arrastados irresistivelmente à prática da virtude. Em chinês, a expressão li-chi, correspondente a “governo civil”, significava mais que uma autoridade não-militar e não-religiosa: significava “o governo pela bondade”. Com o objetivo de alcançar essa bondade e ser conhecido por seu povo, dava-se a essa bondade e virtude do governante uma expressão concreta nos ritos e na música. Se as pessoas fossem expostas aos influxos civilizadores dos ritos e da música, segundo insistiam os intelectuais Han, não deixariam de ser educados e transformados. Esta era a idéia do “governo pela bondade”.
 
Tirando do imperador o real poder de mando, essa concepção fez muito por evitar que um soberano malévolo ou incompetente chegasse a ocupar o trono, por força da sucessão dinástica, e afetasse o governo da nação. A par disso, também teve grande alcance a teoria de que as más ações do governante, ou a falta de um bom governo nos níveis superiores, ocasionavam deslocamentos na ordem natural e a aparição de cometas, eclipses, pragas, animais raros, etc. Tais fenômenos eram interpretados como manifestações diretas da ira do céu e advertências à humanidade para reformar-se. Essa corrente, chamada de “A Teoria dos Portentos”, teve uma enorme influência no pensamento político Han porque deu à burocracia um método para censurar indiretamente o trono quando a crítica direta não era politicamente correta nem possível. Nessa teoria se incluíram os conceitos do “mandato do céu” e do “direito à rebelião” ou “teoria da revolução”: o imperador que se mostrasse indigno de seu posto punha em risco a ordem natural das coisas e deveria ser afastado.
 
A importância que teve este conceito é facilmente imaginável, porque persistiu intimamente associado ao exercício do poder imperial até a época moderna e abarcou a Coréia e o Japão. Entretanto, deve-se recordar que os teóricos Han ofereceram esta interpretação e justificação do poder imperial não para seu próprio beneficio, mas para restringir o abuso de sua exercício ao definir as grandes responsabilidades do governo imperial e ao estabelecer instituições que pudessem servir para controlá-lo.
 
A administração quotidiana era levada a cabo pelos eruditos-funcionários. Na época da unificação da dinastia Han, século II a.C., a ideologia confucionista converteu-se em doutrina estatal, mantendo-se em vigor ao longo dos séculos. Eventualmente, os mandarins eram afastados da cena política; nestes casos, eles se retiravam em silêncio para lugares solitários ou pouco importantes e preparavam seu inevitável retorno: afinal, eles eram indispensáveis. Se não fosse por seu trabalho, exercendo um controle férreo sobre a unidade do império e mantendo os aristocratas locais em sues lugares, o particularismo teria terminado com a soberania, e a civilização chinesa teria perecido.
 
 
== O sistema de concursos ==
Em um dos livros clássicos do confucionismo, havia uma sentença atribuída a Confúcio: ''“Quando os homens adequados estão disponíveis, o governo floresce. Quando os homens adequados não estão disponíveis, o governo decai […] a administração do governo depende dos homens adequados”''
 
Para se perpetuar como elite e renovar seus quadros, os pensadores políticos e os homens práticos de negócios estavam de acordo em que o remédio principal para os problemas do dia a dia era o recrutamento de homens de talento para o serviço do Estado. A idéia de que o governante devia ser servido e assessorado por um grupo de conselheiros proeminentes por sua integridade moral e sua sabedoria tem fundas raízes na história chinesa.
 
Quando a dinastia Han (206 a.C.-221 d.C.) começou a reorganizar o império centralizado e burocrático que deixou a dinastia Chin (221-206 a.C.), as idéias confucionistas começaram a influir na política pública. Os primeiros passos foram para organizar o recrutamento de servidores civis com base no mérito; as nomeações a postos oficiais se deram a “homens de talento” que foram recomendados à capital do império por iniciativa de funcionários locais. Mais tarde, utilizaram-se os concursos como uma avaliação do talento. Foi durante a dinastia Han que se estabeleceu a primeira relação entre a carreira oficial e uma educação nos clássicos confucionistas, quando o governo principiou a empregar graduados da universidade nacional com treinamento confucionista.
 
Depois de vários séculos de divisão interna, durante a dinastia Sui (589-618) e a dinastia T’ang (618-906), os governantes se deram conta de que o treinamento e recrutamento de um serviço civil centralizado era a melhor forma de vencer os poderes do regionalismo e a aristocracia hereditária. Para treinar uma elite de mérito, os T’ang organizaram um sistema regular de concursos e começaram a recrutar um considerável número de seus funcionários dentre os graduados. As seguintes dinastias chinesas mais importantes, a Sung (960-1279), a Ming (1368-1644) assim como a Ch’ing (manchu), já assimilada à China (1644-1912), confiaram em grande medida no sistema de concursos públicos e competitivos para recrutar funcionários para o Estado. Esta foi outra grande invenção política. Já na época Ming os concursos que se apresentavam nos três níveis – a prefeitura, a província e a capital – conduziam à obtenção de graus sucessivos. Em sua maior parte, só a obtenção de um grau acadêmico qualificava um homem para ingressar no mundo dos funcionários. Desde dinastias anteriores se haviam feito muitos experimentos com o conteúdo dos exames. Durante a dinastia T’ang, por exemplo, outorgavam-se graus em alguma das especialidades que se ofereciam, inclusive nos clássicos, letras, direito e outras. Sob os imperadores Ming, essa lista se reduziu quando a padronização dos concursos fez com que estes fossem unicamente sobre os clássicos confucionistas e sua interpretação ortodoxa, conforme a definiu o filósofo Zhu Xi da época Sung. Ou seja, com essas medidas o sistema começou a atrofiar-se. Foi a época em que a filosofia confucionista ficou baseada em forma definitiva nos livros antigos, os clássicos chineses. Como se pode supor, esses livros antigos se transformaram em um cânon cujos textos foram interpretados e reinterpretados através dos séculos.
 
Neste processo, textos posteriores escritos para esse propósito se juntaram ao cânon, enquanto que outros de maior antiguidade foram esquecidos. Nesse cânon se acumularam 13 textos clássicos cuja ordem se simplificou pelos eruditos que seguiram, os quais selecionaram os famosos Quatro livros: os Analectas de Confúcio, o Livro de Mêncio, a Doutrina do significado e a Grande Aprendizagem, que foram abreviados para que qualquer nobre pudesse aprendê-los de cor. Sobre essas obras clássicas versavam os concursos de ingresso ao serviço civil.
 
Depois, refinado pelas experiências cambiantes e os gostos das gerações sucessivas, o sistema de concursos se converteu em um dos adornos principais do Estado chinês tradicional. Dentro do governo, os assuntos relacionados com o serviço civil, seu recrutamento e composição, o sistema de exames e seu grau de adequação estavam entre os problemas mais estudados e eram matéria de acerbas discussões. Entretanto, os concursos periódicos se converteram em grandes acontecimentos públicos da vida política chinesa. A figura do erudito pobre, a caminho da capital para apresentar-se aos exames, se converteu em uma imagem indispensável das historias de ficção e dramas da literatura chinesa desde a dinastia Sung. Também na época Sung o funcionário-erudito ficou firmemente estabelecido como o pináculo da estrutura social chinesa; sua carreira dava ao homem, como nenhuma outra, na China ou em outras partes, acesso ao poder, ao prestígio e à riqueza simultaneamente. A aparição desta aristocracia de mérito, ou meritocracia, livrou a dinastia, de forma definitiva, de sua dependência de uma aristocracia hereditária mais antiga.
 
A utilização regular de provas para recrutar funcionários teve conseqüências duradouras para a cultura, assim como para a sociedade. As tradições do pensamento e educação chineses começaram a ser conformados gradualmente pelos padrões e práticas do sistema de concursos. Os árduos preparativos – que consumiam muito tempo – para prestá-los fizeram que os aspirantes a um cargo levassem uma virtual “vida de concursos”. A ênfase estava em memorizar os livros clássicos e seus comentários. Cultivar uma boa memória e exercitá-la nas avaliações escritas era a meta: os concursos não estimulavam a criatividade, mas a tradição.
 
Desde o princípio, vários observadores ocidentais que chegaram a China identificaram imediatamente o serviço civil como uma das características únicas do corpo político chinês. MATEO RICI, missionário jesuíta, arquiteto e um dos primeiros cronistas das missões jesuíticas na China, deixou uma descrição admirável por seus detalhes do conteúdo e procedimentos do sistema de concurso. Mais tarde, nos séculos XVII e XVIII, descrições como a de RICI sobre o serviço civil em China, recrutado com base na virtude individual, suscitaram uma admiração entre os filósofos iluministas franceses. VOLTAIRE, TURGOT e muitos outros fixaram em seus escritos a imagem do serviço civil chinês como uma carreira aberta ao talento e se serviram dessa informação para atacar a força dos privilégios hereditários na Europa de seu sua tempo. Na verdade, pode-se constatar uma notável similitude entre algumas idéias confucionistas e as que propunham alguns filósofos europeus dessa época.
 
A prematura admiração do Ocidente por todo o que era chinês cedeu lugar a uma apreciação sóbria, chegando a um certo desdém. Com uma atitude mental mais crítica, estudiosos ocidentais e chineses começaram por averiguar se os concursos de ingresso no serviço civil haviam fornecido tanto sangue novo ao mundo oficial como se havia proclamado. Em um estudo pioneiro, o padre ÉTIENE ZI examinou as raízes étnicas e sociais bem como as carreiras subseqüentes de 300 homens que obtiveram com distinção o grau acadêmico mais alto, o chin-shih. Também investigou os antecedentes educativos e sociais dos funcionários de maior escalão do império e descobriu que entre os graduados mais distintos os chineses eram mais numerosos que os manchus, mas eram estes os quais ostentavam em maior número as posições mais altas do serviço civil. A conclusão do padre ZI foi que as raízes étnicas, ou seja, ser manchu quando governava uma dinastia manchu, significava posSuir uma base mais segura para subir às mais altas posições do governo que uma preparação intelectual e moral de excelência, conforme o demonstravam os concursos aprovados.
 
Investigadores acadêmicos posteriores examinaram a mobilidade social, e em particular aquela para ingressar no serviço civil de todas as principais dinastias dos últimos mil anos. Outros investigadores analisaram os antecedentes sociais e as carreiras de graduados e funcionários governamentais para saber se o serviço civil em realidade recrutava “homens de talento”, sem se importar com seus antecedentes sociais ou se, depois de todo, estava dominado por um grupo relativamente pequeno de “grandes famílias” que exerciam o poder por largos períodos. O resultado dessa análise os levou à conclusão de que houve um alto número de pessoas simples que ingressaram no serviço civil através do sistema de concursos, o que atesta o verdadeiro índice de mobilidade na China tradicional. Entretanto, ser rico sempre ajudava ao se prestar um concurso, pois os estudos dependiam de muito tempo livre e este tempo custava caro. Dinheiro era também necessário para pagar a um instrutor e, em casos excepcionais, para subornar funcionários encarregados dos concursos.
 
Provavelmente, sempre haveria mais candidatos graduados que posições de governo disponíveis. De fato, só o grau mais alto, o chin-shih, assegurava a quem o recebesse obtenção, quase automática, de uma nomeação oficial. Uma pessoa que tivesse o grau intermediário de chü-jen poderia ser empregada nos níveis mais baixos da escala oficial, mas não teria garantia disso. Quem obtivesse o grau menor de sheng-yüan quase nunca conseguia um cargo. Ser um graduado era condição necessária, mas não suficiente para entrar na burocracia oficial. Entretanto, os graduados do escalão inferior que não obtinham postos oficiais com freqüência eram empregados em funções quase governamentais, sobretudo em nível local.
 
Finalmente, estudos demonstraram que, em algumas épocas, privilégios hereditários permitiram a entrada no governo dos filhos de funcionários sem passar pelo concurso. Curiosamente, isto não significava premiar a falta de talento; pelo contrario, os filhos de funcionários tinham a oportunidade de aprender em casa muitas das habilidades e pontos de vista que qualificavam um homem para assumir um cargo. Contra todo o que esse fato fazia supor, o serviço civil não se converteu em território exclusivo das famílias notáveis, pois em muitas ocasiões estas não puderam manter-se em posição proeminente.
 
O recrutamento sempre esteve sujeito a injunções políticas. No século XX, MAX WEBER chamou atenção sobre a estreita relação entre a aparição de um serviço civil recrutado sobre a base do mérito e o desaparecimento do feudalismo em China. Igualmente, viu uma conexão entre a alta taxa de mobilidade dos que entravam como dos que saíam do serviço civil, por uma parte, e por outra, no fracasso dos funcionários em constituir um contrapeso ao absolutismo dinástico. Entre outros estudos sobre os aspectos políticos do recrutamento, estão os que demonstram como a manipulação das quotas regionais para o sistema de concurso foi utilizada pela dinastia para alcançar finalidades políticas. Outros comprovam que o processo do recrutamento para entrar no serviço civil chegou a estar intimamente relacionado com as lutas de poder de facções da corte. Também se demonstrou que as mudanças transcendentes no processo de recrutamento e, portanto, na mobilidade, puderam coincidir com as crises políticas mais importantes na duração das dinastias, e se presume que havia uma relação entre o processo do recrutamento, a mobilidade efetiva e o ciclo dinástico. Mais tarde, estudaram-se os procedimentos para recrutar homens para o serviço civil em outro contexto, o da história das idéias e os valores.
 
O interesse mudou da procedência social e o contexto político dos funcionários, e começou-se a perguntar acerca do conceito do “talento” e a natureza da educação que qualificava um homem para um cargo na China tradicional. No último terço do século XIX, alguns chineses reconheciam que o atraso de seu país em tecnologia se devia em parte às tradições educativas e intelectuais que haviam sido promovidas e perpetuadas com o sistema de concursos, baseado como estava no estudo dos clássicos de filosofia, literatura e história da tradição confucionista, com exclusão da ciência e da tecnologia.
 
Ao conhecer o status dos artesãos e técnicos no serviço civil da dinastia Ming, sabe-se muito sobre os ideais educativos desse tempo, em particular sobre uma espécie de hierarquia de qualificações em que se consideravam o caráter, a habilidade intelectual e a destreza técnica em ordem descendente. Não se sabe com clareza acerca da forma em que os chineses da época Ming, ou de qualquer outra dinastia, concebiam a relação entre caráter e a habilidade. Entretanto, essa relação era crucial para trabalhar no serviço civil e nos procedimentos de recrutamento. Todos estavam de acordo em que “caráter” e “integridade” eram a marca distintiva de um verdadeiro funcionário qualificado. Não obstante, na prática habilidade com freqüência se adotava como uma medida para avaliar um homem e era, em todo caso, uma forma de avaliá-lo, além do “caráter”. Se na dinastia Ming podia ter-se êxito por uma avaliação equilibrada do caráter e da habilidade intelectual, a tendência na maioria das dinastias para ser recrutados consistiu nos atributos mensuráveis e quantificáveis, como a inteligência, a memória e ainda a facilidade para escrever e redigir; ou seja, o que podia verse em os concurso do serviço civil, em lugar de avaliar a estatura moral, que era intangível. Foi precisamente a substituição dos critérios tangíveis, mas secundários, em lugar dos intangíveis o que trouxe muitas críticas ao sistema chinês de concurso através dos séculos. Essas críticas demonstravam que, para os chineses, o problema foi mais sério que para as escolas ocidentais: a questão dos concursos objetivos contra os subjetivos. Os chineses estavam, de fato, à busca de algum sinal externo de uma graça interior que qualificasse um homem para a liderança política. Por isso, estudar o procedimento do recrutamento para o serviço civil chinês é observar o jogo de idéias e instituições em uma área crucial da experiência chinesa.
 
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